Na tela, Joselito cantava uma canção para um cabritinho sob o olhar
benevolente e encantado de uma dupla de guardas-civis. Junto à televisão,
uma coleção de santinhos da Virgem compartilhava as honras com velhos
retratos de seu marido Rodolfo, empastado de brilhantina no chamejante
uniforme da Falange. Apesar da devoção pelo finado marido, dona Paula
estava muito contente com a democracia porque, como dizia ela, a TV
agora era colorida e, afinal, era preciso se atualizar.
— Nossa, que barulheira na outra noite, hein? O noticiário tinha
mostrado o terremoto na Colômbia e, ai, ai, não sei não, me deu um medo
enorme...
— Não se preocupe, dona Paula, a Colômbia fica muito longe
daqui.
— Dizem que sim, mas como também falam espanhol... Não sei, eu
acho que...
— Não tenha medo que não há perigo algum. Queria dizer que não
se preocupe como meu quarto. Vou passar o Natal com a família.
— Ora, Oscar, que alegria!
Dona Paula quase tinha me visto crescer e estava convencida de que
tudo que eu fazia era uma maravilha. "Você, sim, que tem talento",
costumava dizer, embora nunca tenha explicado muito bem para quê.
Insistiu para que eu tomasse um copo de leite e comesse uns biscoitos que
ela mesmo tinha feito. Foi o que fiz, apesar de não estar com fome. Fiquei
um pouco com ela, vendo o filme na TV e concordando com seus
comentários. A boa mulher falava pelos cotovelos quando tinha companhia,
ou seja, quase nunca.
— Olhe só que beleza de menino, hein? — dizia, indicando o
cândido Joselito.
— É mesmo, dona Paula. Mas vou ter de deixá-la agora...
Dei um beijo de despedida no rosto dela e fui embora. Subi
correndo ao meu quarto e rapidamente peguei algumas camisas, um par de
calças e roupa de baixo limpa. Coloquei tudo numa bolsa, sem perder um
segundo além do necessário. Ao sair, passei pela secretaria e repeti minha
história de festas com a família com a cara mais limpa. Saí dali desejando
que tudo na vida fosse fácil como mentir.
Jantamos em silêncio na sala dos retratos. Germán estava calado,
perdido em seus pensamentos. Às vezes, nossos olhares se cruzavam e ele
sorria, por pura gentileza. Marina remexia o prato de sopa com a colher,
sem nunca levá-la aos lábios. Toda a conversação se reduzia aos ruídos dos
talheres arranhando os pratos e aos chiados das velas. Não era difícil