Operaçao mar verde

Cantacunda 543 views 15 slides Apr 18, 2011
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I PREPARAÇÃO

Assim que terminou a operação "Nebulosa", o Comandante Calvão embarcou
para a Metrópole, a fim de expor uma ideia ao Governador General Spínola
que se encontrava na estância termal do Luso.
Tratava-se de eliminar os barcos do PAIGC, na própria base principal, isto é,
Conakry. Para tal utilizar-se-ia uma· equipa de mergulhadores sapadores que,
empregando minas-lapas, procuraria neutralizar as embarcações.
Faltava contudo o material explosivo: não dispúnhamos de minas-lapas. Havia
no entanto a possibilidade de as obter na África do Sul.
O Governador aprovou a ideia e o Comandante Calvão regressou a Lisboa
para tratar da deslocação. Avistou-se com o Chefe do Estado Maior da Armada
(Vice-Almirante Armando de Roboredo) a quem apresentou o assunto e que,
imediatamente, concordou com a viagem à África do Sul, facilitando o apoio
logístico à mesma.
Nos primeiros dias de Setembro de 1969 embarcou o Comandante Calvão num
avião da TAP rumo ao Aeroporto de Jan Smuts, na companhia do Inspector
Adjunto Matos Rodrigues, cujos anteriores contactos com as autoridades Sul-
Africanas poderiam ser de grande auxílio.
Os homens do Bureau of State Security (B.S.S.) acolheram os nossos enviados
muito hospitaleiramente e, dois dias depois, eram recebidos pelo chefe do
B.S.S. Exposto o problema, obteve-se um acolhimento muito favorável, de tal
forma que, na manhã seguinte um major que informava que nos iam ser
fornecidos algumas minas-lapas. Para evitar maiores demoras, o Comandante
Calvão trouxe os engenhos explosivos como bagagem de mão, no Boing de
regresso.
O material seguiu para Bissau, onde era preciso solucionar outro problema.
Necessitavam-se planos actualizados do porto de Conakry, que não existiam
no CDMG. Foram -se vasculhando discretamente os navios mercantes
nacionais e estrangeiros que tocavam Bissau, até que num deles se descobriu
um plano aceitável, se bem que desactualizado.
O Comandante Calvão propôs ao Comandante da Defesa Marítima (Comodoro
Luciano Bastos), que se fizesse uma incursão a Conakry para actualização do
plano. Obtida a concordância superior, embarcou na LFG "Cassiopeia" (Cap.
ten. Camacho de Campos), em meados de Setembro, rumo à ilha João Vieira,
OPERAÇAO MAR VERDE
Relato de Alpoim Calvão no seu livro
“De Conakry ao MDLP – dossier secreto”

onde se procedeu ao disfarce do navio e onde se estudou a melhor maneira de
executar a missão. Ficou assente que, caso se aproximasse algum navio, a
"Cassiopeia" içaria a bandeira do PAIGC e apenas os elementos africanos da
guarnição se mostrariam no exterior. (Durante o trajecto, e com o boné de
capitão-tenente na cabeça, o actual cabo-fuzileiro especial António Augusto da
Silva – Touré – respondia com uma continência impecável aos pesqueiros que
foram encontrados!)
Pelas zero horas do dia 17 de Setembro, avistaram-se as luzes de Conakry. O
navio manobrou, numa volta larga, a fim de demandar o porto vindo do Sul e
entro no canal entre as ilhas de Les e a península de Conakry às duas da
manhã. Reduzida a marcha, colocou-se a escala mais conveniente no écran do
radar e, rapidamente, esboçaramse as principais modificações que existiam no
porto, mormente no que dizia respeito aos. novos molhes de acostagem.
Às três da manhã deu-se o trabalho por terminado.
À saída do canal, uma avaria nos geradores obrigou a dar fundo ao ferro,
felizmente por pouco tempo, mas mesmo assim, com forte efeito nos nervos
dos participantes ...
Terminado o cruzeiro, novos parâmetros se depararam, desta vez sob a forma
dos grupos de guineenses em oposição ao regime de Sékou Touré.
Desde a ascenção deste político marxista ao poder, que se formou na vizinha
República da Guiné um forte movimento oposicionista com várias facções. A
maneira despótica e arbitrária - infelizmente tão comum aos novos estados
africanos - como Sekou Touré iniciou o seu governo, deu origem a fortes
reacções, principalmente da etnia Fula que foi duramente massacrada quando
os franceses se retiraram do país.
Convém contudo historiar um pouco mais detalhadamente a conjuntura política
do país nos últimos anos.
Logo a seguir à II Guerra Mundial, vários partidos disputaram o sufrágio dos
guineenses, no decorrer de cada eleição legislativa ou municipal. Existiam,
assim, o B.A.G. (Bloco Africano da Guiné) e o M.S.A. (Movimento Socialista
Africano) que mais tarde se agruparam para constituirem o P.R.A. (Partido do
Reagrupamento Africano) para se oporem ao cada vez mais forte R.D.A.
(Rassemblement Democratique Africainl, criado por Houphouet - Boigny, na
vizinha Costa do Marfim.
O PDG (Partido Democrático da Guiné) foi criado em Março de 1947, sete
meses após a formação do RDA, do qual era a secção territorial guineana.
Esta, caracterizou-se pela violência da ruptura com as autoridades tradicionais,
procurando substituí-las, em face da importância dada aos problemas do
enquadramento político das massas e à instauração duma disciplina de ferro.
Revelava-se assim uma concepção comunista do partido, acentuada ainda,
pelas ligações do RDA com o P.C. francês.
Dá-se em 1951 a ruptura entre a secção guineana e o RDA. O PDG emerge
em força e ganha cada vez mais importância no contexto do território.
A subida ao poder, do partido e do seu secretário-geral, Amed Sékou Touré,
em Outubro de 1958, fornece-lhe novos meios de acção contra os outros
grupos políticos, que são completamente subjugados até fins de 1958.
Os partidos banidos ressurgem então no exterior da República da Guiné e
iniciam uma acção clandestina contra o regime que, entretanto, depois de
cortar as relações com a França, se inclina cada vez mais para o grupo dos
países comunistas. Dos grupos oposicionistas destacava-se o FRONT DE

L1BERATION NACIONAL GUIN ÉEN (FLNGl, enformado por mais de 600.000
pessoas repartidas pela Costa do Marfim, Senegal e Zâmbia.
Aproveitando a existência de oposicionistas, Sekou Touré, detecta "complots"
em série. Uns verdadeiros, outros inventados com a finalidade de eliminar
alguns indivíduos, que pela sua categoria e posição social, poderiam vir a
contrariar a sua linha de conduta tirânica (Ex: EI Hadj Lamine KABA, grande
IMAN de Conakry, advogado IBRAIMA DJALLO, coronel Kaman Diaby, o ex-
ministro do Interior FODEBA KEIT A, o ex-representante na ONU, SORY
KABA, etc.).
A última tentativa de "complot" verificou-se em Março de 1969, organizado por
militares, e que falhou, por traição de elementos da Força Aérea, que no último
momento se colocaram ao lado de Sekou Touré.
Convém ainda recordar que, quando Amílcar Cabral fixou residência em
Conakry, em fins de 1959, o PDG aprovou inteira e incondicionalmente o
PAIGC, cuja estrutura marxista tinha muitos pontos de contacto com a do
partido guineense. Formou-se assim uma profunda simbiose, praticamente
impossível de destrinçar, o que nem sempre tem sido devidamente com-
preendido.
Desde 1964 que os oposicionistas guineenses, procuravam contactar, como é
lógico, com as nossas autoridades.
Foram-se trocando ideias, pesando possibilidades, mas não apareciam
resultados práticos palpáveis. A política seguida pelo Governo Português dera
origem a uma cautelosa estratégia militar, que considerava as fronteiras (l)
tabú, permitindo assim que as unidades do PAIGC tivessem sempre
possibilidades de refúgio, de recompletamento e de treino.
Contudo, com a vinda do então Brigadeiro António de Spínola, as coisas
tomaram outro rumo. Os oposicionistas guineenses começaram a sentir que
havia viabilidades para realizações práticas que os poderiam ajudar a alcançar
o objectivo das suas aspirações pertinazes - a queda do regime de Sekou
Touré.
As diversas ramificações do FNLG tinham vindo a contactar as autoridades
portuguesas por canais diferentes - Ministério do Ultramar em Lisboa e Sub-
Delegação da D.G.S. em Bissau. Esta, com o núcleo que se ia agrupando à
sua volta, iniciou a recolha dum certo número de informações que, recortadas
com as que vinham de Lisboa, fizeram perceber a amplitude da dissidência
guineense.
Foi primeira intenção do Governador e Comandante Chefe, instalar um ramo
militar do FNLG algures em território da província, donde irradiariam acções de
guerrilha contra o vizinho do Sul.
Esta hipótese foi encarada em Outubro de 1969 começando-se os preparativos
para a enformar. Necessariamente, assunto tão complexo levaria muito tempo
a resolver em toda a extensão e assim de facto sucedeu.
Mas com o decorrer do tempo, a viabilidade do plano parecia maior e
verificava-se, com satisfação, que o projectado ataque aos navios do PAIGC
em Conakry, poderia ser perfeitamente enquadrado nas futuras operações de
guerrilha do Front.
Contudo, uma análise mais cuidada, lançou um balde de água fria nos
planeadores. Com efeito, qual seria a reacção da ONU, OUA e países da
Cortina de Ferro a respeito duma guerrilha lançada contra a República da
Guiné a partir de território português? A guerrilha é uma técnica da arte militar

que torna os conflitos necessariamente demorados. Assim, arriscávamo-nos a
uma condenação total - hipótese mais branda - nos areópagos internacionais
ou uma intervenção armada, a favor de Sekou Touré, com consequências
catastróficas.
Acrescentemos ainda que a sorte de vinte e tantos militares portugueses que
jaziam em prisões da República da Guiné, não seria com certeza melhorada na
sequência duma actuação nestes moldes.
Havia pois que reformular o processo técnico a empregar para obter o fim em
vista: o Comandante Calvão propôs que se executasse um golpe de Estado em
Conakry o que obteve a imediata adesão do General Comandante Chefe.
Iniciou-se então, intensa actividade no campo das informações, simultânea
com um programa de reunião, transporte e adestramento de exilados
guineanos destinados a tomarem parte na acção.
Este programa apresentava muitas dificuldades que tinham de se resolver a
cada passo. Os homens aos quais se destinava encontravam-se dispersos no
Senegal, Gâmbia e Costa do Marfim, estavam empregados nos mais diversos
mesteres; tinham famílias; alguns eram vigiados pela polícia secreta de Sekou
Touré, etc., etc ..
Após vários encontros de coordenação entre a parte portuguesa (Cap. ten.
Calvão e Inspector Adjunto Matos Rodrigues) e os representantes do FNLG,
realizados em Bissau, Paris e Geneve, fizeram-se uma série de acções para a
recolha do pessoal. Estas, obedeciam a um padrão, nos seguintes termos:
1. Combinava-se a data-hora e local de rendez-vous, limitados ao período da
noite e às horas das marés e escolhendo-se locais isolados, com boas
possibilidades de embarque. Assim, percorreram-se as costas do Senegal,
Gâmbia e Serra Leoa, até à fronteira da Libéria, utilizando as mais variadas
praias para o fim em vista.
2. Acordava-se o número de homens a embarcar, códigos rádio, sinais
luminosos, etc., etc ..
Para a execução, formaram-se grupos tarefa compostos por uma ou duas LFG,
comandados pelo Cap. ten. CALVÃO. Os navios eram camuflados o melhor
possível, singrando a evitar qualquer navegação e içando, sempre que
necessário, o pavilhão do PAIGC. A aproximação do local da RIV fazia-se com
cautelas redobradas. Depois de trocados os sinais de código, lançavam-se
botes de borracha à água e abicava-se às praias onde se embarcavam os
homens. Desta maneira se recolheram cerca de 200 exilados guineenses,
sendo principalmente utilizada no seu transporte, a LFG "ORION" (Cap. ten.
Faria dos Santos) cujo comandante foi um precioso colaborador no
planeamento das acções e, na execução, demonstrou ser um navegador tão
hábil quanto arrojado.
Entretanto, não era descurada a parte das infra-estruturas. Para alojar e treinar
o pessoal do FNLG, construiu-se um aquartelamento na ilha de Soga,
escolhida pelo seu relativo isolamento. Foi-se recolhendo o melhor pessoal
instrutor disponível: 1.° ten. Rebordão de Brito, 2.° ten. Benjamim Lopes de
Abreu, furriel Marcelino da Mata, cabo FZE Lopes Rossa, mar.º FZE Luís
Tristão, mar.° FZE António Augusto da Silva, alferes Ferreira, mar.º C Moita,
furriel Teixeira. Estes homens conseguiram aos poucos moldar uma unidade de
combate, através dum treino intensivo e, à força de muitas palavras e alguns
castigos atenuaram os conflitos tribais e religiosos existentes, - pecha
constante em todas as sociedades da Africa Negra - resultando um certo

espírito de coesão, fundamental para a missão a desempenhar.
O trabalho de informação continuava. Arranjaram-se planos detalhados da
cidade de Conakry, acumularam-se todas as notícias possíveis de encontrar e
pouco a pouco foi-se delineando o provável teatro de operações.
Mandou-se executar uma maqueta da zona portuária, sobre a qual havia uma
razoável certeza, mas as outras incógnitas eram muitas. Convém aqui abrir um
parêntesis acerca das deficiências encontradas na obtenção da informação
externa.
Os órgãos nacionais com serviços de informação dispunham de uma
confrangedora falta de material de "inteligence". Sabia-se alguma informação
política, alguma informação estratégica mas, aos níveis operacional e táctico,
os conhecimentos eram quase nulos.
Houve, pois, que montar uma organização "ad hoc", devotada à recolha de
notícias. Estas eram obtidas através de livros, revistas, folhetos de propaganda
turística e de antigos elementos do PAIGC e exilados guineenses. Contudo,
estas notícias pecavam pela falta de actualidade: as mais recentes tinham
quase dois anos de atraso, o que era francamente mau. Felizmente, apareceu
uma mensagem de Lisboa informando a captura dum desertor, o grumete
fuzileiro Alfaiate, que se entregou voluntariamente às nossas autoridades,
vindo de Conakry há três semanas.
Com vontade de se reabilitar, o grumete Alfaiate foi um colaborador de valor. E,
sem as preciosas indicações que forneceu, teria sido impossível sinalizar
devidamente a planta da cidade, sinalização que se revelou exacta em 95 %.
Dada a possibilidade de êxito do golpe de Estado, organizou-se um programa
político com a colaboração dos três delegados do FNLG que, para o efeito,
foram viver para Bissau. Elaborou-se uma lista de governantes, escreveram-se
as primeiras declarações a fazer pela rádio, etc. etc ..
Assim, nos fins de Outubro de 1970, começou o trabalho de designação de
tarefas e da constituição das equipas que as iriam executar.
Para se conseguir a paralisação de actividades necessárias ao sucesso da
operação, individualizaram-se, na carta de Conakry, 52 objectivos. Ordenaram-
se depois, por ordem de importância, e constituíram-se as equipas
encarregadas de as neutralizar. Como era desde já intenção firme executar o
desembarque numa noite de sábado para domingo, altura em que a maior
parte dos serviços públicos estão desactivados e as forças militares e para-mili-
tares se encontram de licença, o número de objectivos primordiais limitou-se a
25.
A cada objectivo fez-se corresponder uma equipa, variável em tamanho e tipo
de armamento, pois a gama de objectivos assim o justificava: ia desde a central
eléctrica ao quartel da guarda republicana, do aeroporto à Villa Silly (casa de
veraneio de Sekou Touré), do Estado-Maior à "Gendarmerie".
Todo o sistema estava subordinado à seguinte determinante táctica: primeiro,
obter o domínio no mar, seguidamente em terra e por fim no ar.
No princípio de Novembro iniciou-se uma discreta concentração de meios na
ilha de Soga, propalando-se, simultaneamente, a notícia da realização duma
grande operação na Ilha do Como.
Além do grupo de exilados guineenses reuniram-se as seguintes forças de
desembarque:
Destacamento de Fuzileiros Especiais N.º 21 (Africano); (1.
0
ten. Cunha e
Silva).

- Companhia de Comandos Africanos - (Capitão João Bacar Jaló)
Convocaram-se também alguns elementos europeus de unidades de fuzileiros,
possuidores de conhecimentos ou aptidões especiais.
No dia 14 de Novembro, o comandante Calvão veio a Lisboa, com uma carta
do General Spínola, dirigida ao Presidente do Conselho de Ministros. No dia 17
foi recebido pelo Professor Doutor Marcelo Caetano, que deu a sua
concordância à operação, com a indicação expressa de que não deveriam ficar
vestígios da presença portuguesa no local da acção.
Por especial deferência do general Dores Delgado, que então comandava a 1.
ª

região aérea, regressou o Comandante Calvão a Bissau no dia 19, seguindo
nesse mesmo dia para Soga a fim de ultimar os preparativos.
Formara-se entretanto a TG27-2, (140001NOV) incorporando os seguintes
navios: LFG's ORION (cap. ten. Faria dos Santos), CASSIOPEIA (cap. ten.
Lago Domingues), DRAGÃO (1.
0
ten. Duque Martinho, HIDRA (1.
0
ten. Fialho
Góis), e LDG's BOMBARDA (cap. ten. AGUIAR DE JESUS) e MONTANTE (1.
0

ten. COSTA CORREIA).
O CTG. 2 (cap. ten. CALVÃO) embarcou na "ORION", cujo comandante foi,
mais uma vez, um colaborador de inestimável valor.
No meio desta actividade febricitante e quando tudo já estava ordenado,
detalhado e "briefado", surgiu algo de perturbador e inesperado. O major Leal
de Almeida, supervisor de Companhia de Comandos Africanos, recusava-se a
tomar parte na acção! Por um estranho e inexplicável rebate de consciência,
aquele oficial, já informado de todo o planeamento há cerca de 15 dias, dizia
que era contra a ética militar realizar uma operação contra o governo dum país
com o qual não estávamos em guerra. Apesar dos argumentos que o
comandante da operação apresentou, relativos aos prisioneiros portugueses,
ao apoio dado ao PAIGC, etc., o major manteve-se irredutível.
Foi-lhe dada voz de prisão e seguiu de helicóptero para Bissau a fim de se
apresentar ao Comandante-Chefe. Este exautorou-o vigorosamente e fê-lo
regressar a Soga a fim de se integrar novamente nas forças de assalto. A
citada atitude produziu efeitos deletérios sobre o moral de alguns elementos da
Companhia de Comandos Africanos: o próprio capitão João Bacar teve um
momento de hesitação. Revelou dúvidas, condicionalismos. Posto firmemente
em face do seu dever, reagiu, e o seu ascendente sobre os homens da CCA
neutralizou um pouco a desmoralização incipiente.
Também no "briefing" com os comandantes dos navios nem tudo correu
perfeitamente bem: o comandante da "Montante", apesar da mensagem
secreta 162CC, de COMDEFMARQUINÉ , de 18 NOV 70 . I ver nota) mostrava-
se renitente quanto a participar na operação. Foi claramente interpelado sobre
a opção que teria de tomar. Reconsiderou e cumpriu bem as instruções que
recebeu.

NOTA - "Todas ordens emanadas CT G.2 devem ser pronta e integralmente
cumpridas seja qual for a sua natureza amplitude e quaisquer que sejam implicações
que dai possam resultar."

II EXECUÇAO

No dia 17 de Novembro de 1970 o General Spínola deu conhecimento aos
Comandantes Chefes Adjuntos da ordem de operações "Mar Verde". Assim, foi

possível fazer reforçar e alertar as posições do Exército, junto à fronteira com a
República da Guiné, e a Força Aérea pôde esquematizar uma série de
missões, quer de reconhecimento e apoio à TG 27-2, quer de intervenção e
bombardeamento no solo (objectivos - bases referenciadas do PAIGC na
República da Guiné) caso o Golpe de Estado tivesse êxito.
As missões de reconhecimento, executadas por um P2V-5, iniciaram-se no dia
18, às 09.20. Tinham por fim detectar discretamente quaisquer movimentos de
navios de guerra e de concentrações de pesqueiros. A fim de dar uma ideia
deste trabalho transcreve-se o relatório do dia 19.
…………………………………………………………………………………………….
"3. Data: 19 NOV 70 - 4-ATD/ATA/ATE - 06.15/09.10/02.55.
5. Efectivo empenhado (N.º/Tipo de avião) 1/P2V-5
6. Pilotos - Cardoso - 9.
……………………………………………………………………………………………
9. Observações
07.00 - Oito contactos compreendidos nos azimutes 209° e 171
0
ilha de Orango
entre 29 e 61 milhas. Investigados três arrastões grandes.
07.10 - Arrastão Pos. 14JO Tugnifilidi 17 milhas 330/8.
07.27 - Cinco contactados 237 Conakry 19 - não foram avistados supondo-se
serem pesqueiros por pouco dispersos.
07.30 - Dois navios cargueiros ou arrastões grandes fundeados a 2 milhas
oeste ilha Tamara. Um navio fundeado em Fotoba (cargueiro). Três navios (I
grande e 2 pequenos) fundeados no canal entre Ilha de Kassa e Conakry.
08.ao - Sete contactos 5 milhas Norte Conakry. Foi feita aproxim'ação mas não
foram confirmados visualmente.
08.10 - Três arrastões POso 291
0
Conakry 65. Foi feita inves-
tigação ECM sem resultado.
METEO - 5/8 CU SICU - 2000' - 6000' COBERTO À 8000
ESTADO DO MAR - CALMO
Foi feita escuta em 119.1 (Torre e aproximação de Conakryl.
Tráfego reportado apenas civil".
A missão das forças foi transmitida verbalmente no dia 18, às 09.ao, aos
comandantes das unidades participantes.
Entregaram-se, por escrito, os anexos de comunicações, de navegação e
logístico necessários à execução (ver apêndice).
Pintaram-se os navios (inclusivamente bóias de salvação) de forma a não
revelaram quaisquer sinais identificadores.
As equipas foram dispostas nos navios de acordo com os locais de
desembarque. Assim:
LFG'S DRAGÃO e CASSIOPEIA: Equipas destinadas ao grupo de objectivos
do PAIGC, que incluíam a residência Villa Silly de S. Tomé e o Campo de
Milícias do PDG. Eram essencialmente constituídas por elementos do DFE 21,
reforçado com alguns homens de CCA e pelo 2.
0
ten. Benjamim Abreu.
LFG "HIDRA": Equipa destinada ao Aeroporto, comandada pelo cap. pára-
quedista Morais.
LDG "BOMBARDA" - Equipas destinadas a: Palácio Presidencial, Ministério do
Interior, Direcção da Gendarmeria, Residência de Lansana Beavogui e
Sayfoulhah Djallo, Gendarmeria, Cubanos, Emissora de Boulbinet e corte do
istmo entre Conakry I e II.
LDG "MONTANTE" - Equipas destinadas a: Central Eléctrica, Campo Samouy

(Estado-Maior da Defesa Nacional) e Guarda Republicana.
LDG "ORION" - Equipa destinada às lanchas rápidas do PAIGC e República da
Guiné.
Presidia à ideia da manobra a seguinte reunião de conceitos:

a) Obter o domínio no mar. A presença das lanchas rápidas, armadas com
metralhadoras quádruplas de 25 mm e com mais de 30 nós de velocidade era
francamente incómoda. Era pois necessário neutralizá-Ias rapidamente.
b) Obter o domínio em terra. Interessava seguidamente a neutralização das
forças, que, pela sua natureza, podiam intervir mais rapidamente. Incluiam-se,
pois, nos objectivos prioritários a gendarmeria, a guarda republicana, o campo
de milícias e o campo militar Samouy, onde sediava o Alto Estado-Maior e uma
força mecanizada. Previa-se logo a seguir o corte do istmo que separa Conakry
I e II, numa largura de cerca de 150 metros, junto ao Palácio do Povo. Assim se
impediria qualquer reforço vindo do Campo Alpha Yaia ou do complexo militar
do quilómetro 36. O grupo de objectivos do PAIGC encontrava-se incluído
neste estágio da acção.
c) Obter o domínio no ar. Logo que rompesse o dia, a ameaça dos MIG' S 15 e
17 tinha de estar neutralizada. Os navios do TG não dispunham de defesa AI A
adequada contra este tipo de aviões e o raio de acção da nossa aviação de
caça disponível não permitia cobertura aérea.
d) Convinha capturar, desde o início, a emissora de radiodifusão mais
escutada. Desta maneira, a emissora de Boulbinet foi considerada prioritária,
apesar de não se esperar que funcionasse antes das 8 horas da manhã.
Neste contexto, a TG 27-2 levantou ferro de Soga no dia 20, às 19.50.
Marcou-se a hora H para as 22.00, no ponto RIV junto à ilha de Canhambaque,
navegando em coluna até dia 21 às 03.50, altura em que se formou um
dispositivo aconselhado pelas circunstâncias. Deu-se também ordem, nessa
altura, para ocultação rigorosa de luzes e artilharia pronta, com postos de
combate AI A, a partir do nascer do sol.

Neste contexto, a TG 27-2 levantou ferro de Soga no dia 20, às 19.50.
Marcou-se a hora H para as 22.00, no ponto R/V junto à ilha de Canhambaque,
navegando em coluna até dia 21 às 03.50, altura em que se formou um
dispositivo aconselhado çpelas circunstâncias. Deu-se também ordem, nessa
altura, para ocultação rigorosa de luzes e artilharia pronta, com postos de
combate A/A, a partir do nascer do sol.
A distância entre o "main body" e a "screen" variava entre 4 a 6 milhas, sendo o
rumo base 125. As indicações do P2V-5, de cobertura permitiam fazer o registo
de navegação de superfície, manobrando a TG de forma a evitá-Ia o mais
possível.
Às 17.50 voltou-se à formatura em coluna, pois a proximidade da noite permitia
que assim se fizesse, sem perigo de detecção. A tensão a bordo dos navios
aumentava de momento a momento e a felicidade com que até ali decorrera o
percurso era tomada como um índice de bom augúrio.
Às 20.20 ordenou-se o "split" da TG-2, conforme previsão, e depois de
alcançados os pontos E e F, os navios da força rumaram para as posições
mais convenientes a fim de desembarcarem as equipas de assalto. Às 21.30
indicou-se, como hora de desembarque em terra, 01.30 do dia 22.

III O DESEMBARQUE

A LFG "ORION" fundeou a NW dos molhes de protecção do porto de Conakry.
A maré estava completamente cheia, o vento era nulo, e apenas o clarão da
cidade iluminava a noite. Os botes de assalto foram colocados na água e, pelas
0045, a equipa Victor, do comando do 2.° tenente Rebordão de Brito e
composta por 14 elementos, largou discretamente em direcção aos molhes.
Encostou ao "Dique Norte", localizou exactamente o objectivo e partiu ao
ataque. O grumete FZE Abu Camará eliminou silenciosamente a sentinela, o
que permitiu a entrada a bordo das três vedetas P6, que se encontravam a N
da ponte do cais bananeiro. Abertas as portas das cobertas foram lançadas
granadas de mão ofensivas para o interior das mesmas neutralizando as
guarnições. A equipa de assalto atravessou velozmente a ponte e invadiu os
restantes navios: mais três vedetas e uma espécie de lancha de desembarque.
Entretanto soara o alarme no porto e o inimigo abriu fogo sobre os nossos
elementos que, repetindo a técnica das granadas de mão, eliminaram os focos
de resistência a bordo. Os incêndios ateados pelas granadas, cresceram
rapidamente e, em breve, de bordo da "ORION", avistaram-se as bolas de fogo
provenientes das explosões das lanchas.
A equipa Victor, que realizou o notabilíssimo trabalho, regressou a bordo pelas
02:10, com dois feridos ligeiros e sem a menor perda de material.
As LFG's "Dragão" e "Cassiopeia", transportando a equipa ZULU, fundearam
em 5 metros de fundo, na pequena baía a N da península de Conakry, junto
aos baixos de "La Prudente", cerca das 0015, a três milhas marítimas do local
de abicagem.
Às 01.40 os botes (em número de 10) largaram dos navios. Houve, poucos
momentos depois, um pequeno contratempo: alguns botes enrodilharam-se em
várias redes de pesca, que não foram avistadas devido à escuridão da noite.
Depois de aturado trabalho a desenvencilhar os hélices, conseguiu-se o
desembarque pelas 02.15.
A equipa dividiu-se em três elementos: o primeiro, comandado pelo 1.° tenente
Cunha e Silva, dirigiu-se imediatamente à prisão "La Montaigne", onde, depois
de violenta escaramuça, eliminou a respectiva guarda e libertou os 26
prisioneiros portugueses que lá se encontravam.
O segundo, comandado pelo sub-tenente Falcão Lucas seguiu para o grupo de
objectivos do PAIGC. Neutralizou uma série de sentinelas, destruíu 5 edifícios
do partido, seis viaturas e abateu vários militantes que se encontravam nas
instalações.
Finalmente o terceiro, comandado pelo 2.° tenente Benjamim Abreu,
encarregou-se do Campo das Milícias e da Villa Silly, residência secundária de
Sekou Touré. Com uma decisão notável, o pequeno grupo (22 homens), forçou
a entrada do Campo, esmagou a débil estrutura que se começou a formar e, à
granada de mão, à bazucada e com bem dirigidas rajadas de metralhadora,
pôs fora de combate cerca de 60 milicianos que guarneciam as duas casernas
existentes. Prevendo que a guarda da casa de Sekou Touré, tivesse acorrido à
defesa dos dois portões de entrada da propriedade, o tenente Benjamim
resolveu saltar o muro que separava os dois objectivos e pôde assim,
colhendo-a de supresa, eliminar a referida guarda. Sekou Touré ainda não
chegara a casa: o quarto de dormir, a cama, impecavelmente aberta,
aguardava o ditador Guineense! Incendiado o objectivo, o grupo retirou-se a fim

de se juntar ao resto da equipa, o que conseguiu pelas quatro da manhã.
Passou a equipa ZULU a constituir a reserva de manobra do Comandante da
operação.
Da LDG "Montante", partiram as equipas OSCAR, ÍNDIA e MIKE. A primeira,
seguiu em botes de borracha conduzidos por pessoal do navio e abicou ao
Quartel da Guarda Republicana, pelas 0135. Para o desembarque das outras
duas, a "Montante", num alarde de boa manobra, abicou pelas 01.40 ao molhe
Yatch Club!
A equipa OSCAR, constituída por efectivos nossos e do Front (total 40
homens) e encabeçada pelos alferes Ferreira e Tomás Camará, dirigiu-se
discretamente para o portão da entrada. O alferes Ferreira temerariamente
tentou dominar a sentinela, a qual se refugiou na casa da guarda. O alferes, ao
tentar persegui-lo foi abatido na soleira da porta por dois homens que se
encontravam no interior, os quais abriram nutrido fogo sobre os assaltantes.
Valeu a decisão e coragem do furriel de comandos Marcelino da Mata:
mergulhou através da janela e na confusão de vidros partidos e cadeiras
caídas, etc., abateu os oponentes com uma rajada de AK-47.
O grupo entrou de rompante pelo recinto, colocando-se em posição de enfiar a
saída das casernas, enquanto alguns homens corriam para a armaria.
Apanhados de supresa, os guardas republicanos tentaram sair das casernas
mas foram abatidos na maioria, perdendo-se os outros na escuridão da noite.
Ocupado o campo, abriram-se as portas da prisão onde foram encontrados
cerca de 400 presos políticos, que retomaram a liberdade no meio de grandes
manifestações de alegria. (ver relato do Capitão Abou Sommah, ocupante da
cela n.º 37). Fez-se em seguida a entrega do campo às forças do FNLG (20
homens), na pessoa do chefe Barry Ibrahima, conhecido por BARRY III e cujas
qualidades o tinham feito estimar por todos quantos com ele contactaram.
A equipa ÍNDIA (10 homens, furriel Demda Sêca e Thiam do FLNG),
atravessou a linha de caminho de ferro de Conakry - Fria e dirigiu-se para a
Central. Observou a existência de quatro portas com sentinelas. Eliminou duas,
prendeu o encarregado da central e obrigou-o a cortar a luz da cidade. Eram
02.15. Esta acção era primordial para o efeito psicológico que se pretendia
obter. O seu sucesso contribuiu bastante para a desorientação verificada.
A equipa MIKE (50 homens) tinha por objectivo o Campo Militar Samory. Em
marcha acelerada percorreu o quilómetro que a separava do alvo. Desarmou
as sentinelas que estavam nos portões e ocupou o recinto sem efusão de
sangue. A tarefa seguinte constituiu em "bazucar" e destruir os veículos que
vinham para o campo carregados de pessoal: foram assim destruídas 16
viaturas com algumas dezenas de soldados. Deitou-se fogo aos edifícios do
Estado-Maior e, não havendo mais resistência, a equipa dividiu-se em duas:
uma, com o Alferes Sisseco (ferido na boca), que conduziu os nossos
elementos feridos para o molhe do Yatch Club. A outra, com o coronel do
.FNLG DIALLO, o Comandante ASSAD e o jornalista do JEUNE AFRI QUE
SIRADIOU DIALLO, seguiu a ligar-se à equipa INDIA. Por um acaso infeliz os
rádios da equipa MIKE ficaram quase imediatamente fora de acção, o que
obrigava a contactos directos com os outros grupos para saber o que se
passava.
A LDG "BOMBARDA", do comando do cap. ten. Aguiar de Jesus, cuja calma
imperturbável era demonstrada pela descontracção como fumava o inseparável
cigarrinho na extremidade duma já velha boquilha, pelas 01.00 pairava a 300

jardas a sul da praia Peronné. As 01.05, largaram de bordo dois botes com a
equipa Hotel, encarregada de se apossar da Emissora de Boulbinet.
Esta equipa, comandada pelo Alferes JAMANCA e tendo como acessor do
FNLG o engenheiro electrónico TIDIANE DIALLO, actuou de forma bizarra. O
alferes JAMANCA dera boas provas ao longo de 7 anos de campanha. Mas
inexplicavelmente, depois de desembarcar junto do objectivo ou por
desorientação do engenheiro DIALLO, conhecedor do local, ou por indecisão
do alferes o facto é que, os dez homens da equipa Hotel ficaram agarrados ao
local de desembarque até receberem ordem para retirar!
Entretanto, e em duas vagas de botes de borracha, desembarcaram as
restantes equipas: ALFA, BRAVO, CHARLlE, DELTA, ECHO, FOXTROT e
GOLF. Passada a desorientação inicial devida à escuridão provocada pelo
corte de luz e por se estar numa cidade desconhecida, estas equipas,
compostas por elementos da C.C.A. e do FNLG - cujos guias nem sempre se
mostravam à altura da situação - seguiram para os objectivos e neutralizaram
os meios importantes.
Apenas na Gendarmerie se encontrou resistência de vulto. Como a equipa
ECHO (reforçada com a GOLF, BRAVO e DELTA, num total de 50 homens)
demorou mais que o previsto a reagrupar o pessoal, ao chegar ao alvo que lhe
estava destinado, verificou que uma coluna blindada se preparava para sair. O
Capitão João Bacar, que comandava a equipa, atacou as viaturas com decisão,
destruindo quatro e causando elevado número de baixas.
A guarda do Palácio Presidencial, ao ver chegar os dez homens da equipa
ALFA, debandou em grande velocidade deixando aos assaltantes o problema
de revistar um edifício tão grande e que se encontrava vazio!
Finalmente, a LFG "HIDRA" (1.° tenente Fialho Goes). aproximou-se, depois
duma hábil navegação, do local de desembarque da equipa Sierra (capitão
pára Morais). pairando pelas 212330, com dois metros de fundo. Em 220015,
os botes largaram do navio, com rumo ao local de desembarque, sob o
comando do guarda-marinha Centeno, imediato da HIDRA.
As três milhas demoraram uma hora a percorrer e só pelas 0130 se conseguiu
desembarcar.
A equipa Sierra era composta por:

a) Elementos nacionais.
Cap. Lopes Morais
2.º Sarg. mil. comando Teixeira Formação do comando
1.ºs cabos páras Duarte, Morais
Tenente Januário, com 9 homens do seu pelotão
Alferes Justo, com 24 homens do seu pelotão.
b) Elementos do FNLG
Sub-Lieutenant Boiro, com cinco homens, sendo um, de nome Mamadu 8aldé,
antigo controlador de circulação aérea no Aeroporto de Conakry.

Iniciou a progressão em direcção ao campo e antes de o atingir foi
surpreendido pelo som dos rebentamentos que se iam ouvindo na cidade. O
Cap. Morais, apesar de uma lesão num joelho contraída recentemente num
salto de pára-quedas, forçou a marcha, mas sentindo uma certa resistência ao
movimento na retaguarda, mandou um dos seus homens tentar a ligação e
verificou com espanto que o tenente Januário e cerca de 20 homens tinham

desaparecido.
" ... a partir daquela altura só uma coisa importava já: localizar os MIG's e
destruí-los; dirigi-me ao local, mas não estavam; entretanto, no campo Alpha
Ya- Ya, ouviam-se toques de clarins e ruídos fortes de motores a trabalhar; por
me ressentir do joelho fiquei com três homens a meio do "taxi-way" e ordenei
ao Alf. Justo e 2.° Sarg. Teixeira para irem procurar os MIG's; voltaram vinte
minutos depois, informando-me que no fim da pista estavam 3 aviões de hélice
já velhos e que havia outra pista ao lado da principal e em terra batida, mas
nada de MIG's. Voltei para trás e aproximei-me da placa; nessa altura ouvia-se
um toque prolongado de sino no aeroporto seguindo-se-Ihe, passados alguns
minutos, toques de apitos, calculo que por motivo da chegada dos pescadores
a terra. Na placa havia seis aviões: 2 "Caravelle", que o Ten. Boiro identificou
pertencerem à Companhia AIR AFRIQUE e 4 aviões bi-motores, de asa alta,
tipo Fokker F-27. O Alf. Justo quis ir destruí-los, mas não autorizei. Entretanto
chegou uma viatura pesada que me pareceu uma auto -metralhadora; nos
hangares que estavam abertos e iluminados não havia aviões". (do relatório do
Capitão Morais).
Desde as duas da manhã que o comandante do T. G. tinha conhecimento da
deserção do ten. Januário (msg. enviada pelo Grupo Sierra - "O filho da puta do
tenente fugiu com 20 dos meus homens. Traiu -me miseravelmente").
Embarcada a equipa Victor, a "ORION" levantou ferro, seguindo a toda a força
para junto da "BOMBARDA" e "HIDRA". Era necessário desembarcar a equipa
PAPA, destinada a cortar o istmo que separa Conakry I de Conakry II.
O CTG 2 passou em bote de borracha para a "BOMBARDA" a fim de, face à
evolução da situação, accionar a equipa PAPA. Às 02.30 recebera
comunicação da "HIDRA" de que a equipa "Sierra" não tinha encontrado os
MIG' s.
Pelas 03.00 algumas notícias colhidas junto de prisioneiros em terra afirmavam
que os MIG' s, tinham sido enviados para LABÉ no dia 20, devido a uma
remodelação ministerial no Governo de Conakry! Havia ainda a hipótese de se
conseguir capturar Sekou Touré. Às 04.00, CGT 2 teve conhecimentos que o
Presidente não fora visto nem na Villa Silly nem no Palácio Presidencial.
Mandou suster o desembarque da equipa PAPA, quando a "BOMBARDA" já
manobrava para tomar posição, e "fez o ponto".
"Pelas 04.30, a situação apresentava-se da seguinte maneira:
- Objectivos PAIGC atingidos em boa parte.
- Domínio no mar, assegurado.
- Domínio em terra, ainda em disputa, mas com forte possibilidade de sucesso.
- Presidente Sekou Touré - não encontrado.
- Domínio no ar - não assegurado.
Este factor pesou fundamentalmente no meu julgamento pois, dali em diante, a
minha única preocupação foi deixar o menor número de provas documentais da
nossa actividade.
A possibilidade de afundamento dum navio nas águas de Conakry era de evitar
a todo o custo.
Mandei, pois, reembarcar todo o pessoal que compareceu nos locais para isso
designados em caso de insucesso. "(Do relatório de CTG 27.2).
A LFG "HIDRA", que reembarcara a equipa "Sierra", foi mandada pairar na
posição uma milha a sul do farol de BOULBINET.
Às 04.40, a LDG "BOMBARDA", iniciou a tarefa, pela equipa "HOTEL" e

terminou-a às 05.30, deixando dois botes para o grupo ALFA, que foi recolhido
pela ORION, onde já se encontrava novamente o CTG 2.
Às 06.00 deu-se ordem à "BOMBARDA" e "ORION" para constituírem a T.U.
27.2.1., seguindo para sul da ilha de KASSA onde, às 07.10, meteu ao Rv-180°
durante uma hora, em diversão. Navegou depois independentemente, tendo às
13.35, recebido indicação para aguardar o resto da TG 27-2 em ORANGO.
O problema do reembarque na parte norte do T.O.
Parâmetros mais delicados devido ao baixa-mar. Além disso, o Sol já iluminava
perfeitamente o terreno e uma grande multidão, que vitoriava ruidosamente as
equipas que actuaram em terra, aglomerava-se agora junto aos locais de
reembarque.
A "MONTANTE" colocou-se a 1.000 jardas de terra e, com o auxílio dos botes
das LFG' s, foi reembarcado o pessoal, com excepção dos elementos do FNLG
que quiseram continuar em terra. De terra, às 07.40, duma posição junto ao
Palácio do Povo fizeram quatro disparos de morteiro de 82 sobre a
"MONTANTE", muito mal regulados. O navio e a "DRAGÃO" que se interpôs a
fazer de escudo ao pessoal que reembarcava, calaram a boca de fogo com
alguns tiros de intimidação. Às 08.05, a "DRAGÃO" encostou à "ORION" para
receber material de transfusão de sangue, pois o 1.° tenente MR Hélder
Romero necessitava dele para o tratamento dos feridos e transbordou o
sargento aviador LOBATO, que se encontrava prisioneiro há 7 anos!
Desde o romper do dia que a força naval se achava no mais alto grau de
prontidão anti-aérea. Quando, pelas 09.00, se deu por terminado o
reembarque, já havia ordem para formar em losango, dispositivo que foi
executado às 10.30, ao rumo base 240.°.
O regresso fez-se sem incidentes, fundeando-se em SOGA em 231625.
Terminada a operação, que custou ao inimigo mais de 500 baixas, desfez-se a
TG 27.2.
Respingam-se ainda os seguintes passos do relatório do CTG 27.2.

4. Resultados obtidos

Sob o ponto de vista estritamente militar, a operação decorreu de forma muito
satisfatória, atendendo ainda a que foi a primeira do género, realizada entre
nós.
Conseguiu-se surpresa total, grande parte dos objectivos foram conseguidos e
numa acção normal, todos seriam atingidos, à excepção dos MIG' s por
deficiente informação.
Atendendo, contudo, à estreita margem de liberdade de acção que os
princípios da estratégia indirecta, enformadores do plano, consentiam, não se
podia ir mais além. Fazê-lo, seria correr um risco gravíssimo - a possibilidade
de afundamento de um dos nossos navios, prova documental irrefutável contra
nós - de consequências desastrosas.
Por conseguinte, dentro da correcta cadeia de decisões política, estratégica,
operacional, táctica e técnica - a decisão política devia sobrelevar as outras: o
nosso comprometimento, tinha de se reduzir ao mínimo.
Nestas condições tomei a decisão de retirar.

5. Propostas e sugestões

Verificou-se que cerca de 30 % dos elementos de informação eram inexactos.
Mesmo assim, estou certo do êxito da acção, caso tivéssemos conseguido
destruir a aviação de caça, que as notícias obtidas diziam estar estacionada no
aeroporto de Alfa - Ya Ya.
Para isso, foi demonstrado que possuímos capacidades tácticas e técnicas.
O insucesso do Golpe de Estado ficou-se devendo à manifesta carência de
informação, que falhou completamente no que toca à presença da aviação de
caça em Conakry e aos apoios activos internos que não existiam ou, se
existiam, não se concretizaram.
Urge, pois, encarar o problema com realismo e com vista ao futuro. Creio ser
absolutamente necessário, criar um organismo dependente directamente do
Presidente do Conselho e dirigido por um Subsecretário de Estado adjunto,
onde sejam tratados todos os problemas de informação (no sentido de
"intelligence"). A esse organismo competiria ainda o planeamento de
operações de género desta e, para a execução das mesmas, agregaria os
meios necessários.
O estado actual do funcionamento dos nossos serviços de informação é
confrangedor, pela ausência duma estratégia nacional de informação.
Chegamos mesmo ao ponto de termos órgãos de contra -informação a
trabalharem em informação e a terem de dar satisfações a três ou quatro
chefes diferentes.
Este assunto, é apenas mais um que se insere naquilo a que podemos chamar
o problema da rectaguarda.
O insucesso do Golpe de Estado deu-se exclusivamente a deficiências de
informação. A exacta localização dos MIG's teria sido a chave da acção. Mas
isto só se conseguiria com agentes "in-Ioco", dispondo de meios rádio que lhe
permitissem, rapidamente, dar-nos a conhecer dados fundamentais.
É necessário, também, investigar cuidadosamente os indivíduos que se nos
apresentam como chefes de oposições aos regimes africanos nossos
adversários. O panorama que o FNLG nos apresentou sobre a situação na
República da Guiné era basicamente correcto, mas falhou redondamente nos
apoios que dizia ter. O próprio FNLG tinha duas tendências divergentes e para
mal de nós escolhemos exactamente a mais desonesta para trabalhar
connosco, o que aliás escrevi num memorandum en tregue pelo Senhor
Governador da Guiné ao Senhor Ministro do Ultramar.
Todos estes problemas e muitos outros, que seria ocioso enumerar, deviam ter
sido estudados pelo organismo que acima sugiro. Creio que pode ser
estruturado em dois ou três anos e, se dispuser dos meios necessários,
teremos à disposição um trunfo muito importante para auxiliar na escolha das
linhas estratégicas que conduzirão aos objectivos fixados pela Alta Política
Nacional".