QUESTÃO 37
Crônica da abolição
[...] Toda a história desta lei de 13 de maio estava por mim
prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates,
tratei de alforriar um molecote que tinha. [...]
Disse-lhe com rara franqueza:
– Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga,
já conhecida, e tens mais um ordenado, um ordenado que...
– Oh! meu senhô! Fico.
– Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo
cresce neste mundo: tu cresceste imensamente. Quando
nasceste eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto
que eu. Deixa ver; olha, és mais alto quatro dedos...
– Artura não qué dizê nada, não, senhô...
– Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis: mas é de
grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales muito
mais que uma galinha.
– Eu vaio um galo, sim, senhô.
– Justamente. Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se
andares bem, conta com oito. Oito ou sete.
Pancrácio aceitou tudo: aceitou até um peteleco que lhe dei
no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da
liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso
natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título
que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois
estados naturais, quase divinos. Tudo compreendeu o meu bom
Pancrácio: daí para cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés.
MACHADO DE ASSIS. Crônica da abolição.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br>. Acesso em: 07 ago. de 2014.
Com um objetivo marcadamente irônico, Machado de Assis
publicou essa crônica poucos dias depois da abolição da
escravatura no Brasil. O discurso e a atitude do “dono” de
Pancrácio, que o alforria para contratá-lo como assalariado,
são os elementos que sustentam a ironia do texto.
A fala que melhor revela a hipocrisia desse personagem é:
A. “Toda a história desta lei de 13 de maio estava por mim
prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos
debates, tratei de alforriar um molecote que tinha.”
B. “Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens
casa amiga, já conhecida, e tens mais um ordenado.”
C. “Um ordenado pequeno, mas que há de crescer.
Tudo cresce neste mundo: tu cresceste imensamente.
Quando nasceste eras um pirralho deste tamanho;
hoje estás mais alto que eu.”
D. “Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis: mas é de
grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales
muito mais que uma galinha.”
E. “Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se andares bem,
conta com oito. Oito ou sete.”
QUESTÃO 38
– Aí, beleza? Você joga bola?
– Jogo.
– A gente tá precisando de um lateral direito pra
completar o time da turma, tá afim?
– Tô dentro.
– Aí, gente, fechamos o time! Qual é seu nome?
– É Léo.
– Vem pra cá, Léo! Chega mais! – chamou um outro garoto.
REBOUÇAS, T. Ela disse, ele disse. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
Por causa de influências históricas, sociais, regionais, entre
outras, a variação linguística do Brasil é rica e retrata a
diversidade de seu povo. No trecho apresentado, à procura
de mais um jogador de futebol, um garoto convida Léo para
completar o time. A linguagem utilizada
A. pertence à variedade culta da língua e está adequada
ao contexto, pois os garotos acabaram de se conhecer.
B. representa o modo de falar dos garotos daquela idade,
pois a informalidade é comum nesse grupo de falantes.
C. está em desacordo com o contexto, pois a informalidade
do ambiente pede que a linguagem seja coloquial.
D. reforça a ideia de como os jovens se expressam mal,
pois esse modo de falar não condiz com a norma-padrão.
E. dificulta a compreensão dos garotos, pois as abreviações
das palavras e o uso de gírias são inadequados.
QUESTÃO 39
O Brasil figura entre os países de maior diversidade
linguística. Estima-se que, atualmente, são faladas mais de
200 línguas. A partir dos dados levantados pelo Censo IBGE
de 2010, especialistas calculam a existência de pelo menos
170 línguas ainda faladas por populações indígenas.
Embora não contabilizadas pelo Censo, pesquisas na
área de linguística também apontam para outras línguas
historicamente “situadas” e amplamente utilizadas no
Brasil, além das indígenas: línguas de imigração, de sinais,
de comunidades afro-brasileiras e línguas crioulas. Esse
patrimônio cultural é desconhecido ou mesmo ignorado
por grande parte da população brasileira.
A historiografia do país demonstra que foi necessário
considerável esforço do colonizador português em impor
sua língua pátria em um território tão extenso. Trata-se
de um fenômeno político e cultural relevante o fato de,
na atualidade, a Língua Portuguesa ser a língua oficial e
plenamente inteligível de norte a sul do país, apesar das
especificidades e da grande diversidade dos chamados
“sotaques” regionais. Esse empreendimento relacionado à
imposição da Língua Portuguesa foi adotado enquanto uma
das estratégias de dominação, ocupação e demarcação
das fronteiras do território nacional, sucessivamente, em
praticamente todos os períodos e regimes políticos. Da
Colônia ao Império, da República ao Estado Novo e daí
em diante.
GARCIA, M. V. C. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br>.
Acesso em: 21 out. 2016. [Fragmento]
Em um país territorialmente tão grande como o Brasil, é
impossível não haver variedade linguística. Sobre essa
diversidade exposta no texto, conclui-se que
A. as influências de outras culturas no país contribuíram
para que a Língua Portuguesa alcançasse todos os
falantes do território brasileiro.
B. os sotaques interferem na compreensão e na qualidade
da Língua Portuguesa, apesar de esta ser falada de
norte a sul do país.
C. as outras línguas, embora plenamente usadas, são
irrelevantes, visto que a maioria da população usa a
Língua Portuguesa.
D. as línguas faladas pela minoria são desvalorizadas pela
população geral, que sabe muito pouco ou nada sobre
a existência e a importância delas.
E. os portugueses esforçaram-se para que a Língua
Portuguesa dominasse o Brasil por considerarem
inferiores as outras línguas.ENEM – VOL. 2 – 2020
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