Um dia na aldeia

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About This Presentation

Livro de Daniel Muduruku


Slide Content

M... preguiçou, mas continuou

deitado na uru. Olhou para o lado e viu que sua

ixi já estava de pé no lado de fora da uk'a. Sabia

que ela preparava a primeira refeigáo do dia,

normalmente composta de mingau de akobá,
usuktd e wixik'a, Também poderia ter melancia,

abacaxi, manga - dependia da época do ano.

O céu ainda estava cheio de kasoptas. O kaxi
ainda estava longe de aparecer. Fazia parte da
tradiçäo munduruku acompanhar o caminho do
kaxi pelo céu.

Acordar muito cedo, tomar o primeiro
banho no cabitutu e fazer a refeiçäo matinal

era uma sequéncia natural que se repetia todo

dia. Manhuari perguntou para sua ixi qual o

significado desse ritual

-É assim mesmo, filho. Quando vocé crescer, vai

entender: o banho matinal é para tirar da gente as

coisas ruins que a noite pode trazer. Além disso,

repetir as mesmas agóes sempre nos ajuda a ficar
S que podem nos surpreender -

com um riso nos labios

Manhuari sorria também, mas náo entendia

direito aquilo que sua ixi dizia. Acreditava nela

esperava crescer. Deixava as dúvidas para os
Pensando neles, correu até o cabitutu para tomar

banho.

Um estranho jexeyxey

O pai de Manhuari, um grande cagador
munduruku, convocou os homens da aldeia para

uma conversa. Contou que havia sonhado com

uma jakora enorme. Ela veio ao seu encontro,
mas, em vez de atacá aos seus pés

como se desejasse

Esse jexeyxey o deixou um pouco confuso
pois sabia que a jakora é um animal feroz e sua
presença no jexeyxey era motivo de preocup:

Todos ficaram atentos a narrativ

Resolveram que ouviriam a opiniáo do pajé,

aquele que interpreta je s. O velho chegou de
mansinho, sentou-se num pequeno banco e ouviu
com atençäo tudo o que Ihe foi contado. Náo
emitiu nenhuma opiniäo. Ao final da história,

tirou de sua bolsa o pó do fumo e o langou para

alto, esperando que o kabido mostrasse a direçäo

do jexeyxe
Todos ficaram paralisados diante daquele
léncio era absoluto. Em seguida o velho
edisse:
ey & um bom sinal. Sinal de que
teremos um tempo de paz e tranquilidade. Tudo
caminha bem, e o espírito de nosso cacique
em sintonia com o Universo. Cagada será boa.
Podem ir cagar, mas nao se esquegam de que no:
tradigäo nos lembra de abater apenas os seres da
natureza suficientes para alimentar nosso corpo.

Ninguém deve sacrificar um baripnia por esporte

ou por prazer. Cada ser é nosso baripnia e devemos

sempre respeitá-lo.

Dizendo isso, o homem voltou para sua uk'a.

Acaminho da kü

Após a suculenta refeiçäo, a ixi de Manhuari
tratou de preparar seus ictius para levar à kü.

Dentro deles colocou um facáo, algumas cui:

uma bilha com 4gua. O caminho era longo e era

preciso nao esquecer nada antes de partir, pois

náo teria como voltar para buscar. Manhuari
também organizou suas coisas: o arco ea flecha,
um pequeno ictiu em que colocaria as fruta
iria colher pelo caminho e uma faca que ha

ganho de seu irmáo mais velho,

Momentos depois já estavam todos prontos
para ir para a kil, Era possivel vislumbrar o claro
do kaxi que se mostrava, revelando que aquele
seria um dia muito quente. Para Manhuari e
seus amigos, isso näo representava nenhum

problema, pois sabiam que havia um cabitutu

onde poderiam se refrescar novamente.
Muitas mogas também iriam, acompanhando
ss mulheres mais velhas, para aprender a magia
da floresta. As meninas estavam se preparando
para o ritual da maioridade, quando teriam que
asumir outros compromissos na comunidade
casar-se, construir uma uk'a, com a ajuda do

marido, aprender a cuidar do próprio corpo,

extrair da árvore o perfume que iriam usar no

dia do casamento, aprender a preparar alimentos
deliciosos para alimentar os filhos que nasceriam
principalmente, aprender a conversar com

espíritos da floresta. A eles recorreriam sempre

Manhuari e seus oborés sabiam disso tudo.
Sabiam também que mais tarde seria com eles.
Hoje queriam apenas se divertir.

Após algumas horas de caminhada, chegaram à
kil e combinaram o que poderiam fazer enquanto
ajudavam as ixis nas tarefas do dia. Essas tarefas
consistiam em carregar água para todos, encher
os ictius de musuktá, buscar lenha no mato,
enquanto as meninas se ocupavam em coletar

frutas e sementes em outro canto da mata. Isso

tudo faziam com muita rapidez, pois queriam

mesmo era se embrenhar na mata e brincar

A caca à jakora

Kaxi logo propós que fossem brincar de caga
ecagador. Todos toparam imediatamente.

Escolheram o próprio Kaxi para ser a jakora e
quem seriam os cagadores. Depois, deram um

tempo para que o menino-jakora se escondes

mais preparavam seus arcos e

Passado algum tempo, os meninos-cacadores
partiram atrás do menino-jakora. Todo cuidado
era pouco. O jogo consistia em caçar sem
cagado. Ou seja, tinham que aprisionar o animal
acuado t
que fazer companhia à jakora na próxima vez,
Claro que todo mundo queria demonstrar sua

destreza de cagador e por isso levavam aquela

brincadeira muito a sério!

Depois dos primeiros passos, os meninos-
separaram. Cada um foi para um

canto. Caminharam sozinhos sem ser vistos pelo

animal. E assim fizeram por longo tempo sem

ter nenhum sinal do menino-jakora, que tinha s

escondido muito bem entre as árvores. De nada

adiantou procurar, procurar e procurar.

Quando os meninos-cacadores se

reencontraram, ficaram pasmos. Ninguém havia

encontrado o menino-jakora Kaxi. Jamais aquilo

havia acontecido! Para onde ele teria id

Ninguém soube responder aquela pergunta.

Será que ele havia se perdido na mata? Será que
algum animal de verdade o havia pegado? O que
eles deveriam fazer?

Manhuari sugeriu que contassem ás mulheres,
que estavam na casa de farinha, que Kaxi tinha
desaparecido. A tradiçäo dizia que € melhor que
todo mundo saiba do desaparecimento para

que a procura seja mais intensa. Todos foram ao

encontro das mulheres... mas, para espanto

todos, elas também náo estavam lé. A apreens
tomou conta deles,
Os meninos já haviam comegado a choramingar

quando saíram de trás das grandes árvores todas

as mulheres com um sorriso no rosto. Elas deram
altas gargalhadas ao ver a cara assustada dos
meninos. Eles náo entenderam nada no comego,
mas, depois que viram que uma delas trazia
consigo o “menino-jakora”, perceberam que lhes

tinham pregado uma pega.

Depois do susto, todos foram almogar na casa

de farinha e riram a valer da criatividade das

mulheres,

De volta à aldeia

O caminho de volta foi só alegria. As mulheres

nao pararam de rir um só minuto pelo que

haviam feito. Os meninos também riram uns do

outros, e tudo acabou numa grande brincadeira.

Manhuari guardou aquilo na memória, pois
poderia repetir aquele tipo de jogo com outros
amigos. Ele poderia, inclusive, combinar ante:
om as mulheres. Seria muito divertido!

Eles nem notaram o passar do tempo. Logo
avistaram a aldeia e apressaram o passo. Estavam
suados e precisavam dar um mergulho nas ägua

geladas do cabitutu. Seria muito refrescante!

Antes, porém, teriam que deixar na uk'a os

ictius carregados de farinha, frutas, legumes e

sementes.

'orrendo, cada menino levou ictius para sua

uk'a. Logo se reuniram novamente no cabitutu,

onde iniciaram uma gostosa brincadeira de pega-

pega, para esperar os cacadores retornar com o
resultado da cagada. Enquanto isso, as mulheres
repartiam com toda a comunidade os produtos
colhidos ou produzidos naquele dia: frutas,
sementes, farinha de musuktá, farinha de tapioca
e beiju.

Chegam os caçadores

caçadores chegaram pelo brago do cabitutu e

encontraram os meninos no meio da brincadeira.

Estes aproveitaram para mergulhar na parte
funda do rio e puxar as pernas das bekitkits para

baix

Logo em seguida saíram da á
rumou para sua uk’a, para repartir o produto
da cagada. A tradiçäo dizia que cada cagador só
poderia levar para uk'a o que pudesse carregar

Ele nao poderia matar mais animais do que «

que coubessem em sua bolsa. Além disso, cada

caçador tinha que empunhar seu arco e flecha. Era
assim, e náo podia ser diferente. Isso garantia que
suficiente para sua

familia e náo desperdicasse alimento matando

outros animais da floresta sem necessidade.
Manhuarie seus amigos foram atrás de seus
pais e baripnias. Todos iriam para uk'a preparar
o jantar depois de um dia de muito trabalho,
jogos e brincadeiras. Era o momento de todo

reunirem para uma deliciosa refeigáo capaz de

unir as familias em uk'a. A tradigäo dizia que,

assim fosse feito, cada membro contribuiria para

manter o céu suspenso.

Ahora da histéria

A noite jé se apresentava quando Manhuari
sentou no banco em formato de jakora que ha

ganho de seu tio, Já sentia sono e de vez em

quando bocejava. Ficou ali quietinho esperando

a cuia com carne de bio, recheada de farinha
de musuktá. Enquanto todos se alimentavam,
conversavam sobre o dia de cada um.

A ixi de Manhuari contou sobre o susto qui
haviam dado nas bekitkits. Todos riram muito,
inclusive Manhuari. O pai falou sobre a cagada e

sobre os perigos que passaram & caga da bio.

Após arefeigáo, a família de Manhuari come
a se organizar para dormir. Era costume
munduruku dormir cedo, já que a noite havia sido
criada para descansar e sonhar com o mundo dos

ancestrais. Assim, quando a noite se aprc

brindo o mundo com seu manto escuro, o povo
Munduruku se refugia no sossego de sua uk'a para
entrar no universo dos jexeyxt

Antes, porém, de o sono cair
avó comegava um canto muito antigo

que iria contar uma história da origem do mundo.

No tempo em que o tempo ainda náo existia,

apareceu um homem que sabia de tudo.

E, levado pela cantilena daquele sábio, o menino

Manhuari foi visitar os baripnias do mundo dos

Mas isso já é outra história

akoba: banana

baripnia: parente (usado para pes
floresta)

bekitkit: crianç:

bio: anta

borduna: pedago de madeira usado como arma

cabitutu: igarapé (córrego)

casa de farinha: local onde a mandioca € processada
etransformada em farinha para consumo diário. Ela
écomposta por um grande forno onde a farinha é
torrada,

ictiu: ce
ixi: mi

jexeyxey: sonho
jakora: onga
kaxi: Sol
kabido: vento

kasopta: estrela

mandioca

amigo

nao indigena

batata-doce

SOBRE OS MUNDURUKU

é muito
corpo todo coma
tinta extraída do jenipapo, assim como a cor das
formigas. É uma forma de se identificar para os

outros povos inimigos daqueles tempos antigos.

O povo Munduruku se identifica como Wuy jugu,

que quer dizer “gente verdadeira”. Essa é a forma

primeira v
naquela regiäo no século X ó entraram
em contato edade brasileira no com:

do século XX. Esse encontro fez o povo se adaptar

‘umes que nao eram seus, como
roupa industrializada, morar num mesmo lugar
para sempre (eles gostavam de andar, viajar para
outros lugares), comer comida industrializada,
entre outras coisas. Também comegaram a ser

vitimas de doengas que Ihes eram desconhecidas

antigamente. Isso fez muitos deles morrer ou

ficar muito necessitados de cuidados médicos

especializados.

Jém disso, tiveram que aprender a falar

portugués para poder se comunicar com as
pessoas das cidades. A lingua que eles falam é

originária do tupi e ainda hoje a preservam.

Dizem os pesquisadores que os Munduruku

chegaram a ter uma populaçäo de 40 mil pessoas
e formavam um grande exército amedrontador
Com o passar do tempo, os Munduruku
deixaram de guerrear, e sua populaçäo, hoje, é de
aproximadamente 13 mil pessoas.

É um povo que continua guerreiro, corajoso, e

que cuida do próprio território para que náo seja

invadido. Já montou escolas dentro das aldeias,

para evitar estudar na cidade. Isso ajuda a manter

sua cultura e seu modo de viver.

As aldeias desse povo säo atendidas pela

Fundacáo Nacional do Índio (Funai), respon:

pelo cuidado de todos os povos indígenas do

que auxilia os indígenas em quaisquer
ssidades: satide, educaçäo, produçäo de

alimentos e preservagäo da cultura munduruku.
Este livro retrata um dia típico de uma

bekitkit munduruku, desde quando acorda até

o momento de ir dormir. Observe que é um dia
bastante ocupado, pois a maneira de aprender
fora da escola

afazeres cotidiano:

eoutra, se aprende a cagar, pescar, subir em

árvores, nadar nos cabitutus, caminhar pela mata

Tudo isso é importante para os Munduruku,

porque, mais tarde, a bekitkit vai uti

esses conhecimentos para viver melhor em

comunidade.

DANIEL
MUNDURUKI

Escitorindigena com quarenta € ol ios publicados, graduado em
Flosofa tem Icencatur em História ePSiooga.Douor em Eduardo
pela Universidade de Sao Palo (USP). ietor presidente do Instituto UK.
~Casa dos Saberes Ancestras Comendador da Order do Mérto Cultura da
Presidencia da República desde 2008. Conseihelr consultivo do Museu do
{no do Ro de Janeiro Membro da Academia de Letras de Lorena, Recebeu
diversos prémiosno Brasileno entero entre els Prémio abut o Premio
da Academia Brasa de Letras, oPrémio rico Vanuc Mendes (otorgado
peloConselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(QP); Prémio Tolerancia (otorgado pea Unesco) Muto eses vos

receberamo slo Altamente Re da Fundagáo Nacional do Livro

Infantile Juvenil FNL)

MAURICIO
NEGRO

lus designer ráfico estrado temas ancestral mitológicos
ambient ético e multas vezes relacionados diversidad cultural
trasera, Tem particadode diversos catálogos exposes, no Bras
empaísescomo Alemanha Argentina, China, olómba, Corea, Esolqua
Ila, Japa e México. Reebeuprämies como PémioNoma apo,
2008 fo finalista do C Picture Book Festal (Corea, 200), White Ravens
(Alemania, 2000 XSi (Port Alegre, 2012).Jreebeuo elo Altamente
Recomendävel pela FL uso diversa obras de autres indigenas. €
Daniel Munduruku tem uma long pace, Écoordenador editora da
eg Muiaqu da Global Editora e membro do Conslho Dora So

edad dos sacre do Brasil
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