A busca responsável pelo equilíbrio entre tutela e autonomia, prerrogativas e privilégios, juventude e
senilidade, direitos e deveres é um desafio jurídico, além de social e ético. A Declaração Política da ONU
sobre o envelhecimento, produzida a partir daquele recente encontro em Madri, refere-se já em seu
primeiro artigo à meta de promover o desenvolvimento de uma sociedade para todas as idades e,
naturalmente, a contribuição das legislações para a formação de um novo paradigma de convivialidade,
diante desta nova ordem demográfica, não pode ser desprezada. Os Direitos Humanos, entendidos
através de seu caráter universalizante, apreendidos como verdadeiro movimento de globalização íntima,
no qual são contemplados e sacralizados apenas necessidades e interesses constantes – ainda que
historicamente expansíveis –, porque próprios da humanidade, são a referência legítima à limitação do
Poder, inclusive em plano internacional, e se prestam a nortear condutas neste diálogo intercultural e
intergeracional.
Tais Direitos básicos nascem dos fins humanos, sobretudo daqueles de maior significação. Do ciclo vital
nascimento-crescimento-reprodução-morte derivam todos eles, embora com variações aduzidas pelo
tempo e pelo espaço. Pacificamente admitidos os direitos à vida, à igualdade, à alimentação, à liberdade
(inclusive procriativa, a render, no entanto, ainda calorosos debates acerca, por exemplo, do aborto, da
seleção gênica, etc.), impõe-se a nobilitação também do direito ao envelhecer. Assim estabelecidos os
direitos, poder-se-ia pensar que o direito da pessoa idosa corresponde ao homem em abstrato, direito,
portanto, “de primeira geração”. Entretanto, para que finalmente seja ultrapassada a era de direitos
noctifloros, que surgem e desaparecem em um único período porque não lhes foram asseverados
sobrevivência e respeito no corpo social, deve-se justificar estes valores na demonstração de que “são
apoiados no consenso, o que significa que um valor tanto é mais fundado quanto mais é aceito” (BOBBIO,
1992, p.27).
Isto equivale dizer que fundamentação e justificativa estão na imposição da realidade – envelhecida,
discriminada. Neste raciocínio – de que reconhecimento e eventual proteção de direitos estão intimamente
relacionados a um contexto social determinado –, crê-se que só foi possível cogitar Direitos de categorias
(idosos, mulheres ou trabalhadores) ulteriormente a certas mudanças que ensejaram o aparecimento
destas categorias. O direito, portanto, é antes social que natural, neste aspecto. Em nossa sociedade, a
velhice difere de outras categorias etárias basicamente no que se refere a inúmeras perdas de
relacionamentos afetivos (por afastamento ou por morte); profundas modificações familiares (com a
ausência dos próprios pais, quiçá do cônjuge, e o surgimento de novas famílias constituídas pelos filhos);
dificuldades quanto ao mercado de trabalho ou opção por uma segunda carreira, especialmente sob um
sistema coercitivo de aposentadoria e subemprego; batalha contínua contra doenças crônicas e
debilidades orgânicas, proximidade da morte, ameaça à sexualidade, à inteligência e à integridade.
(FRAIMAN, 1995, p.23).
Em 1970, quando Simone de Beauvoir escreveu seu famoso ensaio sobre a velhice, não havia ainda,
assim entendida, tal categoria de cidadãos seniores: Em política, o indivíduo conserva durante toda sua
vida os mesmos direitos e deveres. O Código Civil não faz qualquer distinção entre um centenário e um
quadragenário. Os juristas consideram que, fora os casos patológicos, a responsabilidade penal dos
idosos é tão integral quanto a dos jovens. Os velhos não são considerados uma categoria á parte e, por
outro lado, isto não lhes agradaria; existem livros, publicações, espetáculos, programas de tevê e de rádio
destinados às crianças e aos adolescentes; aos velhos, não. (BEAUVOIR, 1990, p.9). Além do homem em
abstrato, senhor dos direitos humanos de liberdade – os quais se consagraram como de “primeira
geração” –, ganha então espaço o homem específico, diferenciado quer por sua idade, quer por seu sexo
ou sua posição na cadeia de trabalho.
O Direito do Idoso, dessa forma, está catalogado como direito social, junto a todos outros direitos
chamados de “segunda geração”, que exigem ações – e não omissões – do Poder. Obviamente, são
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