Arte Manuelina, século XVI, Arte portuguesa

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Apontamentos sobre Arte Manuelina


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54 O Ancnzonoco Porruauts

A arte manuelina e os críticos

No VI Congresso Internacional dos Arquitectos, retinido em Ma-
arid no ano de 1904, definin-se e votou-so que, «para haver um estilo,
6 necossário que haja um novo principio gorador, construtivo, e novas.
aplicagdes desso principi

Estudada a arquitectura manuclina segundo esto critério, tere
mos de reconhocer que ela nfo constitui um estilo, porque 6, org:
nicamento, de traga gótica, obedecendo, nos seus princípios fandamen-
tais, As últimas variantes da abóbada norvada.

© oseritor brasileiro Varnhagem, ao deserever, em 1842, 0 mo-
numento do Belém, foi o primeiro que propos a adopeto do quali-
ficativo manuelino o indicou os caracteres que, em seu entender,
acentunm a originalidado dos respectivos monumentos. Dos dez en.
racteres indicados por 6sse escritor, sete dizem respeito à ornamen-
tacto; o, dos trés que se roferem As condigdes ostáticas da arquitec-
tura —o predominio da volta perfeita ou do arco de quatro centros
(arco de sarapanel, arco Tudor), a tolerancia de todas as outras
curvas e a existencia de abóbadas sustentadas por altos pilares
enfoixados, em quo o enfeixamento 6 mascarado pola auseneia de
arestas saliontes o pela exuberán docoragdo—— dsses tres
‘earactores, nenhum representa um prinelpio construtivo novo. ¿Desdo
que, na ligagto do suporto com a abóbada, nto há originalidade, desde
que a abóbada manuelina 6 a abóbada norvada do período ogival,
que importa o predominio desta ou daquela curva, quo importa que
os esteios polisilos apresentem ou ndo arestas, sejam ou año pro
fasamente decorados?

Mas se, no tragado (plantas o algados), no sistema constrativo,
no há originalidade,—na ornamentaria, que nem sompro 6 lógica,
mas que 6, quési sempre, do cativante ofeito pitoresco, o manuelino
tinge uma expresso incontestávelmento interessante o original.

Os críticos, nacionais o estrangeiros, que so tem ocupado da
arto manuolina, apreciam-na divorsamento, quanto As influéncias que
nola so reflectem, e quanto A sua originalidade.

Joaquim de Vasconcëlos afirma que a arquitectura manuelina
depende inteiramento da arquitectura espanhola paralela, acresee
tando nfo ser para admirar que assim sucoda, visto como 05 espa-
nhéis organizaram-o ensino das artes e oficios primeiro do que nés

‘As corporagdes eatalds ¢ valencianas. i
minante no sie. XIV, a0 passo que as nossas só aparecom ni
do sée. xv e raro incluem nos seus estatutos elementos didácticos,

O ArcuroLoso Poxrucues

providencias acerca do ensino. Dos numorosos estatutos de corpo-
Tagdes e oficios que estudon —continua Joaquim do Vasconcelo:
apenas encontrou um relativo aos podreiros, o Case, ainda assim,
oferente ao grau inferior do oficio. Em Espanha, as ordenanzas re-
lativas aos alarifes aparocem om Córdova em 1508 o em Sovilha em
1597, porfcitamento redigidas o represontando cortamente una tra:
digto muito anterio. Juntas de arquitectos funcionam regularmente
em Espana, como na Ttális, discutindo problemas o organizando
¡concursos entre os artistas. Os tratados teóricos italianos sto tradu-
zidos o publicados. Em Portugal, D. Joto TIT encomendou a Pedro.
Nunes 6 a André de Resende a tradugto do Vitravio o de Albert;
mas ossas tradugbos fcaram inéditas, como inéditos fcaram os mss.
de Francisco de Olanda, que estove na Ttália, ondo so relacionon com
os homens mais eminentes—incluindo Miguel Angelo. Só em 1738,
na obra do P.* Inácio da Piedado e Vasconcelos, Artefactos sine-
tríacos e geométricos. so publica pola primeira ver, entre nós, uma
condensacto de Vignola, Ao passo que nds nos sacrificávamos para
sustentar o nosso dominio no Oriente, a Espanha trabalhava para.
avassalar a Europa. Esta diferenga, tam essencial, nos destinos das
duns nagdes peninsulares reflete-so na Arte. Em Portugal, no so
lovantaram por 0sse tompo edificios quo possam comparar-se aos os-
ppanhdis:—palécios, bolsas, pagos municipais. A nossa inferioridade
na teoria © na prätien da Arto 6 manifesta. ¿Como podorá,
pregunta Joaquim de Vasconcelos, falar-0 em originalidade, em in-
vengäo de um estilo, nacional? Tivemos, 6 certo, artistas de mero-
cimento nos sécs. X¥ © XVI; mas uma ou outra figura saliento no

digto segura, secular, que nfo existia em Portugal, de uma progressto
que actua lentamente. No manuelino, conclui Joaquim de Vasconcelos,
ño há originalidado nos processos de constrair; nto há clara deter-
minaçlo das fungôes que os elementos arquitectónicos tem do exercer,
ficando, por vezes, clomontos constrativos reduzidos a aces
ornamentais e simulando acessórios oranmentais elementos const
tivos; no há sistema decorativo nom estlizagto; ndo há observant
dos limites quo separam as trés arte

Recentemento (1913), escroveu o erudito arqueólogo. portuense
que «D. Manuel concontrou em Belém e em Tomgg, por meio de
admiráveis lavoros simbólicos —os do chamado estdo manuelino—
a expresso mais artística do pensamento plástico nacional».

Alberto Haupt esereve, em resumo, o. seguinte:

Alem do um gótico decadento, derivado, om parto, da Espanha,

56 © Anctrovoco Porruauts

em parte, da Batalha, florescou no pais, at6 o fim do sóc. xv, uma
escola, única em sou género, pröpriamente gótica, que, já no último
quartel daquele século produziu, anscrónicamente, o castelo do Leiria
© $. Francisco de Santarèm. Por outra parte, os mouros cxorceram
uma influencia decisiva, ao sul o no interior de Portugal, nos pormeno-
res da constructo, o que so explica por serem exercidos por Glos
alguns mesteres relacionados com a arte de construir.

Essa infludncia rovela-so nos colunelos delgados, com eapitéis de
estilo árabo, que nos aparecem, sobretudo em Évora o em Sintra,
como suportes de arcos dentados ou do forma de ferradura, o no
aspecto geral dos edificios acastelados o das fortificagües. Da fus
esses tipos arquitectónicos com formas provenientes do Norto o
do Oriente derivou a arquitectura maniteline,—mixto singular, quo
se afasta do gótico preponderanto nos outros países © que nonhuma
relacio tem com a arte espanhola contemporánea. D. Joto II chamou
a Portugal um arquitecto e escultor italiano, André Contueci, o San-
sovino, que permanecen novo anos em Portugal (1490-99); mas
a sua influéneia nfo devo ter sido muito sensível, pois que, no dizer
de Vasari, André Contucei executon mumerosos projectos arquitec-
iónicos «segundo o uso do país», o que equivalo a afirmar quo elo
tovo do subordinar muitas vezes os sous trabalhos As formas prodo-
minantes, meio góticas, meio mouriscas: Só trinta anos depois o país
entrou no caminho da vordadeira Renascenga.

‘Uma das variantes do manuelino consiste no emprego de olemen-
tos do gótico do último período, caindo-se freqtentemente, por um
lado, no tosco, mas ostentando-se, por outro lado, certa pompa de
ornamentagto.

Pouco a pouco, o manuelino atingo um naturalismo vigoroso, quo
transforma os elementos arquitectónicos dos vos em ramos e árvo-
res, fazendo lembrar exemplos do gótico alomto. Bsso naturalismo
converte-se depois, mered da influtneia de artistas eminentes, muma.
expresso muito singular, embora forgada, do que 6 espécimo típico
a ctlebre janela da Casa do Capitulo do convento da Ordem de Cristo,
om Tomar. É nas construgdes deste grupo quo mais nítidamente so
reconliece a interferóncia do clementos indianos.

A par desta feigio do manuelino © conjugando-se por vezes com
ela, outra so agentua, caracterizada pola fusño do gótico do último

+ Attese anche Andrea, mentre sete con quel Re [o de Portugal), ad alowne
énse stravaganti e dificli @archtitura, secondo Fuso di quel pace (Portugal,
er compiacere al Be...

E O Ancmzonoso Poxruauts or

período com formas de origem árabe. O ornato dominante nos monu-
mentos desta categoria 6 a moldura cujo perfil representa tres quartos
de cireulo.

A acgto da arte do Renascimento imprime no manuelino um ca-
rácter novo. Nos edificios deste quarto grupo, as formas clássicas

Put Ir o Covent da Jes (ta)

aliam-se com as antigas. As linhas gerais mantem-so góticas, for-
mando uma grande moldura, na qual a ornamentagio de Renascenga,
progresivamente dominante, se enquadra. Os elementos construtivos
elässicos faltam, porém, completamente, continuando a ser emprega-
dos, até & extingto do manuelino, os delicados colunelos do gótico do
derradeiro período, com capitéis de folhagens, e, como botaréns, em

58 © AncnzoLoao Porruauts

caso de necessidade, pilares de secgño quadrada ou poligonal, com
‘ornamentagio profusa © acompanhados de membros delgados.

Para Haupt, a comparaçäo dos monumentos portagueses e espa-
ahôïs-nûo confirma a opiniño de Joaquim de Vasconeclos. Pelo con-
trário; as únicas duas construgdes existentes em Espanha, que podem
considorar:se aparentadas com as manuelinas —o pateo do Colégio
de S. Grogörio em Valladolid, o o do palácio dueal do Infantado em
Guadalajara— diferem tanto dos monumentos manuelinos, quer no
carácter geral, quer nos detalhes, que pode legítimamente eoncluir-se
que, procedendo, embora, umas o outras, de uma tendencia em ab
luto semelhante, nunca os trabalhos portugueses dependeram dos
spanhôis, devendo talvez supor-se, antes, que aqueles dois monumen-
tos isolados fossem inspirados pelos portugueses. Demais, 0 estilo
espaaliol de transigAo pouco durou, o breve eodeu o lugar ao plate-
‘resco, primeira fase, já caractorizada, da Renascenca espanhola. Por
outro lado, © encontrarem-se os monumentos mais importantes 6 ca-
racteristicos do estilo manuelino ao longo da costa, entro Lisboa ©
Coimbra, e nto do lado da fronteira, 6, na opinito de Haupt, outro
argumento a favor da independencia do manuelino.

António Augusto Gonçalves observa que, perante a energia © a
opulencia do manuelino,. duas questdes naturalmente surgem: a ra-
cionalidado lógica, histórica o artística da sua superabundäneia pito-
rosca em face dos principios ostabelocidos como leis invioläveis da
ostötica, o a justiicagto da originalidade nacional quo Ihe tem sido

da. Para uns, a manifesta indisciplina do manuelino 6 rovola-

; para outros, 6.0 descomedimento rade,

'0, exereendo-se sem propósito © sem
weis que paregam —continua A. A. Goncal-
ves-— estas duas opinides sño rigorosamente ju
Ë certo que a arquitectura 6 uma arto ossencialniente fundada

nas lois da geomotria o da mecanica; mas, se o manuelino tantas
vezes roveste formas ¡lógicamente porturbadoras o desviadas do seu
natural destino o fango, a veemencia do sentimento e a exuberáncia
imaginativa que o faz vibrar, resgatam amplamento as infracgdes de
sua natureza indócil, precisamento pelo espírito do rebeldia que o
anima. O manuelino, como nio. assenta em regras sistemáticas de
proporgäo e medida, permitia a cada artista gizar a sua obra na
ampla liberdade © no impeto expansivo da sua fantasia e dos seus
recursos. E a feigio naturalistica da ornamentaria manuclina, sendo,
decerto, a que melhor se adaptava ás improvisagdes de artifices,
como os portugueses, destituidos de educacto artística delicada o

O AncHgoLoco Porruauits 59

maleével, era também a mais conformo as eircunstäneins, momenta-
neas © fortuitas, que convulsiónavam entio a corte e as classes ele-
vvadas, no delirio dos fumos orientais, a ésse alvorógo, a essa sobre-
excitagto fobril, a essa instabilidado o confasño moral, determinados
pelos sucessos désso período —brilhanto, sem dévida, mas enganoso,
porque nele se prepararam, nelo tiveram origen, os desastres ulte-
res.
Para A. A. Gongalves 6 incontostávol a origom importada do
manuelino; mas 6 também inquestionável quo langou raizes fundas
na alma popular, que se adapton ao terreno o dilatou Juxuriantemento
neste clima de grandezas, assumindo feigtes características, uma
fisionomia propria, acentuada, adquirindo uma vitalidade tal, que
por muito tempo se mantovo antónomo o livre em face da Renascenga
vitoriosa, e produzindo obras do carácter, por assim dizer, popular,
que, na sua espontancidado fremento e robusta, na sua linguagem
grosseira o inculta, nfo so das que menos impressionam e comovem.

Quanto à influencia indiana sobre a arto manuelina, observa. que
nfo 6 fácil saber em que factos coneretos se fundamentar aqueles
que a afirmam; e que a influencia de uma arquitectura sobre. outra
s6 pode doeumentar-se por analogías essenciais de estrutura 6 rev
timento, acentuando que nunca puderam constituir indicios seguros,
racionais, do influencias où afinidades artísticas a configurarlo das
massas, on os acidentes avulsos o fortuitos do vaga semelhança ma-
terial. Coincidencias de concepgto o detalhes de fisionomia no movi-
mento geral da arquitectura ou da estatuária, em dados momentos
do seu percurso através das civilizagües e dos. povos, constituem
um fenómeno muitas vezes indicado nos episódios da história da arte.

Pola sua indole ornamental, pelas condigdos sumptuárias do meio
social © pela veeméncia dos incentivos mentais do período histori
em que surgiu © se desenvolveu, o manuelino toma aspectos de tal
forma diversos e caprichosos, que dificilmente podem ser aferidos
por uma fórmula única de apreciagio, em abstracto.

À face dos espécimes existentes, parece indispensável admitir très
ordens de manuelino, quo revestem formas materiais diversas © cor-
rospondem a modos de sentir inconfundiveis:

1) O manuelino que so mantem fiel à tradigho o As normas góti
‘eas, no respeito o compreensäo da supremacia da linha construtiva,
sem ousar infringir as condicdes extrinsecas do equilibrio aparente;

2) O manuelino que, mun esforço de conciliagio, tenta realizar
um tipo novo, pelo amélgama pitoresco dos principios góticos com os
elementos da Renascenga;

do O AncueoL0GO Porruaués

3) O manuélino, a que poderemos chamas popular; inculto, arre-
batado, indomável, audaz, cheio de vigor e originalidade, quo 6 como
que um brado de independencia o de revolta contra a disciplina dos
proceitos novos, e nto respeita balizas quo tolham a enorgia da sua
exubertacia decorativa.

Ramalho Ortigao entendo que o estilo manuelino nto 6 um mero
desenvolvimento do gótico. Embors composto de elementos góticos
—porquo, em toda a evolugto da arte, coexistem os fenómenos
precursores com os vestigios avitos,— a arquitectura manuelina
$ uma das formas peninsulares da Renascenga, no sen primeiro
período, assumindo om Portugal uma expresso paralela à do plate-
resco em Espanha. O plateresco 0 0 manuelino sto fenómenos andlo-

, concomitantes, derivados do causas comuns na história, no espl.
rito, no temperamento da raga, e que tomaram uma particular
acontuagto regional em cada um dos lugares em que so manifostaram.

© arquitecto A. Bermudes entendé que a faso por que passaram,
em Portugal, a arquitectura © as artes decorativas suas tributárias,
no reinado de D. Manuel, constitai um estilo,

Fundamentalmente, as formas estraturais e decorativas dessa fase
artística baseiam-se nas da Renascença flamenga, como no principio
do reinado de D. Joxo III so baseiam nas da Renascenga francesa,
© no fin do mesmo reinado nas da Renascenca italiana, ou elissica,

formas, porém, modificam-se a tal ponto, eriam tal unidado
© pureza do expresstio. influencias tam variadas e estranhas, pros.
tam-so a tam arrojadas e improvistas combinagües, que nos dio,
anal, nos seus resultados, uma modalidado artística inconfundivel,
um verdadoiro estilo, com o seu carácter, tipo © cunho peculiares,
Aiferente de todos os outros, —at6 mesmo dos estilos dos paises donde
velo a sugestto inicial. As manifostagdes désso estilo, afirma A. Ber-
mudos, ainda se nfo esgotaram, o nele podem encontrar uma copiosa.
fonte de inspiragto os artistas portugueses da actualidade © do fu
turo.

Walter Cram Watson entendo que o estilo manuelino nto deve
ser considerado como um simples desenvolvimento da última fase
do gótico espanhol, porquo fgi curta a duragilo dela, © o manuelino
& quási seu contemporáneo.

O estilo manuolino nto. oferece sempre os mesmos caracteres,
Umas vezes, 6 um gótico exuberanto, misturado com o que quer
que soja poculiar o caractorístico, parecendo derivar do uma unio
do gútico d último periodo com o mourisco. Outras vezes, presentas
se francamente naturalistico, parecendo representar uma ovolugño do

0 Ancurotoco-Porruauts 61

gótico em sua dorradoira fase. Outras, ainda, resulta do emprego
simultanco dos estilos gótico o da Renascenga, sendo sempro a com
posieo ainda gótica, embora os porthenores sejam do Renascimento.

De todas estas modalidados, que, por vezes, so oncontram jun:

Porta era da Consiga Ya Lab)
tas, aquelas a quo pode aplicar-se com maior propriedade o designa-

imeiras.

tivo manuelino sto as duas
E. Bortaux ontonde o soguinte:
Ligada à arquitectura civil, manteve-so por muito tempo em Por-
ugal uma arto identica A arto mudgjar espanhola e que pode deng-

RE © Axcutotoco Porrvavis

minar-so mourisca. No tempo de D. Joto I, nfo obstante haver jé
decorrido séeulo e meio depois da expulsto dos derradeiros mugul-
manos do Algarve, essa arte manifesta-so ainda no palácio de Sin-
tra, complicando os recortes dentados de portas e janelas góticas,
où enquadrando nos sous compartimontos geométricos aves pintads
(as lendárias pogas), e penetra mesmo na arquitectura sacra, guar-
necendo, na Batalha, os recortos flamejantes da grande rosicoa
com uma réde do pedra mais delicada, cujos desenhos, igualmente
fiamejantos, opdem um yöu ao ardor do sol, vindo assim a consti
tuir a tradugdo anglo-mourisca da adufa. Para alem do Tejo, nos
fins do sóc. XY, essa arte mantinha uma vitalidade tal, que muito
mais fecundas do que as esbogadas no tempo de D. Joño I foram
as combinagdes que ela formou com a arto ogival, quando, nos reina-
dos de D. Joño II © D. Manuel I, Évora o outras cidades do Alen-
tajo foram teatro do uma intensa actividade artística. E note-s0: os
mouros do Alentejo parece nada terem devido aos seus viziahos de
Castela. As suas obras sabiam dar uma graga a um tempo oriental
inal, frisantemento documentada, por exemplo, nas janelas do
de Évora, cujas arcadas duplas, em forma do ferradura,
apresentam vatiagdes, executadas, nio em tijolo ou estuque, mas em
mérmore e granito. As amcias, os coroamentos de forma cónica, as
igrejas com 0 aspecto exterior, com a silhueta, do mesquitas abundam
na rogito, mostrando claramente como era grande a vitalidado dossa
arte, que se comprazia em “aplicar motivos da arquitectura profana
a construcdes sacras.

‘As formas compésitas quo aparecom om Évora complicam-se rá
pidamonte. Na interessante porta da casa capitular dos Léios, a
dupla arcado, em forma do ferradura, 6 acompanhada de torcidos;
dos colunelos monolíticos, de märmore, parecem entranga-
8 capitéis, quo semelham turbantes, sto também formados de
torcidos. Éste singular tipo de capitel foi transportado, com outros
pormenores da arto pre-manuelina do Alentejo, para o pago de Sin-
tra o para o mosteiro da Pena (alpendro da capela).

E certo que, ao norte do Tejo, a arto monrisca se havia tambem
combinado com a arte ogival. Mas 6 também certo que as obras de
carpintaria que constituem a mais notável manifostagäo dessa arte,
«como, por exemplo, o tecto da igreja de Caminha, nXo explicam a
arte pre-manuelina. Do entro os elementos da arte mourisea, há um
—e 08so 6, oxactamento, de todos, o mais puramento mourisco— que
36 apareco no sul: 0 arco de forma de ferradura. Os torcidos, que
slo, muitas vezes, o motivo único da decoragto manuelina (portal

0 AronsotoGo Porruauts 63

de S. Francisco, em Évora) o quo aparecen já em edificios anteriores
ao reinado de D. Manuel, sio, nalguns casos, aplicados A própria
constracio. Na igreja de Jesus em Setúbal (1480), por exemplo, os
pilares da nave, as nervuras da abóbada da absído rovestem essa
forma, quo om breve só genoralizon a todo o país, ndo só nos por-
fais © naves das igrejas, como nos eruzoiros, polourinhos, ete. Os
torcidos das abóbadas chogam, por vezes, a formar verdadeiros nbs,
que substituem os fechos (abdbada dos nös [1513] na Sé de Viseu).
Mas os elementos arquitectónicos experimentam, nalguns casos, uma
vordadeira metamorfoso:—os colunelos tornam-se semelhantes a tron-
cos, donde partem ramos, quo so eruzam. Ésto vegetabilismo encon-
‘ra-se em Sintra, em Evora, em Beja. O naturalismo, que, em Portugal,
se apodora das formas mais abstractas da arquitectura, tinha ja sur-
sido em Castela (cfr. a fachada do S. Gregério do Valladolid com o
portal da igreja de Viana do Alentejo). Neste ponto, so influencia
houve, foi dos monumentos espanhöis nos portugueses, porque os
espanhóis slo anteriores. Nenhum documento prova a interferéncia
de artistas espanhöis, ou dalgum déssos numerosos artistas flamen-
¿os ou alemtos quo trabalhavam em Espanha, nos monumentos ma-
nuelinos de pedra, ao menos -durante o período que antecede as
primeiras penetractes da Renascenga. A decoragio dos port
posta, quási exclusivamente, de motivos goométricos e vogotais:
vas trilobadas, umas concavas, outras convexas, ora entrelagadas, ora
justapostas. Os modelos destas combinagdes encontram-s em Espa-
ha (coroamento das portas da abside, sobre os túmulos dos antigos
reis, om Toledo; porta do cardo, em Lito); mas, em Portugal, ésto
motivo deforma-se, a ponto de perder toda a aparéncia geométrica
(Portais do Marvila (Santarém] o Vostiaria [Alcobaga).

A arquitectura manuelina transplanton, das construgtes dos eis
catélicos, o coro, assente numa abóbada de perfil abatido. Mas a dif-
culdade da constructo de tais abóbadas 6 a única que os arquitectos

um zimbério. E na
fachadas, mesmo das mais ricas, a Ornamentaria nto
vai alem dos portals, —ao contrário do quo sucedo nos monumen-
tos dos reis católicos, Fernando e Isabel, em que o revestimento
ornamental das fachadas é completo. Portanto, a arte manuelina pedía
à arte espanhola alguns dos sous elementos; mas ésses clementos
to fizeram mais do que enriquecer uma arto que já existia. A orna-
‘mentagto vegetal receben porventura estacas de Valladolid; mas os
sous primeiros ramos tinham já florido nos túmulos dos príncipes
© herdis do sée. xv (túmulos da Capela do Fundador, na Batalha,

64 © Anonzoroco Porrugußs

túmulo de D. Duarte de Meneses em $. Joto de Alporto, Santarem,
túmulo com a data 1479 om 8. Francisco do Porto, túmulo de Fernto
Telos de Meneses, em 8. Marcos, junto a Coimbra). Para avaliar bem
' infinóncia da arto ospanhola na' arto manuelina, 6 preciso vt-la ma
nifestar-so num determinado momento o, depois, desvanccer-s0 nos
grandes monumentos riais, quo, pela sua imponento grandeza, pola
sua riqueza exótica, pola sua misteriosa originalidado (étrange), ox.
cedem as construgdes dos reis católicos.

É corto quo as formas estranhas © monstruosas de arte indiana fo-
ram conhecidas em Portugal desde o tempo de D. Manuel. Em Sintra,
9 pequeno tanque mourisco da sala árabo tem como motivo central
um bronze dourado, que 6, evidentemente, cépia de um objecto tra-
zido da India. D. Manuel mandava os sous arquitectos a Goa, a Ma-
laca, A África sotentrional. Um désses viajantos construía a tôrro do
Belem, dando-lhe as cúpulas e balcdes de um palécio indiano. A ar-
guitectura militar da época manuelina, em suas formas mais ricas,
inspirara-so do Extremo Orient. É certo, contudo, que os arquitectos
sabiam transformar com liberdado os elementos que transplantavam.
Assim, por exemplo, na torre de Belém, o arquitecto procura a forga,
regressando, no desenho das janelas © mesmo das ogivas das
das, As formas posadas, macigas, da arte románica. Sem as imitar,
repoto as fantasias horáldicas da arquitoctura castelhana, quando
transforma as ameias da torre do Belém em outros tantos enormes
escudos, que ostontam a cruz do Cristo. Uma das torrelas angulares
$ sustentada por um rinocoronto, que simboliza, ndo a Íadia. mas a
África. Mas a forma mais original da arto manuclina no 6 europeia,
nem indiana: 6 maritima. Os artistas quo a realizaram, nada di
a qualquer das artos do seu tempo: —recomecavam, com uma esp6-
cio do barbaria magaífca, um dos mais antigos ensaios da arte—
a arto micénica, soqtencia de uma arto constituida na Tha de Creta,
habitada por um pequeno povo de audazes marinheiros. É em Tomar,
onde, aids, se obsorvam também reminiscencias da arto indé, que so
encontram 05 mais frisantos especimes dessa arte, que no pertence
a tal ou tal artista, mas que 6, acima do tudo, a arto do um povo. Em
Bolom, sobretudo depois da intervengto do Joto de Castillo, isto 6,
depois de 1517, predomina um estilo mais-sovero, mais sóbrio, mais
disciplinado, mais puro —mais cléssico dentro do gótico— estilo a
que vém ligar-so elementos da Ronasconga— pilastras, arabescos,
vasos de perfil antigo. Dir-se-ia quo Joto de Castilho, arrependido de
herosia artística praticada em Tomar, se convertera. O que se ignora
ainda, 6 onde foi o artista encontrar os modelos da ornamentacko

© AnchwoLooo Porruauis

05
elássica que, pouco a pouco, invade as suas obras de arquitecto. Nos
mármoros do
cebeu a ma

msovino, que, lis, parecia desconhecer, quando con
estranha e poderosa obra manuelina em Tomar?
Dieulafoy pensa: quo a estilo n

suelino 6 uma hipertrofia dos
estilos góticos, mudejar e platereaco do último terco do sée. xv, de-

torminada pelo aflaxo, extremamento rápido, do oiro, constitaindo,
20 mesmo tempo, uma demonstragto de reconhecimento para com o
cavaleiros de Cristo.

Finalmente, o erudito arquitecto-arqueólogo espanhol D. Vicento

66 H O Ancnzoroco Porruauits

Lampóroz y Romea, ocupando-se do gotico peninsular na fase de de.
cadencia (im do séeulo xv © comego do imedisto), em uma ou duas
conferóncias há dois anos realizadas om Madrid, aludia: também à
‘nossa arto manuelina, e por isso resumimos a sua interessante expo-
sigo, devendo, todavia, frisar que o consagrado arqueólogo confess
nilo conhecer directamente os monumentos portugueses e ndo so jul-
gar, portanto, autorizado para formular uma opinito definitiva.

© gótico flamejante nto se radicou em Espanha o Portugal. Na-
turalizouse, Foi traduzido por wma singular mistura de elementos
góticos, tragos mouriseos o tendencias naturalísticas.

O característico de todas as decadóncias 6 tratar a ornamentagho

indo a natureza, com desprezo das leis da estilizagao: a gótica

o fez, como nenhuma outra. Mas há, na arquitectura, outro natura-
lismo, mais Taro e discutivel: o que trata os elementos estruturais
‘como produtos da natareza (corais, troncos, oto.), ou como produtos
industriais (cordas, cadeias, tecidos, eto.). Quési todos os grandes
cstilos professaram a teoria de quo a arquitectura nAo 6 uma arte
imitativa, mas interpretativa, o por isso o seu objectivo e a sua gloria
6 fazer sentir por meio de formas criadas por ela. Aquele naturalismo
especial, que se opde a essa teoria, aparece no gótico decadente
peninsular com uma forca poderosíssima, cuja origem nfo 6 fácil
determinar. ¿Imitacto dos livros do oragdes do tempo? Simbolismo?
¿Infiencia de uma alta © poderosa indivualidade, de um grande
artista, que, enamorado da Natureza o vondo nas suas fórgas ocultas
o símbolo da Vida, se voltasse para ela, como fonte novíssima o
inexgotável de inspiragto? Talvez quo esta última hipóteso seja a
verdadeira. Potentíssimo desenvolvimento tevo em Portugal o natu-
ralismo, com o estilo manuelino. O manuelino 6 um mixto de elemen-
os mouriscos e naturalísticos, postos caóticamente sobre um fando
gótico decadente. Góticos, slo os pilares fasciculados, as abóbadas
norvadas, as janelas com pinásios, as portas abuzinadas;—mouriscos,
so os arcos mistilinios, os qjimezes, a multiplicidade de curvas ¢
© contra-curvas, os lobulados o festonados das arquivoltas, a repeti-
eto curítmica dos ornatos; —naturalisticos, o emprégo de troncos,
raınos, cordas, nbs, ete. Em Espanha, o grau de baroquiemo desses
elementos nunca subiu tanto, porvontura porque o Ronascimento pene-
trou 14 primeiro do quo em Portugal.

‘Tais sto as opinides dos arqueólogos o críticos mais autorizados,
que da arte manuelina so tóm ocupado.

O ArcugoLoGo Porruavis 6?

Poderemos, talvoz, concluir 0 x
É admissivel o designativo manuelino, aplicado A arquitectura y

+ ARSE
Y [a

ann aa de Chars om vera (cio demolido)

artos dela derivadas, na faso de decomposigto do gótico, devendo,
porém, observar-se que essa interessante expresso artística, produto

08 O ArcusoLoso Porrucuts

de influencias diversas, cuja intensidado varia, contando-so entre olas
infiuoncias individuais, nfo eorresponde, com absoluto rigor, ao ro
nado de D. Manuel.

‘Alem das très modalidados definidas pelo Sr. António Augusto
Goncalves, uma quarta 6 mister accitar:—a representada pelo gótico-
-mouriseo de Alem do Tejo o do pago do Sintra, conquanto este a
pecto da transigäo soja, talvez, no sou inicio, cronológicamente, pr
smanuelino.

Estruturalmente gótica, som nenhum dos elementos construtivos
da Renascenga, embora também sem algumas das peças do admird-
vel organismo ogival,—a arquiteetura’manuelina nto constitui, pró-
priamente, um estilo, tomada esta palavra na acopeto rigoros em
que, segundo o VI Congresso Internacional dos Arquitectos, deve ser
tomada. A originalidade da arte manuelina reside, sobretudo, na or-
namentagio, que, destituida, em geral, de pureza e unidade, 6, em
compensagio, rica, pitoresea o sugestiva, e reflecto com nitidez o mo-
‘mento da vida portuguesa a que corresponde, o estado da alma na-
cional, no periodo do brilhante posto que ofémera grandoza, em que
‘essa arto com tanta exuberáncia so manifeston.

Lista das obras a cujos autores se faz roferénela

artigo

Noticia historica e descriptiva do mosteiro de Belem. Com um

io de varios termos respectivos principalmente & architectura
gothica.—F. A, de Varnhagen. Lisbon, 1842. (Memória publicada
áriamento no Panorama, vol. Vi).
Joaquin do Vasconcelos. Conferón-
cia realizada em Coimbra em 1884. Publicada no volume Exposigdo
distrietal de Coimbra em 1884, e, depois, em separado, com numero-
sas © eruditas notas, constituindo um dos estudos da série Historia
da Arte em Portugal.

Monumentos da arte considerados como subsidio para a história da
civilizagio portuguesa. — Joaquim de Vasconcelos, Porto 1913.

Die Baukunst der Renaissance in Portugal, 2 tomos.—A. Haupt.
Hannover, 1890 e 1895. (Tradusto portuguesa na revista Serbes).

© Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. —António Augusto Gon-
salvos. (In A Arte e a Natureza em Portugal, n.° 28.)

‘Thomar.—Anténio Augusto Gongalves. (In A Arte e a Natureza
‘en Portugal, n° 62 0 68).

A conclusio do edificio dos Jeronymos.—Ramalho Ortigto. Lis-
bon, 1897.

ee an a Pry

O Axcuzotoao Poxrvauts 69

Portuguese Architecture. — Walter Crum Watson. London, 1908.
(Cap. x).

La Renaissance en Espagne et en Portugal. —E. Bortaux. Cap. vt
da 2 parto do tomo 1v (Paris, 1911) da obra Histoire de l'art
depuis les premiers temps chrétiens jusqu'à nos jours, publicada sob
a dircegäo do André Michel.

Espagne et Portugal.—M. Dieulafoy. (Na biblioteca Are Una).
Paris, s. d. (Cap. 19).

Una evolución y una revolución de la Arquitectura española
(1480-1520). —V. Lampérez y Roma. Madrid, 1915.

Nota.—A simula da confert
nuctina, lömo-la, hi anos,
pordm, acedendo amável
Gimos a sua opin,

‘em que o St. Bermudes traton da arto ma-
‘un jornal de quo perdemos a nota. O conferento,
ento a podido nosso, rovin où periodos cm que si

D. José Prssaxua.

Descrigäo dos «ex-libris»
existentes no Museu Etnológico Portugués!

ras de armas, pinturas, sinetes, ete.—, abundam ali as incorrecgos,
quer na disposigto dos möveis que entram na composigto dos bra-
ses, quer nos metais o esmaltes com que os apresentam. Mas, como
o meu trabalho ndo tem por fim fazer a crítica dessas incorroegdos,
© antes so limita a um simples catálogo dos ex-librie existontes no
Museu Etnolôgico Portugués, nenhuma referencia faremos ao desa
côrto com que brasonaram muitos delos. Nao seguiremos o exemplo
do Aníbal Fernandes Tomás, que, no seu folheto Er-libris orna-
mentaes portugueses, Porto 1905, desereve com um pretenso rigor

1 [Na impossbilidado de, por falta do tempo, catalogar en proprio todos os
úhjectos que vou obtendo para o Museu Etnologico, necesito de, por vezes re-
correr & eolaboragto de outros Assim, polo que toca as x bris, pol
a0 mou amigo D Alvaro de Azerodo, ento rosidonte em Li

tituom a 14 série do presento artigo. Como poré o mes
Lisboa, encarreg da continnagdo do Cats 2 Luis Chaves, Conservador.
interino do Musou: e o son traba série. Novas séries so pu
blicario em havendo novos exibris.—J. La om VJ.