começou a espancar o João Felipe na sua frente dizendo: eu não falei, e
batia nele, que era pra tu estudar, e batia, e deixar de vadiar, que, se eu
tiver que vir aqui na escola de novo, e não parava de bater, se eu tiver que
ouvir reclamação tua, tu já sabe. A essa altura você estava paralisado. Você
pensou em encaminhar o ocorrido para a direção da escola. Mas você
percebeu que a escola em que você estava tinha problemas demais,
portanto, por mais que fosse grave um pai bater no filho porque ele
supostamente não estudou, esse parecia ser o menor dos problemas. Depois
daquilo eles se levantaram, não sem antes ouvir do João Felipe que se
comprometeria a estudar. E você se sentiu culpado por não saber nada do
seu aluno e ainda provocar uma surra nele. Teve também as vezes em que
você atendeu a mãe da Maria Vitória. Tratava-se de uma boa aluna,
esforçada e gentil. No entanto, quando a mãe dela vinha conversar com os
professores, todo mundo tentava fugir. Porque, sempre que começava a
falar, ela não tinha limites. Passava mais de quarenta minutos num
monólogo e, mesmo que você tentasse interrompê-la, ela dava um jeito de
seguir falando da casa dela, do trabalho dela, depois da sua infância e de
como ela era na escola, que hoje está tudo diferente, no meu tempo o
professor enchia o quadro e a gente copiava tudo, não tinha isso de não
fazer nada, eu até ganhei uma distinção de melhor aluna do ginásio,
porque eu copiava tudo e gostava muito de estudar química. O professor
Gervásio era o mais durão na época, a gente tinha medo dele, e eu acho
que hoje falta isso, professor, os alunos não têm mais medo dos professores,
por isso a escola está desse jeito. Eu lembro que minha mãe nunca admitia
que eu chegasse em casa com nota baixa, minha mãe era uma mulher
braba, e sabe, professor, eu não tive pai, porque ele morreu quando eu
tinha seis anos, minha mãe era quem cuidava de tudo, lutou muito para nos
criar, a gente nunca passou fome, professor, mas a gente teve dificuldades
e, quando tinha pouca comida, minha mãe costumava fazer uma sopa de
couve com feijão, o senhor já comeu sopa de couve com feijão? A essa
altura, obviamente a sua cabeça já estava em outro lugar, e, mesmo que
você respondesse qualquer coisa, não faria diferença, justamente porque sua
resposta não interessava, ela apenas queria falar. Na verdade, após anos de
magistério, a escola transformou você num indiferente. Com o passar do
tempo o desencanto tomou conta da sua vida. A escola e os anos de prática
docente te transformaram num operário. Anos e anos acreditando que você
estava fazendo algo de significativo, mas vieram outros anos e anos e