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escolheu os mais madurinho pra vende e os outro dava pras galinhas, criava pros porco.”
(JOSINA). O sr. Adílio lembra que no verão extraíam a palha do butiá e vendiam para
uma fábrica de Laguna: “Naquele tempo não existia vassoura de faxina em casa. Não
existia nada pra fazer o dinheirinho do verão... era palha de butiá. Pegava a palha de
butiá e amarrava e o caminhão levava pra fábrica. Teve um ano que eu tirei cem arrobas,
não foi?” (ADÍLIO).
Uma questão importante é a referência aos engenhos de farinha que existiam na região.
Conforme citado nas memórias de Santanna (2016), os engenhos de farinha, juntamente
com as atividades de produção e manutenção dos equipamentos para pesca, constituíam
um importe ponto de produção econômica e de compartilhamento social na região das
Dunas da Ribanceira. Segundo a sra. Josina, “tinha muito engenho aqui, tudo de farinha,
nós trabalhava na roça, nós só convivia com farinha, só.” (JOSINA). Neste sentido, fala
o sr. Adílio que: “quando não era aqui era no morro, plantar cana, plantar feijão...
serviço. Quando terminava todas as coisas iam arrumar um engenho para fazer farinha
e arrumar as redes para pescar tainha.” (ADÍLIO). Sra. Edith reportou durante a
entrevista da existência de oito a nove engenhos na localidade.
As condições de vida dos moradores das Dunas da Ribanceira eram difíceis. Sr. Adílio
narra estas dificuldades: “Fazia um frio... faziam um fogo bem grande, bem grande,
parece que eu tô vendo, nós era nove, nós chegava no final da tarde e comia. Come ligeiro
come, que é pra deixar a querosene pra noite. Isso eu lembro do meu pai dizer, pra deixar
a querosene pra noite. Aí depois nós se deitava, aí tava tudo bem. Mas fazia frio, nós
deitava numa esteira, uma manta por cima e outra esteira por cima, amarrado. Naquele
tempo, uma friaca, e naquele tempo não era a de agora. O tempo mudou. Era aquela
coisa de gelo, era uma friagem. O tempo mudou muito. Não deu mais aquela friagem e
naquele tempo não existia prontuário, não existia remédio. Era remédio do mato. Fulano
tá com uma dor na boca do estômago, tá pra morrer. Naquele tempo morria muita gente.
Ah, tá enfeitiçado, enfeitiçado. Tinha feitiço naquele tempo. Nascia uma criança ‘ie, ie,
ie, ie’ dava chá, chá do mato, benzeção. Fiz muita benzeção. Também pra nascer, nascia
em casa.” (ADÍLIO). Colchão para se dormir, segundo a sra. Edith, era “uma esteira de
piri” (EDITH).
No relato do sr. Adílio é possível observar o imaginário fantástico relacionado à
colonização de base açoriana e que se fazia presente nas Dunas da Ribanceira. Bruxas,
lobisomens, boitatás. A medicina popular na presença das benzedeiras e parteiras,
reportadas também pela sra. Edith, embora se refira à região da Araçatuba, onde viveu
sua infância. Sra. Josina fala da existência de uma parteira na localidade, provavelmente
na década de 1960: “Uma senhora muito querida até, quando se formava temporal, que
eu tenho muito medo, aí ela saia na rua e benzia. O temporal se abria todo, ela passava
pra lá, passava pra cá, mas aqui graças a Deus não acontecia nada. Mas ela também já
faleceu. Eles eram de Garopaba e vieram morar aqui, trabalhavam lá na roça. Depois
mais tarde voltaram para Garopaba e tadinha, foi falecer lá em Garopaba.” (JOSINA).
Os relatos colhidos dos três entrevistados apresentam uma comunidade de base açoriana,
cuja economia de subsistência fundava-se na agricultura, na pesca tradicional e no
beneficiamento de alguns produtos locais (palha do butiá e farinha de mandioca
principalmente). As dunas (areal) referenciadas como local de caminhos, sepultamento
de mamíferos de grande porte, brinquedos (escorregar pelas dunas) e para onde se acorria
na atividade do extrativismo vegetal. O fantástico e o religioso também tinham espaço
nas dunas, seja nas “visagens” do boitatá seja como cenário pelo qual se aproximava a
“Bandeira do Divino”, conforme relato da sra. Josina: “O momento de festa que tinha
aqui era quando a Bandeira do Divino Espirito Santo vinha. Nós trabalhava tudo na
roça. Aí a bandeira tá lá no Arroio, que era pra lá da Praia Vermelha. Cantoria que a