A morte faz parte do cotidiano de todos nós, inclusive de nossas crianças. Cabe aqui
lembrar que, atualmente, a morte invade nossa vida repentinamente, sem nos pedir licença,
sem aviso prévio, sem controle, sem formas de proteção e faz parte de nossa vida pessoal. É
a “morte escancarada” (Kovács, 2003). Isso é vivenciado por todos e cada um de nós nas
ruas — violência, homicídios, acidentes etc. —, nos meios de comunicação — jornais,
rádios etc. — e dentro de nossas casas — nos noticiários da TV , nas cenas de violência
física e social, nas cenas de acidentes, homicídios, guerras, atentados. E esses eventos não
têm horário certo para acontecer e/ou serem exibidos, em qualquer hora do dia ou da noite,
para qualquer um, de qualquer idade. A morte invade nossos lares, e não há reflexão a
respeito. Desse modo, corremos o risco de sermos impregnados pela dor e pelo sofrimento,
dando a impressão de que isso é natural e faz parte da vida. Podemos encarar essa situação
como uma banalização da morte. E, assim, continuamos a jornada, sem falar sobre a morte,
sem elaborar o tema. Parece que somos obrigados a engolir a morte sem digeri-la.
A morte está presente, inclusive, nos desenhos animados dos quais as crianças tanto
gostam. A ideia mágica da imortalidade aparece quando, por exemplo, o Pica-Pau é
atropelado por um trem, fica completamente estendido no chão como folha de papel e, em
questão de instantes, toma sua forma original e sai por aí aprontando das suas... Ou nas
aventuras de Tom e Jerry —, ao explodir uma bomba na boca do Tom, Jerry fica totalmente
chamuscado e logo se recupera para novas investidas contra seu rival... Ou os ídolos de
filmes, como o James Bond ou Indiana Jones, que passam por tantas aventuras, enfrentando
situações de perigo inusitadas e saem ilesos, ainda fazendo amor com lindas mulheres. Aí
está a ideia de imortalidade.
Atualmente, com os joguinhos eletrônicos, a criança enfrenta situações e/ou
batalhas nas quais consegue driblar a morte. Ganha bônus por suas brilhantes estratégias
para combater seus inimigos e é recompensada, ao passar de nível, adquirindo “vidas
extras”.
Por um lado, vemos a banalização da morte e, por outro, a imortalidade. Assim fica
fácil continuar negando a morte e viver a vida fazendo de conta que ela está longe de nós,
que só acontece com os outros.
Diante do cenário no qual vivemos, assistindo a tantas mortes a cada dia, em todo e
qualquer lugar, esta deixa de ser uma questão isolada e individual e passa a ser coletiva,
para adultos, velhos, jovens e crianças. Não resta dúvida de que todos nós nos sentimos
vulneráveis.
Não posso deixar de mencionar aqui o quanto o mundo ficou sensibilizado quando,
dia após dia, foram veiculadas nos jornais, rádios e canais de televisão a notícia e cenas da
morte do grande ídolo brasileiro da Fórmula 1, Airton Senna, falecido em 1994. Ele era
ídolo de homens, mulheres, jovens, velhos e crianças. Morava no coração de cada um de
nós. Esse ídolo não era imortal. Ele morreu. Para nós, restaram as lembranças.
Entre muitas outras notícias veiculadas pelos meios de comunicação estão o famoso
e fatídico 11 de setembro em 2001, que chocou o mundo e o deixou mais vulnerável, e,
mais recentemente (em 2006 e 2007), acidentes aéreos que deixaram muitas famílias
desestruturadas em seu sofrimento inesperado. O inesperado torna-se então presente: cenas
de destruição, morte, perdas, dor, sofrimento e desespero são vistas por todos, inclusive
pelas crianças.
A indignação surgiu em vários ambientes: nas casas, no trabalho, nas escolas...
Todos querem entender o porquê da necessidade de guerras e conflitos armados. Todos
querem saber sobre as falhas que provocaram os desastres aéreos. De quem é a culpa pela