Tito olhava para Epaminondas como que hipnotizado. As danças de ciganas
daquelas palavras embriagadas acalmaram a angústia do rapaz, que se sentia
totalmente oco. Tito sentia uma espécie de catarse e vergonha, não sabia ao certo
por que, porém sentia-se envergonhado por não poder oferecer alguma troca com
Epaminondas. Não era também de estranhar que o negrão se exaltasse algumas
vezes com ele, pois parecia realmente meio patético e fez colocações patéticas, era
um sóbrio, agora tinha certeza disso, e esta verdade crua o incomodava, não queria
sê-lo! Porém, por mais que olhasse para dentro de si não encontrava nada. Um
demônio quem sabe? Unzinho! Até mesmo meio inofensivo, qualquer coisa afinal,
mas não, nada! Sentia que era e não era; quem é Tito? Pensava. A sensação que
experimentava era de um bonifrate que de repente dá-se conta das cordas que
provocam seus movimentos e também de que se as cortasse cairia no chão feito
um amontoado inútil de ripas de madeira. Agora, a força da presença do velho
diabo quase o esmagava contra a parede da razão sóbria. Perdido, começava a
sentir um leve bafejar de desespero: quem é Tito? O que fazia ali? Por que estava
ali? Epaminondas acendeu serenamente um charuto, colocou seu chapéu na
cabeça e deu uma profunda baforada – Não bebe mais, irmão? Este vinho está
delicioso – Tito rejeitou com um sinal negativo qualquer, estava enjoado e
totalmente perdido, a bebida só complicaria mais as coisas. O negrão então
continuou: - Logo mais realizarei algumas práticas infernais, mas gostaria que você
não estivesse presente, desta vez não, você não está em condições, não encontro
mais aquela alegria instintiva em seus olhos. A tristeza e a melancolia não são bem
vindas aqui, porém, não vou ser cruel, pois a crueldade do diabo é puro
preconceito, he,he... se não tivessem lhe embaçado a visão com seus preconceitos,
talvez você tirasse de letra essa depressão. Mas não é o caso, como eu disse, você
é um sóbrio da gema, é um produto finalizado para ser função, nem demônios
têm, caralho! É asséptico, tem alma, é branco e meio transparente por dentro. Eu
não! Sou feito de sangue e carne! Sou carne! Amo o cheiro da carne! Do sangue!
Cuspo, ejaculo, defeco, mijo, peido, tenho excreções corporais, transpiro pra
caralho, irmão! Tenho bafo de trago, tenho cheiro de humano, sou Natureza, tenho
fome, sede – e como! – gosto da embriaguez dos sentidos; adoro sexo, adoro o
cheiro das carnes generosas e transpirantes de perfumes excitados, amo a vida,
amo estar vivo, amo o aqui e o agora. Sou o causador, o mentor, o demolidor, o
pensador de mim mesmo! Também o criador de mundos, o engolidor de
demônios brincalhões, o festeiro, o homem que celebra; amo as orgias, amo os
sátiros e as ninfas! Amo o vinho, sangue da existência embriagada! Tenho pêlos,
tenho dentes caninos, tenho orgulho de ser irmão dos animais! Sou um animal e
grito isso aos quatro ventos! Sou um animal caçador, destruidor e criador ao
mesmo tempo. Crio rituais para meu deleite, me divirto muito! Crio meu
misticismo. Adoro rir, rio muito! Crio eventos para meu prazer, sou um hedonista
74