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sobreviver diante da morte e das frustrações do mundo é um segredo que apenas o próximo
capítulo vai começar a desvendar.
Enquanto isso o versículo 9 nos faz lembrar de um outro aspecto da alegria: sua relação
com aquilo que é certo. À primeira vista este lembrete do julgamento parece uma espada de
Damocles pendurada sobre a nossa cabeça, para roubar à festa todo o seu sabor. Talvez seja
verdade, mas apenas se a nossa alegria for uma paródia da verdadeira alegria. Os caminhos que
satisfazem ao teu coração e agradam aos teus olhos, ou, em outras palavras, a verdadeira liberdade,
devem ter um alvo que valha a pena alcançar, um "muito bem!" que desejamos ouvir para ter
satisfação. Caso contrário, a trivialidade ou, o que é pior ainda, o vício assume a direção. Seja qual
for a conotação que a palavra "playboy" tenha para nós, sabemos que é uma pessoa que não re-
laciona a sua vida com coisa alguma que seja exigente, e muito menos com os valores eternos; é uma
pessoa miserável. Assim este versículo, ao insistir que nossos caminhos interessam a Deus e são,
portanto, significativos em toda a sua extensão, não rouba alegria alguma, mas apenas acaba com o
vazio.
A meu ver, o versículo 10 acompanha esta linha de pensamento. À primeira vista talvez não
pareça mais que um simples escapismo, uma tentativa desesperada de extrair o prazer de uma
situação sem sentido. Mas ele adquire mais sentido
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se for uma extensão do convite feito ao
"jovem" do versículo 9 para regozijar-se na sua juventude, porém de maneira responsável.
Idolatrar a condição de jovem e temer perdê-la é desastroso: prejudica o dom, mesmo enquanto
ainda o desfrutamos. Considerá-lo, por outro lado, como uma fase passageira, "bela no seu tempo"
mas não além dele, é libertar-se de suas frustrações. O desgosto do qual se fala neste versículo vem a
nosso encontro mais de uma vez no livro como a amargura provocada por um mundo duro e frus-
trante.
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Ele tem o seu lugar para tornar-nos realistas, como destaca 7:3; não é motivo, contudo,
para nos tornarmos pessimistas. Desde o seu início, este versículo afasta a depressão; e a segunda
linha, remove da tua carne a dor, pode muito bem ser um eco a reforçar a primeira, segundo o estilo
da poesia hebraica. Mas também pode estar levando o pensamento um passo além, ao reino moral,
uma vez que a palavra aqui traduzida por dor significa basicamente "mal"
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. Neste caso, ela
sincroniza com o lembrete que diz que todos os nossos caminhos interessam a Deus, que é o nosso
juiz (v. 9c). A alegria foi criada para dançar junto com a bondade e não sozinha.
Mas essa maneira positiva de encarar a vida, que perpassou todo este capítulo, deve
repousar sobre alguma coisa mais substancial do que jovialidade, coragem, ou até mesmo
moralidade perfeita. O capítulo final dedica-se ao que é básico e insta conosco a que não percamos
tempo ocupando-nos também com isso.
Teme a Deus!
12:1 Lembra-te do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e
cheguem os anos dos quais dirás: Não tenho neles prazer;
2 antes que se escureçam o sol, a lua e as estrelas do esplendor da tua vida, e tornem a vir as
nuvens depois do aguaceiro;
3 no dia em que tremerem os guardas da casa, os teus braços, e se curvarem os homens
outrora fortes, as tuas pernas, e cessarem os teus moedores da boca, por já serem poucos, e se
escurecerem os teus olhos nas janelas;
4 e os teus lábios, quais portas da rua, se fecharem; no dia em que não puderes falar em alta
voz, te levantares à voz das aves, e todas as harmonias, filhas da música, te diminuírem;
5 como também quando temeres o que é alto, e te espantares no caminho, e te
embranqueceres, como floresce a amendoeira, e o gafanhoto te for um peso, e te perecer o apetite;
porque vais à casa eterna, e os pranteadores andem rodeando pela praça;
6 antes que se rompa o fio de prata, e se despedace o copo de ouro, e se quebre o cântaro
junto à fonte, e se desfaça a roda junto ao poço,
7 e o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu.
8 Vaidade de vaidade, diz o Pregador, tudo é vaidade.
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Observe a relação existente entre as duas frases: a segunda dá razão à primeira.
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Veja 1:18; 2:23; 7:3 (heb.).
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Isto não é mais que uma possibilidade, pois em geral é moralmente neutro (cf. 12:1). Contudo o conselho "remove da tua
carne o mal" (ER, ERC) dá uma introdução mais adequada para a linha final: porque a juventude e a primavera da vida são
vaidade.