A Ocupação do Espaço Psicológico

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u

A Ocupagäo do Espago
Psicolögico

1. INTRODUGAO

Em virtude das obrigagdes incompativeis com que está
comprometida, a psicologia reproduz no plano teórico a am-
biglidade da posigäo do seu objeto: o sujeito dominador e
dominado; o individuo liberto e reprimido, Por causa disso, na
história da psicología, a ordenagdo no tempo das inovardes
teóricas e das descobertas empíricas só € tarefa razoável dentro
dos contornos bem definidos de um corpo teórico ou na inves
gasio de uma problemática particular. No conjunto da dis-
ciplina, porém, no lugar de uma história propriamente dita, seja
ela concebida como acumulaçäo ou como revolugto, nos depa
ramos com um complexo de relagdes sincrónicas, caracterizadas
pelo antagonismo entre diversas orientagdes intelectuais ir-
redutiveis umas às outras. Cabe-nos, entäo, investigar o signifi
cado destas doutrinas no contexto dos conjuntos culturais de que
fazjm parte e nas suas relagdes com o projeto autocontraditório
de constituido da psicología como ciéncia independente. Num
primeiro momento, esta investigagdo segrega dois grandes
agrupamentos de matrizes do pensamento psicológico que, como
se verá posteriormente, subdividem-se em outras tantas
oposigdes internas.

Encontramos, por um lado, escolas e movimentos sendo
gerados por matrizes cientificistas, em que a especificidade do
objeto (a vida subjetiva e a singularidade do individuo) tende a
ser desconhecida em favor de yma imitago mais ou menos

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bem-sucedida e convincente dos modelos de prática vigentes na
ciéncias naturais. Quando, seguindo esta linha evolutiva, a psi-
cologia ultrapassa o nivel da imitado formal e caricata, € para
extinguir-se como cióncia independente e afirmar-se solidamente
como uma disciplina biológica,

Paralelamente esto as escolas e movimentos gerados por
matrizes "románticas" e "pós-románticas”. Aqui se reconhece e
sublinha a especificidade do objeto - atos e vivéncias de um
sujeito, dotados de valor e significado para ele -, e reivindicarse
a total independencia da psicologia diante das demais ciéncias.
Em contrapartida, estas escolas carecem completamente da
segurança que as de indole cientificista de uma forma ou de outra
ostentam. Véem-se obrigadas, entlo, a procurar novos cánones
científicos que legitimem suas pretensdes. — y.

Nas próximas seçdes apresento de forma sucinta as princi
pais matrizes do pensamento psicológico, assunto que será reto-
mado e aprofundado nos capítulos seguintes

2. MATRIZES CIENTIFICISTAS

2.1. Matriz nomo tética e quantificador a

Esta & a matriz que define a natureza dos objetivos e
procedimentos de uma prática teórica como sendo realmente
científicos, e suas marcas estto presentes em todas as tentativas
de se fazer da psicologia uma ciéncia natura” A matriz orienta 0
pesquisador para a busca da ordem naturaTdos fenómenos
psicológicos e comportamentais na forma de classificagdes e leis,
gerais com cardter preditivo.*

</As operagdes legítimas sto a consırugäo de hipóteses for-
maisHlacerca de relagdes empíricas ou de mecanismos subj

centes), a dedugto exata das conseqUéncias destas hindteses, na
formaide previsdes condicionais (cálculo), e o teste (mensura-
‘qlol_AEm alguns casos - pesquisas exploratórias - a única
operaçäo efetuada € a mensuragto, sustentada na pura observa-
‘glo ou na intervengdo deliberada do pesquisador. Neste caso, 0
procedimento de manipulagäo experimental concretiza uma ex
pectativa implicita e vaga quanto aos prováveis efeitos da inter-
vençäo programada. Mas mesmo no caso da simples observagio,
há expectativas latentes definindo o qué e o como da mensura-
slo. Em outras palavras, fos momentos da formulaçäo de

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hipóteses e de previsdes condicionais sempre atuam - seja de
forma manifesta ou encoberta - e & o conjunto articulado das
três operagdes - hipotetizagdo, cálculo e mensuragdo - que define
a lógica experimental. Esta lógica garante um movimento inces-
sante de autocorregäo das expectativas acerca dos resultados de
uma agio ou das associagdes naturais entre eventos. Em todo
caso, estas expectativas - que num nivel de maior formalizaglo
convertem-se em leis e um nivel de maior amplitude convertem-
se em teorias - orientam, ou slo capazes de orientar, as práticas
de controle do "ambiente naturaM. As aspas devem lembrar isto
ao leitor: o que se concebe ccfifio*ambiente natural” &, por seu
turno, definido pela possibilidade de aplicagäo de lógica experi-
mental. Nesta medida”os aspectos da vida social passiveis deste
tipo de tratamento devénTser incluídos na categoria de ambiente
naturahj

22.M

triz atomicista e mecanicista

Esta matriz orienta o pesquisador para an2ro_cura de re-
lagdes deterministas ou probabilísticas, segundo Urna concepçlo
linear e unidirecional de causalidade. Como preliminar do estudo
da causalidade cumpre efetuar a análise dos fenómenos de forma
a identificar os elementos mínimos que os constituern*Subja-
cente ao procedimento analítico está a concepgdo atomistica da
realidade"ojeal slo os elementos que, em combinagdes diferen-
tes, mecanicamente "causam” os fenómenos complexos, de na-
tureza derivada

A matriz, pela rígida noglo de causalidade que abri
llreduz a temporalidade a um processo mecánico de desdobra-
mento das potencialidades de um estado inicial, segundo um
encadeamento inexorável de causas e efeitos. A idéia de um
futuro aberto a novidades e transformagdes inesperadas nasce
da nossa ignoráncia do estado presente; o passado,

conhecido. A substituigäo do determinismo pelo probabilismo
mbigdo de conhecimento mas ndo altera essencialmente
ismo mecanicista - os procedimentos da estatistiva
inferencial, no contexto mecanicista, visam, exatamente, separar
da variabilidade intrínseca ¢ da variabilidade aleatória as re-
lagdes efetivas de causa e efgito. A imprevisibilidade relativa
resultaria de um erro de cálculo ou de um "erro" da natüreza.

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Cabe aqui considerar as condigdes que permitem a aplica-
sio deste esquema explicativo aos fenómenos subjetivos da
vivéncia e da aço, bem como avaliar as consequéncias deste
tratamento, Salta à vista, por exemplo Jjamçompatibilidade entre
a explicacio mecanicista e a nogAo dé unTsujeito capaz de ago
transformadora e inovadora. Da mesma forma, 90 redu:

do sujeito à reaçäo inevitavelmente gerada por causas antece-
dentes (sejam ambientais, sejam orgánicas), elimina-se a dimen-
sio ética do comportamento e a responsabilidade individual”

O atomicismo, por seu turno, despoja de status ontológico
as dimensdes estruturais e as configuragdes; os conceitos rela.
cionais como o de organismo, valore significado nio encontram,
portanto, guarida, Ora, os antimecanicistas (románticos ou fun-
cionalistas) denunciarlo a incapacidade de considerar estes
aspectos da realidad como insuportável para as ciéncias da vida
e, em particular, para a psicología.

Em que pesem as freqdentes acusagdes de mecanicismo e
atomicismo assacadas contra as psicologias científicistas, vere-
lante que esta]matriz foi muito influente apenas na

da psicologia com pretensdes ¢ renlizagdes con-
sistentemente científicas. O mecanicismo, efetivamente, pre-
parou o terreno ideológico favorável à emergencia de muitas
entre as quais a psicologia, mas de há muito que sua
declinou. Hoje ele representa um limite externo para
o qual, vez por outra, tendem os movimentos científicistas. Da
mesma forma, os procedimentos de análise correntes na prâticas
de pesquisa obedecem, predominantemente, a concepgdes dife-
rentes da atomicist

2.3. Matriz funclonalista e organicista

Esta matriz, seguramente, exerceu e exerce sobre o pensa-
mento psicológico uma influencia muito mais poderosa que a
atomicista e mecanicista’. Caracteriza-se por uma nogdo de
causalidade funcional que recupera - dando credibilidad cien-
tifica - a velha nogäo de causa final de AristotelesJps fenómenos
vitais, realmente, precisam ser explicados em termos de sua
funcionalidade, dos seus "propósitos" objetivos - sto fenómenos
que evoluíram e se mantém na interasdo com as suas con-
seqüénciss. Mais que isso: sto fenómenos que incorporam seus
efeitos nas suas próprias definigdes’. Encontramos entäo uma
causalidade circular em que um efeito também € causa de sua

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causa e uma causa & também efeito de seu efeiloi.A isto se
acrescente a sobredeterminagäo de cada fenómeno: a funcio-
nalidade de um órgdo, de um mecanismo, de um processo
fisiológico, de um comportamento etc. remete necesariamente
20 todo de que faz parte e se define apenas no contexto da
interdependéncia das partes deste todoWÉ o organismo, sua
adaptaçäo, sobrevivencia e reprodugäo, que confere significado
a cada um dos fenómenos vitais. A análise obedecerá, entäo, a
regras diferentes daquelas que emanam do atomicismo, A sub-
divisäo da matéria na tentativa de detectar os elementos mínimos
€ substituida pela anâlise que procura identificar e respeitar os
sistemas funcionais. A totalidade estruturada do organismo e
seus padrdes de interacdo funcional com o ambiente sto sempre
pressupostos na análisgj

Uma outra característica desta matriz, que nasceu junto
com a biologialé a atengdo dispensada aos processos temporais!
Os seres vivos tem história: uma história obvia e vislvel - a do
desenvolvimento - e outra - que se impde como uma exigéncia
da inteligibilidade científica (avessa a milagres) - a da evolusto.
Diante da necessidade de oferecer solusdo ao enigma da tem-
poralidade dos seres vivos, a matriz funcionalista e organicista -
sempre conservando seu esquema funcional de explicapäo + se
dividirá em duas submatrizes: a submatriz ambientalista e a
submatriz nativist Na primeira, enfátiza-se o controle do dese
volvimento da fungio pelas suas conseqUéncias adaptativas ime-
diatas; na segunda, sublinha-se a natureza biologicamente
herdada das fungdes adaptativas (o controle pelas conseqdéncias
ambientais é mediado pela reprodugto)*

funcionalismo organiste, ao superar o atomicismo e 0
mecanicismo, resgatou as nogôes de valor e significado. Estes
conceitos se aplicam apenas a realidades dotadas de estrutura
inteng2o, como é o caso dos processos de interagäo adaptativ
Contudo, este "estruturalismo" biológico está fundado na id
de complementaridade entre as partes do sistema. O confito
caracterizaria uma disfungäo patológica. lista concepgio, que
provavelmente é verdadeira para a biologia, traz para a psicolo-
gia uma consequéncia inevitévellA dimensio ética do compor-
tamento - que & inegavelmente uma dimensto essencial €
diferenciadora do comportamento humano - tende a tran
formar-se, sob a tica funcionaliga, em uma técnica de x
brevivéncia. No lugar das nogdes de bem < mal, justo

‘le, - que orientam o enfrentamento moral dos con

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intengäo de anulá-los - aparecem as nogdes pragmáticas de
conveniéncia e adequaçäo. Diante do conflito, uma técnica de
sobrevivéncia é conveniente e adequada se o elimina ou reduz,
restabelecendo a harmonia e a complementaridade, o "equi
brio" “Nos capítulos correspondentes a esta matriz procurarei,
como no caso das anteriores, identificar as condigdes de aplica:
bilidade do funcionalismo ao estudo dos fenómenos subjetivos e
avaliar suas conseqúéncias em termos das präticas sociais que
sio assim legitimadas.

3. MATRIZES CIENTIFICISTAS E IDEOLOGIAS
CIENTÍFICAS"

Para além da dimensäo ideológica particular a cada uma
das matrizes cientificistas, cumpre considerar a /contribulglo
generalizada do cientificismo psicológico para a consolidagdo e
Justificagdo dos padrdes de interagdo social. /

Hé em todas as manifestagdes na psicologia das matrizes
cientficistas apregcupagdo com a produgto do conhecimento
Gtil'A utilidade, porém, deve ser avaliada tanto no nivel prático
como no simbólico. Näo devemos «buscáda apenas através da
avaliaçao da eficiéncia das técnicas! De fato, um dos focos mais
antigos e constantes de pesquisa psicológica tem sido a elabora»
¿lo de técnicas: técnicas psicométicas, técnicas de treinamento
€ ensino, técnicas de persuasto, técnicas terapéuticas etc. Indubi-
tavelmente, muitas destas técnicas do eficientes para os fins que
se propdem e nos contextos em que costumam ser usadas. No
entanto, à psicologia do século XX coube a tarefa de fornecer,
mais que técnicas, legitimagdes* Énecessário dar ás prâticas
sociais de controle e dominagko alégTtimidade que ainda Ihes €
(débilmente) negada pelos resíduos do liberalismo. Para isto &
Tundamental uma prática que tenha toda a aparéncia da cien
ficidade; o importante ndo € a eiciénia das técnicas na solugdo
de problemas fora das condigdes altamente especificas em que
costumam ser elaboradas e testadas. O que importa € que elas
existam e possam exibir orgulhosamente seu cardter de ciéni

aplicada] Sua mera existéncia transmite, entlo, a seguinte mer
sagem: uma tecnologia psicológica € possivel e ndo há mal
nenhum em usd-la (a ciéncia garante). Neste contexto & que o
verdadeiro significado da pesquisa pura pode ser apreendido
Muitas vezes acusada de desvinculagdo e descompromisso com

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a soluçäo dos problemas präticos, é cla porém, a pesquisa "de
base”, a maior fiadora da possibilidade de aplicar aos fenómenos
subjetivos os modelos de inteligibilidade das ciéncias naturais e,
em conseqüéncia, de submeter aqueles fenómenos ao interesse
tecnológico, Isto ela o faz sem sujar as mios, apoiando-se just

mente no seu pretenso descompromisso com os problemas pré-
ticos'. Este esforgo de legitimagdo € tanto mais necessério porque
as práticas de dominagto e controle social estfo sujeitas a um
processo incessante de contestado cujas manifestagdes teóricas
no campo da psicologia emergem das matrizes románticas”

4. MATRIZES ROMÁNTICAS E PÓS-ROMÁNTICAS

4.1. Matriz vitaliste e naturl

ta

Tudo o que fora exeluldo pelas matrizes cientificistas &
recolhido pelo conjunto de atitudes e perspectivas intelectua
que estou denominando de vitalismo naturista: o "qualittivo",
indeterminado", o "erativo”, o "espiritual" etc. Trocam-se of
, mas permanece a divisto entre raz8o e "Vida". Os vialis
tomam partido: sdo a favor da "vida" e contra a razho. O interesse
tecnológico, com suas exigäncias de classificaglo, cálculo e
mensuragäo, deve ser aceito apenas para o trato com a matér
inerte, mas precisa ser superado no ¡rato com a vida e, particu-
larmente, com a forma de vida mais clevada, a vida espiritual do
homem; a ineligéncia conceituai, a servigo da prática de con-
role, deve ser susbstitulda pela intuicao, pela apreensäo imedi
la da natureza "naturante”” das coisas, pelo entregar-se ©
fundir-se sem intermediärios ao Muxo do dan vital. Em que pese
a indigencia dos mitos naturistas, como sio a manifestaglo
espontánea do material reprimido pela estlo sempre
aflorando nas diversas seitas psicológicas unificadas pelo anti-
racionalismo, pela mistica da vivéncia auténtica, pré-social €
pré-simbólica. É o sujeito que, por nfo se reconhecer na sua
ciéncia, na imagem que Ihe devolve o espelho científico, desiste
de obter de si uma imagem refletida. O conheeimento da vida
pela vida e do espirito pelo espirito passa a se identificar com a
propria vivéncia e com a propria experiéncia espiritual. No lugar
do interesse tecnológico domina aqui o interesse estético, con-
templativo e apaixonado, em que se anulam as diferengas entre
sujeito e objeto do conhecimento e a diferenga entre ser e
conhecer.

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Värias correntes das chamadas psicologias humanistas, a
obra da decrepitude de W. Reich e a bioenergética, a terapia
gestältica e outras técnicas corporais trazem, em diferentes
graus, as marcas desta matriz que está, por sinal, profundamente
enraizada no senso comum da prática psicológica e nas repre-
sentagdes sociais da psicología.

4.2. Matrizes compreensivas

Considerarei, em capítulos separados, très grandes linhas
compreensivas - o historicismo idiografico, o estrutural
fenomenología. Destas, apenas a primeira pode ser cl
identificada como uma matriz romantica. Os estruturalismos so
de fato reaçdes anti-románticas de indole tendencialmente cien-
tificista, enquanto a fenomenología & um dos coroamentos da
tradiçäo filosófica racionalista, iluminista e, portanto, anti-ro-
mäntica. Näo obstante, enquanto matrizes do pensamento psi-
colégico, elas se inscrevem numa problemática instaurada pelo
romantismo: a problemática da expressdo. O que as unifica é
visar - mediante os mais diversos procedimentos - a exper
humana inserida no universo cultural, estruturada e definida por
cle, manifesta simbolicamente. Diante dos fenómenos vitais de
natureza expressiva coloca-se a exigencia de compreensdo, que
se converte em interpretaçäo quando a compreensäo imediata é
bloqueada,

© conhecimento comprensivo & impulsionado pelo inte-
resse comunicativo ¢ o real, objeto deste conhecimento; sto,
efetiva ou analogicamente, formas simbólicas e/ou modos ex-
pressivos, ou seja, manifestasdes de uma subjetividade (indivi-
dual ou coletiva) atravessada pela intengdo comunicativa ¢
projetada na diregäo de uma intengäo compreensiva,

O historicismo idiográfico busca a captagäo da expetién
tal como se constitui na vivéncia imediata do sujeito, com sua
estrutura sui generis de significados e valores, irredutivel a
esquemas formais e generalizantes. A compreensio psicológica
deve individualizar o sujeito, como a compreensto histórica deve
individualizar uma época e uma cultura, e a compreensäo esté-
tica, uma obra de arte, porque somente as configur:

© peculiares ao sujeito, à época ou à obra conferem sentido a cada
um dos seus elementos e manifestagdes parciais.

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O problema de difici solugäo para o historicismo idiogré-
fico é o do método. Inicialmente a compreensäo era concebida
como revivéncia e simpatia. Entretanto, a revivéncia integral nio
no se ss

perspectiva do intérprete, sua história, sua insergdo particular
num universo simbólico particular o acompanham a toda parte.
Mas mesmo que fosse possivel a reviväncia perfeita, nflo se
resolvia assim o vento, que supde a possi-
bilidade de enunciaçäo. ra que revivesse integral.
mente a experiencia da loucura ficaria ¡do incapaz quanto o
préprio louco de compreender-se e ser compreendido. O histori-
ador que se transportasse integralmente ao passado, de forma à
experimentar "de dentro" os grandes acontecimentos históricos
segundo a ética dos seus atores, ndo poderia proporcionar ao
presente uma melhor compreensdo deste passado tdo intensa-
mente vivido, Ao invés da revivéncia, propde-se, entäo, a recon-
strugdo do sentido, Há que decifrar e interpretar as manifestagdes
vitais, culturais e psicológicas, ou scja, cabe As ciencias do
espirito uma tarefa hermenéutica.

Para que a hermenéutica se eleve à condigäo de ciéncia,
desprendendo-se do solo místico e religioso em que surgiu e fo
cultivada, precisa equacionar a resolver o problema da verdade:
como escolher entre interpretasdes conltantes? Como discernir
© significado verdadeiro das vivéncias c das intengdes que se
oferecem ao intérprete numa linguagem fregUentemente ci
frada? A dificuldade decorre da exigéncia simultänen de tarefas
mutuamente condicionadas. Para que a interpretagdo alcance 0
significado da mensagem e nfo seja nem uma reduglo da
mensagem a esquemas formais pré-definidos nem uma constru-
o arbiária a sabor dos vieses do intérprete, necessärio que
© esclarecimento do sentido seja simultanco à elaborapäo do
instrumental (regras e conceitos de imerpretagdo); ao mesmo
tempo devese deciftar e construir o código da decifraçäo. Nao
se pode dar um único passo interpretativo sem que exista um
<sbogo de código, que nada mais & que a operacionalizaglo de
uma antecipagto de compreensko. Como validar eta ant

630 sento na prática interpretativa, procurando atrairos detalhes
da mensagem ao esquema prévio? Mas é ala a probabilidade das
inerpretagdes parciais "validarem” a compreensto antecipada,
Já que estes detalhes foram interpretados à luz de regras que
cortespondem áquela antecipagto. E este o famoso circulo her-

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menêutico. Nele se debateram e atolaram durante anos os epis-
temologistas e os profissionais das ciéncias compreensivas.

Uma das solugdes para o problema da compreensio foi
proporcionada pelos estruturalismos. Aqui o trabalho de inter-
pretacao tenta se modelar pelos procedimentos de hipotetizagto,
cálculo e teste de hipóteses, característicos das ciencias naturais.
A grande preocupagto dos estruturalismos € a de elaborar mé.
todos e técnicas de interpretaçäo que conquistem o mesmo grau
de seguranga e objetividade que o obtido pelas ciencias da
natureza. Embora queiram chegar à compreensäo da vivéncia na
experiéncia irrefletida e imersa nos horizontes da cultura, int
duzem uma longa mediagdo metodológica e técnica a fim de
neutralizar a subjetividade do pesquisador e a consciéncia ime-
diata do sujeito, promovendo o encontro dos dois no terreno
objetivo das estruturas inconscientes.

A intençäo dos estruturalismos € re-construlr as estruturas
geradoras das "mensagens", as regras que inconscientemente
controlam a organizagdo das formas simbólicas e a emissäo dos
discursos. Quando o intérprete e o interpretado compartilham
integralmente as mesmas regras de comunicagdo, o processo €
fácil e imediato, Caso conträrio, é necessário inventar hipóteses
acerca destas regras e testar sua pertinencia na pröpria prática
interpretativa. Nao & necessärio inventar uma regra para ca
mensagem: as estruturas geradoras, segundo o estruturalismo,
têm uma existéncia transistórica e transindividual, sendo
capazes de, a partir do seu conjunto finito de elementos, engen-
drar uma variedade infinita de formas. E exatamente este caráter
das estruturas profundas da vida simbólica que permite, em
última análise, a comunicagdo entre as mais diferentes culturas,
épocas históricas e personalidades,

Finalmente, encontramos na fenomenología uma tentativa
de superaçäo tanto do cientificismo - a cujo charme os estrutu-
ralistas sucumbem - como do historicismo.

O problema para cuja solugdo foi criada a Fenomenologi
€ o da fundamentagdo do conhecimento. A fenomenología re-
chaga duas alternativas epistemológicas denunciando suas con-
seqdéncias céricas. A legitimagäo naturalista do conhecimento -
como ocorre no empirismo - € inadequada porque as formas do
mundo se apresentar à consciéncia ndo sto oriundas da própri

experiéncia, seno que a precedem e estabelecem suas condi
de possibilidade. Faz ainda menos sentido a tentativa de extrair

35

da experiéncia os critérios de avaliagdo da falsidade ou ve-
racidade dos juizos empíricos. É io supor,
10 ceticismo, que todo conhecimento oujuizo empirico retire sua
certeza de uma estrutura cognitiva apriorística que defina as
formas, as categorias e os mecanismos da cogniglo de acordo

um fato

conhecimento for totalmente naturalizado,
no mundo de fatos, a um produto psicoflsico qualquer, ele

ccarecerd de toda normatividade. Um fato $ ou ndo é, mas nio se
the pode aplicar as categorias de certo e errado, verdadeiro où
falso. Nesta medida, a procura de fundamentos seguros mediante
uma imersho nos objetos do conhecimento eonduziria ao cet
sismo. O fundamento, ao contrário, deve ser procurado do lado
da consciencia pura, do sujeito transcendental que determina as
es de existencia para a consciéncia de todos os objetos
da vida espiritual. Trata-se de efetuar a descrigho das estruturas
apriorísticas da consciéncia. Os objetos nesta disciplina ndo sto
05 eventos naturais, mas os fenómenos, aquilo que se dé à
consciéncia, ou, dito de outra forma, é visado por ela como pura.
para a fenomenología seria uma pura
intencionalidade: é sempre consciéncia de algo. A fenomenologia,
(Ciéncia cidética) procura descrever a esséncia do algo visado
pela consciéncia (investigagHo nocmática) e a esséncia das estru-
turas gerais e dos modos especifios da consciéncia visar seus
objetos (investigagto noëtica que esclarece a ess£nein da percep-
go, da recordagto, da imaginagao, do juízo ete), nas diferentes
esferas das relagdes inteneionais (experiencia religiosa, ex-
periéncia moral, experiéncia estética, experiéncia científica, ex-
perigncia afetiva interpessoal ete)

Apreendendo os eventos psíquicos de acordo com a sua
especificidade - que é a de nfo serem coisas no mundo mas atos
constitutivos do mundo - a fenomenología proporcionaria à
psicología as normas para compreender e interpretar as modu-
laçôes da consciéncia empírica, vale dizer, as formas de relacio-
namento sujeito/objeto concretamente vivenciadas.

Em relagdo so histricismo idiográco, a fenomenología
também o denuncia como Irremediavelmente céico. A história,

nes, ndo fgmece os crtris seguros para inter.
pretar o validar seus produtos; entre os quals, para sermos
historicisas consegdenteg A propria flosoña historicista. Nao
podemos admitir a completa ircdutibilidade das épocas, das
Culturas e das personalidades a um padtto normativo Comm,

36

pois sem esse padräo no se poderiam validar os conhecimentos
produzidos em qualquer época e cultura e por qualquer in-
dividuo, inclusive as teses historicistas e idiogräfkas. Em outras
palavras, o ceticismo seria a conseqdéncia direta do relativismo
radical historicista, Demonstrava-se assim a impossibilidade de
uma ciéncia estritamente idiográfica, destinada à compreensio
do individual (fosse uma personalidade, uma cultura, uma obra
ete.) "de dentro" e sem nenhum pressuposto. A fenomenología
se apresenta como a propedéutica de toda ciéncia compreensiva,
já que une o reconhecimento da especificidade dos eventos
Psiquicos - atos de um sujeito atravesados por uma inten-
cionalidade que deve ser apreendida mediante a interpretaçäo
de suas manifestagdes sensiveis - com o reconhecimento da
necessidade de uma ciéncia das esséncias. Esta ciéncia daria a
sustentagdo e serviria de gı
empíricas.

A fenomenología da consciéncia transcendental, con-
fluindo com outras tradigdes filosóficas, e literdrias, está na
origem dos existencialismos, cujas repercussdes no pensamento
psicológico sto mais profundas que as diretamente provenientes
da filosofía fenomenológica. As várias correntes existencialistas
unificam-se pelo intuito de descrever e elaborar as categorías
analíticas da existéncia concreta. A fenomenología da existéncia
(ou, em alguns autores, do existente) humana descobre que o
homem & um ser que näo tem esséncia alguma pré-definida. A
existéncia € o modo de ser de quem projeta e realiza seu destino,
sociavelmente vinculado a uma situado, mas trans-
cendendo-a num impulso incessante para a frente, para o futuro,
para o nada, para a morte. As descrigdes da estrutura universal
da existéncia servem de fio condutor para a descrigdo das formas
empiricamente dadas de existéncia (formas auténticas e formas
alienadas, formas patológicas etc). A antropologia fenome-
nológica existencialista dé o quadro de referéncias (os elementos
e a norma, o "modelo" de sujeito) que será investigado pelas
ciéncias humanas empíricas. A compreensdo do individuo, - sto
où "doente", - implica na reconstrugdo do seu mundo, na
explicitagäo dos horizontes implícitos que conferem sentidos a
seus atos e vivéncias conscientes, no desvelamento do projeto
existencial que subjaz a todas as suas agdes. Quando se esclarece
a estrutura e a natureza do mundo do existente e se estabelece
a vinculagdo desta estrutura com o que há de mais subjetivo, isto
é, o projeto, torna-se possível tomar todas as manifestagdes do

37

sujeito - seus discursos, seus gestos, seu comportamento inten-
cional, suas obras e, em última análisc, toda a sua vida e suas
‘opgdes - como mensagens. Mas na origen destas mensagens ndo
encontramos uma estrutura impessoal, objetiva e passivel de
análise á moda cientificista, como é 0 caso para os estrutu-
ralismos. Encontramos um sujeito e suas escolhas.

5. MATRIZES ROMÁNTICAS, PÓS-ROMÁNTICAS E
IDEOLOGIAS PARARRELIGIOSAS

Assim como as matrizes cientfiistas secretam ideologias
científica, as matrizes románticas e pós-románticas (com exe
lo dos estruturalismos, que, ao contário, fazem a balança
Pender para o outro lado) produzem frequeniemente ideologías
pararreligiosas: elas divulgam o culto da experigncia única
irredutivel, intransferivel e incomunicável, uma mistica da liber:
dade de escolha individual e do indeterminismo. No altar desta
nova rligito está colocado o "individuo", a “liberdade” e outras
imagens do género, sem que se coloque com seriedade uma
análise das condigdes concretas que poderiam permitir sua
realizagto. Se as ideologías científicas do pensamento psicoló-
ico afirmam que o sujeito $ um objeto 140 bom quanto outro
qualquer para o exereico do poder, e legitima a dominagto com
‘© manto idóneo da ciéncia, as ideotog completam:
independentemente destas questiünculas de dominagao e poder,
aliberdade humana € indestrutivel,o individuo € live e a prépris
escravidto é uma opgäo do sujeito. Se nada me prende e minha
vida € meu projeto, a solugfo € minha © para mim. Estas
ideologias legitimam assim o retraimento do sujeito sobre si
mesmo numa inflagäo inconseglente e formal da subjetividade
Nesta medida, se há oposiglo entre as ideologias científicas
psicológicas e as pararreligiosas, elas, de uma certa forma, se
complementam.

6. PERSPECTIVAS ATUAIS

A instabilidade epistemológica da psicologia, que se reflete
no tragado ziguezagueante e circular das modas psicológicas, faz
com que permanega sempre atual o projeto - creio que essencial-
mente inviável - de uma unificagto filosófica e metodológica. Do
behaviorismo tosco de J. B. Watson ao sofisticado de B. F.

38

Skinner, à Psicanálise e a toda a obra de Jean Piaget reflete-st
mesma intenso. É ela também que inspira as grandes tentativas
de sintese, como a da psicologia da forma, ou gestaltismo.
Recentemente, o campo da psicología social foi sacudido por
propostas novas de unificaglo e sintese, como a de Harré e
Secord', que em muitos aspectos se aproxima do gestaltismo. Ao
longo dos próximos capitulos algumas mengdes se fardo a estes
empreendimentos exemplares.

A percepgäo da impossibilidade de uma unificagäo neste
nivel, desde W. Wundt, * vem gerando projetos de partilha e
fragmentado da disciplina. Wundt diferenciava a causalidade
fisica da psicológica, processos internos e externos e, o que mais
nos importa, uma psicología experimental quase fisiológica e
uma psicologia étnica que era o estudo dos procestos mentais
superiores e internos, totalmente subordinados à causalidade
psíquica e a seus processos sul generis, mediante a análise das
obras e manifestagdes culturais, como a linguagem

No inicio do século o psiquiatra K. Jaspers* também
distribuiu os fenómenos psicológicos entre uma ciéncia da na-
tureza, destinada a explicá-los, e uma ciéncia do espirito, desti-
nada a descrevé-los e compreendé-I6s. Hoje € possivel encontrar
autores como S. Koch” que, reconhecendo a diversidade da
psicologia, aceita-a como inevitável e preconiza, inclusive, a
anexaçlo das diversas áreas ¢ linhas de pesquisa (que ele deno-
mina de “estudos psicológicos”) as disciplinas mais próximas.
Teríamos assim, adjacentes as diferentes disciplinas biológicas,
territórios de estudos psicológicos; o mesmo em relagko as
disciplinas sociais. Há ainda quem defenda a permenéncia da
duplicidade epistemológica e metodológica, articulando as dife-
rentes psicologias dai resultantes ao nivel da prática de resolugdo
de problemas, aonde cada uma teria sua contribuigAo específica
Esta posigäo é, por exemplo, a de Nuttin,” que afirma: "A
característica própria do comportamento consiste, portant, (..)
no fato de ele ser penetrado de uma intencionalidade compreen-
sivel e de uma açlo das leis da natureza viva, No acreditamos
que a ciéncia do comportamento possa eliminar um desses
elementos em proveito do outro". Um outro autor, Howarth",
assumindo uma ótica pragmática, reúne o que ele chama de
"tradigäo humanista” e "psicologia mecanista”. "Ajudar o cliente
a esclarecer seus objetivos; tentar entender como ele vé o pro-
lema e o que concebe como soluçlo; nesta atividade os métodos
da psicología humanista sAo apropriados. Descobrir a natureza

39

{
|

dos recursos psicológicos disponiveis pelo cliente; nesta ativida-
de os métodos da psicologia mecanista podem se mostrar úteis”.
A posiçäo defendida por Howarth nada mais é que uma ex
tagdo um tanto embelezada do ecletismo que, sob domináncia
funcionalista, mas incluindo também uma forte dose de
humanismo vitalista, constitui o senso comum da psicología e €
muito facilmente encontrado nos subterrineos da prática profis-
sional de inimeros psicólogos, reinando quase absoluto entre os
alunos dos cursos de psicologia. O ecletismo € a maneira predo-
minante da comunidade profissional enfrentar as contradigdes
do projeto de psicologia como ciéncia independente, Sua princi-
pal desvantagem & que neste enfrentamento as contradigdes
ficam camufladas, travestidas em complementaridade, e a prö-
pria natureza do projeto é subtraida do plano da reflexto e da
critic

Passo em seguida a expor com maiores detalhes as diversas
matrizes e submatrizes do pensamento psicológico, para no
último capitulo retornar à discussto das perspectivas atuais da
psicología.

se ver nos próximos capítulos, vrios caos de meseta
das duns mates, gerando ducaret parteularment frágel co
Watson, o "pal" de Behavioismo (mula detalbes no captulo Y).

3. A dependéncla dos conceltos de sgaliado valor des formas erganl-

las de upto £ spontada por E- Sprenger com as segalntes plat
"Sento sempre relacionado a valores. Digo que uma interconerto funcional &
tada de sentido quando todas as ecorrenclasparcals nla conldas #40 com-
preenslveo à partir de su recho com desempenhor totale dotados de valer. =)
Um organismo £ dotado de sentido ua medida em que sussfunsdesprópras cto
erletadas para a conservas tele sob dades cond de vida ¢
porque eta comservacto pode ser Jada valla pars cle” OSPRANGER, E-
Formas de vida. Ra de Janeiro, Zah 0916, p31.

4. A condita fea repomva na comiera raclonal de fe, eng
écoles encarna a comlderaglo racional des melo. A ul

técnica que resulta da mati funcional correspond
+A reinste dos sa ago social.

Senivel 3 rien Mcoléice.

e uscado? Este fm & pri. A ideologia
jslfcagtn ds Interessen de um ip de socledade”.
lacus interessante acerca da dimenstoIdeoldgles da pacotogia
a aprendizagem "basa" pode ser encontrada em KVALE, 5. (The psychology of
technology. Beheloimo, 1976, p- 97-118), xj
la

49 único camfaho para tangar as bass lentes de n

profunda sabedora e alta lencia. Para uma bos spardncl de ciente
Irrelevante melhor.

8. Natura narans Ex
pongo à rare narrar que da.
(Uma apresentaco sumária desta poso será fli no limo capita
© ler interes orginal tés de proposta deve ro

1068, dem Wühelm Wundt nd cry amerkam psychology ch ocular,
Em: RIEBER. RW. - SALZINGER, K (rg) Aychsog There
perpectves ra

(AN: 293-282. Embors este teren, por serem em ll, pone ofrecer alge
leuldude de letra para alguns alune, so aboletamente Indispensável para
2 comprecnsto da plcloga wundtlane no seu context cultural e entf.
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