Aula 03 da disciplina Morfofisiologia Comparada 1, ministrada ao curso de Ciências Biológicas da UNIFESSPA
Size: 1.26 MB
Language: pt
Added: Jun 14, 2017
Slides: 29 pages
Slide Content
Morfofisiologia Comparada 1
Adaptação e fisiologia evolutiva
Prof. Caio Maximino
Objetivos
●Discutir os conceitos de fisiologia ambiental, fisiologia comparativa, e
fisiologia evolutiva
●Definir “ambiente” e “adaptação” para a fisiologia evolutiva
●Revisar os métodos comparativos e seu uso na detecção das adaptações
●Analisar respostas fisiológicas em diferentes escalas temporais, níveis
funcionais, e escalas espaciais
●Descrever mecanismos adaptativos nos níveis molecular e genético
As três fisiologias
●O estudos dos mecanismos que os animais usam para lidar com os problemas colocados pelos
seus ambientes particulares é o campo da fisiologia comparativa
–Princípios gerais da função dos organismos (similaridades que existem entre todos os organismos), bem como
as exceções para as regras gerais
–Pesquisa de laboratório com organismos-modelo clássicos ou com animais altamente especializados levados
ao extremo de seu desempenho
–A maioria dos animais não precisa de adaptações fisiológicas extrema, utilizando estratégias comportamentais
para evitar as piores dificuldades de seus ambientes
●Ecofisiologia = Fisiologia comparativa + história natural
–Objetiva entender como os animais funcionam e respondem a seus ambientes naturais, em todos os estágios
de seus ciclos vitais
–Rigor crescente e crítica ao “paradigma adaptacionista” - ecofisiologia deve transcender os limites da ciência
anedótica
●O entendimento dos processos pelos quais uma característica ecofisiológica surgiu, e de como os
valores de parâmetros fisiológicos resultam da seleção natural, é o campo da fisiologia evolutiva
Relação com a biologia molecular
●Integração mais explícita de perspectivas genéticas de curto e longo prazo na ecologia
fisiológica
●P. ex., dentro de cada espécie, saber qual a base genética de uma característica
fisiológica, e qual a magnitude e causas da variação fisiológica, pode ajudar a entender
como essa variação pode ser moldada em prazo relativamente curto pela seleção natural
●A fisiologia evolutiva também examina a evolução de características em períodos de
tempo mais longos, comparando espécies ou táxons superiores
●A análise filogenética permite entender como a fisiologia de uma espécie ancestral afeta
o que é possível a seus descendentes, bem como estimar a velocidade com que uma
característica fisiológica evolui
–A biologia molecular também permite acompanhar a evolução dos componentes moleculares das
avaliações fisiológicas
Ted Garland Jr.: Fisiologia evolutiva
●Como os organismos funcionam?
●Como podemos utilizar “organismos-
modelo” para elucidar os princípios
fisiológicos básicos?
●Qual é a fronteira entre a variação
individual “normal” e a patologia?
●Como promovemos a saúde e
curamos doenças?
●Como as populações mudam com o
tempo?
●Como podemos utilizar “organismos-
modelo” para elucidar princípios
genéticos e evolutivos básicos?
●Quão importantes são, em termos
relativos, a seleção natural, a
seleção sexual, e a deriva genética
aleatória na construção da
diversidade biológica?
Como a forma como os organismos funcionam influencia
a forma como eles evoluem? Como a evolução dos
organismos influencia a forma como eles funcionam?
A interação entre genótipo,
fenótipo, e ambiente
O que é “ambiente”?
●Em um sentido muito óbvio, se refere ao tipo de habitat em que o animal
vive; nesse sentido, ambiente = bioma
–Ex.: profundezas do oceano, floresta tropical, deserto quente, &c
●O ambiente é certamente mais complexo do que o bioma, e cada espécie
apresenta um ambiente mais precisamente definido dentro de um bioma
–Ex.: comunidade bentônica de oceano profundo, região arbórea da floresta
tropical, &c
●O ambiente deve ser entendido como um conjunto de características
físicas (o bioma) somado a alguns elementos de interações bióticas
O que é “ambiente”?
●Microambiente: “Em um terceiro nível, cada animal individual tem seu próprio
ambiente: a totalidade dos fatores externos que experiencia, sejam bióticos ou
físicos. Esse ambiente é comumente modificado pelas próprias escolhas
comportamentais e pela própria presença do animal” (Willmer et al., 2005 p. 4)
●Há uma gama de opções dentro do ambiente; às vezes, o animal escolhe o
microhabitat menos estressante
●O ambiente que interessa para a fisiologia evolutiva é aquele ocupado pelo
organismo em si e as cercanias imediatas, medido em escala temporal e
espacial apropriada para o animal
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Parâmetros importantes
do ambiente
●Nível de estresse ambiental: Os ambientes variam enormemente em relação ao estresse que
impõe aos seus habitantes, e esse estresse pode ser abiótico e biótico
●Magnitude das flutuações: Os ambientes podem variar em magnitudes diferentes e em
escalas temporais diferentes (da geológica à quase instantânea). Ambientes mutáveis dão
grande valor seletivo à versatilidade ou tolerância dos animais, ao invés de selecionar
adaptações precisas para condições específicas
●Disponibilidade de recursos: A energia está mais disponível em alguns ambientes do que em
outros; ambientes com pouca disponibilidade de energia resultam em comunidades simples
com cadeias alimentares curtas, e ambientes relativamente estáveis com fluxo energético
rápido favorecem comunidades complexas e diversas. Além disso, níveis variáveis de
disponibilidade de recursos favorecem o polimorfismo trófico (diferenças intra-específicas de
comportamento, estratégias de história de vida, ou morfologia)
Ambiente e seleção
●As interações entre os três componentes do ambiente tendem a
determinar os tipos e diversidade de animais que ocorrem no
ambiente, bem como o tipo de seleção que opera
–Seleção-r: Taxa de crescimento populacional da espécie é maximizada;
animais pequenos, de reprodução rápida, maturação precoce, e vida curta
–Seleção-K: Adaptação a nicho específico é maximizada; animais grandes,
de reprodução lenta, e vida longa
–Seleção-A: Seleção por adversidade (ambientes com alto estresse mas
pouca flutuação); animais com alta resiliência, baixa fecundidade,
maturação tardia, e vida londa
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Os vários sentidos da adaptação
1) Termo usado para as características que resultam da seleção (p. ex., a Hb
é uma adaptação para permitir maior transporte de O
2
no sangue)
2) Um processo pelo qual a seleção natural ajusta a frequência de genes que
codificam aquelas características que afetam w (p. ex., aumentar as [Hb]
em um táxon pode ser visto como uma adaptação para ambientes
potencialmente hipóxicos)
3) Mudanças compensatórias de curto prazo em resposta a perturbações
ambientais (aclimatação); resulta da plasticidade fenotípica (p. ex., a
diminuição súbita de O
2
resulta em aumento de [Hb])
Evidências para a adaptação
●Para definir uma característica fisiológica como adaptativa, é preciso ter
evidência de que evoluiu (i.e., apresentou mudanças durante a história
evolutiva) de modo a melhorar o desempenho em uma tarefa,
aumentando o valor adaptativo w
–Alternativas: exaptações; características que evoluíram porque não causam
dano; características neutras ligadas a uma característica que aumenta w; inércia
filogenética
●4 tipos de evidências
1) Correlação entre a característica e um ambiente ou um uso
2) Comparações de diferenças individuais intraespecíficas
3) Observação dos efeitos de alterar uma característica
4) Evolução experimental
Métodos adaptativos para detectar
a adaptação
●Método mais comum para inferir adaptações
●Observação de uma característica em diferentes espécies que diferem em comportamento ou
ecologia para determinar se mostram ≠s fenotípicas que possam ser interpretadas como adaptações
●Problema inerente: assim que ocorre a divergência entre duas espécies, elas irão diferir em muitas
características; algumas dessas ≠s podem ser causadas por deriva genética
●Uma forma de determinar se uma mudança de ambiente passou por seleção é a comparação com
grupo externo
●Além disso, se diversas radiações evolutivas apresentam a mesma mudança fisiológica associada à
mesma diferença no ambiente, existe evidência para uma correlação entre fisiologia e ambiente
–A informação presente na filogenia é crucial! Cada radiação é um teste independente de se há relação entre
característica e ambiente
Exemplo: Relação entre
Hb e filogenia
●Os círculos verdes representam espécies de vida marinha sem Hb; os
círculos brancos representam espécies de vida estuarina com Hb
●Como interpretaríamos esses resultados? O quão confiável é essa
inferência?
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Exemplo: Relação entre
Hb e filogenia
●Os círculos verdes representam espécies de vida marinha sem Hb; os
círculos brancos representam espécies de vida estuarina com Hb
●Como interpretaríamos esses resultados? O quão confiável é essa
inferência?
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Exemplo: Relação entre
Hb e filogenia
●Os círculos verdes representam espécies de vida marinha sem Hb; os
círculos brancos representam espécies de vida estuarina com Hb
●Como interpretaríamos esses resultados? O quão confiável é essa
inferência?
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Exemplo: Relação entre
Hb e filogenia
●Os círculos verdes representam espécies de vida marinha sem Hb; os
círculos brancos representam espécies de vida estuarina com Hb
●Como interpretaríamos esses resultados? O quão confiável é essa
inferência?
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Como interpretar
características contínuas?
WILLMER, P; STONE, G.; JOHNSTON, I.Environmental physiology of animals. 2ª Edição.Malden: Blackwell Publishing, 2005. 754 pp.
Evolução experimental
●Estudo de populações experimentais, observadas por diversas
gerações, em condições definidas e reprodutíveis
●Em ambiente natural: respostas evolutivas a eventos naturais;
adaptações a ambientes humanizados; espécies invasivas que o
fazem repetidamente; introduções deliberadas de espécies em
ambientes novos; alterações deliberadas do ambiente
●Em laboratório, podemos alterar com mais controle o ambiente de
uma população, comparando os efeitos com populações-controle
–P. ex.: “abate de laboratório”, seleção artificial, domesticação
Respostas fisiológicas em
diferentes escalas: Tempo
●O processo de adaptação é algo que ocorre em escala temporal longa,
ocorrendo por gerações, e normalmente é irreversível
●A aclimatação, por outro lado, é um fenômeno comparativamente mais rápido,
com mudanças fisiológicas ou comportamentais ocorrendo durante a vida de
um animal individual, e resultando da exposição a novas condições
ambientais
●Mudanças de curto prazo no estado fisiológico normalmente são respostas
agudas associadas a algum efeito comportamental; a escala temporal está
nos segundos a dias
●Efeitos genotípicos/evolutivos de longo prazo
Efeitos ontogenéticos
●Como as formas assumidas em diferentes fases do ciclo vital (embrião, larva,
juvenil…) podem ocupar ambientes muito diferentes, também podem apresentar
respostas ambientais muito diferentes → plasticidade ontogenética ou fenotípica
●Essas mudanças de fenótipo durante a ontogenia operam em uma escala temporal
um pouco mais longa e permanente do que a aclimatação
●O ambiente age ativando “interruptores” em padrões de expressão gênica que
determinam um programa ontogenético, levando ao aumento na duração de um
estágio ou na taxa de desenvolvimento, ou à produção de fenótipos alternativos
Efeitos ontogenéticos
Respostas fisiológicas em
diferentes escalas: Nível funcional
●Quando um animal é confrontado com mudanças no ambiente,
normalmente apresenta uma de 3 categorias de resposta:
1) Evitação: Mecanismos (normalmente comportamentais) para retirar
o organismo do estresse
2) Conformidade: Mecanismos para mudar o estado interno de
maneira similar às mudanças impostas externamente; não há
tentativa de manter a homeostase para todo o organismo
3) Regulação: Mecanismos para manter todos ou alguns dos
componentes do ambiente interno em valores próximos aos níveis
originais ou “normais”
Respostas fisiológicas em
diferentes escalas: Nível funcional
●A evitação na dimensão do espaço é uma função principalmente comportamental; os
animais fazem escolhas que favorecem condições locais mais ou menos estressantes
dentro de um macroambiente
●A evitação na dimensão do tempo exige respostas mais complexas em todos os níveis
–P. ex., animais entrando em torpor precisam acumular alimento, construir ou encontrar um refúgio,
reduzir sua temperatura corporal e sua taxa metabólica, &c
●A conformidade/robustez é principalmente uma alteração nos níveis fisiológico e bioquímico.
Se as condições internas variam muito, os tecidos e células precisam de mecanismos
bioquímicos que permitam que continuem a funcionar às novas condições
●A regulação requer mudanças custosas e substanciais no nível da bioquímica, da
morfologia, da fisiologia, e do comportamento
Respostas fisiológicas em
diferentes escalas: Espaço
●As respostas adaptativas ocorrem fundamentalmente
no nível molecular, mas “aparecem” em diferentes
níveis espaciais do organismo (subcelular, celular,
tecidos, órgãos)
●Além disso, como há compartimentalização
anatômica, também há compartimentalização de
respostas adaptativas ou de aclimatação
–Fluido intracelular, fluido extracelular, fluidos circulantes
–