Casal Arnolfini Análise da obra Profº Beto Cavalcante
A narrativa do quadro é um enigma fascinante. É um casamento? Um noivado? Ou uma homenagem póstuma a Costanza , primeira esposa de Arnolfini , que morreu um ano antes da datação da pintura? Os objetos são “ símbolos disfarçados” ou apenas representações realistas de objetos domésticos? O cão é um símbolo de fidelidade, luxúria ou uma referência aos que são vistos em monumentos funerários? Ao fundo há um espelho convexo que reflete duas figuras: Arnolfini ergue a mão, talvez para saudá-las. É provável que a pintura original tivesse portinholas que, quando abertas, faziam com que o observador do quadro se sentisse entrando no aposento e sendo saudado também.
Uma única vela arde no candelabro. Ela representa o olho de Deus que tudo vê. Costumava-se colocar uma única vela acesa junto ao leito dos recém-casados para incentivar a fertilidade.
Mãos unidas são centrais no casamento cristão, significando a união de duas pessoas em uma só. As mãos unidas também uniam a pintura, e o formato delas se repete acima, nas formas curvas do candelabro.
Na parede, à esquerda do espelho, está pendurado um rosário, que era típico presente de casamento de um futuro marido para sua noiva. O cristal é símbolo de pureza, e o rosário sugere a virtude da noiva e seu dever de continuar devota e fiel.
Na janela há uma laranja. As laranjas importadas do sul, eram artigos de luxo na Europa do norte, e talvez lembrem as origens do mediterrâneo dos modelos do retrato. Conhecidas como “pomos de Adão” , as laranjas também são usadas para representar o fruto proibido no Jardim do Éden. Assim, elas se referem ao pecado mortal da luxúria que, segundo se considerava, levou à queda do homem. Os instintos pecaminosos da humanidade são santificados através do ritual cristão do casamento.
Giovani de Arrigo Arnolni era rico comerciante italiano que se estabeleceu em Bruges, por volta de 1421. Ele teve cargos importantes na corte de Fiipe, o Bom, duque da Burgúndia. Na época os Países Baixos faziam parte do Império da Brungúndia. Mais tarde, ele tornou-se tesoureiro da Normandia e fez fortuna recolhendo impostos sobre bens importados. Ele usa roupas sóbrias, que eram elegantes na corte.
Os sapatos postos de lado eram sinal de que uma cerimônia religiosa estava ocorrendo – mais uma prova de que o quadro deve ser uma elaborada certidão de casamento. A posição de destaque dos sapatos, talvez seja importante: os sapatos vermelhos de Giovanna estão perto da cama, os do marido perto do mundo exterior. Na época se acreditava que tocar o chão com os pés descalços garantia a fertilidade. O cão dá um toque leve e encantador a uma tela que se dedica pela solenidade A pintura detalhada dos pelos é uma verdadeira proeza técnica. Nos retratos, um cão costuma representar a fidelidade e o amor terreno, e quase com certeza é este o seu objetivo simbólico aqui.
No banco, a figura esculpida que emerge do dragão é supostamente Santa Margarida, padroeira das grávidas. Constanza pode ter morrido ao dar à luz.
Em torno do espelho há dez das catorze estações da cruz – incidentes durante a jornada de Cristo até sua morte. Sua presença sugere que a interpretação da pintura deve ser também cristã e espiritual, não só legal e factual. No século 15, o casamento era o único sacramento cristão que não requeria a presença de um padre; podia ser realizado em particular, na presença de duas testemunhas. Em vista do reflexo de duas pessoas no espelho, já se sugeriu que esta tela é, na verdade, um documento legal certificando o casamento de Arnolfini .
Giovanna usa um elegante vestido verde, adequado para um retrato de sociedade e de casamento, já que o verde é a cor simbólica da fertilidade. Ela não está grávida – sua pose apenas destaca o ventre, que na época era considerado um ponto de beleza. É possível qe sua postura e curvatura exagerada do ventre sugiram a fertilidade e a futura gravidez. Giovanna vinha de uma rica família italiana, e sem dúvida sua união foi cuidadosamente arranjada como um bom partido. Entretanto, as coisas não ocorreram como o esperado. Não tiveram lhos, e mais tarde Arnolni foi processado por uma amante que queria compensações depois de ter sido abandonada por ele.
A assinatura, traçada acima do espelho numa elaborada caligraa gótica, diz “Johannes de Eyck fuit hic 1434” (em latim, Jan van Eyck esteve aqui em 1434). O artista também incluiu seu reexo no espelho, indicando sua presença naquele momento. Alguns estudiosos acreditam que ele foi testemunha do casamento.