Sumário
Informação
um eu todo retorcido
19 P
21 S
22 P
23 D
26 A b
28 Jo
30 A m
32 A fl
34 C
35 I
38 V
41 I
44 O
48 A
49 A m
50 E
51 Nu
53 O e
uma província: esta
57 C
58 R
60 C
61 Evo
62 C
65 M
67 E
70 P
a família que me dei
75 R
77 O
83 I
84 V
88 C
89 Pe
92 C
94 A m
104 Se
105 A L
cantar de amigos
111 O
114 M
118 V
119 C
120 A m
122 A F
123 C
na praça de convites
133 C
134 S
136 L
137 E 938
138 M
139 C
140 N
147 O e
150 D
155 M
158 O
159 A
161 C
164 C
amar-amaro
167 O a
169 Q
170 N
172 N
174 O m
181 C
188 C
190 E
192 E
193 C
196 V
198 I
199 O
200 S
201 O q
202 A
203 E
204 T
206 F
207 C
209 R
210 Me
211 A
poesia contemplada
215 O
218 P
220 B
221 O
222 P
224 C
uma, duas argolinhas
227 S
228 P
229 O
230 Á
231 C
tentativa de exploração e de
interpretação do estar-no-mundo
237 N
238 O
239 O
241 C
244 T
245 Ro
249 A m
253 Ja
254 C
255 C
256 R
258 D
259 C
260 O a
261 E
266 D
267 E
269 M
271 A u
280 A i
281 S
282 V
283 Re
286 M
288 I
289 C
293 O
296 E
299 Po
O aprendizado da poesia,
antonio cicero
317 L
318 C
324 C
325 Í
ANTOLOGIA POÉtica
19
poema de sete faces
Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
20
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
(ap)
21
soneto da perdida esperança
Perdi o bonde e a esperança.
Volto pálido para casa.
A rua é inútil e nenhum auto
passaria sobre meu corpo.
Vou subir a ladeira lenta
em que os caminhos se fundem.
Todos eles conduzem ao
princípio do drama e da flora.
Não sei se estou sofrendo
ou se é alguém que se diverte
por que não? na noite escassa
com um insolúvel flautim.
Entretanto há muito tempo
nós gritamos: sim! ao eterno.
(ba)
22
poema patético
Que barulho é esse na escada?
É o amor que está acabando,
é o homem que fechou a porta
e se enforcou na cortina.
Que barulho é esse na escada?
É Guiomar que tapou os olhos
e se assoou com estrondo.
É a lua imóvel sobre os pratos
e os metais que brilham na copa.
Que barulho é esse na escada?
É a torneira pingando água,
é o lamento imperceptível
de alguém que perdeu no jogo
enquanto a banda de música
vai baixando, baixando de tom.
Que barulho é esse na escada?
É a virgem com um trombone,
a criança com um tambor,
o bispo com uma campainha
e alguém abafando o rumor
que salta de meu coração.
(ba)
23
dentaduras duplas A Onestaldo de Pennafort
Dentaduras duplas!
Inda não sou bem velho
para merecer-vos…
Há que contentar-me
com uma ponte móvel
e esparsas coroas.
(Coroas sem reino,
os reinos protéticos
de onde proviestes
quando produzirão
a tripla dentadura,
dentadura múltipla,
a serra mecânica,
sempre desejada,
jamais possuída,
que acabará
com o tédio da boca,
a boca que beija,
a boca romântica?…)
Resovin! Hecolite!
Nomes de países?
Fantasmas femininos?
Nunca: dentaduras,
engenhos modernos,
práticos, higiênicos,
a vida habitável:
a boca mordendo,
os delirantes lábios
apenas entreabertos
num sorriso técnico,
e a língua especiosa
24
através dos dentes
buscando outra língua,
afinal sossegada…
A serra mecânica
não tritura amor.
E todos os dentes
extraídos sem dor.
E a boca liberta
das funções poético-
-sofístico-dramáticas
de que rezam filmes
e velhos autores.
Dentaduras duplas:
dai-me enfim a calma
que Bilac não teve
para envelhecer.
Desfibrarei convosco
doces alimentos,
serei casto, sóbrio,
não vos aplicando
na deleitação convulsa
de uma carne triste
em que tantas vezes
eu me perdi.
Largas dentaduras,
vosso riso largo
me consolará
não sei quantas fomes
ferozes, secretas
no fundo de mim.
Não sei quantas fomes
jamais compensadas.
Dentaduras alvas,
antes amarelas
e por que não cromadas
25
e por que não de âmbar?
de âmbar! de âmbar!
feéricas dentaduras,
admiráveis presas,
mastigando lestas
e indiferentes
a carne da vida!
(sm)