ABR / MAi 2015 nº 856
Autores
Introdução
A maioria dos exames de diagnóstico por imagem
utilizam a radiação ionizante, que comprovadamente tem
potencial de causar danos no DNA, com consequente
aumento no risco de carcinogênese. Isto é especialmente
verdadeiro em crianças, tendo em vista a maior radiosen-
sibilidade de seus tecidos
1,2,3,4.
Outro importante aspecto
da radiação ionizante, é que seus efeitos são cumulativos
ao longo do tempo, sendo portanto, fundamental o uso
judicioso em pacientes pediátricos, tendo em vista a sua
maior expectativa de vida.
Uma vez que a maioria dos tumores pediátricos
apresentam níveis elevados de sucesso terapêutico e cura
quando diagnosticados precocemente, estes pacientes são
acompanhados por muito tempo com métodos de imagem,
que emitem radiação ionizante, elevando os riscos do de-
senvolvimento de um segundo tumor primário.
Neste sentido, há mais de uma década a RMCI vem
sendo utilizada, como uma ferramenta isenta de radiação
ionizante, que com o incremento tecnológico e evolução
dos softwares e hardwares dos últimos anos, ganhou maior
resolução de imagem, com redução no tempo de aquisição,
reduzindo com isso artefatos (respiratório e peristático) que
antes degradavam as imagens.
Protocolo do exame
Não existe ainda um protocolo padrão bem estabeleci-
do na literatura, sendo o plano coronal e a sequência Stir
mais universalmente empregados. A adição da sequência
difusão, permite a detecção de tecidos hipercelulares,
sendo que sua avaliação conjunta com as sequencias
anatômicas, incrementa a detecção e caracterização de
lesões. Em nossa instituição (AC CAMARGO CANCER
CENTER) utilizamos mais frequentemente as sequências
Stir no plano coronal, T1 nos planos coronal e axial, e
difusão no plano axial. Não utilizamos rotineiramente
meio de contraste venoso e antiespasmódicos, sendo que
os pacientes menores muitas vezes precisam de procedi-
mento anestésico.
Aplicação em oncologia
Em muitos momentos o exame de RMCI é empregado
no manejo do paciente oncológico, seja no estadiamento,
avaliação de resposta terapêutica e seguimento.
A avaliação da medula óssea é bem estabelecida pelo
método, com estudos demonstrando sua não inferioridade
em relação a cintilografia óssea na detecção de metástases
5,6
,
lembrando que no paciente pediátrico, é fundamental o co-
nhecimento do padrão de distribuição da medula vermelha,
correlacionando as imagens ponderadas em Stir e T1, para
sua correta interpretação (figura 1).
A capacidade de diferenciação tecidual das sequências
T1 e Stir, associada a sequência difusão, que demonstra
tecidos hipercelulares, permite a caracterização de tecidos
normais e patológicos, possibilitando a avaliação dos órgãos
sólidos e tecidos moles com performance comparável aos
demais métodos que utilizam radiação ionizante. Também há
estudos demonstrando sensibilidade e especifidade da RMCI
no estadiamento de doenças linfoproliferativas comparáveis
as do PET-CT e tomografia computadorizada
7,8
(figura 2). Até
o presente momento, o uso da tomografia computadoriza-
da do tórax parece ser essencial para acurada avaliação de
pequenas metástases pulmonares
9
, sendo as lesões maiores
bem demonstradas (figura 3).
Importante citar ainda, o emprego deste método no
screening de neoplasias em crianças com síndrome de pre-
disposição ao câncer, das quais as mais comuns incluem neu-
rofibromatose tipo 1, síndrome de Beckwith-Wiedemann,
neoplasia endócrina múltipla, Von Hippel-Lindau, polipose
adenomatosa familiar e Li-Fraumeni
10
, sendo esta última a
mais amplamente reconhecida, cujos indivíduos afetados
tem maior predisposição a osteossarcoma, sarcoma de partes
moles, leucemia, câncer de mama, tumores cerebrais, me-
lanoma e tumores corticais adrenais, sendo estes pacientes
seguidos anualmente com RMCI em nossa instituição.
Ressonância Magnética de corpo inteiro (rmci):
alternativa diagnóstica importante, especialmente
em pacientes pediátricos
Aplicações Diversas
O exame de RMCI também tem inúmeras aplicações
não oncológicas, sendo empregado na pesquisa de doenças
reumatológicas, infarto ósseo, osteomielite e abuso infan-
til
11,12,13,14
. Suas indicações são diversas e crescentes com a
popularização do método.
Conclusão
É fundamental o conhecimento dos riscos da radiação
ionizante advinda dos exames radiológicos, sobretudo em
crianças. A ressonância magnética do corpo inteiro parece
ser uma ferramenta com performance semelhante aos demais
métodos radiológicos, isenta destes riscos.
1 Brenner, D. J., & Hall, E. J. (2007). Computed tomography--an in-
creasing source of radiation exposure. The New England Journal
of Medicine, 357(22), 2277–84. doi:10.1056/NEJMra072149
2 Miglioretti, D. L., Johnson, E., Williams, A., Greenlee, R. T., Wein-
mann, S., Solberg, L. I., … Smith-Bindman, R. (2013). The use of
computed tomography in pediatrics and the associated radiation
exposure and estimated cancer risk. JAMA Pediatrics, 167(8), 700–7.
doi:10.1001/jamapediatrics.2013.311
3 Pearce, M. S., Salotti, J. A., Little, M. P., McHugh, K., Lee, C., Kim, K.
P., … Berrington de González, A. (2012). Radiation exposure from
CT scans in childhood and subsequent risk of leukaemia and brain
tumours: a retrospective cohort study. Lancet, 380(9840), 499–505.
doi:10.1016/S0140-6736(12)60815-0
4 Newman, B., & Callahan, M. J. (2011). ALARA (as low as reasonably
achievable) CT 2011--executive summary. Pediatric Radiology, 41
Suppl 2, 453–5. doi:10.1007/s00247-011-2154-8
5 Stecco, A., Lombardi, M., Leva, L., Brambilla, M., Negru, E., Delli
Passeri, S., & Carriero, A. (2013). Diagnostic accuracy and agree-
ment between whole-body diffusion MRI and bone scintigraphy in
detecting bone metastases. La Radiologia Medica, 118(3), 465–75.
doi:10.1007/s11547-012-0870-2
6 Balliu, E., Boada, M., Peláez, I., Vilanova, J. C., Barceló-Vidal, C.,
Rubio, A., … Pedraza, S. (2010). Comparative study of whole-body
MRI and bone scintigraphy for the detection of bone metastases.
Clinical Radiology, 65(12), 989–96. doi:10.1016/j.crad.2010.07.002
7 Kwee, T. C., Vermoolen, M. A., Akkerman, E. A., Kersten, M. J.,
Fijnheer, R., Ludwig, I., … Nievelstein, R. A. J. (2014). Whole-body
MRI, including diffusion-weighted imaging, for staging lymphoma:
comparison with CT in a prospective multicenter study. Journal of
Magnetic Resonance Imaging : JMRI, 40(1), 26–36. doi:10.1002/
jmri.24356
8 Littooij, A. S., Kwee, T. C., Barber, I., Granata, C., Vermoolen, M.
A., Enríquez, G., … Nievelstein, R. A. J. (2014). Whole-body MRI
for initial staging of paediatric lymphoma: prospective comparison
to an FDG-PET/CT-based reference standard. European Radiology,
24(5), 1153–65. doi:10.1007/s00330-014-3114-0
9 Kembhavi, S. A., Rangarajan, V., Shah, S., Qureshi, S., Arora, B.,
Juvekar, S., … Kurkure, P. (2014). Prospective observational study
on diagnostic accuracy of whole-body MRI in solid small round
cell tumours. Clinical Radiology, 69(9), 900–8. doi:10.1016/j.
crad.2014.04.006
10 Monsalve, J., Kapur, J., Malkin, D., & Babyn, P. S. (2011). Imaging
of cancer predisposition syndromes in children. Radiographics : A
Review Publication of the Radiological Society of North America,
Inc, 31(1), 263–80. doi:10.1148/rg.311105099
11 Von Kalle, T., Heim, N., Hospach, T., Langendörfer, M., Winkler,
P., & Stuber, T. (2013). Typical patterns of bone involvement in
whole-body MRI of patients with chronic recurrent multifocal
osteomyelitis (CRMO). RöFo : Fortschritte Auf Dem Gebiete
Der Röntgenstrahlen Und Der Nuklearmedizin, 185(7), 655–61.
doi:10.1055/s-0033-1335283
12 Perez-Rossello, J. M., Connolly, S. A., Newton, A. W., Zou, K. H.,
& Kleinman, P. K. (2010). Whole-body MRI in suspected infant
abuse. AJR. American Journal of Roentgenology, 195(3), 744–50.
doi:10.2214/AJR.09.3364
13 Miettunen, P. M., Lafay-Cousin, L., Guilcher, G. M. T., Nettel-Aguirre,
A., & Moorjani, V. (2012). Widespread osteonecrosis in children with
leukemia revealed by whole-body MRI. Clinical Orthopaedics and
Related Research, 470(12), 3587–95. doi:10.1007/s11999-012-2579-x
14 Axelsen, M. B., Eshed, I., Duer-Jensen, A., Møller, J. M., Pedersen, S.
J., & Østergaard, M. (2014). Whole-body MRI assessment of disease
activity and structural damage in rheumatoid arthritis: first step
towards an MRI joint count. Rheumatology (Oxford, England),
53(5), 845–53. doi:10.1093/rheumatology/ket425
Referências Bibliográficas
Alex Dias de Oliveira1
Marcos Duarte Guimarães1
Rubens Chojniak2
1- Médicos radiologistas do AC Camargo
Cancer Center
2- Médico radiologista e diretor do Departamento de
imagem do AC Camargo Cancer Center
Figura 1: Paciente masculino, 13
anos, estadiando osteossarcoma
osteoblástico. Imagem no plano coro-
nal Stir (a) evidenciando volumosa
formação expansiva no fêmur distal,
com infiltração da medula óssea e
extensão as partes moles adjacen-
tes. Imagem ponderada em difusão
no plano axial (b), demonstrando
hipersinal, o que denota intensa
hipercelularidade da lesão.
Figura 2: Paciente feminina, 15 anos, estadiando linfoma de
Hodgkin, tipo esclerose nodular. As imagens no plano coronal (a)
difusão e (b) PET-CT, evidenciam linfonodomegalias mediastinais e
supra-claviculares.
Figura 3: Nódulo
pulmonar bem caracte-
rizado em paciente pe-
diátrico em seguimento
de sarcoma de Ewing.
A
B
A B