Salomão, consternado, disse com sensibilidade para a platéia de insensíveis:
— Já fui chamado de louco, psicótico, doido, demente, insano, maluco, pirado, mas de
endemoninhado é a primeira vez. Vendo que machucara o jovem com a mais alta ofensa,
percebendo que no fundo não aceitava os diferentes e que escondendo pesadelos e não sonhos,
Edson olhou para ele e disselhe, sem meias palavras:
— Desculpe-me. Realmente, desculpe-me. Fui profundamente indelicado, injusto, tolo e
superficial. Acho que você é muito mais forte do que eu. Suporta o deboche público, enquanto
eu procuro os aplausos.
Ficamos fascinados com as palavras honestas e corajosas do Edson. Enfim, começara a
realizar um dos mais difíceis milagres, o da humildade. Eu, como ele, jamais pedira desculpas
para alguém, fosse quem fosse. Éramos pequenos deuses, eu no templo do conhecimento, ele
no templo da espiritualidade. Começávamos a entender que, quando somos frágeis, aí é que
nos tornamos fortes. A partir desse momento nos desinibimos, nos apresentamos ao jovem e
começamos a entrar nos capítulos da sua vida. Ele tentara cursar psicologia, mas teve de
desistir, pois seus professores disseram que um obsessivo não poderia tratar de doentes
mentais. Tentara a faculdade de direito, mas teve de desistir, pois seus professores disseram
que um obsessivo com rituais tão histriônicos não poderia ser levado a sério por seus clientes,
e muito menos fazer debates nos tribunais.
Não durava um trimestre em cada emprego. Ninguém queria dar oportunidade para alguém que
parecia não controlar seu comportamento. Não conseguia namorar. Ninguém se interessava
por um homem que era uma fonte de deboche. A exclusão tecia as vestes da sua existência.
Todavia, era um ser humano fortíssimo, como o mestre previa. Apesar de enfrentar todo esse
colar de dificuldades inexprimíveis, não se deprimia e muito menos pensara em tirar a própria
vida, como eu. Tinha importantes conflitos, mas, excetuando os momentos em que se
angustiava pelo sentimento de rejeição, aprendera a viver com alegria, curtia a vida. Vivia
melhor que os discípulos. Nós é que precisávamos comprar seus sonhos, e ele sabia disso.
Entrar no mundo desse jovem foi uma viagem maravilhosa. Descobrimos um ser humano
fantástico por trás de alguém socialmente ridicularizado. Após nossa viagem de
descobrimento desse fascinante continente chamado Salomão, o mestre o chamou para vender
sonhos.
Em seguida nos conduziu para um lugar aberto. Não era uma praça, mas tinha algumas árvores;
o ar ali era menos poluído. Nesse lugar nos falou de outro Salomão, o grande rei de Israel.
Comentou que ele fora um jovem que tivera um excelente início de vida. Não queria ouro,
prata nem poder político; queria o mais excelente tesouro, a sabedoria. Diariamente bebia e
respirava sabedoria, e seu reino progrediu sobremaneira, tornando-se um dos primeiros
impérios antigos. E a relação com as nações vizinhas era regada de paz.
Mas o tempo passou, e o poder o embriagou. Ele abandonou a sabedoria e começou a se
envolver em inumeráveis atividades. Além disso, de tudo o que seus olhos pediam ele se