18 C APÍTULO 2
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A comparação de duas pesquisas bem conduzidas evidencia a influência do tipo de instru-
mento e da pontuação utilizados no valor da prevalência.
A primeira efetuada nos EUA identificou 28% dos idosos com IF. É fundamental destacar
que o instrumento utilizado considerou somente a presença de alterações físicas graves, como
dificuldades para banhar-se ou vestir-se, e mobilidade.
A segunda pesquisa utilizada para comparação foi desenvolvida pela Organização Pana-
mericana da Saúde (OPAS) no Município de São Paulo e investigou, além de sete alterações
básicas, como banhar-se, mais oito alterações instrumentais, como a capacidade de usar trans-
porte coletivo, detectando uma prevalência de alteração de 47%.
Cabe, então, reafirmar a necessidade de estar atento aos instrumentos e à pontuação
utilizados nos levantamentos. Incorporando-se esses cuidados é possível afirmar, com o co-
nhecimento acumulado, que uma prevalência de 30% de IF corresponde a um valor realista do
problema para o idoso não-institucionalizado, considerando a população geral.
Existem subgrupos com percentuais mais elevados de incapacidade, superiores a 50%,
como os idosos com idades mais elevadas ou os institucionalizados.
O cálculo da prevalência utilizado até aqui para demonstrar a importância da CF é
bastante conhecido e relativamente simples de se efetuar, sendo necessário conhecer duas
informações, ou seja, o número de doentes, no caso o número de idosos com IF, e o número
total de idosos entrevistados, e, realizar, a seguir, a divisão do número de incapacitados pelo
total de entrevistados.
A demonstração do segundo aspecto da importância da CF, que é o seu caráter de indica-
dor de evolução negativa, como o óbito precoce, exige procedimentos epidemiológicos relati-
vamente mais complexos do que os utilizados no cálculo das prevalências. Novamente a
importância da CF está sendo assumida pelo seu complemento negativo que é a IF, ou seja,
quando o idoso perde a CF, ou tem parte dela comprometida, passa a apresentar maior chance
de uma evolução negativa, cuja IF é indicadora.
Para se demonstrar que a incapacidade se associa a eventos negativos, como o óbito
precoce, é necessário, em geral, analisar dois grupos, um com incapacidade e outro sem incapa-
cidade, acompanhá-los durante alguns anos, anotar a mortalidade em cada grupo e compará-las.
Existem, é claro, outras estratégias de análise, mas esta é bastante geral e permite perceber com
facilidade a maior complexidade deste tipo de estudo em relação ao estudo de prevalência.
Este esquema genérico, apresentado em parágrafo anterior, pode servir de referência para
o exame mais detalhado da pesquisa de Ramos, que estudou a possível associação de diversas
variáveis com a mortalidade do idoso, dentre as quais a CF.
Assim, pode-se descrever, de forma resumida, que Ramos, no desenvolvimento do Progra-
ma EPIDOSO, examinou, no início de seu seguimento, 1.667 idosos com idade de 65 anos ou
mais, coletando um número expressivo de informações de cada idoso, tais como informações
relativas às variáveis sociodemográficas e de morbidade, além de material para exames. A CF
foi aferida, por meio de um instrumento com 13 itens, básicos e instrumentais, parte de um
instrumento mais amplo cuja sigla é BOMFAQ.
Utilizando essas informações o autor identificou, no início do trabalho, que 557 dos idosos
não referiram queixas de incapacidade e 267, em outro extremo, referiram queixas em pelo menos
sete dos itens do instrumento de aferição. No final de dois anos de acompanhamento, observou
que no grupo sem incapacidade ocorreram 18 óbitos, correspondendo a um coeficiente de morta-
lidade (CM) de 3,2%, obtido pela divisão de 18 por 557. No grupo com incapacidade ocorreram 75
óbitos, resultando num CM de 28%, resultado da divisão de 75 óbitos por 267 idosos.
Para identificar e quantificar a importância da incapacidade na ocorrência do óbito, o
procedimento é dividir o CM observado no grupo com incapacidade pelo CM do grupo sem
incapacidade, que é a divisão entre 28% por 3,2% resultando no valor 8,6.