Conforto em tempos de enfermidade

AcsaTirza 485 views 72 slides Aug 17, 2016
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About This Presentation

ACONSELHAMENTO BÍBLICO


Slide Content

CONFORTO EM TEMPOS DE
ENFERMIDADE
R B. POWER, M. A.
EDITORA FIEL da
MISSÃO EVANGÉLICA LITERÁRIA

CONFORTO EM TEMPOS DE ENFERMIDADE
Traduzido do inglês:
A BOOK OF COMFORT For Those in Sickness
Primeira edição em português — 1985
Segunda edição em português — 1989
Tradução: João Marques Bentes
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução deste
livro, no todo ou em parte, sem a permissão escrita dos
Editores.
EDITORA FIEL da
Missão Evangélica Literária
Caixa Postal 30.421
01.051 — São Paulo — SP
Distribuído em Portugal por:
Edições Peregrino Lda.
Zona J de Cheias
Lote 549 r/c-D
1900 - Lisboa — Portugal.

ÍNDICE
Introdução 5
1. Será Deus, realmente, um Deus de conforto? 7
2. Empecilhos para crermos que Deus é um Deus de Con­
forto 13
3. Auxílios para crermos que Deus é um Deus de Conforto 20
4. Um conforto na dor 25
5. Conforto para quando nos sentimos inúteis 30
6. Conforto em meio à indignidade sentida 40
7. Um conforto que contrabalança pensamentos invejosos
sobre outras pessoas 44
8. Conforto para quando somos uma carga para outras
pessoas 50
9. Conforto no temor de que a aflição perdurará por longo
tempo 55
10. Conforto diante da idéia de ficarmos sós 60
11. Conforto para o temor de que, no fim, falharemos e
desonraremos a Deus 65
12. Conforto diante da idéia que partiremos daqui 69

INTRODUÇÃO
Entre as admiráveis verdades que na Bíblia são ditas acerca
de Deus, uma das mais maravilhosas e belas é que Ele é o "Deus
de toda a consolação" (II Coríntios 1:3), o Deus de todo o conforto.
"Conforto" é palavra tão terna em si mesma que, no mo­
mento em que a ouvimos em relação a Deus, somos levados a
esperar grandes coisas — algumas de natureza encorajadora,
outras edificantes, outras que nos refrigeram a alma, outras recon­
fortantes, e outras que nos suavizam as dificuldades — tudo muito
excelente.
Há leitos de enfermidade que não contam com a presença
de Deus. Como é lógico, pouco consolo pode haver ali. Não é de
admirar que os dias pareçam longos e monótonos, e as noites
povoadas de escuridão para a pessoa que tem de suportar sozinha
as suas dificuldades — e que não conta com um Deus com quem
possa falar, ou que fale com ela. Se tal pessoa chega a pensar em
Deus, fá-lo com um senso de medo, pois teme que sua enfermidade
apenas sirva para finalmente conduzi-la à presença dEle. Ou então,
pensará em Deus com um senso de descontentamento, visto pensar
que Deus a sujeitou àquela enfermidade.
Estas páginas não foram escritas para aqueles que preferem
um leito de enfermidade sem a presença de Deus, exceto, real­
mente, para mostrar-lhes um caminho mais excelente.
Caso este livro chegue às mãos de alguma pessoa nessa
situação, então ele dirá à tal pessoa: "Prezado amigo, você não
pode evitar estar doente, deitado em uma cama, em um sofá, ou
mesmo em uma poltrona (há muitas pessoas, em sofás ou em pol­
tronas, que estão tão doentes quanto você, e que são tão dignas
de lástima e estão tão necessitadas de consolo como aqueles que
não podem sair de seus leitos). Mas, é possível que você esteja
contribuindo para ser tão infeliz quanto se sente. Todas essas cir­
cunstâncias não precisam ser destituídas de conforto. São assim
somente porque você expulsou Deus de suas atuais circunstâncias".
Porém, que diríamos sobre Deus ser o Deus do conforto?
Tudo depende disso. Tanto você, que não espera em Deus, quanto
você, que nEle espera, estariam em situação igualmente adversa,
se Deus não fosse o Deus de todo o conforto.
Ora, para nosso próprio bem, a melhor coisa que temos

a fazer é averiguar o que a Palavra de Deus ensina a respeito dEle,
pois é ali, e nas experiências diárias do Seu povo, que nos com­
pete encontrá-Lo.
E, quando descobrirmos que Ele é, realmente, o Deus do
conforto, se você O considerava apenas um adversário duro, um
juiz, um vingador e nada mais, você verá que fazia dEle um juízo
errado; de agora em diante, encoraje-se e comece a pensar em
Deus sob um novo prisma.
Disse o salmista: "Bendizei ao Seu nome". Ora, é exatamen­
te isso que desejo fazer, bem no início deste livro. Pois, se você
puder ser persuadido a pensar em Deus em termos positivos, então
receberá todos os benefícios aqui referidos. E eu gostaria que toda
pessoa enferma, que lesse estas páginas, obtivesse essas bênçãos
e fosse ricamente consolada.
Bendito Senhor, este é um livro de conforto.
Mas, a fim de que o mesmo realmente funcione co­
mo tal, em primeiro lugar precisamos ter a certeza
daquilo que Tu és. Ó Tu, valorosíssimo Juiz eterno,
não encontramos qualquer motivo de consolação
em nós mesmos. E, a menos que Te reveles a nós co­
mo um Deus confortador, não poderemos achar
qualquer conforto em Ti. A Tua justiça, Teu poder
e Tua majestade não nos servem de conforto se esses
atributos estiverem isolados do Teu conforto, pois
somos apenas pó, uns miseráveis pecadores. É aquilo
que nos dizes sobre Ti mesmo que nos confere toda
e qualquer satisfação. Se não nos tivesses mostrado
o caminho certo, não poderíamos pensar em esperar
conforto de Tua parte. Mas agora, que já fizeste isso,
o nosso conforto e a nossa paz virão somente de Ti,
e daquilo que é relativo a Ti.
Sim, o conforto vem de Ti, ó Espírito Santo, o
Consolador, por meio de quem a paz do Pai nos en­
che a alma. Mostra-Te para nós, assim como Te
manifestas em Tua Palavra. Conforta-nos com aquela
gentileza e bondade que há em Ti; e fala de paz a
todos os leitores deste livro, por amor ao grande
Pacificador — o Príncipe da Paz, o próprio Jesus
Cristo. Amém.

SERÁ DEUS, REALMENTE,
UM DEUS DE CONFORTO?
A pergunta que forma o título deste capítulo precisa ser
respondida antes que este livro possa ser, para os seus leitores,
aquilo que desejo que ele seja, isto é, um livro de conforto.
Isso é necessário porque muitos doentes dizem: "A última
fonte onde posso procurar conforto é em Deus. Não é esse o grande
Deus, pleno de poder e de majestade? Não é esse Aquele que criou
os céus e a terra? por qual razão eu deveria pensar que Ele se
preocuparia com coisas tão pequenas como os meus problemas
pessoais?" E mesmo quando pensamos que Ele se interessa, ten­
demos por dizer: "Não é esse o Deus a quem tenho ofendido, cujas
leis tenho desobedecido, cujos convites tenho rejeitado, que é tão
puro de olhos que não pode contemplar a iniqüidade? E quando
me lembro daquilo que tenho sido, daquilo que continuo sendo,
por certo Ele é o último em quem eu deveria buscar conforto".
Tudo isso é razoável. Eu não teria sequer uma palavra em
contrário. Ao invés de tentar escrever um "livro de conforto", eu
próprio teria de entregar-me ao desespero se, porventura, Deus
não me tivesse revelado, em Sua Palavra, certas coisas a respeito
de Sua pessoa, as quais me autorizam a escrever um livro de con­
forto. Ora, são essas coisas reveladas que me autorizam a afirmar,
a iodo aquele que ler este livro: "É tudo para você — tudo para
você, meu querido amigo, sem qualquer mitigação ou reserva, é
tudo para você. Deus quer que você seja confortado, Ele quer que
você receba esse conforto ao escolher a Ele".
Longe de Deus não querer que você venha até Eie, em bus­
ca de conforto, Ele condena a sua busca de conforto em qual­
quer outra fonte. Ele sabe que cada pessoa necessita de consolo,
uma por um motivo, e outra por outro (as tribulações das pes-

soas são diferentes; e ainda que elas sejam parecidas entre si, não
atingem precisamente os mesmos particulares da vida, e nem o
fazem do mesmo modo). Contudo, sem importar quais sejam essas
tribulações, e sem importar como elas estejam atuando, o clamor
da Bíblia inteira é que não devemos renunciar Àquele que é a fonte
das águas vivas, e nem devemos escavar para nós cisternas rotas,
incapazes de reter as águas.
As Escrituras dizem-nos que Deus tem ciúmes; e Ele não
o sente somente quando o homem adora a outro deus, mas tam­
bém quando o homem confere a Ele o segundo lugar em qualquer
coisa, inclusive na questão do conforto.
Não há dúvida de que os nossos amigos têm algum con­
forto para dar-nos, conforto que também podemos obter de livros,
das visitas de ministros do evangelho, e de muitas outras fontes;
mas todas essas fontes precisam ser subordinadas a Deus. De outro
modo, serão como os consoladores de Jó — "consoladores mo­
lestos" (Jó 16:2). De alguma maneira inesperada e inoportuna, elas
nos deixarão sem nada, pois não tínhamos a Deus.
Examinemos na Bíblia, porém, como o próprio Deus se si­
tua, nessa questão do conforto. Encontramos ali a posição de Deus
sobre o conforto?
Paulo mostra-nos claramente como Deus cuida da questão.
Paulo acabara de invocar graça e paz — duas virtudes mui­
to confortadoras — sobre os crentes de Corinto. Donde procediam
essas virtudes? Da parte de Deus, nosso Pai, e da parte do Senhor
Jesus Cristo. Em seguida, o apóstolo, como se não fosse capaz de
conter as palavras, ao começar a falar dessas coisas tão boas, vin­
das do Pai, irrompeu em grandiosa atribuição de louvor a Deus:
"Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai
de misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos con­
forta em toda a nossa tribulação,.." (II Coríntios 1:2-4).
Mais adiante, no capítulo 7, versículos 4 a 6, o apóstolo
dá-nos um exemplo de como o nosso Deus nos conforta. Nesse
caso, o conforto veio através de agentes humanos, e na ocasião
mais oportuna possível, pois então as tribulações manifestavam-
se com grande intensidade. Mas o consolo procedeu de Deus, e
Paulo destacou distintamente a pessoa dEle como a fonte de onde
viera o conforto. "Sinto-me grandemente confortado e transbor­
dante de júbilo em toda a nossa tribulação. Porque, chegando nós
à Macedónia, nenhum alívio tivemos; pelo contrário, em tudo fo­
mos atribulados: lutas por fora, temores por dentro. Porém, Deus,

que conforta os abatidos [note esta expressão: é própria para você],
nos consolou com a chegada de Tito".
Deus tem Suas ocasiões oportunas e Suas maneiras de con­
fortar-nos. Por enquanto, quero apenas chamar sua atenção para
o fato que o apóstolo mostra Deus como Aquele que tem o hábito
de confortar aos abatidos. Ora, esse conforto nos chega como algo
bem natural, e não como algo estranho, surpreendente e extraor­
dinário, que possa ter ocorrido em uma ocasião para nunca mais
se repetir.
Alguns referem-se a Deus como se nEle não houvesse qual­
quer conforto, e também como se Jesus nos confortasse capa-
citando-nos a escapar de Deus. Porém, o apóstolo via a ambos,
ao Pai e ao Filho, igualmente ativos nessa bendita obra de conforto.
Ainda que não houvesse outro versículo para consolar a uma pobre
alma, os versículos 16 e 17 do capítulo 2 de II Tessalonicenses
deveriam ser capazes de consolar-nos. Esses versículos deveriam
conduzir uma pessoa à presença do próprio Deus, a fim de receber
consolação da parte dEle. "Ora, nosso Senhor Jesus Cristo mesmo,
e Deus nosso Pai, que nos amou e nos deu eterna consolação e
boa esperança, pela graça, console os vossos corações e os con­
firme em toda boa obra e boa palavra".
O salmista, conforme você deve saber, foi um homem que
passou por muitas tribulações, e encontrava seu conforto no pró­
prio Deus. Não fugindo dEle, mas achegando-se a Ele. Davi
firmava-se naquilo que Deus havia declarado. Se essas declara­
ções não fossem consoladoras, não teriam tido qualquer utilidade
para Davi. "Lembra-te da promessa que fizeste ao teu servo, na
qual me tens feito esperar. O que me consola na minha angústia
é isto: que a tua palavra me vivifica" (Salmos 119:49,50). Outra
vez, diz ele no versículo 76: "Venha, pois, a tua bondade consolar-
me, segundo a palavra que deste ao teu servo".
O Salmo 86 consiste em uma mistura de luzes e trevas.
Nele há profundíssimas verdades. A alma é referida, nesse salmo,
como uma entidade que pode ser livrada do mais negro inferno,
pois Deus está à altura de todas as necessidades da alma. Davi
roga que a sua alma seja levada a regozijar-se. E para quem ele
olha, a fim de receber tal regozijo? Para Deus. E, por ter feito isso,
achou a ajuda e o conforto que buscava. "Mas tu, Senhor, és Deus
compassivo e cheio de graça, paciente e grande em misericórdia
e em verdade. Volta-te para mim, e compadece-te de mim; concede
a tua força ao teu servo, e salva o filho da tua serva. Mostra-me

um sinal do teu favor, para que o vejam e se envergonhem os que
me aborrecem; pois tu, Senhor, me ajudas e me consolas" (Salmos
86:15-17).
Quando Davi se sentiu perplexo, então exclamou: "Nos mui­
tos cuidados que dentro em mim se multiplicam, as tuas consola­
ções me alegram a alma" (Salmos 94:19). E quando se tornasse
mais oportuna a necessidade de conforto, então Deus, como o
Deus de todo o conforto, estaria bem próximo. "Ainda que eu ande
pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque
tu estás comigo: a tua vara e o teu cajado me consolam" (Salmos
23:4).
Examinemos agora, por alguns momentos, os escritos dos
profetas, pois ser-nos-á de grande ajuda se tivermos fixada em nos­
sas mentes a verdade que o próprio Deus dos profetas é Aquele
em quem devemos buscar conforto.
Sião havia transgredido amargamente contra o Senhor, e,
segundo a regra normalmente aplicada por Deus, após o pecado
vem a punição. Jamais Sião deveria ter experimentado "lugares
assolados", e nem o "deserto" ou a "solidão". Considerando o que
Jerusalém fizera contra Deus, é claro que se poderia supor que
Deus fosse o último recurso onde Sião poderia buscar conforto.
Todavia, a palavra que o Senhor determinou que o profeta dissesse
foi talhada segundo a natureza divina, e não segundo a natureza
humana. "Porque o Senhor tem piedade de Sião; terá piedade de
todos os lugares assolados dela, e fará o seu deserto como o Éden,
e a sua solidão como o jardim do Senhor; regozijo e alegria se
acharão nela, ações de graça e som de música" (Isaías 51.3). No­
temos como Deus dispôs-se a agir com aquela largueza que Lhe
é peculiar. Sempre que a bênção é ampla e abundante, podemos
estar certos que Deus está ali operando. Pois a ação divina reveste-
se de notável plenitude de bênção, como se fosse um certo nú­
mero e variedade de pedras preciosas, todas elas engastadas em
um único anel valiosíssimo, presenteado a uma só pessoa. É assim
que Deus nos conforta.
O anjo do Senhor, no primeiro capítulo de Zacarias, clamou
diante de Deus em prol de Jerusalém, dizendo: "Ó Senhor dos Exér­
citos, até quando não terás compaixão de Jerusalém e das cidades
de Judá, contra as quais estás indignado faz já setenta anos?" (v.
12). O anjo não ocultou que Aquele a quem clamava era Aquele
que, em justo juízo, permitira aquela tribulação. Porém, foi da parte
do Senhor que procedeu o conforto. "Respondeu o Senhor com

palavras boas, palavras consoladoras, ao anjo que falava comigo".
Na ocasião, tal como naquela outra, vê-se a profusão da miseri­
córdia divina: "Portanto, assim diz o Senhor: Voltei-me para Jeru­
salém com misericórdia; a minha casa nela será edificada, diz o
Senhor dos Exércitos". "Assim diz o Senhor dos Exércitos: As minhas
cidades ainda se transbordarão de bens; o Senhor ainda consolará
a Sião e ainda escolherá a Jerusalém" (Zacarias 1:13-17).
Por igual modo, no livro de Jeremias, diz Deus acerca de
Si mesmo: "...tornarei o seu pranto em júbilo e os consolarei; trans­
formarei em regozijo a sua tristeza" (31:13). E em Oséias 2:14: "Por­
tanto, eis que eu a atrairei, e a levarei para o deserto, e lhe falarei
ao coração". E diz em Isaías 51:12: "Eu, eu sou aquele que vos
consola..." No dia de ação de graças, este é o cântico: "Graças
te dou, ó Senhor, porque, ainda que te iraste contra mim, a tua
ira se retirou, e tu me consolas" (Isaías 12:1). "Por causa da indig­
nidade da sua cobiça eu me indignei e feri o povo; escondi a face,
e indignei-me, mas rebelde, seguiu ele o caminho da sua escolha.
Tenho visto os seus caminhos e o sararei; também o guiarei, e lhe
tornarei a dar consolação, a saber, aos que dele choram" (Isaías
57:17,18).
Reencontramos esses versículos noutras ocasiões. No mo­
mento, desejo que eles sejam úteis nesse sagrado pormenor de
levar-nos a nos aproximar um pouco mais de Deus. De início, quero
destacar estes três pontos:
(1) Esteja convicto de que Deus, o próprio Deus, Deus Pai,
o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, Aquele que também é o nosso
Pai, é um Deus de conforto. Leia repetidas vezes as muitas decla­
rações que Ele nos tem dado sobre Si mesmo, até que a idéia lance
raízes em seu coração. Creia que o conforto é algo sobre o que
Deus pensa e valoriza, sabendo que dEle precisamos.
(2) Não busque o seu consolo primário e mais importante
em outra fonte. Não nego que se pode encontrar muito conforto
nos amigos, nos sentimentos de felicidade, nos livros e em muitas
das nossas circunstâncias, e que esses consolos podem aliviar-nos
os sofrimentos quando adoecemos. Porém, quero que você chegue
a essa conclusão em sua mente, sentindo que o único conforto
seguro vem da parte de Deus.
(3) Espere o conforto da parte de Deus. A expectativa hu­
mana geralmente é um prelúdio da atividade divina. Primeiro,
cumpre-nos abrir a boca, e então Ele a encherá. Convém que en-

chamos as talhas até à borda, e então Ele transformará toda a água
em excelente vinho.
Que esses textos bíblicos o tenham levado a ter aquela
apropriada atitude de expectação. Diga para Deus: "Fala, Senhor,
pois o Teu servo ouve". Que Deus fique sabendo que há alguém
que dEle está esperando o conforto, algum de Seus pobres filhos
insatisfeitos e necessitados, e que esse filho é você. Quem sabe
se nas páginas deste livro, não dará o Senhor tudo o que você
precisa?

EMPECILHOS PARA CRERMOS
QUE DEUS É UM DEUS DE CONFORTO
Quando o sol brilha intensamente, seus quentes raios ex­
traem da superfície da terra as névoas úmidas, e, com freqüência,
estas obscurecem o sol. Quando se acende uma lâmpada, quanto
mais ela brilha tanto mais os insetos juntam-se ao seu redor. E
assim, quanto mais resplendente for qualquer das verdades reve­
ladas por Deus, tanto mais Satanás se esforçará por cercá-la de
névoas que a obscureçam, ainda que, de fato, ele não seja capaz
de extingui-la.
Assim sendo, podemos esperar encontrar muitos obstáculos
que nos impeçam de crer plenamente que Deus é um Deus de
conforto. De forma alguma me admiro que assim suceda, mas que­
ro ser um instrumento para que, pela graça de Deus, taís empeci­
lhos sejam removidos. Porém, antes de podermos removê-los, é
preciso que os percebamos. Ora, no que consistem tais empecilhos?
Um desses empecilhos é o nosso senso de indignidade —
quão indignos somos de receber qualquer conforto, especialmente
quando se trata de um tão grande Deus, que toma sobre Si a tarefa
de confortar-nos. Não podemos embalar a menor dúvida acerca
de nossa indignidade. É correto você sentir que não é digno de
qualquer coisa boa proveniente de Deus. Sendo assim, longe de
condenarmos tal sentimento, começarmos por ele é uma bênção.
E, se mui infelizmente, você não tem tal sentimento, então terei
de dizer-lhe: "Não podemos dar nem o primeiro passo, na dire­
ção do conforto vindo de Deus, até percebermos essa realidade
e crermos nela. Pois Deus não quer que a pessoa fale ou pense
sobre os seus méritos".
"Méritos não os tenho, para trazê-los;
Somente à Tua cruz posso agarrar-me."

Essas palavras exprimem bem os sentimentos daqueles que
estão aptos a receber conforto, e esses certamente serão
confortados.
Agora, pois, antes de mais nada, sinta-se grato pelo fato
que você percebe sua falta de mérito no tocante a qualquer con­
forto, ou no que diz respeito a qualquer outra coisa boa. Por isso
mesmo, isso deveria ser motivo de algum conforto para você. Pois,
se é assim que você se sente, então não terá de passar por todo
aquele processo de ensino e humilhação a que nosso Deus nos
sujeita, mediante o que Ele arranca o nosso orgulho. Se você já
está vazio da soberba, Deus não terá de esvaziá-lo. E permita-me
dizer-lhe ainda que, se você não se sentisse indigno de ser con­
fortado, ninguém poderia saber o quanto você ainda teria de ser
disciplinado. Você poderia ter sido levado a uma situação em que
estaria dez vezes mais sem conforto do que agora. A lei de Deus,
que você quebrou, poderia mostrar-se contrária a você, o ofensor,
em cores tão fortes que você poderia sentir-se vencido. E talvez
você tivesse de ser engolfado em profundas águas de enfermidade,
piores do que aquelas que agora o cercam. Alegro-me que você
não tenha de ser tratado por Deus com maior rigor.
"Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos"
(Lucas 1:53). "Clamou este aflito, e o Senhor o ouviu, e o livrou
de todas as suas tribulações" (Salmos 34:6). "...já não sou digno
de ser chamado teu filho" (Lucas 15:19). O filho pródigo tinha forte
senso de demérito pessoal, e sabemos como tudo terminou tão
favorável a ele. Ora, se você se assemelha ao faminto, ao aflito
e ao filho pródigo, então você será farto, será libertado e será bem
recebido.
Você descobrirá que há uma outra coisa que o está impe­
dindo de crer que Deus pode ser-lhe um Deus de conforto.
Você tem consciência de ter uma natureza depravada e
cheia de suspeitas. Logo que Adão caiu no pecado, começou a
desconfiar de Deus. E toda a sua posteridade herdou essa tendência
para a desconfiança. De fato, a desconfiança fez parte da tentação
com que Eva foi assediada. Pois quando Satanás disse-lhe que Deus
sabia que no dia em que ela e Adão comessem do fruto da árvore,
os seus olhos seriam abertos e eles seriam como deuses, conhe­
cedores do bem e do mal, o que foi isso senão a infusão do senti­
mento de desconfiança na mente da mulher, como se Deus tivesse
negado a ela tal conhecimento, temendo que ela se tornasse se­
melhante a Ele?

Esse fator de desconfiança manifestou-se poderosamente
na primeira tentação, e afeta até hoje a todos os seres humanos.
Assim, não admira que você também desconfie de Deus, e que
em sua mente levantem-se pensamentos adversos a respeito do
Senhor.
Temos aqui um mal bem claro e definido, contra o qual pre­
cisamos lutar. Não devemos viver desconfiando de Deus. Se Ele
nos disser alguma coisa, não devemos imaginar que Ele queira
dizer outra coisa. Não nos cabe supor que Deus tenha mente dúbia,
em qualquer de Seus caminhos. Antes, devemos dizer a nós mes­
mos: "Deus disse isto, e Ele quis dizer exatamente isto, e eu aco­
lherei a vontade de Deus de acordo com a Sua Palavra. Não quero
atribuir dois ou três outros sentidos às Suas claras declarações.
O que Ele disser, aceitarei palavra por palavra". Não devemos andar
à cata de segundos sentidos, de limitações ou de coisas que fujam
ao uso comum das palavras. Quanto mais nos mantivermos no
caminho comum da linguagem e do sentido das palavras que Deus
tiver dito, tanto melhor.
Agora, prezado amigo, reflita sobre isso, e jamais desconfie
novamente de Deus. Por causa da desconfiança, pelo menos em
parte, é que não entendemos Deus. Ora, sempre que há algum
mal entendido, há confusão e dificuldades.
Existe ainda mais um empecilho, dentre diversos outros,
que eu desejo mencionar, ou seja, aquele velho e arraigado hábito
de não esperarmos o que é bom da parte de Deus.
A nossa velha natureza, cheia de desconfianças e de incom­
preensões, leva-nos a imaginar que Deus deveria ser a última pes­
soa de quem poderíamos esperar aquilo que é bom. Quando consi­
derávamos o juízo, a ira por causa do pecado e o castigo, e coisas
similares, então certamente era para Deus que olhávamos. Não
esperávamos dEle coisas excelentes. Mas, quando Deus se revelou
a Moisés, que lemos a respeito da Sua glória em favor dos
transgressores?
Quando os israelitas estavam sob a mão de Deus, severa­
mente castigados pelo Senhor, por causa dos seus pecados, que
poderia ser mais improvável, humanamente falando, do que a aju­
da de Deus? Porém, examinemos o que está escrito em Deutero-
nômio 4:27-31: "O Senhor vos espalhará entre os povos, e restareis
poucos em número entre as gentes, aonde o Senhor vos conduzirá.
Lá servireis a deuses que são obra de mãos de homens, madeira
e pedra, que não vêem, nem ouvem, nem comem, nem cheiram".

De quem os israelitas deveriam esperar socorro? Cumpria-
Ihes esperá-lo da parte de Deus. "De lá buscarás ao Senhor teu
Deus, e o acharás, quando o buscares de todo o teu coração e
de toda a tua alma. Quando estiveres em angústia, e todas estas
coisas te sobrevierem nos últimos dias, e te voltares para o Senhor
teu Deus, e lhe atenderes a voz, então o Senhor teu Deus não te
desamparará, porquanto é Deus misericordioso, nem te destruirá,
nem se esquecerá da aliança que jurou a teus pais". O que Deus
afirmou não poderia ter sido dito em termos mais claros: Vós me
tendes ofendido, mas é a mim que deveis buscar. Diz o Senhor,
em Oséias 13:9: "A tua ruína, ó Israel, vem de ti, e só de mim o
teu socorro".
Mas, talvez você argumente: "Nunca pensei muito em Deus,
nunca me habituei a esperar nEle". Bem, essa tem sido uma atitude
errada no seu passado. Mas agora estamos mais interessados no
presente. O passado está esquecido e morto. Não podemos alterar
um passado insensato e mau. O passado permanecerá para sempre
aquilo que foi. Mas agora, interessa-nos não deixar tal erro pros­
seguir, a fim de não sermos prejudicados no momento, e que, real­
mente, tudo fique sepultado no "passado".
Portanto, diga para si mesmo: "Não esperar coisa alguma
da parte de Deus é um mau hábito antigo que tenho. Devo inter­
romper de vez esse mau hábito. Que agora Deus renove em mim
todas as coisas". Esse passado insensato e sem valor não tem o
direito de projetar-se no presente. Basta a cada dia o seu próprio
mal.
Quando surgem dificuldades, elas costumam desencorajar-
nos. Essa é a nossa tendência natural diante das dificuldades. Um
homem desencorajado sempre será um homem frágil. Satanás sabe
disso muito bem. Assim sendo, ele lança todo tipo de desencoraja­
mento no caminho que nos compete percorrer até Deus, a fim
de recebermos conforto.
Quando você perceber que uma razão após outra lhe es­
tá subindo à mente, indagando por quais motivos você não deveria
esperar conforto da parte de Deus, então, ao invés de ficar desa­
nimado, diga: "Essa é a coisa mais natural do mundo; é o que eu
deveria esperar. Faz parte do antigo e mau caminho que estou
abandonando. Acho que Satanás percebe que estou buscando se­
riamente o Senhor, e por isso ele está erguendo tantas barreiras
em meu caminho".
Meu amigo, não duvido que você tenha passado por muitos

desencorajamentos. Mas, já foi realizada alguma coisa grandiosa
e permanente sem eles? Eles formam a própria atmosfera dentro
da qual é aperfeiçoado tudo quanto é grande, bom e permanente.
Extraia uma nova coragem do desencorajamento. Diga: "Sa­
tanás está vendo que agora estou no caminho certo, e procura
impedir-me de todas as maneiras ao seu dispor. Minha porta é
estreita e meu caminho é apertado. E isso é um bom sinal de que
estou no caminho certo".
Você não deveria condenar-se. Você fazia isso antes — que
isso tenha sido feito de uma vez para sempre. Se você passar todo
o seu tempo condenando-se, não lhe restará tempo para buscar
a Deus. Minha opinião é que Deus não se agrada do homem que
passa todo o seu tempo se condenando. Na verdade, Deus quer
que o homem viva no espírito da autocrítica — e como o homem
poderia viver em outra atitude? Todavia, estar sempre a queixar-
se e a condenar-se não é algo que Deus queira que faça parte da
herança diária de Seu povo. Penso que, nesse caso, Deus bem po­
deria dizer-nos: "Como!? Você está sempre olhando para si mesmo,
e nunca para Mim! E quando você olha para Mim, nunca recebe
qualquer conforto? Seus pecados são mais importantes do que
a Minha graça? O senso de culpa escraviza tanto a sua mente a
ponto de não permitir que eu o conforte e abençoe conforme gosto
de fazer?" Esteja certo de que algo mais do que os seus pecados
deve manifestar-se, se Deus tiver de ser glorificado em sua vida.
Ele receberá maior glória se você deixar-se confortar do que se
você recusar-se continuamente a ser confortado, ou se você viver
exclamando que não merece ser confortado. A autocondenação
é boa quando usada devidamente. Mas, quando está fora de lugar,
é extremamente prejudicial. Ora, essa atitude está fora de lugar
quando se torna tão grande que chega a impedir que recebamos
conforto da parte de Deus. Podemos aproximar uma moeda tão
perto dos olhos que ela esconda de nossa visão o próprio sol. E
podemos situar o nosso minúsculo "eu" de tal modo que o próprio
Deus não mais possa ser visto.
Além disso, você não deveria desistir quanto a essa questão
do conforto, e nem quanto a qualquer aspecto da vida cristã, só
porque parece que você não está vencendo. Com freqüência, es­
tamos obtendo vitória, mesmo quando não sabemos que assim está
sucedendo. Deus jamais muda, e nem as Suas misericórdias de­
pendem das nossas "vitórias". Medimos assim a nós mesmos, mas
essa não é a medida usada por Ele.

Por igual modo, não devemos ceder diante de pensamen­
tos de abatimento e desespero, só por não estarmos experimen­
tando êxtases espirituais. Há muitos filhos de Deus que jamais
experimentaram qualquer coisa que se aproxime do êxtase espi­
ritual. Nem chegaram além de uma confiança tranqüila e cheia
de paz no Senhor. Esses descansam pacificamente em seus leitos.
Crêem em uma glória que ainda haverá de revelar-se. Crêem no
futuro, e contentam-se em esperar pelo mesmo. Nesse ponto, os
êxtases podem ser-nos muito adversos. Alguns dos mais favorecidos
filhos do Senhor, alguns dos crentes mais coerentes e constantes,
jamais passaram por um êxtase em toda a sua vida. Mas, há aqueles
que passam por êxtases arrebatadores, para em seguida se preci­
pitarem em profundo desânimo.
Não procure os êxtases espirituais. Não olhe para eles como
se fossem sinais. Não os considere essenciais à vida cristã, ou ao
conforto que é próprio da vida do crente. Se porventura Deus lhe
conceder algum êxtase, será necessário que Ele o faça acompa­
nhado de Sua graça. E talvez, com tal êxtase, será necessário que
Ele o discipline.
Paulo foi arrebatado ao terceiro céu, e ouviu palavras que
não lhe eram lícitas repetir. Mas, a fim de que isso não lhe fosse
prejudicial, recebeu um espinho na carne. E, embora tivesse orado
por três vezes, para que o mesmo lhe fosse retirado, não foi
atendido.
Não se deixe desanimar quando as dificuldades lhe servi­
rem de empecilho. E quando se levantarem nuvens entre você e
Deus, então pense com freqüência nestes termos: "Ah, eis aqui
um impedimento. Isso não faz Deus mudar, e nem altera minha
posição diante de Deus. Mas é um obstáculo, e está fazendo aquilo
que um obstáculo pode fazer".
Quando surgirem obstáculos, não nos deixemos intimidar
por eles. Antes, digamos: "Isso é o que deveríamos esperar. Mas
esses obstáculos nada podem fazer contra o Senhor". Milhões de
pessoas, que têm sofrido os efeitos de tais empecilhos, têm ultra­
passado suas nuvens e suas tristezas. Milhões delas têm entrado
na pátria onde não há mais empecilhos. Como é que eu poderia
esperar que Satanás me permitisse passar por qualquer experiência
boa, sem tentar molestar-me? É necessário que eu dê prossegui­
mento à minha batalha cristã, mesmo no leito de enfermidade,
como o faria se estivesse vivendo ativamente no mundo. Mais cedo
ou mais tarde, também obterei o triunfo total. E então exclamarei:

"Graças sejam dadas a Deus, que me dá a vitória através de
Senhor, Jesus Cristo". (Ver I Coríntios 15:57.)

AUXÍLIOS PARA CRERMOS
QUE DEUS É UM DEUS DE CONFORTO
Seria lamentável salientar a existência de empecilhos ao
conforto, se não crêssemos que esses empecilhos podem ser supe­
rados, e também se não pudéssemos mostrar como isso pode ser
obtido.
Eis que o pobre e mui atribulado homem pode dizer: "Infe­
lizmente, conheço os meus empecilhos. Ajude-me a livrar-me deles,
e então você ter-me-á prestado um favor".
E isso que eu gostaria de fazer agora. Isso faz parte essen­
cial de um livro de conforto.
Ora, uma das maneiras mais eficazes de nos livrarmos des­
ses obstáculos consiste em lhes descobrirmos a origem, averiguan­
do de onde procedem.
Não duvido que muitos desses obstáculos procedem de cer­
tas noções distorcidas a respeito de Deus. Em conseqüência disso,
os auxílios que tivermos de receber também deveriam estar fir­
mados em conceitos, mas em conceitos corretos. É preciso estarmos
sempre munidos dos pensamentos de Deus. Devemos substituir
as idéias e sugestões tenebrosas, induzidas por Satanás, por pensa­
mentos gloriosos acerca de Deus. Pois, se não agirmos assim, Sa­
tanás poderá fazer Deus parecer terrivelmente contrário a nós.
Por mais que desviemos a atenção para outras coisas, o Maligno
poderá continuar dizendo: "Mas, o que dizer sobre seu relaciona­
mento com Deus? Nem tudo está certo entre você e Ele. E o que
é pior, nem tudo poderá estar certo entre você e Ele".
Mas, se nos tivermos achegado a Deus, e se nossos con­
ceitos sobre Ele forem firmes, então Deus jamais será para nós
uma sombra escura, mas uma fonte de luz. Nós O conheceremos
realmente como um Pai. Nesse caso, se Satanás pretender
atormentar-nos com pensamentos negativos acerca de Deus, po-

deremos dizer: "Sabemos quem Ele é — é o nosso Pai, que está
nos céus".
Penso que o caráter de Deus é minha grande ajuda para
que eu creia nEle como o Deus de todo o conforto.
Em primeiro lugar, com base no fato que Ele é generoso,
podemos julgar que é muito provável que Deus seja o Deus do
conforto.
Por toda a Bíblia, Deus é apresentado como um Ser dotado
de grande coração. Ele é Alguém que não tem prazer na morte
do ímpio, mas antes, gostaria que o pecador abandonasse suas
iniquidades e vivesse. Diz o Senhor. "Abre bem a tua boca, e ta
encherei" (Salmos 81:10). "Pois, perdoarei as suas iniquidades, e
dos seus pecados pamais me lembrarei" (Jeremias 31:34). Quão mais
generoso é Deus do que o homem. Isso nos é admiravelmente ex­
posto pelo profeta Jeremias. "Disse mais o Senhor nos dias do rei
Josias: Viste o que fez a rebelde Israel? ela foi-se a todo o monte
alto, e debaixo de toda árvore verde, e ali andou prostituindo-se.
E eu disse, depois que fez tudo isto: Volta para mim..." (3:6,7 —
Corrigida).
Outros, que não Deus, teriam dito a Israel: "Vai-te para sem­
pre!" Mas Deus a convidou: "Retorna a mim!" Isso é generosidade
autêntica. No primeiro versículo deste capítulo, o Senhor mostra-
nos que a maneira como um homem trataria outro homem, sob
condições similares, seria muito diferente. Todavia, o Senhor é
Deus, e não homem, e os Seus caminhos e pensamentos não são
iguais a nossos caminhos e pensamentos. Sua generosidade é muito
superior à nossa.
Abrindo minha Concordância Bíblica, encontrei cinco tre­
chos, um após outro, nos quais o Senhor refere-se ao fato que
podemos clamar diante dEle com pleno êxito. "Depois disto, Deus
se tornou favorável para com a terra" (II Samuel 21:14). "Assim
o Senhor se tornou favorável para com a terra, e a praga cessou
de sobre Israel" (II Samuel 24:25). "...porque na peleja clamaram
a Deus, que lhes deu ouvidos, porquanto confiaram nele" (I Crô­
nicas 5:20). "...Manasses... fez-lhe oração, e Deus se tornou favorável
para com ele, atendeu-lhe a súplica e o fez voltar para Jerusalém,
ao seu reino..." (II Crônicas 33:13). "Nós, pois, jejuamos, e pedimos
isto ao nosso Deus, e ele nos atendeu" (Esdras 8:23). Sim, Deus
é "...compassivo e cheio de graça, paciente e grande em miseri­
córdia e em verdade" (Salmos 86:15). E, na parábola do filho pró­
digo, vemos que um tratamento mui generoso foi exibido por Deus

— o pai recebeu o miserável pecador exatamente como ele vie­
ra; sem repreendê-lo, restaurou-o ao seu favor, vestindo-lhe as me­
lhores vestes e mandando abater o bezerro cevado em sua honra.
Ora, se eu precisar de alguma coisa, será grande encora­
jamento para mim se eu souber que terei de tratar com uma pessoa
generosa. Então sentirei que essa pessoa está predisposta a ajudar-
me, a tratar liberalmente comigo, a fazer-me o bem. Deixe que
esse pensamento o conforte. Em toda a Bíblia não há uma única
palavra mesquinha sobre Deus. Você pode estar certo que obterá
dEle tudo quanto Ele prometeu dar-nos, simplesmente por ser Ele
quem é.
Se Deus é generoso, também é autocomunicativo, isto é,
está sempre transmitindo o bem. Deus não se contenta só em des­
frutar de Sua própria bondade, conservando-a para Si mesmo. Ele
não poupou o Seu próprio Filho, porém deu-O gratuitamente em
favor de todos nós. E como não nos daria juntamente com Ele,
gratuitamente, todas as coisas?
Se tivéssemos de apelar para alguém, quanto a qualquer
coisa, e se realmente ele estivesse disposto a dar-nos aquilo de
que precisássemos, em quão maravilhoso espírito nos dirigiríamos
a ele, pedindo-lhe que satisfizesse a nossa necessidade!
Ora, poderia Deus possuir tudo quanto é capaz de tornar-
nos felizes e de infundir-nos conforto, e, no entanto, jamais fazer-
nos provar coisa alguma de toda essa riqueza? Por certo que não!
Portanto, se você quiser, Ele haverá de revelar-se a você. Pois, aquilo
que Deus comunica, tem de ser Ele mesmo, tem de ser como Ele, e,
portanto, tem de ser bom. Deus entregar-se-á pessoalmente a você,
conforme você é, e de acordo com as suas necessidades particu­
lares. Ele derramará das Suas fontes, sobre os seus poços secos,
sobre todas as suas terras gretadas pelo estio, sobre todos os seus
cursos de água ressequidos. Onde você estiver mais seco e em
maior necessidade, aí Deus derramar-se-á com maior abundância.
Acresça-se que podemos obter grande conforto da idéia
que Deus está relacionado conosco como Pai. E, posto que Ele
tem de fazer tudo da melhor e mais perfeita maneira, devido à
Sua própria natureza, e isso da forma mais plena, então podemos
estar certos que Ele agirá conosco melhor do que qualquer pai
terreno agiria em favor de um filho seu.
Se qualquer um de nós, que já somos idosos, que temos
experimentado as provações e aflições da vida, ouvisse dizer que
nosso pai ressuscitara dentre os mortos com um amor mil vezes

multiplicado, maior do que jamais demonstrara enquanto viveu,
e dotado de grandes riquezas com as quais quisesse demonstrar
esse amor de modo prático, e com uma sabedoria que eficazmente
impedisse que cometesse qualquer equívoco, então nosso conforto
seria realmente grande, sem importar qual provação nos estivesse
oprimindo no momento.
Porém, dispomos de algo bem melhor do que isso. Temos
um Pai nos céus, e Ele nunca ficará aquém do que é necessário
no cumprimento das funções de pai.
Anime-se, pois, com o pensamento que Aquele com quem
temos de tratar é, em todos os sentidos, Alguém cujo próprio rela­
cionamento para com você garante que você haverá de obter o
que deseja. Se seu Pai celestial não vier confortá-lo, quem poderá
fazê-lo? Ele é a pessoa de quem, mais provavelmente, você poderá
obter conforto. Portanto, é apropriado que você busque nEle o
conforto.
Visto que Ele é Pai, você poderá esperar o mais terno con­
forto de Sua parte. E devido às ternas compaixões de Deus que
temos sido visitados pela aurora. Tiago revela-nos que "...o Senhor
é cheio de terna misericórdia, e compassivo" (5:11). A ordem para
que sejamos bondosos uns com os outros, que sejamos ternos de
coração, e para que nos perdoemos mutuamente, está firmada
nessas virtudes divinas — "...como também Deus, em Cristo, vos
perdoou" (Efésios 4:32).
Mas, se ao invés dejassim olharmos para Deus, e para tudo
quanto haverá de manar dEle, por ser Ele aquilo que Ele é, prefe­
rirmos olhar para nós mesmos, e para tudo o que merecemos, então
não seremos confortados. O conforto jamais nos será dado nessa
última vereda. Cumpre-nos olhar para nós mesmos esperando en­
contrar somente a deficiência, o vazio, sem disfarçarmos em qual­
quer grau a nossa condição real. Não devemos ficar surpreendidos
ou perplexos, ou mesmo desencorajados, quando percebermos o
nosso vazio, pois isso deriva-se apenas daquilo que somos. Se esti­
vermos resolvidos a fazer descobertas sobre nós, todas as desco­
bertas serão feitas em consonância com o nosso vazio. E, quanto
mais nos examinarmos, tanto mais descobriremos que estamos
vazios.
No entanto, todas as descobertas que fizermos na pessoa
de Deus revelarão a Sua plenitude. E quando associamos esses
fatores — o nosso vazio e a plenitude de Deus — então obtemos
conforto real.

Preencha os seus pensamentos com Deus. Seja rico em
Deus — pobre em si mesmo, mas rico em Deus.
Você percebe o que Deus é. Toda a Sua natureza, todas
as Suas declarações, todos os Seus feitos falam de conforto para
nós. Não de conforto para os impenitentes, para os independentes,
para os que pensam que não têm qualquer necessidade. Mas de
conforto para os humildes, que têm uma necessidade real e querem
ser supridos por uma fonte fora de si mesmos.
Portanto, quando estivermos meditando, que os nossos pen­
samentos sejam os seguintes:
Quem conhece tão bem a Deus quanto Ele mesmo? Tudo
o que Ele me tem dito em Sua Palavra me dá a possibilidade de
ser confortado. Não atribuirei a Deus um mau caráter, esperando
da parte dEle somente a negatividade.
Não acatarei as opiniões de Satanás sobre Deus; pois que
outro interesse poderia ter Satanás, senão difamá-Lo?
Não permitirei que o meu próprio coração enganador, re­
pleto de suspeitas malignas e ignorante, me ofereça suposições
acerca do Senhor. Pois, de minha pobre natureza decaída, só po­
derei colher pensamentos distorcidos.
Haverei de lançar-me aos cuidados do Senhor, conforme
Ele se tem revelado para nós. Manterei os meus olhos fixos nEle,
e os fecharei para tudo o mais.
Apegar-me-ei ao que Ele nos tem revelado. Só poderei ser
aquilo que sou — vazio. E Deus só pode ser aquilo que é — o
Supridor para o meu vazio. E da plenitude de Deus que receberei.
E, visto que Deus é aquilo que é, receberei graça que me ajude
em cada ocasião de necessidade!

UM CONFORTO NA DOR
Não convém subestimar a gravidade da dor. É uma tolice
aquela idéia de que não nos devemos deixar abalar pela dor —
e que, visto que a dor perdura somente por algum tempo, não deve­
ríamos prestar-lhe a mínima atenção.
A fim de ser confortado em meus momentos de dor, tenho
uma linha de pensamento totalmente diferente dessa idéia. Longe
de não dar atenção à dor, atribuo-lhe grande importância. Creio
que se trata de uma tribulação mui real, de uma provação severa,
que impõe grande sobrecarga à minha fé e à minha paciência e
que requer todas as minhas energias físicas e mentais. Penso que
é um insulto, contra os que sofrem alguma dor, o fato de alguns
a subestimarem. Não considero o sofredor um espartano, que se
gloria em sofrer sua dor sem a simpatia alheia. Nem sou como
um espartano. Por outro lado, gosto de sensibilizar-me diante da
infelicidade de outras pessoas. E sentir-me-ia triste se nada sentisse
ao defrontar-me com o sofrimento de alguém.
A dor é um fato que não pode ser negado, e tentarmos ol­
vidar sua realidade é loucura.
Desse reconhecimento é que se deriva parte do meu con­
forto. Deixe-se persuadir, portanto, do fato de que Deus não des­
preza a sua dor. Quanto a mim, sinto-me confortado em meus so­
frimentos ao pensar que Deus sabe tudo sobre os mesmos, e que
Ele se sensibiliza diante da minha dor. A simpatia é um bálsamo
admirável; e você conta com a simpatia de Deus.
Nesse caso, por qual razão Deus não remove a sua dor,
quando é evidente que Ele poderia fazê-lo com uma única palavra?
Talvez você já tenha tido algum pensamento mais amargo em re­
lação a Deus, exatamente por esse motivo, pois você sabe que
o seu médico, ou um amigo seu que viesse visitá-lo e que simpa-

tizasse com você, por certo haveria de removê-la, se pudesse fazê-
lo. Assim, sempre que Deus pode fazer tal coisa, mas não a faz,
seria a Sua simpatia menor que a de um mero amigo seu?
Certamente que não! Não percebemos as razões para a exis­
tência da dor. Somos parecidos com crianças que, por causa de
alguma vantagem presente, esquecem-se de qualquer bem futu­
ro que possam vir a receber. Nosso Pai celeste, embora simpatize
com as nossas causas, é um Deus sábio, que a tudo vê. E Ele quer
que obtenhamos grandes bênçãos, se estivermos dispostos a per­
mitir que Ele nos abençoe a Sua maneira.
Isso posto, deixe-se confortar em face de cada dor, armado
da idéia que a dor não escapou de Sua observação. Antes, tudo
foi observado pelo Senhor, tudo foi sentido por Ele. "...a minha
ansiedade não te é oculta" (Salmos 38:9). A dor não é uma questão
vulgar, quando a vinculamos à simpatia divina.
Acima de tudo, chegamos à idéia de que Jesus igualmente
sofreu muitas dores. Anotemos esse fato como um segundo con­
forto, e pensemos nesse fato como motivo de grande conforto. Cris­
to (o Deus-homem), em Sua natureza humana composta de nervos,
carne e sangue, exatamente idêntica à nossa natureza humana —
em cada nervo, em cada músculo — realmente sofreu profundas
dores; talvez maiores do que qualquer dor que jamais tenhamos
tido de suportar. Para Ele, uma dor lancinante era uma dor lanci­
nante, e uma dor opressiva e torturante era uma dor opressiva e
torturante, tal e qual é a dor para qualquer um de nós. Você não
pode experimentar dor que Ele já não tenha experimentado. A mes­
ma dor que você está sentindo, provavelmente Ele já experimentou
em sua forma mais intensa, quando estava pendurado na cruz.
Se você entrar em comunhão com Cristo, penso que Ele
o ajudará a suportar melhor as suas dores. E assim você será con­
solado. Não é mais heróico, e nem mais excelente, fechar-se dentro
de si mesmo, suportando tudo solitária e estoicamente. É possível
que os seus amigos mais chegados e mais queridos não possam
penetrar no quadro dos seus sofrimentos. E, algumas vezes, isso
tende a deixá-lo aflito e irritado. Pois bem, lembre-se que há um
Amigo que pode fazê-lo —, o qual foi afligido em todas as suas
aflições. Ele simpatiza com você. Você não passa despercebido
aos Seus olhos, e nem a sua dor é subestimada por Ele. Isso traz
grande conforto.
Um outro fato que nos conforta na dor é que todas as nos­
sas provações chegarão ao fim.

Há uma certa expectativa diante de nós: devido à alegria
que Lhe fora proposta, Jesus suportou a cruz, desprezando a
ignomínia.
Ora, Deus quer que meditemos sobre a vitória final. Ele
exibiu todas as futuras bem-aventuranças à nossa frente, dizendo-
nos tudo, antes mesmo de chegarmos a elas, a fim de que nos enco­
rajássemos e animássemos em nossa caminhada. Leia o que Ele
diz, em Apocalipse 21:4: "E lhes enxugará dos olhos toda lágrima,
e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor,
porque as primeiras cousas passaram". Não digo que essas pro­
messas diminuam as dores presentes, mas dão-nos coragem para
suportá-las. Em meio à dor, elas nos inspiram esperança, dando-nos
um vislumbre de que escaparemos da dor. Para dizermos o mínimo,
isso é animador.
Também nos é motivo de conforto quando acamados com
alguma enfermidade dolorosa, que estejamos em comunhão com
grandes personagens. Um vasto número dos mais eminentes servos
de Deus tem tido de suportar grandes dores. Muitos desses servos
experimentaram dores, ocultas de todos, até que se descobriram
depois da morte deles, relatos desses sofrimentos em seus diários.
Também nos serve de conforto o conhecimento do fato que
a dor nos prepara para uma maior bem-aventurança celeste. "Toda
disciplina, com efeito, no momento não parece ser motivo de ale­
gria, mas de tristeza; depois, entretanto, produz fruto pacífico aos
que têm sido por ela exercitados, fruto de justiça" (Hebreus 12:11).
A labuta cujos resultados são desperdiçados é a pior forma de
labuta. Tentar ensinar àqueles que não podem ou não querem ser
ensinados, ou arar um terreno sem húmus, que não pode devolver
ao agricultor um retorno adequado, — ou outras formas simila­
res de labuta são um duplo labor. Ora, a dor sem propósito tam­
bém cabe nessa categoria. Porém, nenhuma dor deixa de ter seu
próprio alvo, se percebermos que toda dor tem um certo desíg­
nio. O desígnio de Deus é que a dor redunde em uma bênção,
tle determina que a dor deve resultar em algo benéfico e perma­
nente. A dor ocupa um lugar determinado no plano de nossas vi­
das, desde que o homem caiu no pecado.
Assim sendo, por qual motivo nem todos os seres huma­
nos padecem?
Porque o plano divino não é idêntico para cada pessoa.
Se a dor nos atingir, devemos reconhecer que esse é o plano de
Deus para nós, e cumpre-nos crer que o sofrimento não nos atin-

giu em troca de nada, pois a verdade é que o sofrimento antece­
de o bem que Deus nos quer dar. Ora, saber que o bem está à
nossa espera, logo à frente, já é um motivo de consolo pai nós.
Notemos um outro motivo de conforto. Na dor, quando
ela é suportada como convém, Deus pode ser agradado. Mas tal­
vez nossa dor seja tão aguda, ou nos tenha desgastado tanto que
nossa mente não mais funcione ativamente, sendo-nos impossível
manter, de maneira clara, a idéia de que é preciso agradarmos
a Deus.
Nessas circunstâncias, é um conforto pensarmos que nos­
so Deus não exige de nós que pensemos. Deus não é um capataz
inflexível. Ele quer apenas que entreguemos tudo aos Seus cui­
dados. Podemos fazer isso, e, inclinando-nos em nossas cadeiras
sobre o travesseiro, sentir que O estamos agradando, mesmo quan­
do não podemos pensar a respeito dEle.
Assim sendo, por piores que sejam as nossas dores, elas
não formam uma condição tão desconfortável como poderíamos
supor em nossa petulância e precipitação. Na dor há certas con­
solações que lhe são peculiares. Sem dúvida, há consolações que
não podem ser derivadas de outra coisa, senão de nossas dores.
"Porque o Senhor corrige a quem ama, e açoita a todo fi­
lho a quem recebe" (Hebreus 12:6). E muitos crentes podem afir­
mar: "Antes de ser afligido andava errado, mas agora guardo a
tua palavra" (Salmos 119:67)
Portanto, aquele que está passando por alguma dor, diga
a si mesmo coisas como as seguintes:
"Tu, meu Salvador, sofreste dores nos dias da Tua carne.
Estaria o servo acima de seu senhor? ou o discípulo acima do
mestre?
"Oh, meu Salvador, Tu compreendes os meus sofrimentos.
Agradeço-Te que, em Tua exaltação, Tu te sensibilizes a meu res­
peito. Conforto-me na doce condescendência e na simpatia do Teu
amor.
"No tocante às minhas dores, essas coisas chegarão ao fim
Abre diante de mim, ó meu Senhor, a visão da bem-aventurança.
Impressiona vividamente meu coração acerca do tempo em que
meus sofrimentos terão fim. Que os céus possam ser contemplados
por meus olhos cansados; e permite-me arrostar a tudo, ao mes­
mo tempo em que Te contemplo, o Invisível, como também o mun­
do invisível. Que a eternidade sem dores me aumente as forças
nestas minhas horas dolorosas.

"Louvo-Te, ó meu Deus, por estar em companhia de grandes
peis,onagens do Teu reino, nesta minha dor. Assim, também estou
em comunhão com os santos. Oh, não permitas desgraçar aquela
nobre companhia! Fortalece-me, ó meu Deus, pela memória de
todos aqueles que tão nobremente a tudo suportaram, e permite-
me sentir que não estou só. Que o senso de companheirismo me
fortaleça.
"Não me permitas impedir a Tua bênção, ó meu Pai, rejei­
tando os meios através dos quais Tu a envias a mim. Não me deixes
fechar qualquer das avenidas por meio das quais se manifesta a
Tua compaixão. Permite-me esperar que me farás o bem. Consagra
a minha dor para Teu elevado uso. Santifica a minha dor, a fim
de que ela me enriqueça espiritualmente.
"Mostra-me, ó Senhor, a luz de Teu rosto, em meio às mi­
nhas dores, a fim de que eu conheça que estás satisfeito comigo.
Que eu use a minha dor como um instrumento mediante o qual
possa agradar-Te. Deixa-me ouvir-Te falando comigo, e dize-me que
aceitas este sacrifício das minhas mãos."
Assim, nas simpatias de Cristo,
Assim, suportando aquilo que chegará ao fim,
Assim, na comunhão com os grandes do reino de Deus,
Assim, suportando aquilo que nos redunda em bênçãos,
Assim, agradando em tudo a Deus,
Ó sofredor, sinta-se confortado em suas dores. Deus não
determinou que qualquer lugar fosse inteiramente destituído de
conforto. Há muito conforto à sua espera.

CONFORTO PARA QUANDO
NOS SENTIMOS INÚTEIS
Poucos sentimentos são mais aflitivos do que o de sermos
inúteis. Diante de tal pensamento sentimos profunda melancolia,
que quase chega à degradação. Pensamos que somos um fardo
para os nossos semelhantes, e certamente tornamo-nos uma carga
para nós mesmos.
Essa idéia geralmente se apossa da mente de qualquer pes­
soa que adoece. Quanto mais ativa tiver sido ela, quando gozava
saúde, tanto mais inútil ela pensará que se tornou, quando redu­
zida ao leito.
Quero lembrar os meus leitores que este livro de conforto
não está endereçado somente a pessoas acamadas. Muitas das
mais lamentáveis formas de doença e sofrimento atingem pessoas
que não estão limitadas ao leito, mas que se encontram em sofás
ou poltronas. Sim! muitos dos doentes que poderiam reivindicar
as idéias deste livro como suas, estão andando para lá e para cá,
mas foram profundamente atingidos, e nada podem fazer que pa­
reça ter grande utilidade.
Sinto-me perfeitamente à vontade ao confessar que há mui­
ta coisa triste em todos esses casos, muita coisa deprimente, muita
coisa capaz de assediar e amargurar a mente, muita coisa que
pode levar uma pessoa enferma a fazer um juízo errado quanto
a sua situação.
É perfeitamente natural que, quando vemos deslizar o trem
da vida diária, sintamo-nos entristecidos por ficarmos para trás.
É natural que nossa tristeza aumente, se pensarmos que isso se
tem repetido por muitos e muitos dias, e que talvez assim continue
sendo ainda por muito tempo. Sim, talvez continue sendo essa
a nossa sorte, até o último de nossos dias.

Quanto mais nobre for a natureza de uma pessoa, tanto
mais ela sentirá tal condição. Para muitos, o sentimento é sim­
plesmente intolerável. Com freqüência, esse sentimento tem ser­
vido de estopim para o pecado ou a irritação. E suas mentes
tornam-se tão mórbidas que não podem mais examinar com cal­
ma a sua situação, vendo o que está sob a superfície e obtendo
o conforto que inegavelmente está lá.
Por certo, seria espantoso e degradante sermos totalmen­
te inúteis. Isso nos envolveria em uma provação extra, adicionada
às provações que atingem uma pessoa enferma. Se alguém fosse
realmente inútil, então esse alguém sentir-se-ia miserável. Isso seria
uma violação da expressa intenção de Deus, bem como do inteiro
plano de Sua providência, visto que na criação inteira não há uma
só coisa inútil.
Ora, penso que é nesta altura que descobrimos nosso pri­
meiro conforto. O bom Deus, que permitiu a sua enfermidade,
também é Aquele que determinou que coisa alguma seja inútil.
Deus criou você, e o pôs em sua atual circunstância. Ele projetou
que você fosse útil em sua situação, que você também fosse im­
portante entre as outras pessoas.
Não creio que tenha sido ordenado que você seja uma ex­
ceção dentro da criação. Nesse caso, você seria uma pessoa muito
estranha, uma autêntica curiosidade.
Estou certo de que você não deseja imaginar que é uma
pessoa sem paralelo na criação — o único espécime inútil que
o Criador fez. Que tal idéia seja um absurdo já serve de conforto,
em si mesma.
Talvez você pense que toda a vitalidade se esvaiu de sua
pessoa, e que agora você não tem mais préstimo do que um osso
seco, como se fosse um daqueles ossos da visão de Ezequiel, no
vale dos ossos secos, acerca dos quais foi-lhe dirigida a pergunta:
"Filho do homem, acaso poderão reviver estes ossos?"
(Ezequiel 37:3).
Bem, consideremos por alguns momentos essa questão de
ossos secos. Se visitarmos o monturo de uma cidade, veremos pes­
soas catando cuidadosamente cada osso do meio do lixo. As pes­
soas que comeram a carne ao redor desses ossos, talvez pensaram
que a utilidade dos mesmos chegara ao fim, e jogaram os ossos
fora. Por igual modo, você se sente acabado e relegado ao aban­
dono. Todavia, aqueles ossos ainda não chegaram ao fim de sua
utilidade. São enviados à destilaria, onde cada porção de gordu-

ra ou gelatina é extraída dos mesmos. A gordura é enviada aos
fabricantes de sabão, e a gelatina é entregue aos fabricantes de
barras de gelatina, que atualmente são usadas para muitos pro­
pósitos. E os artesãos tomam ossos de qualquer tamanho, e conver­
tem-nos em centenas de artigos de adorno. Até mesmo os meno­
res pedaços de ossos são utilizados. Quando esses ossinhos são
pulverizados e tratados com ácido, formam o célebre adubo su-
perfosfato, um dos mais bem conhecidos fertilizantes.
Um outro importante produto extraído dos ossos é o fósforo,
componente do cérebro e do sistema nervoso, uma das substâncias
que também produzem a chama dos fósforos de segurança. Quão
diversas formas de vida nova aguardam um velho osso, que os
apanhadores de lixo recuperam dos monturos! A matéria desses
ossos, moldada sob a forma de cabos de faca, peças de xadrez,
canivetes, e assim por diante, mistura-se com as preocupações diá­
rias da vida — o seu trabalho árduo, os seus prazeres, as suas
diversões intelectuais — e, enquanto se acham em suas formas
fluidas e de fácil manuseio, sofrem transformações ainda mais
radicais e admiráveis, quando*caem nas mãos das manufaturas.
A dificuldade que sentimos diante desse aparente refugo, que chu­
tamos pelos caminhos, consiste em acompanharmos as mui diversi­
ficadas formas que esse material pode assumir ao ressuscitar.
Quão melhor e mais importante é você, meu amigo, do que
qualquer pedaço de osso, quão melhor do que qualquer coisa!
Você não é uma coisa, mas um homem ou uma mulher que Deus
criou para Sua própria glória; e a respeito de quem Ele não alte­
rou em coisa alguma o Seu propósito, quando enviou a doença
que o atingiu. Não, Deus apenas alterou a esfera e o método de
seu serviço e utilidade, talvez promovendo-o a uma esfera bem
mais elevada do que você jamais estivera antes. Lembre-se de que
se você é inútil, isso deve-se somente à sua própria e deliberada
escolha. Você não deve considerar isso como um ato de Deus. Deus
não retirou toda a sua utilidade, nem reduziu sua pessoa a uma
condição de inutilidade.
Esse é o nosso primeiro conforto. Nossa posição não é tão
má, sob hipótese alguma, conforme pode ter-nos parecido a prin­
cípio. Anime-se, pois Deus tem um lugar reservado para você. Deus
tem algo para você fazer e para você ser, em Seu reino. Você não
é uma pobre criatura, pisada aos pés. Você tem um lugar e um
nome diante do Senhor.
Será de prestimosa ajuda tomar conhecimento disso, se vo-

cê lembrar-se que a inutilidade aparente é muito diferente da inu­
tilidade real. E se, por acaso, você resolver examinar as coisas que
estão sob a superfície, encarando-as em relação a Deus, você no­
tará essa diferença. Algumas vezes, precisamos encarar as coisas
em relação a Deus e aos nossos semelhantes. Doutras vezes, em
relação exclusivamente a Deus.
Não é verdade que aqueles pedaços de ossos perderam to­
da a utilidade. Ainda lhes resta um grande uso, contanto que se­
jam devidamente tratados. Eles cumpriram todas as suas funções
originais, enquanto fizeram parte dos organismos de diversos ani­
mais; mas agora lhes são dadas novas funções, das quais passam
a participar ativamente.
Assim também, toda a inutilidade do leitor é apenas apa­
rente. É verdade! você não mais pode participar de certas ativi­
dades da vida (tal como aqueles ossos não mais podem ajudar
na locomoção e na vida dos animais). Mas você pode ser útil de
outros modos. A sua paciência, a sua resignação, o fato de que
você glorifica a Deus em suas aflições, as palavras de alento que
você dirige a outras pessoas, tudo isso é útil e inestimavelmente
precioso na esfera do reino de Deus, onde foi agora determinado
que você atuasse.
Homem enfermo, você tem grande utilidade diante de
Deus. Não na sua antiga condição, mas nas circunstâncias agora
determinadas por Deus — as melhores circunstâncias, aos olhos
dAquele que é todo-sábio.
Algumas vezes, quando converso com pessoas doentes, po­
nho as coisas sob o seguinte prisma. Em um exército numeroso,
que se dirige para a batalha, há a artilharia, com seus vagões e
canhões, com suas equipes de munição e com seus observadores.
Tudo isso resulta em um impressionante espetáculo — ninguém
pode deixar de ficar impressionado com o troar de suas peças de
artilharia, ou com a execução de suas manobras. Talvez pensemos
que seria ótimo se pertencêssemos à artilharia. Mas eis que surge
em cena a cavalaria — uma corajosa exibição de regimentos que
ataca o inimigo a tropel. E pensaríamos ser algo invejável alguém
poder montar em um daqueles fogosos corcéis — o uniforme dos
cavaleiros é de chamar a atenção! Se quiséssemos lutar em defesa
da pátria, ficaríamos contentes em servir naquele corpo das forças
armadas. Mas, quem são aqueles outros, vestidos de uniformes
escuros, verde-oliva? Mais parecem um bando meio disperso, que
se arrasta com grande cautela — um deles sobe em uma árvore,

ocultando-se no meio da folhagem; um outro se esconde entre
os arbustos; um terceiro abriga-se por detrás de um toco decepado;
e um quarto e um quinto jazem de bruços, no solo Seriam esses
uns covardes, procurando safar-se do perigo, em dia de batalha?
Seriam homens que, sem importar o que os trouxe aqui,
nem pertencem ao exército do rei? Não, pois os seus botões tra­
zem estampada a "coroa real" — fazem parte de um corpo de
elite. Formam uma brigada especial, e é assim que combatem, ao
chegar a ocasião oportuna. Aquele uniforme escuro é essencial
para o desempenho da tarefa que eles têm de desempenhar. Pos­
tam-se de emboscada, esperando apanhar de surpresa os oficiais
do exército inimigo. Talvez precisem aguardar em silêncio, pacien­
temente, quais figuras invisíveis, por muito tempo. Mas estão to­
mando parte ativa na guerra, tanto quanto aqueles que se desta­
cam pela ação. Quando a vitória for finalmente conquistada, e
forem distribuídas as condecorações, aqueles homens trarão me­
dalhas ao peito, tal como quaisquer outros membros das forças
armadas, e serão considerados como quem participou da guerra
e contribuiu para a vitória, tanto quanto quaisquer outros.
Em I Samuel 30:21-25, lemos acerca de duzentos homens
que se sentiram tão fracos que não puderam acompanhar a Davi
e nem "...passar o ribeiro de Besor". E então "...estes saíram ao en­
contro de Davi e do povo que com ele vinha". Lemos que Davi,
"aproximando-se destes, os saudou cordialmente". Foi então que
se manifestaram certos homens malignos, filhos de Belial, que ti­
nham ido com Davi, dizendo: "Visto que não foram conosco, não
lhes daremos do despojo que salvamos; cada um, porém, leve sua
mulher e seus filhos, e se vá embora". Mas Davi retrucou: "Não
fareis assim, irmãos meus, com o que nos deu o Senhor, que nos
guardou, e entregou às nossas mãos o bando, que contra nós vi­
nha. Quem vos daria ouvidos nisso? Porque, qual é a parte dos
que desceram à peleja, tal será a parte dos que ficaram com a
bagagem; receberão partes iguais. E assim, desde aquele dia em
diante, foi isso estabelecido por estatuto e direito em Israel até
ao dia de hoje".
Os homens que cuidam do material de guerra, formam um
destacamento tão importante quanto qualquer outro, durante as
operações militares como um todo. Em tudo são iguais àqueles
que combatem nos campos. Se não houvesse guarnições postadas
nos pontos fortificados, as tropas lançadas a campo não dispo­
riam de uma base para as suas operações — não teriam para on-

de regressar — e talvez a guerra nem ao menos pudesse conti­
nuar sob tais circunstâncias.
Os planos de Deus, a Sua obra, o Seu reino — formam um
grande todo. Embora você seja inútil quanto a este ou àquele as­
pecto da campanha espiritual, da mesma maneira que um cara­
bineiro se sentiria em meio a tropas de artilharia ou de cavalaria,
em sua posição você tem a maior utilidade possível. Deus sabe
como usar você, mesmo que os homens não possam perceber tal
coisa, e embora talvez nem mesmo você possa percebê-la. Tudo
quanto lhe compete fazer é indagar: "Estou no lugar onde Deus
me pôs?" Caso você sinta que assim é, então dependa desse fato:
o Deus que é todo-sábio não faria algo tão insensato como pôr
você em um lugar onde você não tivesse utilidade.
Permita-me apresentar-lhe outra pequena comparação, me­
diante a qual tenho procurado consolar os enfermos.
Imaginemos uma dama que está com uma sacola de belos
fios de lã de todas as cores. Seu filhinho aproxima-se dela, enquan­
to ela trabalha, e lhe diz: "Mamãe, que belas cores — vermelho,
azul, rosa, verde. Gosto de todas essas cores. Quando a senhora
terminar o bordado, todas elas ficarão muito bonitas. Mas tem
aqui um novelo de lã preta. Não gosto dessa cor. É uma cor feia
e sem brilho: e só tem um novelo dessa cor. Não é possível que
esse novelo tenha alguma utilidade. Por isso, vou jogá-lo fora, pois
está estragando a beleza dos fios de lã de cores tão bonitas".
"Não, não, meu filho", diz a mãe do garoto. "Esse é um
novelo muito precioso, e você não deve tocar nele. Vou mostrar-
lhe quão útil é a lã desse novelo, quando chegar o tempo certo."
Assim prosseguiu o bordado, até ficar quase terminado. En­
tão a mãe mostrou ao menino o seu trabalho incompleto. Mas
ele, ao invés de exclamar o quanto apreciava o bordado, olha para
o mesmo com ar de espanto, e diz: "Mamãe, os homens, as mu­
lheres, as crianças, os cavalos e os cachorros desse bordado não
têm olhos; não parecem figuras vivas".
Foi então que a mãe retirou seu novelo de lã preta, e, nos
minutos seguintes, bordou os olhos das figurinhas. E todas elas
adquiriram aparência de vida. Desse modo o garoto aprendeu o
uso de um novelo de lã preta.
Outro tanto ocorre conosco. Nossa doença é um novelo
de lã preta, que empresta certa utilidade à nossa vida, que nos
permite preencher o lugar onde aquela cor se faz necessária, dentro
do grandioso plano de Deus. Talvez sejamos as sombras do grande

quadro que Deus está pintando. Qual quadro poderia ser pintado
apenas com luzes — qual quadro, quero dizer, que retrate este
mundo? O grande quadro do amor de Deus, no que se relaciona
a este mundo, é pesadamente sombreado pela cruz. Desse modo,
longe de tornar-se um inútil, você se sente grandemente confor­
tado. A menos que você deseje deliberadamente ser inútil, você
nem o é, e nem pode sê-lo.
É bem possível que, por causa de sua doença, você esteja
sendo promovido no reino de Deus. Quando aqueles ossos sobre
os quais falávamos há pouco, foram moídos e transformados em
superfosfato de óxido de cálcio, quão sutis tornaram-se eles em
sua benéfica influência! Dali por diante, tais ossos puderam par­
ticipar das minúsculas e capilares raízes e fibras das plantas, pu­
deram combinar-se com os elementos da natureza, puderam operar
maravilhas. O trigo moído torna-se pão, as azeitonas espremidas,
azeite. O incenso, quando queimado, perfuma o ambiente, flu­
tuando em espirais fragrantes que sobem para o céu. Quando o
grão de trigo fica sozinho, não é frutífero; só se morrer participa­
rá da colheita. E o ramo que produz o fruto é podado a fim de
que possa produzir mais fruto.
Portanto, homem ou mulher enfermo, não se lastime nem
fique desanimado. Nunca se considere um inútil.
Se porventura você está suficientemente livre de dores, e
ainda lhe restam forças para tanto, descubra alguma ocupação
para nela atarefar-se. Você se sentirá especialmente útil se essa
ocupação tiver algo a ver com outra pessoa também doente. Se
seus meios de subsistência forem poucos, e se sua nova ocupação
fornecer-lhe alguns dividendos, o que você assim vier a obter será
duplamente doce. Proponha-se algum alvo, alguma tarefa. Enquan­
to eu preparava estas páginas para serem impressas, chegou às
minhas mãos uma carta com esta mensagem:
"Isabel residia em uma pequena aldeia. Ao atingir os de­
zoito anos de idade, trabalhava em uma mina. Foi então que so­
freu um terrível acidente, quando sua espinha dorsal foi quebra­
da em três lugares, além do que cinco costelas também foram fra­
turadas — duas de um lado e três do outro. Faz quarenta e cinco
anos que ela vive nesse estado, sem qualquer tato abaixo da cin­
tura, com uma perna torta, dobrada sob o corpo.
"Ela fazia parte de uma família numerosa, cujos membros
foram falecendo, à exceção de uma irmã, uma mulher idosa de
mais de setenta anos de idade, a qual agora morava em sua com-

panhia e cuidava dela. Essa irmã era surda-muda, e analfabeta:
seu nome era Abigail. E admirável ver as duas irmãs juntas — gos-
tammuito uma da outra. Isabel não pode mover-se do leito. Abigail
a vira de costas ou de bruços, e a entende um pouco por meio
dos sinais que Isabel lhe faz.
"Apesar de sua terrível aflição, Isabel é a crente mais ani­
mada que já pude conhecer. Vive plena de regozijo e gratidão,
e chegou a observar, um dia desses, a uma dama que foi visitá-la:
Quão bom é que o Senhor deixe o sol brilhar em minha janeli­
nha!' Isabel é muito estimada por todos os vizinhos (e não é para
admirar, pois sempre pensa nas outras pessoas). Uma pobre mu­
lher, que estava morrendo e que deixaria órfão um bebezinho de
poucas semanas de idade, não sossegou enquanto Isabel não pro­
meteu que cuidaria da criança e a criaria. E isso Isabel fez, e a
criança viveu até aos catorze anos de idade, quando faleceu de
tuberculose. Mas foi uma criança feliz.
"Um outro exemplo de como Isabel estava sempre pronta
a ajudar o próximo, é este: uma mulher, que fora vê-la certa ma­
nhã, encontrou-a deitada no leito, como era seu costume, mas com
as mãos para fora da cama, ocupada em preparar massa para fa­
zer pãezinhos para uma família necessitada, que vivia nas proxi­
midades."
Sem importar quais sejam as suas circunstâncias, você po­
derá ser muito útil, mostrando-se contente e animado apesar de
suas dificuldades. Assim, aqueles que estiverem ao seu redor no­
tarão que Deus o está sustentando, e haverão de bendizê-Lo e
glorificá-Lo, e talvez também aprendam a confiar nEle.
A seguir temos outra narrativa sobre uma crente útil, que
recebi quando preparava estas páginas para o prelo.
"O Senhor pediu-me que lhe enviasse um breve relato so­
bre Elisa, a pobre e jovem mulher que conheci na cidade onde
meu pai residiu por alguns anos. Por dezoito anos ela ficou presa
ao leito, incapaz de virar-se na cama. Apesar disso, ela foi uma
das pessoas mais felizes que já conheci. Vivia em uma casinha
graciosa, à beira de um rio. Mas ela não podia contemplar a bele­
za ao seu redor (o que ela tanto apreciara antes de ficar paralíti­
ca), exceto por ocasião das marés mais altas, quando então ela
via as embarcações que passavam. Quando ela tinha dezesseis
anos, escorregou do alto de uma rocha e caiu pesadamente de
costas, foi perdendo gradualmente o uso dos membros inferiores
e não demorou a não poder mais sair do leito. Com freqüência

era atacada por fortes dores, e quase nunca podia dormir mais
de uma hora ou duas, a cada noite. No entanto, era impossível
alguém encontrar uma fisionomia mais radiante e feliz, ou um
exemplo mais notável de alguém que se 'regozijava nas tribula­
ções'. Ela costumava dizer: 'Esta tem sido uma bendita doença
para mim, e estou certa de que nenhuma coisa menor do que isso
poderia surtir tal efeito'. Naturalmente, vivendo assim tão anima­
da e encorajada, sua paciência ainda parecia mais admirável.
"Minha mãe costumava dizer que Elisa era uma bênção
para toda a vizinhança. Alguns dos homens mais duros habituaram-
se a ir visitá-la. Sentavam-se ao seu lado, a fim de ouvirem alguma
'palavra' de sua parte, ou de receberem um pequeno livro (do qual
ela sempre mantinha um bom estoque). Quem quer que estives­
se passando alguma dificuldade, confiava-a a ela, e a sua imensa
simpatia pelas tristezas alheias levava as outras pessoas a se es­
quecerem que ela também tinha suas próprias tribulações!
"Costumava afirmar que as suas longas noites lhe davam
tempo para orar sobre todas as dificuldades trazidas ao seu co­
nhecimento. Certos dias, quando ela se sentia melhor, punha-se
a tricotar, a 1er ou a escrever por breves períodos, embora isso
não ocorresse com freqüência. Nos seus últimos anos de vida,
presentearam-lhe um colchão de água, por causa do qual jamais
cessou de agradecer a Deus. A menor gentileza que alguém lhe
prestasse era recebida com tanta gratidão que todos sentiam ser
um grande prazer fazer qualquer coisa em favor dela. Ela tam­
bém costumava 'regozijar-se com aqueles que se regozijavam', da
maneira mais bela que se possa imaginar.
"Elisa faleceu há cerca de três anos, louvando ao Senhor
até o fim, embora tivesse passado alguns meses em meio ao mais
intenso sofrimento. Porém, dizia que estava disposta a passar por
tudo novamente, devido ao conforto e à alegria que sentia no Se­
nhor."
Entretanto, estaria fora do propósito deste livro se nos pro­
longássemos em demasia nos méritos desse tema. Este é um livro
que busca confortar os aflitos. À parte de.todas as considerações,
espero haver dito o bastante para dar a você algum conforto acerca
da questão de nunca sermos inúteis.
Não devemos ter-nos em tão baixa conta que cheguemos
a supor que Deus não pensa que sejamos dignos de qualquer coisa,
e que temos sido postos para um lado como algo sem valor. Po­
demos pensar em nossa indignidade de maneira certa ou errada.

Da mesma forma que um homem pensa sobre si mesmo, assim
também, com freqüência, haverá de ser. Há um lema que foi ado­
tado pelos membros de certa família ilustre: Noblesse oblige —
a nobreza obriga. Em outras palavras: Sou um nobre, portanto,
devo agir como um nobre. Sinta que você é útil dentro do reino
de Deus, e você terá o desejo de agir como quem é útil.
Dissipar-se-á então a nuvem inteira de pensamentos lúgu­
bres e deprimentes. Você mesmo sentir-se-á fortalecido e revivifi­
cado. Deus quer que você continue sendo alguém, e você sentirá
que é uma pessoa a quem cabe um lugar neste mundo, como igual­
mente no céu, na eternidade futura.

CONFORTO
EM MEIO À INDIGNIDADE SENTIDA
Quando adoecemos, geralmente somos perturbados pelo
profundo senso de nossa indignidade. E então vemos a nós mes­
mos como pessoas extremamente más — muito piores do que pen­
sávamos que éramos. Isso nos deixa muito deprimidos. Espiritual­
mente falando, nessas ocasiões descemos muitos degraus em nossa
própria estima.
Mas agora, prisioneiros do leito de enfermidade, temos mais
tempo para refletir. Muitas coisas foram despidas das falsas co­
res que exibiam, das desculpas que dávamos para justificá-las; e
nós as vemos como realmente são. Vemo-nos como culpados de
tais deficiências. Isso serve apenas para deixar-nos deprimidos e
derrotados.
O estado de enfermidade, porém, não é um estado total­
mente destituído de conforto. Nenhuma situação, exceto aquela
de se viver no pecado e na impenitência, afastados de Deus, de­
ve ser isenta da possibilidade de conforto. Todavia, a situação do
leitor não é essa. Assim, longe de ser essa a sua condição, nada
o perturba tanto quanto o pecado, ou o fato de ter sido e conti­
nuar sendo um pecador. Essa é uma condição na qual Deus con­
sidera próprio outorgar conforto. Quanto mais indigno de confor­
to você sentir-se, mais Deus haverá de querer confortá-lo!
Alegre-se, enfermo, por sentir-se indigno.
Agradeça a Deus por sentir-se indigno.
Espere bênção e conforto, próprios da indignidade sentida.
Antes de tudo, pense que isso é o que Deus quer que você
sinta. Deus nunca teve um filho a quem não ensinasse isso. Ele
fez Jó dizer: "...me abomino, e me arrependo no pó e na cinza"
(Jó 42:6). Ele fez Esdras ajoelhar-se e dizer: "Estou confuso e en-

vergonhado, para levantar a ti a minha face, meu Deus: porque
as nossas iniquidades se multiplicaram sobre a nossa cabeça, e
a nossa culpa cresceu até aos céus" (Esdras 9:6). Fez Daniel dizer:
"A ti, ó Senhor, pertence a justiça, mas a nós o corar de vergonha,
como hoje se vê" (Daniel 9:7). Jacó disse: "...sou indigno de todas
as misericórdias e de toda a fidelidade, que tens usado para com
o teu servo..." (Gênesis 32:10). O filho pródigo disse não mais ser
digno de ser chamado filho de seu pai (Lucas 15:19). Quanto a
Davi, os salmos transpiram o senso de indignidade; e, se não hou­
vesse outras confissões, o Salmo 51 seria suficiente.
Assim, você está na companhia de Davi, Jó, Esdras, Daniel,
Jeremias, Isaías e Oséias; de fato, com todos os santos em quem
o Espírito operou. A vereda da indignidade reconhecida deve ser
a vereda certa para você trilhar, visto ter sido palmilhada por es­
ses santos.
Não se permita sentir-se sem conforto, por ser indigno. Es­
sa é a melhor coisa que você poderia sentir. É assim que Deus
quer que você se sinta. Você está no caminho de Deus; não quei­
ra sentir outra coisa. Você está com toda a razão; quanto mais
você andar por esse caminho, melhor. Termos a certeza que esta­
mos no caminho certo, serve-nos de grande conforto.
Esse é um sentimento correspondente à realidade. Onde
quer que a verdade se imponha, haverá saúde e equilíbrio, e tu­
do funcionará como deve. O que você busca é a verdade sobre
a saúde e as questões da alma. Nesse reconhecimento, você en­
contrará a verdade. Não brinque com esse sentimento. Não o dis­
torça ou modifique. Não permita que alguma voz lhe tente, di­
zendo: "Você se sentiria muito melhor se pudesse sentir-se mais
digno, ou se fizesse algo para tornar-se mais digno". Tal opinião
está errada. Se você a aceitasse, entraria em uma região onde im­
pera a falsidade. A mentira faria Deus voltar-se contra você, ao
passo que agora Ele está do seu lado. Ademais, a mentira produ­
ziria toda forma de males, pois Deus resiste aos soberbos. Mas,
aos famintos Ele enche de coisas boas. Mas, se você mudasse de
atitude, não mais seria o faminto, mas o rico. Sabemos o que su­
cede ao rico — é despedido vazio. Assim, convém que você diga:
"Sinto e sei que sou indigno, e não me desfarei desse sentimento.
Quero que o mesmo se intensifique mais e mais. Quero morrer
com esse sentimento, e com ele chegar diante de Deus, alimen-
tando-o por toda a eternidade".
Outro conforto de que você deveria valer-se, baseado no

sentimento de sua indignidade, foi sugerido pelo trecho que diz:
"Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos" (Lucas
1:53). Esse conforto consiste no fato de que quando sentimos nossa
indignidade, isso abre caminho para as bênçãos celestes. Deus nun­
ca encheu de bens uma medida falsa, ou incapaz de conter esses
bens.
Não está você na condição certa para receber a compaixão
divina? Você diz e sente, diante de Deus (e o cerne dessa questão
consiste em tal sentimento): "Sou muito mau; uma criatura cul­
pada e maligna, e nada tenho para oferecer a Deus". Sabemos
que sempre Deus replica a tal pessoa: "Agora que você está va­
zia, há espaço para Mim e para o que é Meu — vou enchê-la".
Se você reconhecer sua indignidade, haverá espaço para
Cristo. Cristo virá enchê-lo com Sua pessoa. E quando o Pai vir
o Filho em você — somente o Filho — Seu próprio Filho amado,
e não algum pedaço de seu próprio ser decaído, e nem suas coi­
sas perecíveis, ficará satisfeito.
Você poderá estar sentado em sua poltrona, ou deitado no
seu leito, como um homem a quem Deus conforta — indigno em
si mesmo, mas perfeitamente digno por causa de Cristo. Você tem
exatamente aquilo que Deus quer ver em você, e isso capacita-o
a saber que Deus está satisfeito.
Seria uma desgraça se tivéssemos de parar ao pensarmos
em nossa indignidade. Mas, reconhecer isso é um meio para che­
garmos a um determinado fim. Não precisamos demorar-nos em
condição tão mísera e degradante. Devemos prosseguir — conti­
nuar — para então nos alegrarmos, sentirmos, dizermos e cantar­
mos: "Em Cristo eu sou digno. Sim, sou digno em Cristo. Deus vê
Cristo em mim, e me acha digno nEle. Conto com a dignidade —
muito abundante — a própria dignidade de Deus — suficiente
para o juízo e para o céu. Tudo provém de Cristo, e tudo também
é meu!"
Agora, conforte-se diante da idéia que ao reconhecer sua
indignidade, você foi poupado de um castigo incalculável, de um
duro tratamento, de uma ruína interior. Mais cedo ou mais tarde,
se você tiver de ser salvo, você terá de aprender a lição da pró­
pria indignidade. Talvez você ainda tenha muito que aprender
quanto a isso. Podemos estar certos de que, se somos do Senhor,
aprenderemos mais e mais sobre nossa indignidade.
Não se desencoraje. Há um grande conforto à sua espera.
Você nunca conseguirá aprender coisa alguma de ruim, sobre vo-

cê mesmo, sem que aprenda algo de bom sobre a pessoa de Cristo.
Realmente, você não será pior, se descobrir que é pior do que ima­
ginava. Apenas uma luz maior terá sido projetada em seu coração;
e agora você percebe as coisas melhor do que antes. As coisas
não pioraram, mas você sabe mais acerca delas. Deus sabe muito
mais a seu respeito, como você nunca conseguirá saber. E Deus
fez provisões, segundo o conhecimento dEle, a seu respeito.
Portanto, quando você descobrir alguma maldade nova em
seu coração ou em sua vida, que seu primeiro pensamento seja:
"Em Cristo há provisão para isso".
Humilhe-se o mais possível, mas nunca tirando Cristo de
diante de si.
A humildade sem Cristo fará de você um homem fraco;
com Ele, você será forte. Nossa indignidade nos esmaga, a menos
que concebida junto com a dignidade de Cristo.
Portanto, aceite o conforto que seu gracioso Deus e Pai bon­
doso tem para você. E, dessa forma, sinta-se em paz.

UM CONFORTO
QUE CONTRABALANÇA
PENSAMENTOS INVEJOSOS
SOBRE OUTRAS PESSOAS
Cada circunstância na vida traz suas tentações e tribula­
ções peculiares. Algumas vezes, as mesmas tribulações e tenta­
ções visitam-nos nessas variadas circunstâncias. Porém, há dife­
renças quanto ao modo como elas nos assediam, e que as fazem
se adaptarem as nossas exatas condições.
Adaptar-se é uma prova de sabedoria e habilidade; e é is­
so que Satanás costuma fazer.
Os períodos de doença são seguidos por sua classe parti­
cular de tentações; estas também se adaptam tão bem às nossas
circunstâncias que uma longa e exaustiva doença com freqüên­
cia requer uma espécie diferente de tentação, em relação aos bre­
ves períodos de enfermidade aguda. Por igual modo, um longo
tempo de escassez, em que somos mantidos sob estreitos limites
econômicos, exige que Satanás empregue uma classe diferente
de tentações daquela que é apropriada a alguma perda súbita e
pesada.
Uma das tentações que algumas vezes perturba muito aos
enfermos consiste em invejarem a condição de outras pessoas —
pensamentos invejosos acerca delas. Assim também, invejar aos
ricos algumas vezes é tentação que ataca aos pobres, os quais vêem
os ricos desperdiçando aquilo que, para os menos afortunados,
é uma comodidade e quase uma fortuna.
Tal pensamento às vezes vem continuamente sobre nós,
quando estamos acamados.
Quando estamos, no leito de enfermidade, ou talvez em
uma poltrona, sentindo-nos em grande desconforto e recebemos
cartas de amigos que relatam como eles têm visitado este ou aque­
le lugar, como viram isto ou aquilo, ou quando aqueles que nos

cercam são pessoas cheias de vida, que apreciam os prazeres da
vida, e o sol brilha e a brisa sopra, lá fora, a vida que ao nosso
redor parece tão intensa, parece ter muito pouco para nos oferecer.
Que poderia haver de mais natural do que nos queixarmos
de nossa sorte? do que invejarmos àqueles que têm aquilo que
não temos, do que invejarmos àqueles para quem a vida não é
um longo desconforto, mas, para quem aparentemente, tudo se
assemelha ao resplendor do sol ?
Podemos esperar que idéias dessa ordem surjam em nos­
sas mentes, devido à própria natureza de nossas circunstâncias.
Poderiam esses pensamentos produzir em nós alguma ou­
tra coisa, além de um profundo desconsolo?
Todavia, não é preciso continuarmos desconsolados. Po­
demos enfrentar tais pensamentos com outros pensamentos, de
natureza mais agradável.
Antes de tudo, quando penso sobre como poderei ser con­
solado quando me acho sob tais circunstâncias, indago de mim
mesmo: "Quem determinou minha presente sorte? Quem permi­
tiu esta minha doença? Deus está envolvido em toda essa ques­
tão? Tenho opiniões distintas sobre essa questão?"
E muito inseguro questionar as circunstâncias alheias, sal­
vo à luz da soberana vontade de Deus.
Lemos em Provérbios 14:30: "O ânimo sereno é a vida do
corpo, mas a inveja é a podridão dos ossos".
Asafe caiu na forma de tribulação de que estamos falan­
do aqui. A tribulação pressionou-o tanto que os seus pés quase
escorregaram, e ele quase tombou. Ora, isso despertou nele pen­
samentos e palavras extremamente indesejáveis. Pôs-se a medi­
tar intensamente, e procurou compreender todos os acontecimen­
tos que o envolviam. Porém, Asafe teve de confessar que tudo era
muito doloroso, tudo era por demais difícil para ele entender, até
que entrou no santuário de Deus; e então ele compreendeu toda
a sua situação. O Salmo 73 forma um estudo muito útil para to­
dos os que se acham em circunstâncias similares às de Asafe.
Você deverá dirigir-se ao santuário, isto é, ao próprio Deus,
meu amigo enfermo, se quiser receber conforto.
"Não és Tu infinitamente sábio, ó meu Deus e Pai? quê?!
o meu coração incrédulo pretende supor que cometeste um equí­
voco — que Te enganaste ao permitires esta minha doença, no
tocante à sua natureza, duração e qualquer de suas particulari­
dades? Entraste em contato comigo, quanto a essa questão, visando

a um mal, com a finalidade de me ferires? Oh, meu Deus, eu Te
contemplarei no interior do santuário, e não nas paredes vítreas
de meu pobre coração maligno, onde eu acabaria distorcendo a
Tua imagem. Mas haverei de contemplar-Te onde Tu queres mani­
festar-Te. E creio que Tu és bom, bondoso para comigo no mais
elevado sentido da palavra."
Ora, esse é o Deus que determinou, para todas as pessoas,
as circunstâncias que cabem a cada uma. O que tenho é aquilo
que Ele me deu, embora se trate da dor. E aquilo que as outras
pessoas possuem, é também o que Ele lhes deu, sem importar se
o prazer é a porção delas. Não faria Deus o que bem entendesse
com aquilo que Lhe pertence?
Mas isso ainda não seria o bastante. Preciso crer que uma
sabedoria infinita tem agido, conferindo-me aquilo que é melhor
para mim. Por qual razão isto ou aquilo é melhor para mim não
sei dizer; mas para mim basta que, tendo vindo da parte de Deus,
assim é que as coisas devem ser.
Já que as coisas são assim, nada tenho a ver com aquilo
que coube a outras pessoas. Tudo se harmoniza com aquilo que
Deus escolheu e determinou, e não me compete pensar que eu
poderia melhorar as coisas. "Tudo é melhor como está, ó meu Pai
celeste. E sinto-me confortado, pois Tu és todo-sábio e bom, e de­
terminaste para mim a minha porção."
Entretanto, ainda há um outro conforto.
A parte que coube a essas outras pessoas, a quem inclino-
me por invejar, seria melhor para m/m? Neste mundo há muitas
coisas que são boas por si mesmas, mas que não são boas para
certas pessoas. Muitos pratos esquisitamente preparados são ex­
celentes para certos indivíduos, mas não para mim; e, visto que
não combinam comigo, busco evitá-los.
É provável que a porção daqueles a quem invejamos não
seja boa para nós. Para nós isso poderia ser uma porção tão ruim
quanto é boa para eles. Cada um de nós está só diante de Deus,
com suas peculiaridades de caráter e temperamento, com as ten­
tações que mais facilmente o afetam. Estamos diante de Deus em
nossa individualidade; e Ele trata conosco como indivíduos. Por­
tanto, se confio em Deus, então isso me serve de conforto, na cer­
teza de que me coube a porção que é melhor para mim.
Como já dissera, por qual razão essa porção é melhor pa­
ra mim não sei dizê-lo; isso é algo que preciso deixar aos cuida­
dos de Deus. Sei que tudo quanto me diz respeito jaz manifesto

e nu diante dAquele a quem terei de prestar contas. Sei que Ele
trata comigo como um indivíduo, e que o meu caso está exposto
diante dEle como se fosse o único a interessá-Lo. (ver Hebreus 4:13).
Oh, Deus, conforto-me diante da certeza de que determi­
naste aquilo que é melhor para mim.
Em seguida, poderíamos indagar de nós mesmos: Aqueles
a quem invejamos sentem-se, realmente, tão felizes quanto nós
que não podemos participar das atividades deles — gastando di­
nheiro, viajando de um lugar para outro, ou desfrutando deste ou
daquele prazer? Essas coisas reluzem mais intensamente, fazem
maior ruído, do que os prazeres mais tranqüilos. Todavia, o ria­
cho de poucas e espumejantes águas brilha mais e é mais ruido­
so ao bater de encontro às pedras, do que as águas mais profun­
das que fluem mansa e silenciosamente, com todo o seu imenso
poder, na direção do oceano.
Quão prontamente surgem e desaparecem os prazeres que
às vezes invejamos! Logo se acabam! Quantos desses prazeres nada
deixam senão cinzas atrás de si! E, quando termina a semana, o
que foi que eles tiveram a mais do que nós?
Damos a muitas coisas um falso brilho e podemos extrair
algum conforto do pensamento de que muito daquilo que havía­
mos pensado ter perdido, nada mais é do que quadros imaginários.
Com freqüência esquecemo-nos de que há diferentes for­
mas de felicidade e prazer; e que nossa forma de felicidade e pra­
zer talvez não seja a última, e nem a pior. Se outros desfrutam
da forma de felicidade e prazer que lhes é peculiar, nós podemos
desfrutar da nossa. Somos árvores diferentes, e em nós há frutos
diferentes. Se porventura nos julgamos destituídos de qualquer
espécie de bem, devido às nossas circunstâncias, não é para ad­
mirar que nos sintamos infelizes e descontentes. Pois o Todo­
poderoso criou o homem de tal modo que este jamais poderá ser
feliz enquanto pensar que não lhe resta algum bem. O essencial
da questão é que devemos crer que temos as nossas coisas boas,
tal como eles têm suas eoisas boas. Se ao menos nos pusermos
a observar, muitas dessas coisas boas também sucederão conos­
co. "Há muitos que dizem: Quem nos dará a conhecer o bem?
Senhor, levanta sobre nós a luz do teu rosto. Mais alegria me pu­
seste no coração do que a alegria deles, quando lhes há fartura
de cereal e de vinho". Sim, o salmista gozava paz. E prosseguiu
em seus pensamentos: "Em paz me deito e logo pego no sono,
porque, Senhor, só tu me fazes repousar seguro" (Salmos 4:6-8).

Quando você estiver buscando conforto nessa fonte, faça
a si mesmo a pergunta: Já descobri iodo o bem que faz parte da
porção que me coube? Procuremos descobrir coisas boas em nos­
sas circunstâncias, e descobriremos nelas coisas boas. A Bíblia mos­
tra que Deus fez uma coisa antepor-se à outra; e, por isso, se o
Senhor determinou o que é amargo, podemos estar certos que Ele
também determinou, juntamente com isso, algo doce.
Por muitas vezes, temos de buscar nossas bênçãos como
quem as caça, se quisermos descobri-las. Mas elas não se tornam
piores por causa disso, a menos que a violeta seja pior, só por ser
preciso procurá-la em meio à folhagem.
Nos períodos de enfermidade, as pequenas demonstrações
de misericórdia são tão importantes para nós quanto as coisas gran­
des são importantes para quem goza saúde. Se déssemos a um
homem pobre quinhentos mil cruzeiros, ele sentiria o mesmo senso
de abundância que sente um homem rico, ao ganhar cinco milhões
de cruzeiros. O pobre desfruta o planejamento de como gastará
aquela importância, com a mesma intensidade com que usufruirá
com seu uso. Prazer é prazer, sem importar se usa como instru­
mento o que é grande ou o que é pequeno. Talvez você se satisfaça
tanto por ficar sentado ao ar livre, tranqüilamente, pelo espaço
de uma hora, como alguém que se alegra ao passar o dia caçando,
pescando, participando de uma excursão, ou desfrutando de algum
grande momento de prazer. As coisas são para nós conforme elas
são; e você pode desfrutar de seus pequenos prazeres, tal como
outras pessoas desfrutam de seus grandes prazeres. Peça que Deus
lhe mostre as coisas boas que fazem parte da porção que lhe cabe.
Creia que há alguma coisa boa ali; procure por ela. É espantoso
o número de coisas boas que descobrimos, quando as buscamos
diligentemente. Há enfermos que sentem tanto prazer por serem
capazes de mover uma junta do corpo como um jovem tem prazer
por conquistar o primeiro lugar em uma competição esportiva;
e há pessoas para quem um pedaço de peru assado é tão delicioso
quanto uma festa oferecida pelo prefeito da cidade.
Portanto, assim que você puder, comece a caçada pelas
bênçãos à sua espera. Caçar essas bênçãos equivale a caçar o con­
forto. Um pescador pode sair para pescar e nada apanhar, um ca­
çador de raposas pode sair a caçar e nada conseguir. Mas, se vo­
cê sair a caçar as bênçãos que lhe cabem, sem dúvida obterá
sucesso.
Assim sendo, que outras pessoas prossigam na vereda que

Deus lhes determinou; para você basta que essa não seja a sua
vereda. Não espere encontrar as coisas que pertencem a e/a5, na
sua própria vereda; da mesma forma que elas não devem encon­
trar as bênçãos que lhe pertencem nas suas veredas. Essas pes­
soas podem sentir-se satisfeitas e úteis em seus próprios
caminhos, e você poderá ser feliz em circunstâncias destinadas
a você.
Só quando pretendemos sair de nossas esferas é que fica­
mos descontentes, invejosos e infelizes, e então fracassamos na­
quilo que Deus determinou para a nossa vida.
Convém que tentemos não fracassar, mas antes, que a nossa
vida redunde, finalmente, na glória de Deus, em nossa esfera es­
pecífica. Podemos ter a certeza que contribuiremos mais para a
glória de Deus, e para a nossa própria felicidade, dentro das cir­
cunstâncias que a infinita sabedoria e o infinito amor de Deus
determinaram para cada um de nós.

CONFORTO PARA QUANDO SOMOS
UMA CARGA PARA OUTRAS PESSOAS
Nem todas as nossas tribulações, na doença, são causa­
das por nossa situação pessoal. Com freqüência, nossas enfermi­
dades entristecem-nos por causa de entes amados de quem nos
tornamos dependentes, e sobre quem essas enfermidades podem
exercer pressão. E o fardo pesará mais sobre eles, pois talvez te­
nham de ocupar-se de uma parte considerável daquilo que fazía­
mos quando estávamos com boa saúde; ou, pelo menos, isso con­
sumirá boa parte do tempo deles, e até mesmo de seus recursos.
Então, ao meditarmos nisso, agrava-se a nossa aflição.
É possível que pensamentos assim brotem de um coração
orgulhoso; pois há quem não queira depender de outras pessoas
em coisa alguma. Ora, se esse é o seu caso, Deus terá de eliminar
esse orgulho. O fato de não querermos depender de outras pes­
soas, seja no que for, não nos torna semelhantes a Cristo. Cristo
sentiu-se endividado diante de muitos, por muitos benefícios re­
cebidos. Houve mulheres que O serviam com seus bens materiais.
Ele sentiu que podia ficar endividado a uma mulher samaritana,
por causa de um simples copo de água; ou ao proprietário do ce­
náculo, usado no dia da páscoa. Por certo Cristo ficou endividado
por muitas noites de abrigo, e agradeceu àqueles que Lhe presta­
ram ajuda. Houve quem muito se preocupasse com Ele, e, tendo
vivido nesta terra como homem, com necessidades tipicamente
humanas, Cristo dispôs-se não somente a dar, mas também a
receber.
Por outro lado, é possível que suas tribulações se originem
em um coração sensível. Algumas pessoas, não duvidamos, não
são sensíveis; mas há aquelas que o são. E, quando adoecem, ficam
ainda mais sensíveis. Sob tais circunstâncias, podemos preocupar-

nos; com freqüência, nos preocupamos ao ponto de chegarmos
a um estado de grande aflição.
Sob tais circunstâncias, o que tem a dizer-nos o nosso livro?
Em primeiro lugar, diz: Seus amigos, e aqueles que o es­
tão servindo, consideram que você é causa de tão grande enfado
quanto você mesmo sente que é? Você tem motivos para pensar
que essas pessoas sentem assim?
Sucede, algumas vezes, que estimamos as coisas de acor­
do com nossa própria lamúria doentia, e por isso conceituamos
cada coisa como se fosse um pesado fardo. E então, visto que cada
pena ou palha é para nós uma carga, também pensamos que as­
sim são as pequeninas coisas para os outros. Para você, meu amigo
enfermo, talvez pareça um grande esforço sustentar um livro nas
mãos; talvez você fique exausto depois de haver dado alguns pas­
sos, como também não é capaz de falar por cinco minutos em
seguida. Porém, não convém que você meça as pessoas ao seu
redor, tendo você mesmo por medida. Vocês se encontram em con­
dições bem diversas; elas não fazem de cada coisa um fardo, co­
mo acontece com você. É natural que você transforme tudo em
um fardo, e também é natural que elas não pensem como você.
Assim, encontramos um pensamento reconfortador. Seus
amigos saudáveis muito provavelmente não são da opinião que
você lhes esteja dando tanto trabalho quanto você imagina.
Todavia, leve em conta não somente a saúde, mas também
o amor daqueles que o estão ajudando.
E provável que você esteja sendo ajudado por alguém que
o ama por razão de parentesco. Mas também pode ser que essa
pessoa não tenha com você qualquer relação de sangue, apesar
do que lhe vota grande afeto; e é por isso que ela lhe está servindo.
Ora, o amor não leva em conta o trabalho que porventura dermos.
Ao contrário disso, regozija-se diante das oportunidades de mani­
festação, e considera muitas coisas enfadonhas como se elas não
dessem trabalho, por amor daqueles em favor de quem tudo é
feito. Você precisa levar em conta até mesmo a bondade natural
que todos sentimos pelas pessoas doentes. Você sentiria o mes­
mo por outras pessoas, se fosse esse o caso; e elas manifestam
tal sentimento a seu respeito. É a atitude com que fazemos algo
que determina o quanto isso nos dá trabalho; e aqueles que lhe
estão servindo por certo fazem-no movidos pelo amor, e, portanto,
pensam que todo o trabalho que estão tendo com você é pequeno.
Ademais, há um outro conforto. É que Deus recompensará

àqueles que nos estiverem ministrando, contanto que o façam por
amor a Ele. Você não deve imaginar que aqueles que lhe estão
prestando algum serviço, fazem-no sem esperar qualquer recom­
pensa. Talvez você não lhes possa recompensar com grande coisa,
ou mesmo com coisa alguma. Porém, há Alguém que observa tudo
quanto estão fazendo, e que, no devido tempo, os galardoará. Se
você realmente confiar nisso, então esse fato lhe servirá de grande
conforto. Assim, quando adoecermos, não sentiremos que estamos
tirando proveito dos que se mostrarem bondosos para conosco, em
troca de nada. Deus devolverá a essas pessoas o que tiverem feito
em nosso favor, muitas vezes multiplicado. Cumpre-nos orar no
sentido de que Ele assim realmente o faça. Quando assim orarmos,
se tivermos fé que nossas orações são ouvidas e respondidas, en­
contraremos um grande conforto. Sim, nós mesmos, os pobres de­
samparados, que tão pouco temos para dar, estamos abençoando
àqueles que nos ajudam. Estamos contribuindo para que eles sejam
regiamente recompensados. E nosso Pai, que cuida de tudo para
nós, será aquele que pagará em nosso lugar, além de tudo quanto
Ele já fez. Que o seu coração, pois, conforte-se diante dessa idéia,
pois, à Sua própria maneira, Deus recompensará a todos aqueles
a quem você tiver ficado devendo favores.
Quem sabe como Deus fará isso? Haveríamos de querer
saber? Nem sempre a fé quer saber. É possível que outras pes­
soas farão, por aqueles que agora estão lhe servindo, o que estes
estão fazendo por você. Você pode estar certo de que chegará
o momento de necessidade dessas pessoas. E você poderá orar
no sentido de que, quando surgir essa necessidade, ela venha a
ser devidamente suprida. Portanto, ore com toda a intensidade e
fé: e então conforte-se diante da idéia que você foi causa da bên­
ção recebida pelos que o ajudaram em suas necessidades.
Todavia, você talvez exclame: "É muito humilhante e en-
tristecedor ficar tão dependente de outras pessoas".
Nesse caso, considere este fato. A lei da dependência po­
de ser vista em todos os quadrantes da vida. Todos dependemos
de outros, seja no que for. E você, ao cair enfermo, apenas estará
preenchendo um dos lados da lei da dependência. Deus ordenou
que você seja um dos dependentes, assim como nomeou seus bon­
dosos amigos para você depender deles. Você está no lugar certo,
dentro do grandioso plano de Deus. Talvez você seja um dos meios
que Deus usa para dar aos seus amigos a oportunidade deles preen­
cherem o outro lado da lei da dependência, ao atenderem as suas

necessidades, e assim receberem a bênção que corresponde a es­
se serviço. Lembre-se de como Jesus se sujeitou a essa lei, quan­
do foi o beneficiário do serviço prestado por outros, e de como
Paulo assim também o fez. Na história dos maiores homens de
Deus há muitos exemplos de pessoas que também se beneficia­
ram com essa lei.
Outrossim, temos outro conforto no fato que, em muitos
casos, podemos poupar trabalho aos que nos servem.
Na doença, as necessidades, sobretudo as "pequenas neces­
sidades", infelizmente são inúmeras. Nós poderíamos tentar limitar
o número dessas necessidades. Algumas vezes, um pouco de pre-
meditação poupará muito trabalho para aqueles que tiverem de
servir-nos. O leito ou a poltrona de enfermidade não deixam de
oferecer preciosas oportunidades para demonstrarmos tais cuida­
dos e abnegações.
Seja como for, podemos limitar nossas reclamações. Não
quero dizer com isso que nunca devemos relatar, aos amigos que
conosco simpatizam, o quanto estamos sofrendo; nem por isso pre­
cisamos cansá-los com nossos queixumes, como é costume de al­
guns. Assim experimentaremos o sentimento reconfortante de que
estamos poupando nossos amigos do conhecimento de tudo quan­
to estamos passando de adverso.
Assim sendo, poderemos mostrar-nos gratos, e isso de ma­
neira expressa e demonstrada, de tal modo que aqueles que es­
tão ao nosso redor sintam que apreciamos o que eles fazem por
nós. Não creio, sob hipótese nenhuma, no sistema do silêncio. Penso
que a expressão da gratidão infunde prazer; e isso encoraja nos­
sos amigos, levando-os a sentirem que o seu labor não é vão. É
pensamento confortante que isso esteja ao nosso alcance.
Eis, agora, outro motivo de conforto. Deus confere àqueles
que se dispõem a servi-Lo no auxílio prestado a outras pessoas,
os sentimentos e a paciência que se fazem necessários em tais
casos. Há muitos que servem ao próximo dotados de uma força
que não lhes pertence, mas a Deus. É possível que aqueles que
lhe estão servindo tenham essa força; mas, se não a tiverem, e
você a pedir de Deus para seus amigos, eles a obterão. E então
a idéia de "trabalheira" com você nunca entrará nas mentes deles.
Também é motivo de conforto que os sentimentos com que
outros nos servem, com freqüência são profundamente afetados
por aquilo que somos. Assim, quanto a questão de sermos uma
canseira para eles, temos algo sob nosso controle. Não jazemos

totalmente impotentes em nossos leitos. Se tentarmos ser animados,
e nos mostrarmos agradecidos e satisfeitos, se apreciarmos os es­
forços alheios e valorizarmos aquilo que outras pessoas estão fa­
zendo por nós, então faremos com que pareça mais leve a tarefa
dos que nos servem. Sermos capazes disso, sem dúvida deveria
ser para nós um motivo de conforto.
Meditemos nisto. Quem sabe quais oportunidades teremos
de devolver, no futuro, à bondade recebida em nossos leitos de
enfermidade! Avançar muito longe, nesse campo, nos faria entrar
no terreno das especulações. Contudo, de hoje em diante, quando
houver oportunidade de mostrarmos nossos melhores sentimentos
a outras pessoas, que a gratidão não seja deixada de lado.
Se o próprio Senhor dirá: "Estive enfermo, e me visitastes",
e por causa disso, seremos galardoados por Ele mil vezes mais,
podemos estar certos de que os discípulos não serão menos be­
neficiados do que seu Senhor.
Não podemos perceber motivos pelos quais, lá no céu, não
haverá os atos de dar e receber, em intercâmbio afetuoso. Sem
dúvida, não consideraremos nossa maior felicidade a possibilidade
de guardarmos tudo para nós mesmos. Se, lá no céu, houverem
santos relacionamentos, que tiveram seu início e raiz aqui na terra,
então bem podemos acreditar que aquilo que há entre quem serve
e quem é servido, será uma dessas coisas.
Portanto, sinta-se confortado, mesmo que você seja um far­
do para outras pessoas. Por mais entristecedora que seja essa idéia,
ela tem o seu alívio.
Se esse pensamento é gracioso e capaz de humilhar-nos,
então você poderá usar todos esses consolos, encontrando bên­
çãos nos mesmos. Porém, se tal pensamento deixá-lo por demais
orgulhoso para depender de outrem, e você rebelar-se diante de
sua própria impotência, lembre-se de que Deus não fez qualquer
provisão para tais pensamentos, e quanto mais cedo você os
abandonar, melhor.
As águas da consolação não poderão subir pelas colinas
do orgulho humano. Contudo, regam os vales da humildade. Quan­
to a isso, como em tudo o mais, "Deus resiste aos soberbos, mas
dá graça aos humildes". Não precisamos ficar desanimados; até
mesmo esse aspecto de nossas aflições tem seu devido alívio e
suas consolações.

CONFORTO NO TEMOR
DE QUE A AFLIÇÃO
PERDURARÁ POR LONGO TEMPO
Posso simpatizar com aqueles que sofrem, quando temem
que sua provação, sem importar sua natureza, venha a ser longa.
Essa idéia intensifica, posso crer, a aflição de qualquer pessoa.
Se ao menos o enfermo pudesse ver o fim de seus sofrimentos,
isso tiraria de suas costas metade do peso. Mas é exatamente isso
que ninguém pode fazer. Assim sendo, precisamos buscar o con­
forto que corresponde a essa fase de nossas aflições.
Há certas consolações à espera dos aflitos. Pois o Deus san­
to que permite que nossas aflições sejam demoradas, não deter­
minou que qualquer situação neste mundo seja inteiramente
desconfortável.
O primeiro grande conforto será dado ao enfermo que qui­
ser viver dia após dia. Deus achou por bem que vivêssemos um
dia de cada vez. Foi o pecado que trouxe a "preocupação com
o futuro" e a desconfiança em Deus. O pecado convocou contra
nós todas as formas de temores, dúvidas e descrenças, a fim de
povoarem o longo e cansativo período de tempo que nossa men­
te é capaz de prever. Deus determinou que Adão vivesse dia após
dia; e quando o Senhor alimentou os homens com a comida do
céu, Ele os alimentou dia após dia. E agora, diz Deus: "Basta a
cada dia o seu próprio mal", cabendo-nos a tarefa de rogar o nosso
pão diário. Nenhuma força deste mundo será capaz de fazer-nos
virar a página da vida do amanhã. "Vós não sabeis o que sucederá
amanhã" (Tiago 4:14). Se você quer ser feliz, em meio a alguma
longa aflição, e se quer atravessá-la vitoriosamente, então será pre­
ciso que feche resolutamente os olhos para o futuro. Que a noite
seja "a morte da vida de cada dia".
Por misericórdia, Deus dividiu a vida em pequenas parce-

las, isto é, em dias. Se Ele não tivesse feito assim, provavelmente
nos sentiríamos oprimidos. Mas, agora sabemos, pela experiência
diária, que podemos fazer aquilo que, considerado em sua totali­
dade, é muita coisa, contanto que o realizemos pouco a pouco.
É pouco a pouco que nos compete suportar nossas longas aflições.
Jamais estenda a mão para as perturbações que só ocorrerão ama­
nhã. A graça divina destina-se só ao dia de hoje. Você não deveria
atrair uma necessidade para a qual não há qualquer promessa de
suprimento.
Ora, porventura não é motivo de conforto o fato que Deus
não permite que sejamos sobrecarregados? Você talvez sobrecar­
regue-se a si mesmo. Mas, se assim fizer, Ele permitirá que as con­
seqüências naturais — na forma de uma mente perturbada —
caiam sobre sua cabeça. Mas, se você estiver resolvido a não se
sobrecarregar, então sentir-se-á feliz diante da idéia de que nin­
guém poderá impor-lhe uma carga demasiada.
Portanto, você poderia até mesmo dizer: "Eu não sei dizer
por quanto tempo durará o futuro para mim; mas sei que terá de
haver dias futuros; e, assim como forem os meus dias, assim tam­
bém será a minha força" (ver Deuteronômio 33:25).
Conforte-se, igualmente, diante da idéia de que o período
de aflições algumas vezes é muito mais curto do que as pessoas
imaginam. Pessoas que haviam temido ficar inválidas durante se­
manas, meses ou mesmo anos, foram restauradas à saúde de ma­
neira maravilhosa e inesperada. E assim também poderá suceder
com você. Você não sabe o que o Senhor tem em reserva para
você. Lembro-me de um piedoso médico, que declarou de certa
feita: "Geralmente Deus mostra-se mais bondoso conosco do que
os nossos temores". No caso dele, assim sucedeu.
E possível, por outro lado, que nunca mais sua saúde lhe
seja totalmente restaurada. Mesmo que isso aconteça, ainda assim
haverá uma grande bênção à sua espera. E talvez você nunca re­
cupere a saúde além do seu estado atual. Conforte-se diante das
possibilidades. Você não sabe o que Deus tem reservado para você.
Suponhamos que a santa vontade de Deus seja que você
permaneça conforme está agora — um inválido por toda a vida.
Mesmo assim você não terá de viver destituído de toda a conso­
lação. O grande poder do hábito fará grandes coisas em seu favor.
Devido ao hábito que se formará, por você estar deitado em um
sofá ou em uma cama, ou por ter de ficar confinado ao interior
de sua casa, todas essas provações serão menos dolorosas pelo

fato de virem a intervalos, através de breves períodos.
Também é reconfortante pensarmos que, sem importar por
quanto tempo venha a durar a nossa tribulação, nunca será longa
demais para os propósitos de Deus. "Até aqui irás, e não mais",
disse o Senhor ao oceano. E embora as ondas do mar espumejem
terrivelmente, não podem ultrapassar o limite da praia que Deus
impôs. Por igual modo, "até aqui e não mais" é o que Deus tem
determinado para as nossas tribulações. Isso posto, o intuito de
Deus em nada se alterará se a nossa tribulação tiver de prolongar-se
por doze meses ou por dez anos, segundo ela se manifesta atual­
mente. E, sendo esse o caso, não devemos imaginar que passare­
mos por qualquer dificuldade sem sentido, ou sem a presença do
Senhor.
Muito teríamos a lamentar se nossas tribulações perduras­
sem por mais tempo do que aquele que Deus estivesse disposto
a ficar conosco. De fato, teríamos de olhar para o futuro esperando
dias sem esperança, noites negras e ameaçadoras, a solidão e o
desencorajamento. Todavia, a duração das nossas aflições contará
com a presença de Deus conosco. A presença de Deus, experimen­
tada no passado, será experimentada todos os nossos dias. Declarou
o Senhor: "E eis que estou convosco todos os dias, até à consu­
mação do século" (Mateus 28:20).
Refletir que a duração de nossa aflição não será maior do
que aquilo que precisaremos passar, é outro motivo de conforto.
Nem sempre entendemos por qual razão temos de passar
por esta ou aquela tribulação. As necessidades de cada pessoa,
quanto a isso, só são conhecidas por Deus. Algumas vezes perce­
bemos essas necessidades, e então tendemos a enfrentar tais si­
tuações de maneira superficial, pensando que uma pequena difi­
culdade pode produzir uma reforma profunda ou ensinar alguma
grande lição. Deus, porém, desce até às raízes. Ele sabe do que
estamos precisando, e o que Ele mesmo está fazendo. E cada dia
em que tivermos de passar por tal tribulação, se a usarmos corre­
tamente, ela haverá de satisfazer alguma necessidade de nossa
alma.
Conforte-se, igualmente, com a certeza de que a tribula­
ção nunca será maior do que a bênção que há de vir. Deus nunca
permite que sejamos atingidos por alguma tribulação, sem a in­
tenção de abençoar-nos. Portanto, todas as vezes que uma aflição
for intensa, podemos ter a certeza de que a bênção que recebere­
mos também será grande. Mas, se tal aflição tivesse permissão

para prolongar-se de maneira proibitiva, acima de nossas possibi­
lidades de produzir fruto, então ela simplesmente se transformaria
em um mal, um castigo ao qual poderíamos levantar objeções.
Assim sendo, diga a si mesmo: "A tribulação deste dia não podia
ser poupada; Deus ainda tem em reserva alguma bênção para
mim". Para que você possa raciocinar assim, naturalmente você
precisa confiar em Deus, e de modo prático. Pois, se você não tem
tal confiança, não posso escrever, de modo algum, um livro de
conforto para você. Sem a atuação de Deus, não posso ajudar.
Lembre-se também deste fato: sua tribulação não poderá
ser mais longa do que a permanência da fidelidade, da miseri­
córdia, da paciência e do poder divinos. Deus será fiel em todo
o seu período de aflição. A paciência dEle jamais se esgota, Seu
poder jamais se acaba. Você nunca ficará sem a presença de Deus.
Ele estará presente em todos os seus amanhãs, da mesma forma
que Ele está aqui, no seu hoje, e tem estado em todo o seu passado.
Ademais, você não deixará de receber o devido alívio. Nem
tudo será dor, nem tudo depressão, nem tudo exaustão, sem qual­
quer raio de sol, sem qualquer sorriso. Os alívios poderão vir por
meio de pequenos instrumentos, que poderão parecer triviais pa­
ra os que gozam saúde. No entanto, a questão não é o que essas
coisas representam para outras pessoas, mas, para você. Deus nun­
ca é limitado em Seus recursos, porque Ele pode fazer milhares
de plantas crescerem por sobre as nossas cabeças, pode fazer mi­
lhares de fendas através das quais os raios do sol possam pene­
trar, e pode fazer amplos raios de sol penetrarem por ali. Ele po­
de colocar um certo prazer e poder em pequeninas coisas, as quais
nos surpreenderão da maneira mais absoluta. O que nos parece ser
nada, quando estamos com saúde, Deus pode tornar preciosíssimo
em nossas enfermidades. Portanto, diga a si mesmo: Encontrarei
alívio ao longo de toda a minha caminhada; jamais se passará
um dia sem algum conforto. E, assim, eu o buscarei, encontrarei
e usarei, quando o mesmo vier.
Creia que os longos períodos de aflição tem seu sentido
e suas bênçãos peculiares.
Creia que seu período de aflição não é um caso diferente
da regra geral.
Esteja certo que essas coisas têm seu devido lugar no rei­
no de Deus. E então, certamente você não haverá de desejar deli­
beradamente que esse período aflitivo seja abreviado, contra a
vontade de Deus, levando consigo todas as suas conseqüências.

Por enquanto, você não pode perceber quão tremenda se­
ria a perda, caso os resultados da tribulação fossem retirados. Não
se sujeite a algum risco; deixe tudo nas mãos de Deus, o qual sa­
be de tudo.
"Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para
nós eterno peso de glória, acima de toda comparação" (II Corín­
tios 4:17). Feliz aquele que suporta a provação. No fim, espera por
ele a colheita de um fruto pacífico.
Se agora só nos inclinamos a olhar para a frente, mais tar­
de poderemos olhar para trás, contemplando o curso inteiro pelo
qual fomos conduzidos. E mesmo agora, quando contemplamos
aquilo a que chamaríamos de longos períodos, quão breves eles
parecem ser, embora comparativamente recentes! E quão mais
breves haverão de parecer, quando forem contemplados da
eternidade!
"Ao anoitecer pode vir o choro, mas a alegria vem pela
manhã" (Salmos 30:5).
Doravante, que aquele que teme que sua tribulação se pro­
longue resolva que não desviará sua atenção do dia de hoje. Hoje
à noite, feche seu coração para todas as considerações sobre o
dia de amanhã. A noite não tarda a chegar, e ele poderá conter-se
até à noite; e que o dia de amanhã tome conta de si mesmo.
Quem sabe quais livramentos estão à espera de tal homem?
Quem sabe quais alívios?
Quem sabe das bênçãos que a enfermidade está preparan­
do para ele, na forma de um abundante peso de glória?
Há um final que já foi determinado. Cada dia que termina
é um dia a menos que terá de ser suportado.
Porém, aconteça o que acontecer. Deus será fiel durante
todo o processo, e haverá de sustentá-lo, segurando-o pela mão
direita até o fim.

CONFORTO DIANTE DA IDÉIA
DE FICARMOS SÓS
Geralmente, os enfermos são forçados a ficar sozinhos por
muito tempo. Enquanto outras pessoas correm para lá e para cá,
nas várias atividades da vida, a parte que cabe aos enfermos é
estarem sozinhos com seus pensamentos, talvez voltados para den­
tro de si mesmos. Não desfrutam de qualquer companheirismo,
salvo o de suas próprias dores. Algumas vezes, os enfermos não
têm amigos que possam fazer-lhes companhia; e, de outras vezes,
os amigos podem permanecer em companhia deles apenas por
breves momentos. A vida é atarefada e poucos são aqueles cujo
trabalho não os pressiona.
Não é de admirar, pois, que a solidão própria da enfermi­
dade seja acompanhada por grande abatimento íntimo. O homem
foi criado por Deus para desfrutar da companhia de seus seme­
lhantes, e não para levar uma vida solitária. Não é pecaminoso,
mas perfeitamente natural, que fiquemos aflitos diante da idéia
da solidão.
Porém, podemos obter grande conforto da idéia que a so­
lidão está longe de ter somente um aspecto negativo, porque tam­
bém tem o seu lado bom.
A superfície da terra, cheia de vida, com árvores que on­
dulam ao vento, com gado que pasta nos campos e com homens
atarefados, encerra muitas formas de beleza. Todavia, o fundo do
oceano, apesar de tão distante, também tem suas próprias formas
de beleza. Muitas formas de beleza podem ser achadas entre os
corais e as conchas, entre as algas e os habitantes do mar — dife­
rentes daqueles cujo habitat é a superfície da terra, mas, ainda
assim, belos em suas formas e colorido.
Procuremos agora, em nosso período de solidão (ou me­
lhor, de isolamento — porque podemos estar "sozinhos" sem es-

tarmos "solitários"), por alguns aspectos atrativos, extraindo de­
les conforto.
Consideremos, antes de tudo, nosso Senhor e Mestre, Jesus
Cristo. Ele vivia só. Esteve só em Sua grande tentação. Durante
todo o tempo em que Jesus esteve no deserto, não contemplou
rosto humano, e nem ouviu voz humana. Dotado de simpatias e
necessidades humanas, Ele foi cortado do companheirismo hu­
mano. O maligno é que Lhe veio fazer companhia; mas, no que
diz respeito ao companheirismo humano, Jesus estava só!
Ora, você desfruta de companheirismo com os sofrimentos
de Cristo. Fortaleça-se nessa honra de viver à semelhança de Cristo,
embora em muito menor escala do que Ele.
Quando participamos das atividades das multidões, bem
podemos esperar pelas tentações que as assaltam; e quando es­
tamos sós, então passamos pelas tentações próprias da solidão.
Em cada um desses casos, porém, podemos desfrutar de compa­
nheirismo com Jesus.
Jesus também isolou-se do aplauso humano. Em um senti­
do, Ele sempre viveu separado desse aplauso, visto que não sim­
patizava com o mesmo, e chegava mesmo a evitar a aprovação
dos homens — lemos, com certa freqüência, que Ele costumava
"retirar-se para estar a sós".
Talvez pensemos que o aplauso dos homens poderia
sustentar-nos em parte; e assim efetivamente sucede. Porém, esse
é um apoio que não penetra até às bases da nossa natureza, e
que jamais poderá impulsionar-nos a realizar algo de valor per­
manente. Quando nos falta o aplauso humano, perdemos muito
menos do que poderíamos supor. O aplauso dos homens não levou
Jesus a coisa nenhuma; o que Ele realizou, fê-lo sem tal aplauso.
E conosco terá de suceder o mesmo. Quanto a isso, pois, você des­
fruta de comunhão com Jesus. Una-se, pois, a Ele. E embora nin­
guém aprecie a sua paciência, e ninguém compreenda a sua po­
sição, da mesma forma que sucedeu a Ele, assim também sucederá
a você. Suas circunstâncias serão parecidas com as dEle. Ele fará
que você se torne, dentro de suas limitações, alguém semelhante
a Ele.
Cristo ficou só em Sua agonia. Aqueles que pelo menos
poderiam vigiar em Sua companhia, foram vencidos pelo sono.
Somente o céu ouviu os gemidos de Jesus, e viu Seu corpo suar
abundantemente. E, quando Ele foi fortalecido, não o foi pela sim­
patia humana, mas através de anjos descidos do céu.

Talvez tenhamos de ficar sós em nossa dor. Seria grande
conforto se pudéssemos contar com uma mão amiga para nela
nos apoiarmos. Seria mesmo um conforto sentirmos que nossos
suspiros, nossos gemidos, ou nossa respiração longamente contida,
caíssem em ouvidos repletos de simpatia e despertassem eco em
algum coração amigo. No entanto, isso não pode ser, pois deve­
mos ficar sós. Portanto, cumpre-nos pensar: "Dentro das minhas
grandes limitações, vivo conforme também viveste, ó meu Senhor".
Por muitas vezes Jesus esteve sozinho, necessitado de sim­
patia humana, solitário, visto que não era compreendido. Pense,
pois, que por menor que seja a simpatia com que você conta, ainda
desfruta de maior simpatia do que Ele desfrutou. E por mais que
você seja mal compreendido, ainda assim não é tão mal compreen­
dido e nem com tanta freqüência quanto Ele o foi. Você poderá
pensar consigo mesmo por muitas vezes: "Ah, quão melhor estou,
quanto a esse aspecto, do que Tu te encontraste entre os homens,
ó meu Senhor". Jesus permitirá que Lhe façamos companhia. Em­
bora não possamos participar de Seus sofrimentos mais profundos,
em quaisquer de suas formas, ainda assim poderemos desfrutar
de companheirismo com Ele, em termos de "espécie". Ora, estar
em comunhão com Jesus, sem dúvida abrilhantará nossos momen­
tos de solidão.
Porém, estar só não equivale, necessariamente, a viver na
solidão. Nada podemos fazer para mudar nossa situação, se esti­
vermos sozinhos; e as circunstâncias em que fomos postos prova­
velmente requerem que assim nos suceda. Todavia, grande parte
da sensação da solidão pode derivar-se apenas de nós mesmos.
Pois Jesus, quando mais estava só, em relação ao mundo, mais
estava em comunhão com o Pai. Estar sozinho, no pior sentido
do vocábulo, é uma coisa; estar a sós com Deus, é algo totalmen­
te diferente.
Encoraje-se diante do pensamento de que há uma certa
"presença". Essa presença é a de seu Pai celeste. Essa presença
você jamais desfrutará sem que Sua voz fale com você, sem que
sua própria voz Lhe responda.
Contudo, há uma outra fonte, que nem por ser de nature­
za inferior deixa de ser real, de onde você pode obter grande feli­
cidade. Sua mente, sua imaginação pode popular sua solidão e
fazer muitas coisas por você. Muitas pessoas ornam tão ricamente
a sua solidão que poderíamos mesmo dizer que elas nunca têm
tanta companhia como quando estão sozinhas.

Nosso leito de enfermidade, o sofá ou poltrona onde nos
recostamos enfermos, não precisam ser o pobre limite de nossa
esfera de vida diária. Em um único instante podemos deixar essas
coisas para trás; sim, podemos deixá-las inteiramente para trás.
Não há dúvida de que nossos corpos têm de ser deixados no quarto
onde se acham muito debilitados; mas nossos corpos não são nós
mesmos. Temos, dentro de nós, aquilo que pode popular nossa pre­
sente habitação, onde residimos sozinhos, com as esperanças, os
pensamentos e os seres da outra vida. Nossa imaginação existe
para ser usada, como tudo que temos. Que a nossa imaginação,
pois, seja santificada e mantida dentro de seus legítimos limites,
e isso haverá de conferir-nos muitas bênçãos. Meditemos com fre­
qüência, em nossos "períodos de solidão", nos santos anjos que
estão ao nosso redor, ou na atividade e na saúde perenes que pre­
valecem na outra pátria para onde estamos indo. Procuremos viver
em meio às atividades próprias da outra existência, embora este­
jamos separados das atividades da presente existência. Dessa for­
ma, podemos ter muitos amigos — dessa maneira, jamais precisa­
remos estar destituídos de amigos.
Também será motivo de conforto para nós se pudermos
perceber que esse estado de solidão pode ser uma boa situação.
Nunca podemos encontrar felicidade em uma condição que, de­
vido à sua própria natureza, consideramos destituída de qualquer
bem.
Quando estamos sós, geralmente recebemos ajudas que
tendem a aproximar-nos mais do céu. É por isso que nosso Pai ce­
leste, com freqüência, permite que Seus filhos fiquem sós, para
ajudá-los nesse sentido.
Quando estamos sós, dificilmente aparecem coisas que nos
distraiam a atenção. Continuamente ouvimos crentes que se quei­
xam das distrações da vida diária. Mas, em um quarto de doente,
bem pouco existe que nos distraia a atenção. Os enfermos gozam
da tranqüilidade de estarem nas sombras, ao lado da agitada es­
trada da vida. Sem dúvida, muito daquilo que poderia ser adqui­
rido mediante árduo esforço, não podemos experimentar quando
estamos doentes. Mas, também somos poupados de muito daqui­
lo que nos pode desgastar o espírito, e que faz parte desse esfor­
ço. Quando estamos doentes, desfrutamos de uma bendita tran­
qüilidade. Se assim não for, então é que estaremos vivendo aquém
dos privilégios próprios do nosso estado. Aceite essa tranqüilidade
como uma bênção.

Ora, quem tem idênticas oportunidades de falar com Deus
e de ouvir da parte de Deus, como você as tem? Você quase se
assemelha a Moisés, quando esteve no monte.
Considere também essa outra grande bênção obtida da so­
lidão. Grandes personalidades têm sido moldadas na solidão. A
solidão é o berço da meditação e da reflexão. Que é o homem
sem os seus pensamentos? Mas, não permita que seus pensamentos
sigam na direção errada. Não deixe que girem demais em torno
de sua própria pessoa. Antes, equilibre o interno com o externo.
E a maneira mais certa de impedirmos que sejamos oprimidos,
ao considerarmos aquilo que somos, é considerarmos, ao mesmo
tempo, aquilo que Deus é.
Sempre que possível, equilibre seus pensamentos com al­
guma ação. Em face das circunstâncias, o enfermo não pode rea­
lizar muita coisa em seu quarto. É mesmo possível que o que ele
faz não seja muito útil. Porém, o que talvez não seja muito por
si mesmo, pode representar muita coisa para o próprio enfermo.
Portanto, até onde lhe for possível, planeje sempre as pequenas
realizações de sua vida diária, e você usufruirá do prazer que sem­
pre se segue à realização de alguma coisa — à realização do tra­
balho feito. Não compare seu trabalho com o trabalho feito por
outras pessoas. Você nada tem a ver com as atividades delas; sinta-
se satisfeito com suas próprias atividades, contentando-se com elas.
É uma forma muito deficiente de nos consolarmos, quan­
do nos pomos a refletir sobre as misérias alheias. Porém, sem dú­
vida nos sentiremos mais felizes, em nossa condição de solidão,
se porventura nos lembrarmos que há muitas pessoas que dariam
grande parcela do que possuem, se ao menos pudessem viver um
pouco fnais sozinhas. Empurradas daqui para lá, por causa dos
negócios ou dos prazeres, ou pelas preocupações domésticas, elas
anelam por uma tranqüilidade que não podem desfrutar.
E há outras pessoas, a quem talvez invejamos, que na ver­
dade vivem solitários na multidão. Tais pessoas vivem realmente
sós — em uma solidão não de espaço, mas de afeto. É possível
ficarmos livres desse tipo de solidão. Não há uma única razão pela
qual o lugar quieto onde fomos postos não possa ser um lugar
animado, onde nossos poucos amigos e Suas raras visitas, nossos
múltiplos pensamentos, bem como a intensa comunhão com nosso
Deus, alegrem nosso deserto e nosso cantinho solitário, levando
nosso deserto a regozijar-se e a florir como a rosa.

CONFORTO PARA O TEMOR
DE QUE, NO FIM, FALHAREMOS
E DESONRAREMOS A DEUS
Esse temor, que passamos a examinar, é um receio natural.
Em certo sentido, podemos obter certo conforto do fato de ter­
mos passado, em algumas ocasiões, por essa forma de temor. Pois
embora o crente deva viver acima de todos os temores, contudo,
tal temor deve obrigatoriamente originar-se de um coração ho­
nesto e bom. Somente em um coração assim tal temor pode estar
firmado; só um coração assim pode ser perturbado por esse temor.
Tal temor é um sentimento natural. Quando nos lembramos
da história passada de nossa vida, o que somos capazes de ver
nela senão um triste registro de fracassos? Nos pontos onde jul­
gávamos que éramos fortes, foi justamente ali que se comprovou
sermos mais fracos; onde julgávamos ter feito o melhor, foi onde
fizemos o pior. E nos conhecemos muito bem quanto ao passado,
ao ponto de crermos que seremos bem capazes de qualquer lou­
cura ou fracasso no futuro.
Nesse caso, o mesmo mal que produz a nossa tribulação
pode igualmente produzir o seu antídoto. Pois de tudo isso pode­
rá derivar-se uma santa desconfiança de nós mesmos, o que é um
sentimento seguro e proveitoso, distinto de qualquer sentimento
de desconfiança em Deus. Por outro lado, trata-se de um senti­
mento que nos lança nos braços de Deus; e, ao assim fazermos,
encontramos a paz.
Provavelmente esse temor se origina muito mais do senso
de que jaz diante de nós o desconhecido — o desconhecido acerca
tanto das tentações que nos assaltarão como acerca de nossa pró­
pria debilidade. Sempre temeremos o desconhecido. Mas, teremos
de conviver sempre com o desconhecido a nossa frente. Ninguém
pode dizer o que o dia de amanhã trará.
Há duas maneiras de enfrentarmos o desconhecido — ou

negando-nos terminantemente a pensar no mesmo, ou pensando
no desconhecido, ao mesmo tempo em que deixamos tudo aos
cuidados de nosso Pai.
Na realidade, talvez nos sintamos muito débeis em nossas
horas finais de vida neste mundo; mais débeis do que fomos antes.
E também podemos ser mais fortemente tentados do que nunca.
Nesse último caso, da mesma maneira que pudemos enfrentar mui­
tos fatores desconhecidos no passado, conforme eles foram apare­
cendo, assim também podemos crer que enfrentaremos com cora­
gem, o desconhecido, quando ele surgir em cena. Alguns dizem
que a distância empresta encanto à paisagem; mas a distância tam­
bém nos aterroriza. Ora, Deus vê o futuro, incluindo tanto a nossa
fraqueza como as tentações que nos assediarão. E, quando essas
coisas nos sobrevierem, descobriremos que Deus também terá vin­
do com elas.
A Palavra de Deus não visa a despertar em nós o temor,
pois é uma Palavra que dissipa o temor. Não há dúvida de que
Deus nos adverte sobre nós mesmos — quanto as nossas fraque­
zas, a nossa nulidade, a nossa total inclinação para a queda —
mas isso serve apenas para impedir que nos firmemos sobre a ba­
se errada do nosso próprio "eu" e da nossa própria força. "Aque­
le, pois, que pensa estar em pé, veja que não caia" (I Coríntios
10:12). Entretanto, uma vez que abandonarmos nossa base pró­
pria, não haverá mais qualquer menção de debilidade. Eis o que
a Palavra nos recomenda: "...sede fortalecidos no Senhor e na força
do seu poder" (Efésios 6:10). "O Senhor é a minha força e o meu
cântico, porque ele me salvou" (Salmos 118:14). Maior é Aquele
que está conosco, do que aqueles que nos são contrários.
Uma das utilidades da Palavra de Deus consiste em elevar-
nos acima das nossas próprias forças, transferindo-nos para uma
base inteiramente nova, tirando-nos deste mundo onde imperam
os temores, e firmando-nos os pés na pátria onde impera a fé.
Em certo sentido, esses temores têm alguma razão de ser,
sempre que se derivarem de nossa estimativa do próprio "eu". Po­
rém, em outro sentido, estão totalmente equivocados, e, à seme­
lhança de todas as coisas que incorrem em erro, devem exercer
somente uma influência perturbadora. Ora, Deus não quer que
fiquemos sujeitos a qualquer influência que nos perturbe. Assim
sendo, cumpre entrarmos decisivamente no terreno básico da fé
pura, onde nos encontraremos com o Senhor. É Ele quem dissipa
todos os nossos temores.

Algumas vezes tememos falhar no exercício da fé, como
se, chegado o momento de ser submetida à prova a nossa longa­
mente professa confiança, sejamos achados em falta. No entanto,
a fé é um dom de Deus. Por qual motivo nosso Pai arrebataria
o Seu dom da fé precisamente nessa oportunidade, no momento
exato em que mais precisamos exercê-la?
Doutras vezes, pensamos que falharemos quanto à paciên­
cia que deveríamos exercer — que a dor ou a exaustão física pos­
sam levar-nos a dizer, ou a fazer, aquilo que não convém,
impedindo-nos de descansar tranqüilamente sob os cuidados do
Pai.
Acresça-se a isso o fato que geralmente pensamos que fi­
caremos aquém daquilo que se espera de nós, e que quanto a essa
questão do conforto — serão retiradas aquelas consolações de
que agora desfrutamos. Ou então, mesmo quando não o sejam,
não seremos capazes de nos apropriarmos delas. E assim prosse­
guem as nossas apreensões, até que vemos o futuro inteiro envol­
vido na mais negra melancolia.
Ponhamos um ponto final em pensamentos desse tipo. Eles
têm a forte tendência de se espalharem e de enegrecerem todo
o nosso horizonte. E assim, imaginamos para nós mesmos um fu­
turo negro. Não é esse o futuro que Deus determinou para nós;
esse é apenas o futuro imaginado por nossos próprios corações
sem fé.
O que nos compete fazer é isto: devemos deixar nosso fu­
turo nas mãos de Deus — nosso futuro terá de ser planejado e
executado por Deus. Nossos pensamentos confortadores devem
provir de pensamentos relacionados ao Senhor.
Consideremos este como um primeiro pensamento confor­
tador: Se entregarmos a honra de Deus aos Seus cuidados, no que
se refere a nós, então Ele tomará conta da mesma. Em parte alguma
a honra divina poderá ser tão bem resguardada como quando é
deixada aos cuidados dEle. Assim sendo, bem poderíamos dizer:
"Opera em favor da Tua própria honra, ó meu Pai, ó Senhor Altís­
simo, guardando-me em minhas últimas horas, com suas fraque­
zas e tensões peculiares, sem importar quais sejam elas. Não me
permitas desonrar as Tuas promessas, ou a Tua fidelidade, descon­
fiando delas. Naquela oportunidade, oculta-me na palma de Tua
mão". E a honra de Deus será preciosa aos olhos dEle; e Ele se
lembrará da confiança que nEle tivermos posto. E ainda que nos
tenhamos esquecido da honra divina, o próprio Deus jamais se

olvidará dela. Seu poder se aperfeiçoa em nossa fraqueza (ver II
Coríntios 12:9).
Consideremos um outro pensamento consolador. "Para
Deus, o fim não é igual ao princípio?" Se, visando à Sua própria
honra, Ele primeiro nos atraiu para fora deste mundo e para a co­
munhão com Ele mesmo, com qual finalidade tê-lo-ia feito senão
para que pertencêssemos a Ele? A proteção final será para Ele
mais difícil do que a atração inicial? Já passamos por diversas
experiências com o Seu poder; e podemos estar certos de que o
Seu braço não se encolheu, de forma a não mais poder salvar.
Consideremos que o mesmo Deus é quem nos assistirá em
nossa debilidade final, tal e qual Ele sempre fez, em todas as nossas
debilidades passadas. Tudo quanto teremos de fazer então será
repousar em Seus braços. Para nós, isso equivale a obter a força
do Senhor. De nada adianta Deus ser forte, a menos que Ele seja
forte em nosso favor.
Portanto, o que nos convém fazer é contemplarmos o pró­
prio Deus, por inteiro, nesta cena — é contemplá-Lo em ação, em
nosso benefício; é considerarmo-nos não como aqueles que sus­
tentam, e, sim, como aqueles que são sustentados.
Certifique-se que essa sensibilidade de coração, no tocan­
te à possibilidade de alguém vir a desonrar a Deus de algum modo,
em seus últimos momentos de vida — por meio da incredulidade,
ou do temor, ou de qualquer outro fator — serve, por si mesma,
de bendito sinal e testemunho de que isso não sucederá conosco.
Deus mostrar-se-á terno e meigo para com aqueles que se mos­
trarem sensíveis para com a Sua honra. Aqueles que quiserem glori-
ficá-Lo, haverão de poder glorificá-Lo. É possível que tenhamos
de dizer, enquanto estivermos descansando passivamente sob os
cuidados de Sua mão, permitíndo-Lhe que Ele faça tudo em nos­
so lugar: ". . . tu, porém, guardaste o bom vinho até agora" (João
2:10). E, no fortalecimento e no júbilo que então haverá, nossas
últimas palavras sobre a terra haverão de bendizer o Seu nome.
E, mesmo depois de termos falecido, nosso testemunho continuará
falando, dizendo a outros que não devem temer qualquer mal;
pois, na última hora, Deus estará com eles. Seu cajado e Sua vara
os consolarão.

CONFORTO DIANTE DA IDÉIA
QUE PARTIREMOS DAQUI
O título deste capítulo diz: "partiremos daqui". Eu pode­
ria ter preferido o título "Conforto Diante da Idéia que Morrere­
mos". Porém, o vocábulo "morrer" está envolvido em uma tão den­
sa nuvem de terrores, e com tantas idéias falsas, que preferi usar
a palavra "partir", em lugar de "morrer".
Quando pensamos em partir deste mundo, é natural que
nos subam à mente todas as formas de pensamentos melancólicos.
Com a morte associamos a dor, a angústia, a separação, a solidão,
a alienação e o temor do desconhecido.
Muitos, até mesmo dentre os filhos de Deus, precisam ser
consolados pelo fato de terem de partir deste mundo.
Um grande conforto quanto a isso consiste em crermos que
Deus fez o melhor arranjo possível, no tocante a todos os aspectos
dessa partida. Não se trata de algum arranjo feito por nós mesmos,
ou por algum parente ou pessoa querida; mas de um arranjo pro­
videnciado por Aquele que, desde o princípio, planejou todas as
coisas. Aquele que determinou os movimentos de todos os cor­
pos celestes, e os relacionamentos entre todas as coisas que há
no mundo — tempos e estações, verão e inverno, nuvens e luz
solar — Aquele que continua ativo em todas as coisas pertinen­
tes à vida, mostra-se ativo também em todas as coisas vinculadas
àquilo que denominamos "morte".
Meu primeiro grande conforto, pois, deriva-se da idéia de
que foram feitos os melhores arranjos possíveis para tudo quanto
está ligado à minha partida deste mundo.
Muitas poderão ser as necessidades daquela ocasião, que
só são realmente conhecidas por Um, que é Deus. Ora, Aquele
que sabe quais serão essas necessidades também á Aquele que

proverá o suprimento para essas necessidades.
A pequenina criança que é enviada a este mundo, tão es­
tranho para ela, é precedida pelas provisões divinas dAquele que
a enviou. E aqueles que são enviados pelo mesmo Deus, para um
outro mundo, não recebem cuidados inferiores aos daquela
criança.
Ora, se Deus é quem está ordenando todas as coisas, en­
tão bem poderíamos deixar tudo aos Seus cuidados. É Ele quem
conhece as necessidades na estrada pela qual teremos de cami­
nhar. Assim, ao deixarmos tudo aos Seus cuidados, isso nos serve
de plena garantia. Grande parte das dificuldades que temos de
enfrentar nesta vida deriva-se das manifestações da nossa incre­
dulidade, as quais nos levam a tentar fazer tudo por nós mesmos,
ao invés de permitirmos que nosso Deus cuide de todas as coisas.
Porém, sob nenhuma circunstância cabe-nos fazer qualquer coisa.
Por esse motivo, preocupar-nos com tal realização é uma demons­
tração de insensatez.
Tranqüilize-se, pois, tendo consciência de que tudo já foi
arranjado a seu favor. Não se perturbe nem com as coisas primá­
rias e nem com as coisas secundárias da jornada. Seu Pai celeste
já providenciou tudo que é necessário.
Esse Pai é o próprio Deus. Todo o Seu poder, bondade, sa­
bedoria e amor atuam em nosso benefício. Ele opera por meio
de Cristo. E Cristo, que partiu pessoalmente deste mundo, sabe
tudo a respeito de partidas. Assim sendo, podemos dizer com o
salmista: "Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não
temerei mal nenhum, porque tu estás comigo: a tua vara e o teu
cajado me consolam" (Salmos 23:4).
É privilégio do crente recusar-se a pensar sobre qualquer
coisa ligada à morte, desvinculando-se de tudo, mantendo-se tran­
qüilo, crendo que Deus se mostrará à altura da tarefa de conduzi-lo
através dessa experiência, confiando que não haverá nenhum er­
ro ou fracasso em Seus propósitos devido ao Seu amor. Por certo,
isso não envolve um conforto de segunda categoria.
Consideraremos agora as nossas idéias sobre o tema.
Por muitas vezes, as coisas tornam-se importantes para nós,
devido à maneira como pensamos sobre elas, ou ao muito pen­
sar que lhes dedicamos.
É por isso que a maneira dos homens pensarem na morte
a torna tão melancólica. Eles ligam a morte à dor, à separação
entre a alma e o corpo, à solidão, à frieza, à vida que continua

fora do sepulcro, e a muitas outras idéias tão lúgubres quanto essas.
Ao invés disso, devemos treinar nossas mentes para idéias
bem diferentes.
Contrário ao que muitos supõem, a alma não é rasgada
para fora do corpo. Quantas mortes ocorrem sem dor! quantas
mortes se parecem com o sono! e por quantas vezes, conforme
temos podido observar, ao chegar o momento da partida, desce
sobre a pessoa um estranho senso de resignação, de tranqüilida­
de, um sereno encanto, que parece apossar-se de quem está pres­
tes a sair do mundo!
Também há muitas mortes que as pessoas costumam des­
crever como "mortes violentas". Antes de tudo, porém, os médi­
cos afiançam que aquilo que parece um tão intenso sofrimento,
não é nada disso para o próprio paciente. Mesmo que assim não
fosse, o mais provável é que a dor não seja mais intensa do que
as dores comuns da vida diária.
Tenha a esperança de que dormiremos em Jesus, de que
partiremos daqui em paz, à parte dessas considerações. Não sa­
bemos em qual momento exato, durante o sono, abandonaremos
a realidade terrena. Mas é ali que praticamente morremos para
a realidade. Não sentiremos o momento da partida.
Algumas vezes penso que a partida da alma para fora do
corpo será mais gradual do que supomos — talvez seja um pro­
cesso mais fugidio do que costumamos imaginar.
Velejando, de certa feita, para um lugar distante, enquan­
to as praias de minha terra gradualmente sumiam no horizonte,
lembro-me que me pus a meditar: "Talvez assim me sucederá tam­
bém, quando eu estiver morrendo!" A alma talvez vá se libertan­
do pouco a pouco de sua tenda terrestre, antes do instante fatal.
Chegado aquele instante, talvez haja apenas um tênue fio a ser
rompido — sim, talvez nada haja que possa ser corretamente des­
crito pela palavra "romper". Ao contrário, talvez a praia deste mun­
do vá retrocedendo lentamente, em que os objetos deste mundo
vão se tornando gradualmente indistintos, ao passo que os obje­
tos do outro mundo se vão tornando cada vez mais claros. Rara­
mente cruzo até à ilha de Wight, sem que essa idéia me suba à
mente. Vejo que a praia que deixei para trás se vai tornando mais
e mais indistinta, ao mesmo tempo que a margem para a qual me
dirijo vai ficando cada vez mais clara diante de meus olhos. E então
digo para mim mesmo: "Talvez suceda algo similar a isso, quando
eu tiver de partir daqui". Portanto, digamos: "Eu dormirei em Jesus".

Nem ao menos precisamos temer o estranho e o desconhe­
cido. O bebezinho que chega a este mundo, inteiramente novo
para ele, não tem medo — tudo lhe é estranho e desconhecido;
mas nem por isso nasce aterrorizado.
Procuremos conceber o tempo de nossa partida deste mun­
do com noções assim. Estaremos indo para a companhia de nosso
Pai celeste. Tudo foi providenciado para nós por nosso Pai. Nosso
Pai está em tudo. Estamos nos dirigindo para um lugar determi­
nado, para a companhia de pessoas amigas, para a vida real. Um
lar, e não uma sepultura, é o fim da nossa vida terrestre. Partiremos
daqui não para estarmos "mortos", segundo alguns equivocada­
mente dizem, e, sim, para realmente começarmos a viver.

Embora os períodos de enfermidade forneçam-nos tempo
para meditar, a tendência natural dos nossos pensamentos
pode não ser muito confortante. As enfermidades podem pôr
um fim às atividades que antes tanto apreciávamos.
Elas nos tornam dependentes de outras pessoas.
E os sentimentos de dor, de inutilidade ou de ansiedade
quanto ao futuro, podem tornar-se dolorosamente reais.
A fim de poder ajudar àqueles que se acham enfermos,
o autor não subestima a força desses empecilhos ao conforto.
Longe de oferecer conselhos superficiais, a posição assumida
pelo autor é de que não se pode obter qualquer consolo a
menos que, em primeiro lugar, haja um autêntico
conhecimento sobre nós mesmos, e, em segundo lugar,
um correto conhecimento a respeito de Deus.
O alvo principal do autor foi o de declarar como esse conhe­
cimento precisa ser orientado, e mostrar como a fé no caráter
e na presença de Deus elimina a necessidade
do sofrimento ser uma experiência tenebrosa.
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