sua presença. Mas o mais estranho em tudo isso é que fui
me acostumando com a aparição do bicho, passei até a
observá-lo; ele sempre lento, ameaçador, inoportuno, e
quase, diria, íntimo. Algum tempo se passou e resolvi
botar um ponto final naquilo, afinal, a casa é minha! Ora,
se não mandar em minha casa, o que me sobra? E tem
mais! Se a casa é minha, as sombras da casa também são
só minhas! Resolvi que se ele era o rei das sombras, então
eu deveria ser mais que isso... deveria mostrar ao monstro
que aquela escuridão tinha dono, e este não era ele! Foi
então que decidi, antes da noite esticar seu véu preto e
misterioso, que deveria alojar-me naquele cômodo, que é
o mais escuro da casa, e ali aguardar que tudo ficasse em
sombras. Ele então surgiria, mas desta vez os papéis se
inverteriam e o intruso saberia, finalmente, quem
mandava. E assim foi. Deixei acesa a luz do abajur de
leitura para atraí-lo e fiquei em meu canto no escuro.
Quando a noite já ia alta ele surgiu, sempre calmo,
seguro, arrogante. Ao não me ver na cadeira voltou-se de
supetão, mas seu olhar, sempre tão amedrontador, deu
com o meu. Meus olhos eram sanguíneos, bem abertos,
donos de si... Desarmado pela surpresa, o monstrengo deu
sinais de medo, isso mesmo, medo. Movi-me lentamente
em sua direção, tinha em meus olhos o brilho sinistro do
assassino, do matador... um grande e assustador
exterminador vindo das sombras, das suas sombras, só
suas, de mais ninguém! O intrujão, então, amedrontado
pela presença inusitada, procurou abrigo junto à tímida
luz do abajur, em seguida deitando-se no chão e ficando
de barriga para cima. Agora se refestelava e grunhia feito
um pequeno bichano a pedir carinho. Senti pena. Acabei
desarmado em meus instintos e quando dei por mim
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