Educação Infantil: Práticas Cotidianas

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About This Presentation

Este material traz uma coletânea de três textos. Os assuntos contemplados são essenciais ao trabalho de qualquer professor: A Organização do Tempo e do Espaço, Planejamento e Avaliação.


Slide Content

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EDUCAÇÃO INFANTIL:
ABORDAGENS CURRICULARES
Organização do Tempo
e do Espaço na Educação
infantil – Pesquisas e Práticas
Maévi Anabel Nono
UNESP – Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas
Departamento de Educação
São José do Rio Preto
O dia a dia das creches e pré-escolas é repleto de atividades organizadas por educa-
dores que, de uma maneira ou de outra, lidam com o espaço e o tempo a todo o momento.
Como organizar tempos de brincar, de tomar banho, de se alimentar, de repousar de crianças
de diferentes idades nos espaços das salas de atividades, do parque, do refeitório, do ba-
nheiro, do pátio? É tarefa dos educadores organizar o espaço e o tempo das escolas infantis,
sempre levando em conta o objetivo de proporcionar o desenvolvimento das crianças.
Maria Carmen Silveira Barbosa e Maria da Graça Souza Horn pesquisam a organiza-
ção do espaço e do tempo na escola infantil e afirmam:
Organizar o cotidiano das crianças da Educação Infantil pressupõe pensar
que o estabelecimento de uma sequência básica de atividades diárias é,
antes de mais nada, o resultado da leitura que fazemos do nosso grupo de
crianças, a partir, principalmente, de suas necessidades. É importante que
o educador observe o que as crianças brincam, como estas brincadeiras
se desenvolvem, o que mais gostam de fazer, em que espaços preferem
ficar, o que lhes chama mais atenção, em que momentos do dia estão mais
tranquilos ou mais agitados. Este conhecimento é fundamental para que a
estruturação espaço-temporal tenha significado. Ao lado disto, também é
importante considerar o contexto sociocultural no qual se insere e a pro-
posta pedagógica da instituição, que deverão lhe dar suporte. (BARBOSA;
HORN, 2001, p. 67).
Para as pesquisadoras, no que se refere à organização das atividades no tempo, nas es-
colas de Educação Infantil, são necessários momentos diferenciados, organizados de acordo
com as necessidades biológicas, psicológicas, sociais e históricas das crianças (menores ou

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maiores). Nesse sentido, a organização do tempo nas creches e pré-escolas deve considerar
as necessidades relacionadas ao repouso, alimentação, higiene de cada criança, levando-se
em conta sua faixa etária, suas características pessoais, sua cultura e estilo de vida que traz
de casa para a escola (BARBOSA; HORN, 2001).
Assim como o tempo, o espaço também deve ser organizado levando-se em conta o ob-
jetivo da Educação Infantil de promover o desenvolvimento integral das crianças. Maria da
Graça Souza Horn ajuda-nos a pensar sobre esse tema. A partir de suas pesquisas, escreve:
O olhar de um educador atento é sensível a todos os elementos que estão
postos em uma sala de aula. O modo como organizamos materiais e mó-
veis, e a forma como crianças e adultos ocupam esse espaço e como inte-
ragem com ele são reveladores de uma concepção pedagógica. Aliás, o que
sempre chamou minha atenção foi a pobreza frequentemente encontrada
nas salas de aula, nos materiais, nas cores, nos aromas; enfim, em tudo que
pode povoar o espaço onde cotidianamente as crianças estão e como pode-
riam desenvolver-se nele e por meio dele se fosse mais bem organizado e
mais rico em desafios. (HORN, 2004, p. 15).
Horn acrescenta:
As escolas de educação infantil têm na organização dos ambientes uma
parte importante de sua proposta pedagógica. Ela traduz as concepções
de criança, de educação, de ensino e aprendizagem, bem como uma visão
de mundo e de ser humano do educador que atua nesse cenário. Portanto,
qualquer professor tem, na realidade, uma concepção pedagógica explici-
tada no modo como planeja suas aulas, na maneira como se relaciona com
as crianças, na forma como organiza seus espaços na sala de aula. Por
exemplo, se o educador planeja as atividades de acordo com a ideia de que
as crianças aprendem através da memorização de conceitos; se mantém
uma atitude autoritária sem discutir com as crianças as regras do convívio
em grupo; se privilegia a ocupação dos espaços nobres das salas de aula
com armários (onde somente ele tem acesso), mesas e cadeiras, a concep-
ção que revela é eminentemente fundamentada em uma prática pedagó-
gica tradicional. Conforme Farias (1998), a pedagogia se faz no espaço
realidade e o espaço, por sua vez, consolida a pedagogia. Na realidade, ele
é o retrato da relação pedagógica estabelecida entre crianças e professor.
Ainda exemplificando, em uma concepção educacional que compreende
o ensinar e o aprender em uma relação de mão única, ou seja, o professor
ensina e o aluno aprende, toda a organização do espaço girará em torno da

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figura do professor. As mesas e as cadeiras ocuparão espaços privilegiados
na sala de aula, e todas as ações das crianças dependerão de seu comando,
de sua concordância e aquiescência. (HORN, 2004, p. 61).
Diante das análises de Maria da Graça, como pensar a organização dos espaços nas
creches e pré-escolas?
Alguns educadores e pesquisadores têm voltado sua atenção para a organização dos
espaços para o cuidado e educação de bebês. Cândida Bertolini e Ivanira B. Cruz enfatizam
que “Os espaços e objetos de uma creche devem estar a favor do desenvolvimento sadio dos
bebês, propiciando-lhes experiências novas e diversificadas” (ROSSETTI-FERREIRA et al,
2007, p. 149).
Maria A. S. Martins, Cândida Bertolini, Marta A. M. Rodriguez e Francisca F. Silva,
no capítulo intitulado “Um lugar gostoso para o bebê”, publicado na obra de Rossetti-Ferreira
et al, (2007) observam que, normalmente, o espaço destinado aos bebês na grande parte das
creches é tomado por berços, restando poucas possibilidades para que os pequenos explorem
o ambiente e se locomovam por toda parte, com segurança. As educadoras pensaram em
uma organização espacial diferente desta, na tentativa de proporcionar aos bebês um espaço
atraente para seu desenvolvimento.
Para elas, “O berçário deve ter espaços programados para dar à criança oportunidade
de se movimentar, interagindo tanto com objetos como com outros bebês. Deve oferecer ao
bebê situações desafiadoras, possibilitando o desenvolvimento de suas capacidades.” (ROS-
SETTI-FERREIRA et al, 2007, p. 147).
As educadoras Maria, Cândida, Marta e Francisca pensaram o espaço de seu berçário,
levando em conta três partes da sala: o chão, o teto e as paredes. Em cada uma dessas par-
tes, elas enxergaram possibilidades de garantir experiências interessantes e desafios para as
crianças, por meio do uso de divisórias de diversos tamanhos e em diversas alturas, caixas de
papelão recortadas e transformadas, brinquedos, canaletas para os bebês passarem por den-
tro, muretas para impedi-los de seguir em frente e obrigá-los a experimentar outros trajetos,
cortinas, espelhos, móbiles etc.
Ainda a respeito do espaço para os bebês, as educadoras alertam: “Os espaços devem
ser sempre atraentes e estimulantes para os bebês. Portanto, eles devem ser observados, ava-
liados e mudados pelos educadores na medida em que eles se desenvolvem e se interessam
por coisas novas.” (ROSSETTI-FERREIRA, 2007, p. 148).
As educadoras trazem ainda algumas sugestões para pensarmos acerca do espaço para
os bebês nas creches. Segundo elas, a partir da observação de sua própria prática, percebe-

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ram que
[...] existe uma boa forma de arrumar o berçário, organizando-o com col-
chonetes, caixas vazadas, móveis baixos, que permitem ao educador ob-
servar todo o movimento da sala e o bebê também. Dessa forma, o bebê
pode tranquilamente ir em busca de um objeto que tenha despertado sua
curiosidade, pois ele está vendo que o educador continua na sala. Isso pos-
sibilita a ele interagir mais com outros bebês. O educador fica então dis-
ponível para aqueles que estão exigindo sua atenção naquele momento.
(ROSSETTI-FERREIRA, 2007, p. 147)
Lendo o capítulo “Espaço que dê espaço”, escrito por Lilian Pacheco S. Thiago (2006),
no qual ela relata suas experiências de estágio com crianças de onze meses a um ano e três
meses, notamos suas conquistas ao reorganizar o espaço dos bebês de uma escola de Educa-
ção Infantil. Indo ao encontro das reflexões feitas pelas educadoras Maria, Cândida, Marta e
Francisca, Lilian desenvolve o projeto “Criando... e recriando espaços” e percebe que
[...] é preciso oferecer espaços com propostas diferenciadas, situações di-
versificadas, que ampliem as possibilidades de exploração e ‘pesquisa’ in-
fantis. As crianças realmente ampliaram suas possibilidades de exercitar a
autonomia, a liberdade, a iniciativa, a livre escolha, quando o espaço está
adequadamente organizado. Percebi, também, que poderia ficar mais livre
para atendê-las individualmente, conforme suas necessidades, para obser-
vá-las e conhecê-las melhor. Dessa forma, ainda, poderia me envolver com
um pequeno grupo de crianças, propondo uma atividade específica, como
na situação relatada anteriormente, quando me pus a brincar de carro com
uma caixa de papelão com algumas crianças, enquanto outras se envol-
viam com diferentes objetos e lugares na sala. (THIAGO, 2006, p. 60)
Lilian compartilha conosco as formas como reorganizou os espaços oferecidos aos
bebês da sala onde realizou seu estágio do curso de Pedagogia e oferece algumas ideias
importantes para o uso adequado dos espaços como parceiros do professor e da professora
de Educação Infantil no desenvolvimento das crianças. Lendo a forma como ela descreve o
espaço que reorganizou, tente imaginar como ficou a sala dos bebês:
O espaço da casinha; as tentativas de organizar zonas circunscritas uti-
lizando bancos, mesas, prateleiras de plástico colorido com gavetas para
pino de encaixe; o balcão baixo de madeira formando uma divisória; os
colchonetes; o painel com gravuras de animais conhecidos (cavalo, gato,
pássaros, cachorro, leão, peixe etc.); o espelho com duas poltroninhas ou
almofadas em frente, sobre o tapete (espaço de busca de identidade) – tudo

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isso permitiu gostosa movimentação pela sala. As crianças andavam de
um lado para outro, ora em busca de um objeto, ora de outro; ora apon-
tando os dedinhos para as gravuras, mostrando conhecer algo que ali se
apresentava. [...] Em outra ocasião, coloquei sobre as mesas, no centro da
sala, livros de história, revistas infantis e outras revistas e fiquei a observá-
-las. Algumas pegaram livros e foram se sentar sobre os colchonetes para
folheá-los à sua maneira; outras manuseavam os livros na própria mesa;
outras crianças preferiram buscar brincadeiras alternativas que o espaço
lhes oferecia intencionalmente. Não é possível pretender que as crianças
pequenas façam tudo ao mesmo tempo ou que todas façam a mesma coisa
ao mesmo tempo. (THIAGO, 2006, p. 59)
Conseguiram ir imaginando como ficou o espaço organizado por Lilian? Ao organizar
as zonas circunscritas, Lilian se fundamenta nas contribuições de Mara Campos de Carva-
lho e Renata Meneghini, presentes no capítulo intitulado “Estruturando a sala”, publicado
no livro “Os fazeres na Educação Infantil” (ROSSETTI-FERREIRA et al., 2007). Vocês já
ouviram falar de zonas circunscritas? Quem já atua na Educação Infantil certamente ouviu
falar de “cantos”. A organização de “cantinhos” nas salas de Educação Infantil é bastante
discutida hoje nas creches e pré-escolas. Muitos educadores tentam organizar suas salas em
cantos de atividades diversificadas, mas, nem sempre essa organização está fundamentada
em uma concepção de criança e de educação que a sustente. Então, os cantos acabam não
funcionando, e sendo deixados de lado, substituídos pela organização anterior, muitas vezes
pautada no uso do espaço que coloca o professor ou a professora no centro das atenções, com
as crianças em volta deles na maior parte do tempo.
Então, vamos tratar um pouco mais das zonas circunscritas, para entendermos melhor
o que fundamenta a organização espacial que se vale dessas áreas delimitadas. Carvalho e
Meneghini (2007) enfatizam que “O educador organiza o espaço de acordo com suas idéias
sobre desenvolvimento infantil e de acordo com seus objetivos, mesmo sem perceber” (p.
150). Quando o educador ou a educadora de Educação Infantil organiza sua sala em espaços
vazios, com poucos móveis, objetos e equipamentos, ele se vale, conforme escrevem as edu-
cadoras na obra de Rossetti-Ferreira et al. (2007) de um arranjo espacial aberto.
Para as educadoras Mara e Renata, nesse tipo de arranjo acontece aquilo que des-
crevemos no parágrafo anterior, ou seja, a maioria das crianças fica em volta do educador,
solicitando sua atenção, sem ter outra atividade a fazer. Dessa forma, “O educador acaba não
tendo muita chance de manter um contato mais prolongado com nenhuma criança. Às vezes
nem pode atender a todas, mesmo que rapidamente” (ROSSETTI-FERREIRA et al., 2007,
p. 150).

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É claro que, muitas vezes, o professor ou a professora desejam reorganizar o espaço de
sua sala mas encontram alguns obstáculos como falta de recursos, falta de apoio da equipe
gestora da escola, condições inadequadas da própria escola de Educação Infantil. Mas, em
muitos casos, há mesmo uma lacuna na formação do professor que o impede de pensar a or-
ganização de sua sala em termos de um arranjo espacial semi-aberto. Nesse tipo de arranjo,
sugerido por Mara Campos de Carvalho e Renata Meneghini na obra “Os fazeres na Educa-
ção Infantil”, são utilizados móveis baixos para formar cantinhos ou zonas circunscritas, que
“[...] são áreas delimitadas em três ou quatro lados, com uma abertura para a passagem, onde
cabem com conforto cerca de seis crianças” (p. 151).
Conforme explicam Mara e Renata,
A característica principal das zonas circunscritas é seu fechamento em
pelo menos três lados, seja qual for o material que o educador coloca lá
dentro, ou que as próprias crianças levam para brincar. Dessa maneira, vo-
cês pode delimitar essas áreas usando mesinhas ou cadeirinhas. Elas tam-
bém podem ser constituídas por caixotes de madeira ou cabaninhas, desde
que contenham aberturas. As cabaninhas podem ser criadas aproveitando
o espaço embaixo de uma mesa e colocando por cima um pano que caia
para os lados, contendo uma abertura, tipo porta. As cortinas também po-
dem ser úteis para delimitar um ou dois lados. É importante que a criança
possa ver facilmente a educadora, senão ela não ficará muito tempo dentro
dessas áreas circunscritas. (ROSSETTI-FERREIRA et al, 2007, p. 151)
Quando as crianças brincam nas zonas circunscritas, ficam mais tempo interagindo
com outras crianças e com a atividade que está sendo ali realizada. Solicitam menos a aten-
ção do educador que, dessa forma, pode acompanhar o desenvolvimento das diversas crian-
ças, focalizando ora uma, ora outra, se desejar, observando se os materiais oferecidos estão
atendendo aos objetivos que deseja alcançar em termos de desenvolvimento de cada criança,
em particular, e do grupo todo, de modo geral, percebendo o momento de reorganizar ou
modificar os cantos propostos para motivar mais as crianças e proporcionar a elas novas
aprendizagens.
Mara Campos de Carvalho, no capítulo “Por que as crianças gostam de áreas fecha-
das?”, da obra de Rossetti-Ferreira et al. (2007), observa que a zona circunscrita oferece pro-
teção e privacidade para as crianças, de modo que elas ficam mais atentas na atividade e no
comportamento dos colegas, envolvendo-se por mais tempo nas brincadeiras proporcionadas
pelo canto organizado pelo professor ou professora.

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ABORDAGENS CURRICULARES
Agora, também é importante que os professores e professoras de Educação Infantil
saibam que as crianças precisam aprender a trabalhar com zonas circunscritas, especialmen-
te se já estavam habituadas a trabalhar no arranjo espacial aberto, com o educador sempre
dirigindo as atividades, sempre interferindo diretamente nas suas ações e relações com os
colegas e o ambiente.
A educadora Mara também alerta os professores e professoras da Educação Infantil
para o fato de que, mesmo no arranjo espacial semi-aberto, as áreas circunscritas não de-
vem tomar todo o espaço das salas das creches e pré-escolas. Outras áreas que não sejam
necessariamente delimitadas por três ou quatro lados também devem ser oferecidas para as
crianças como, por exemplo, espaços com mesinhas e cadeiras para execução de atividades
de colagem, pintura, lápis e papel, espaços sem delimitação com almofadas e tapetes para
leitura de livros de histórias.
Ainda contribuindo para que professores e professoras pensem sobre o espaço que
oferecem para as crianças em creches e pré-escolas, a educadora Mara Campos de Carvalho
(ROSSETTI-FERREIRA et al, 2007) faz algumas análises dos ambientes infantis e conclui
que eles devem estar organizados de modo a promover o desenvolvimento da identidade
pessoal de cada criança, o desenvolvimento de diversas competências como, por exemplo,
poder tomar água sozinha e alcançar o interruptor de luz, oportunidades para movimentos
corporais diversos, a estimulação dos sentidos, a sensação de segurança e confiança e, final-
mente, oportunidades para contato social e privacidade.
Paulo de Camargo (2008) analisa os “Desencontros entre Arquitetura e Pedagogia”
em reportagem na qual conversa com arquitetos e educadores sobre os espaços nas escolas
de Educação Infantil. Os arquitetos entrevistados por Paulo de Camargo ressaltam a neces-
sidade de que as creches e pré-escolas sejam construídas levando-se em conta que elas serão
ocupadas e utilizadas por crianças.
Um dos arquitetos entrevistados, Paulo Sophia, esclarece que, para conceber uma es-
cola, tenta se colocar no lugar da criança, procurando notar como ela irá olhar ou perceber
o espaço. Para esse arquiteto, as crianças têm uma relação própria com o espaço, bastante
diferente daquela dos adultos.
Outra arquiteta entrevista por Paulo de Camargo é Ana Beatriz Goulart de Faria, en-
volvida com diversos projetos de arquitetura educativa. Ana Beatriz observa que na maioria
dos municípios brasileiros, os espaços de Educação Infantil seguem modelos-padrão ela-
borados muito longe daqueles territórios, desconsiderando sua geografia, sua história, sua
cultura, suas políticas para a infância. Para ela, “São projetos-modelo elaborados para uma
infância sem fala” (CAMARGO, 2008, p. 46).

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Paulo de Camargo também entrevista a arquiteta Adriana Freyberger, segundo a qual
é preciso que se dê mais atenção aos espaços da escola de Educação Infantil que vão além
da sala de atividades. Pátios e refeitórios devem ser cuidadosamente organizados, já que são
espaços de aprendizagem.
Para Adriana, pensar o espaço significa pensar além da estrutura física. É preciso,
segundo ela, planejar os materiais, jogos e brinquedos adequados ao projeto pedagógico da
instituição. A arquiteta ressalta a importância do uso de materiais de qualidade nas creches
e pré-escolas e da atenção ao número adequado de crianças para cada espaço, evitando-se o
excesso de crianças por sala.
Para finalizar esse texto sobre a organização do tempo e do espaço nas creches e pré-
-escolas, vejamos a fala transcrita a seguir que expressa a opinião da arquiteta Ana Beatriz
Goulart de Faria (entrevistada por Paulo de Camargo).
Os espaços de nossa infância nos marcam profundamente. Sejam eles ber-
ço, casa, rua, praça, creche, escola, cidade, país, sejam eles bonitos ou
feios, confortáveis ou não, o fato é que influenciam definitivamente nossa
maneira de vermos o mundo e de nos relacionarmos com ele. (CAMAR-
GO, 2008, p. 45)
Vocês concordam com a arquiteta Ana Beatriz? Quais espaços marcaram a sua infân-
cia? Como eram esses espaços? Por quais motivos foram marcantes? Quais lembranças esses
espaços trazem para vocês? Nada melhor que finalizar a leitura deste texto com estas refle-
xões. Pensem também em como vocês lidavam com o tempo na sua infância. Havia tempos
marcados para determinadas atividades ao longo do dia? Estas reflexões sobre o espaço e o
tempo em sua infância devem sempre estar presentes nas suas reflexões sobre o espaço e o
tempo que devemos, como professores e gestores, proporcionar para as crianças nas creches
e pré-escolas.
Referências
BARBOSA, M. C. S.; HORN, M. G. S. Organização do espaço e do tempo na escola infantil. In: CRAIDY, C.;
KAERCHER, G. E. Educação Infantil. Pra que te quero? Porto Alegre: Artmed, 2001, p. 67-79.
CAMARGO, P. Desencontros entre Arquitetura e Pedagogia. Revista Pátio Educação Infantil, Porto Ale-
gre, ano VI, n. 18, p. 44-47, nov. 2008.
ROSSETTI-FERREIRA, M. C. et al. (Org.). Os fazeres na Educação Infantil. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2007.
HORN, M. G. S. Sabores, cores, sons, aromas. A organização dos espaços na Educação Infantil. Porto Ale-
gre: Artmed, 2004.
THIAGO, L. P. S. Espaço que dê espaço. In: OSTETTO, L. E. (Org.). Encontros e encantamentos na Edu-
cação Infantil: partilhando experiências de estágios. Campinas: Papirus, 2006, p. 51-62.
Saiba Mais
Saiba Mais

Planejar para aprender. Aprender para
planejar
Beatriz Ferraz
*
Frente ao desafio de escre-
ver um artigo sobre o plane-
jamento na Educação Infan-
til, me vi inquieta buscando
uma forma de introduzir este
tema de maneira agradável
e com a devida valorização
que merece.
Poderia iniciar escrevendo
sobre a importância do pla-
nejamento na ação do edu-
cador, mas achei que não
seria uma boa alternativa já
que esta é uma afirmação
tão conhecida. Por onde co-
meçar? Começo, então, por
um registro de uma educa-
dora que relata a contribui-
ção que a prática de planejar
trouxe para a sua ação edu-
cativa junto às crianças.
“Trabalho com uma turma
de crianças de 4 anos e
pretendia realizar com elas
um estudo sobre peixes.
O exercício de planejar a
atividade que desperta-
ria nas crianças o interesse
pelo tema foi de fundamen-
tal importância para que eu
pudesse rever tudo o que
estava imaginando fazer. A
primeira atividade represen-
taria o grande disparador
para o trabalho que faríamos.
Senti uma profunda neces-
sidade de pensar como o
projeto deveria ser realizado.
Então sentei e escrevi um
planejamento:
Nome da atividade: Quais
os peixes que queremos es-
tudar.
Contexto da atividade:
Conversa para iniciar um es-
tudo com as crianças sobre
alguns peixes.
Objetivo da atividade (o
que quero que as crianças
aprendam):
- Escolher os peixes que
gostariam de estudar;
- Levantar algumas pergun-
tas que gostariam de ver
respondidas sobre os pei-
xes escolhidos;
- Indicar alguns materiais
que poderíamos usar para
buscar informações.
Conteúdo da atividade (o
que preciso ensinar):
- Elaboração de perguntas;
- Fontes de informação;
- Nome de alguns peixes.
Encaminhamento da ati-
vidade (como desenvolver a
atividade com as crianças):
Levar para a roda alguns li-
vros com imagens de peixes.
Perguntar às crianças quais
peixes conhecem e, desses,
quais gostariam de estudar.
Listar em uma folha os peixes
sugeridos pelas crianças e,
se for o caso, fazer uma vota-
ção para escolhermos alguns.
Perguntar a elas o que gos-
tariam de saber sobre estes
animais. E, por fim, perguntar
às crianças onde poderíamos
encontrar informações para
responder as perguntas.
Estava muito satisfeita com
o meu planejamento! A minha
surpresa foi quando inicia-
mos o projeto e as coisas não
saíram como o esperado!
Quando mostrei os livros
para elas e perguntei quais
peixes elas queriam estudar,
apontavam aleatoriamente
as imagens de peixes dos
livros. Sendo assim, iam vi-
rando as páginas e dizendo
que queriam saber sobre to-
dos eles! Além disso, quan-
do perguntei o que queriam
saber, me disseram coisas
como “Quantos olhos eles
têm? Ele tem boca?...”. E
ainda para finalizar, quando
perguntei sobre onde en-
contro as informações, me
disseram que poderia ser
nestes livros mesmo que eu
havia levado.
Fiquei super frustrada!
Senti que as crianças não
* Beatriz Ferraz é psicóloga e doutoranda em Educação pela PUC-SP. Coordena Projetos de formação continuada em Educação Infantil junto a diversas prefei-
turas e dirige a Escola de Educadores.
artigo
revista criança25

se envolveram, que não se
comprometeram com a mi-
nha proposta e que estavam
respondendo às minhas per-
guntas sem muita considera-
ção, esperando que aquela
atividade acabasse logo e
que pudessem ir brincar.
Depois de muito lamentar,
tomei uma decisão: voltar ao
meu planejamento e pensar
o que tinha de errado para
produzir tal desastre!
Foi justamente nesta reto-
mada que me dei conta de
algumas coisas:
1. Se pretendia fazer
uma atividade que
despertasse o interes-
se, era importante que
o foco dela estivesse
em uma motivação.
Sendo assim, não po-
deria ter como obje-
tivo que as crianças
aceitassem pronta-
mente a minha proposta e
a partir daí respondessem
a todas as minhas soli-
citações. Pude perceber
que no planejamento não
estava considerando as
características do pensa-
mento infantil e, portan-
to, não havia conseguido
fazer uma boa condução
da atividade de modo que
ficassem interessadas na
minha proposta.
2. Também pude me dar
conta de que para que as
crianças pudessem for-
mular boas perguntas que
justificassem uma busca
de informações em dife-
rentes fontes era impor-
tante que elas pudessem
primeiro saber algo sobre
os peixes e a partir des-
te conhecimento pode-
riam levantar suposições
ou mesmo comparações
entre as informações que
tinham gerado o interesse
por novos conhecimen-
tos. As perguntas que as
crianças fizeram podiam
ser respondidas com uma
simples observação das
imagens dos livros e este
era um equívoco meu de
não considerar que eu
precisava ajudá-las a for-
mular questões e, para
isso, precisaria fazer algu-
ma atividade que as aju-
dassem nesta tarefa.
Com estas constatações
fui buscar ajuda das minhas
colegas de trabalho e de mi-
nha diretora para pensar em
outra atividade que pudesse
gerar melhores resultados. A
partir das sugestões que re-
cebi, passei um vídeo que
falava sobre o fundo do mar
apresentando alguns peixes
e algumas informações sobre
eles. As crianças adoraram
e ficaram completamente
envolvidas com as imagens
e as informações que rece-
beram. Quando terminamos
de assistir, tinham muita cla-
reza dos peixes que queriam
pesquisar e tinham pergun-
tas muito interessantes, que
puderam conceber a partir
daquilo que viram e ouviram.
Perguntaram coisas como:
“Porque o peixe espada tem
este nome?”; “Quantas per-
nas tem o polvo?”, “Por que
tem peixe que come peixe?
Os peixes ficam grávi-
dos?” Agora sim, tínha-
mos perguntas que pre-
cisavam de uma pesquisa
para serem respondidas.
Fiquei muito contente
com o novo rumo que
tomou meu trabalho com
as crianças. Sei que foi
graças ao planejamento
feito e depois reelaborado
que pude aprender coisas
tão importantes sobre a re-
lação ensino-aprendizagem
e principalmente, sobre as
boas ações do educador que
favorecem aprendizagens
significativas às crianças!”
A reflexão desta educadora
sobre o uso do planejamen-
to como um instrumento que
nos ajuda a adequar melhor
nossas ações e com isto pro-
piciar uma aprendizagem de
qualidade às crianças nos traz
muitas informações sobre o
quê significa planejar, para
que planejar e como planejar.
artigo
26revista criança
“Também aprendemos
que o planejamento
favorece a reflexão
sobre a prática
educativa...”

artigo
A primeira questão que po-
demos aprender com ela é
que o planejamento precisa
fazer sentido para o profes-
sor, pois ele é um instrumen-
to que visa ajudar e facilitar
a sua prática. Ao planejar,
antecipamos uma série de
acontecimentos que podem
ocorrer na ação e nos prepa-
ramos para lidar com eles, di-
minuindo assim a quantidade
de imprevistos e tornando as
nossas ações mais precisas
e de melhor qualidade.
Também aprendemos que
o planejamento favorece
a reflexão sobre a prática
educativa e, dessa forma,
funciona também como um
instrumento de aprendiza-
gem. Quando planejamos,
tomamos uma série de de-
cisões e fazemos uma série
de relações entre conheci-
mentos teóricos/científicos
e conhecimentos práticos de
nossa experiência pessoal e
profissional. Vejamos alguns
exemplos:
A frase inicial do item 1
deve ser mantida pois ela
explicita bem a idéia que a
autora quer marcar.
1. A partir do plano curricular
da instituição, que ajuda o
professor a guiar sua prá-
tica com as crianças, ele
escolhe, durante o plane-
jamento, quais as melho-
res estratégias para colo-
car em ação cada um dos
conteúdos que pretende
ensinar.
2. Ao realizar o exercício de
pensar sobre as estraté-
gias e os conteúdos de
ensino, o professor preci-
sa pensar sobre quem é
a criança com a qual tra-
balha, quais são as suas
necessidades, seus inte-
resses, suas motivações.
A partir desta reflexão terá
maior clareza em seu pla-
nejamento para decidir o
encaminhamento da ativi-
dade.
3. Ao considerar como irá
conduzir uma atividade
e quais os conhecimen-
tos que pretende ensinar,
exercício propiciado pelo
planejamento, o professor
também tem que compre-
ender como se ensinam
os diferentes conteúdos.
Para cada um deles, ou
para cada bloco deles, há
estratégias que se ade-
quam melhor. Com isto,
aprende mais sobre como
ensinar, pois pode genera-
lizar o que aprende com a
atividade planejada para
outras situações que vi-
vencia diariamente na ins-
tituição.
Por fim, podemos também
aprender com o exemplo
desta educadora sobre como
analisamos e como aprende-
mos com o planejamento.
Quando o professor escolhe
uma atividade para realizar
com as crianças tem que ter
clareza de suas intenções
com ela para que possa ade-
quar suas ações e alcançar
os objetivos propostos. Sen-
do assim, ao conceber um
planejamento é importante
destacar:
1. O que eu quero com esta
atividade.
2. O que eu quero que as
crianças aprendam com
esta atividade.
3. O que eu preciso ensi-
nar para que as crianças
aprendam.
4. Como eu devo desenvol-
ver a atividade (incluindo
antecipar ações e falas,
os materiais que preten-
do utilizar e a organização
do espaço), para que as
crianças construam os sa-
beres propostos.
Todos os itens que fazem
parte do planejamento de-
vem ter coerência entre si.
Ou seja, depois de planejar,
posso voltar ao que escrevi
e questionar: Com isto que
direi às crianças estou aju-
dando elas a aprenderem
aquilo que espero? Toman-
do o exemplo da educadora
acima, se quero que as crian-
ças formulem boas questões
para iniciar uma pesquisa,
será que a melhor alternativa
é começar pelas perguntas?
Com tantas possibilidades
de reflexão, de construção
de conhecimento sobre a
prática, não há como negar a
importância do planejamen-
to na atuação do professor
de Educação Infantil. Não é
mesmo?
revista criança27

revista criança
caleidoscópio
Avaliação sempre envolve uma
concepção de mundo
Claudia de Oliveira Fernandes
*
“...Mal Alecrim segurou a maria-mole, percebeu como era incrivelmente macia. E cheirosa.
Levou-a para seu cantinho na biblioteca, sentou-se em cima dela, pulou, e aprovou.
– Agora, tenho um ótimo travesseiro.
Na manhã seguinte, acordou com a cabeça cheia de açúcar e coco ralado.
– Que maravilha! – deslumbrou-se. – Vai me dar pensamentos doces. – Deu uma lambida na
ponta dos cabelos. – Hummm! E é uma delícia também. Nunca tive um travesseiro tão bom.”
Rosa Amanda Strausz
Alecrim, Ed. Objetiva, 2003
Um certo olhar
A personagem Alecrim en-
tende que terá sonhos doces
ao dormir com um travesseiro
de maria-mole. E você, gosta
de maria-mole? Você teria um
travesseiro em que, ao acordar
pela manhã, seu cabelo esti-
vesse cheio de açúcar e coco
ralado? Depende do ponto de
vista, não? Alguns odiariam a
idéia, outros, como Alecrim,
achariam o máximo! Com a
avaliação acontece a mesma
coisa: depende do ponto de
vista!
A concepção que o profes-
sor possui sobre a função da
avaliação depende de sua
história de vida, de suas lem-
branças escolares, de suas ex-
pectativas em relação às suas
crianças, de sua perspectiva
teórica, da maneira como se
percebe na profi ssão.
Ora, se a Educação Infantil
tem por função primeira so-
cializar, inserir nossas crian-
ças no mundo que as cerca
de maneira criativa, compro-
missada, responsável, bem
como perpetuar e criar conhe-
cimentos e culturas, como si-
tuar a avaliação escolar nessa
perspectiva?
Fala-se muito acerca de
uma avaliação que não pode
ser excludente, classifi catória,
que selecione, segregando as
crianças e separando aque-
las que prometem uma vida
escolar de sucesso das que
estariam fadadas ao fracasso,
que infelizmente, não só es-
taria reservado à vida escolar
do aluno, mas também a toda
sua experiência de vida futura.
Uma marca que o tempo nem
sempre consegue desfazer.
No entanto, até que ponto,
nós professores, refl etimos
sobre nossas ações cotidia-
nas na escola, nossas prá-
ticas em sala de aula, sobre
a linguagem que utilizamos,
aquilo que pré-julgamos?
Nossas práticas estão imbuí-
das de ações que fazem parte
de nossa cultura, de nossas
crenças, e que expressam um
“certo modo” de ver o mundo.
* Doutora em educação pela PUC-Rio. Professora Adjunta da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro/UNIRIO. Realiza pesquisa na área de avaliação escolar, políticas educacionais em avaliação e orga-
nização da escolaridade em ciclos. Participou da elaboração da proposta de avaliação do PROINFANTIL.
Esse “certo modo” de ver o
mundo ainda está muito im-
pregnado pela lógica da clas-
sifi cação e da seleção, no que
tange à avaliação.
Um exemplo: as notas co-
locam os avaliados em uma
situação classifi catória, certo?
A partir desta classifi cação,
podemos separar os melhores
dos piores classifi cados. Em
termos de educação escolar,
os melhores seguirão em fren-
te, os piores voltarão para o
início da fi la, refazendo todo o
caminho percorrido ao longo
de um ciclo de estudos.
Podemos encontrar escolas
privadas de Educação Infantil
que, para terem maior “legiti-
midade” e gozarem de maior
“credibilidade” junto aos pais
e à sociedade, adotam um
sistema de avaliação nesse
segmento, no qual as crianças
recebem uma nota e realizam
provas! Isso é muito estranho,
ou pelo menos incoerente, se
pensarmos que queremos que
nossas crianças possam gos-
tar de descobrir o mundo má-
9

10revista criança
gico do conhecimento e que
aprendam que vão à escola
para ter prazer, para aprender
sem que para isso precisem
receber um prêmio.
Para se discutir mudanças
no que tange à avaliação, an-
tes de se propor métodos e
alterações práticas, é preciso
pensar no papel social que
tem a escola, a pré-escola e
a creche, bem como a pro-
fi ssão de professor. Ninguém
dirá que a função da escola é
selecionar, classifi car, excluir.
Ninguém ousaria, entenden-
do a educação escolar como
um bem universal, dizer que
a escola deveria fi car apenas
com os melhores. Parece que
temos claro qual é nosso pa-
pel e a função social da insti-
tuição a qual nos vinculamos
profi ssionalmente. No entan-
to, concordando com Sacristán
(2001) é necessário desvelar o
óbvio para resignifi car o papel
da escola e do ensino públi-
co como um bem universal. É
fundamental que a discussão
acerca da função social da es-
cola seja colocada novamente,
entre nós educadores, a fi m de
reafi rmarmos os valores para
os quais ela foi criada. A partir
daí, então, podemos começar
a discutir todos os elementos
do currículo/proposta peda-
gógica, inclusive a avaliação.
Os princípios
Ora, se pensar sobre avalia-
ção implica repensar o papel
social da escola e da profi s-
são de ser professor, estamos
falando, portanto, de alguns
princípios que devem nortear
a avaliação. Eles não devem
ser diferentes daqueles que
orientam as práticas e as nos-
sas crenças acerca do papel
da escola e da instituição de
Educação Infantil na vida das
crianças, de suas famílias e da
sociedade.
Gostaria de destacar alguns
princípios que, a meu ver, de-
veriam ser norteadores de
uma avaliação na instituição
de Educação Infantil. São eles:
caleidoscópio
o olhar observador, a promo-
ção das crianças e de suas
aprendizagens, a valorização
das experiências culturais das
crianças, o desenvolvimen-
to da autonomia, a inclusão,
o diálogo, a preservação da
auto-estima favorável ao cres-
cimento, o comprometimento
da escola e do professor com
o social, o caráter formativo da
avaliação, a auto-avaliação, a
participação, a construção da
responsabilidade com o cole-
tivo.
Uma mudança na escola,
em direção a práticas mais
democráticas de avaliação e,
portanto, não classifi catórias
ou segregadoras, não passa
inicialmente, por mudanças
de métodos ou didáticas mais
contemporâneos. Uma mu-
dança profunda implica em
uma refl exão acerca dos prin-
cípios que regem nossa ação
pedagógica e que nos darão
a base para a construção de
nosso projeto pedagógico e
para os processos de avalia-
ção que estiverem aí inseri-
dos. A clareza e a retidão de
princípios poderão nortear
uma prática coerente e própria
de uma escola ou instituição
democrática, compromissada
com o crescimento e a valo-
rização das crianças, profes-
sores, educadores e funcioná-
rios.
Uma avaliação formativa
A Educação Infantil tem
uma prática de avaliação for-
mativa. O que signifi ca isto?
Muitos autores já conceitu-

11revista criança
aram esse tipo de avaliação.
Podemos entender que a ava-
liação formativa é aquela em
que o professor está atento
para os processos e apren-
dizagens de suas crianças.
O professor não avalia com
o propósito de dar uma nota.
A avaliação acontece, pois se
entende que ela é essencial
para dar prosseguimento aos
percursos de aprendizagem.
Continuamente, ela faz par-
te do cotidiano das tarefas
propostas, das observações
atentas do professor, das prá-
ticas de sala de aula. Por fim,
podemos dizer que avaliação
formativa é aquela que orienta
as crianças para a realização
de seus trabalhos e de suas
aprendizagens, ajudando-as
a localizar suas dificuldades e
suas potencialidades, redire-
cionando-as em seus percur-
sos. Perrenoud (1999, p.143)
define a avaliação formativa
como uma avaliação que aju-
da a criança a aprender e o
professor a ensinar.
Considerando que a cons-
trução da autonomia é um
dos princípios que orientam a
Educação Infantil, apontamos
que um aspecto fundamental
de uma avaliação formativa
diz respeito à construção da
autonomia por parte da crian-
ça, na medida em que lhe é
solicitado um papel ativo em
seu processo de aprender. Ins-
taurar uma cultura avaliativa,
no sentido de uma avaliação
entendida como parte ineren-
te do processo e não desvin-
culada para uma atribuição
de nota, não é tarefa muito
fácil. Contudo, sabemos que
na Educação Infantil os pro-
fessores, de um modo geral,
realizam uma avaliação muito
próxima da formativa, dado
que exercem uma avaliação
mais contínua dos processos
das crianças, desvinculada
da necessidade de pontuá-la
com indicadores numéricos
ou de outra ordem, para fins
de aprovação. As práticas
avaliativas na Educação In-
fantil, de modo geral, primam
pela lógica da inclusão das
crianças com vistas à sua
permanência e continuidade
nas creches, pré-escolas e
escolas de Educação Infantil.
Dessa forma, podemos con-
cluir reafirmando que:
1. É fundamental transformar
a prática avaliativa em prática
de aprendizagem.
2. Avaliar é necessário e
condição para a mudança de
prática e continuidade do co-
nhecimento.
3. Avaliar faz parte do pro-
cesso de ensino e de apren-
dizagem: não ensinamos sem
avaliar, não aprendemos sem
avaliar. Dessa forma, rompe-
se com a falsa dicotomia en-
tre ensino e avaliação, como
se esta fosse apenas o final
de um processo.
Assim como Alecrim, pode-
mos e devemos romper com
o que está instituído. Dormir
em travesseiro de maria-mole
pode ser muito gostoso. Rom-
per com amarras, com o que
já está pré-estabelecido, com
práticas antigas que só são
coerentes com uma escola de
décadas passadas, com uma
perspectiva seletiva e, por-
tanto, com uma concepção
de avaliação classificatória,
faz parte do compromisso do
educador desse início de sé-
culo. Falar em avaliação im-
plica, antes de se pensar em
como avaliar, refletir acerca
do porquê e para que avaliar.
Será que sabemos para que
avaliamos?
Referências Bibliográficas
PERRENOUD, P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens, entre duas lógicas.
Porto Alegre: Artmed Editora 1999.
SACRISTÁN, G. A Educação Obrigatória - seu sentido educativo e social. Porto Alegre: Artmed
Editora 2001.
caleidoscópio

Adrianne Ogêda Guedes
*
12revista criança
Para abrir nosso diálogo,
vale discutir o sentido de ava-
liar na educação. A avaliação
estará presente o tempo todo
em nossa prática educativa,
inclusive nos momentos de
inserção de novas crianças e
ao longo de nossos planeja-
mentos. A cada decisão que
tomamos, a cada escolha que
fazemos - desde uma ativida-
de que planejamos, até a for-
ma com que lidamos com as
crianças - estamos avaliando.
A avaliação é, portanto, um
ato que sugere movimento,
refl exão e transformação.
É importante ressaltar que a
avaliação não é um instrumen-
to para medir o quanto a crian-
ça aprendeu nem tampouco é
uma forma de julgar, reprovar
ou aprovar uma criança. A ava-
liação, que de fato contribui
para o crescimento da criança
e para o trabalho do professor,
precisa ser mediadora e aco-
lhedora. É ela que possibilitará
o acompanhamento da crian-
ça em todos os momentos
vividos na Educação Infantil,
contribuindo com seu avanço
na ampliação do conhecimen-
to de si e do mundo.
Acompanhar o desenvol-
vimento da criança ajuda o
professor a rever e aprimorar
seu trabalho. Neste sentido
avaliar a criança nos leva tam-
bém a avaliar nossa própria
ação pedagógica e também a
instituição na qual estamos in-
seridos. Afi nal, avaliar é o mo-
vimento de pensar tudo que
envolve nossa prática e bus-
car caminhos de torná-la cada
vez mais coerente e mais con-
textualizada.
A professora Jussara
Hoffmann – muito conhecida
por suas pesquisas sobre o
tema da avaliação educacional
– afi rma que: “A avaliação
deve ser entendida como
uma prática investigativa e
não sentenciva, mediadora e
não constatativa. Não são os
julgamentos que justifi cam
a avaliação, as afi rmações
inquestionáveis sobre o que a
criança é ou não é capaz de
fazer.” (2000: 15). Portanto,
não devemos avaliar as
crianças para classifi cá-las,
julgando o que sabem ou não
sabem fazer, padronizando
comportamentos, constatando
apenas as suas “capacidades”,
quantifi cando seus saberes
e apontando seus erros. Sua
história deve ser considerada,
as conquistas valorizadas, as
descobertas apreciadas. Para
Hoffmann, a avaliação é uma
forma de conhecer/investigar
o movimento das crianças e,
a partir desta investigação,
pensar formas de intervenção
que possam favorecer o
desenvolvimento e a ampliação
dos conhecimentos da criança.
Avaliar é comprometer-se com
a criança, seu sucesso e suas
conquistas.
Por isso, é fundamental es-
tudarmos mais sobre o desen-
volvimento infantil. Muitas ve-
zes as crianças com as quais
trabalhamos nos surpreendem
com respostas inusitadas que
nos mostram o quanto elas
pensam sobre o mundo à sua
volta, bem como as ligações
entre os diversos conheci-
mentos que vão construindo
na relação com os elementos
da cultura, com seus parceiros
e com o ambiente. A escuta
do ponto de vista da criança
é, portanto, fundamental! Ela
nos revela muito, por um lado,
sobre quem é aquela criança,
quais são as suas vivências e
experiências e, por outro, so-
bre a lógica infantil.
*
Diretora pedagógica da Casa Monte Alegre Educação Infantil (RJ), professora do curso de Especialização
“Educação Infantil: Perspectivas de Trabalho em Creches e Pré-escolas” da PUC-RJ e doutoranda em Edu-
cação da Universidade Federal Fluminense. Participou da elaboração de textos para o PROINFANTIL.
Elaboração e organização de instrumentos de
acompanhamento e avaliação da aprendizagem
e desenvolvimento das crianças
caleidoscópio

As falas de nossas crianças
nos fornecem preciosas pistas
sobre suas hipóteses, suas
idéias próprias e, partindo do
que elas pensam, podemos
desafi ar o avanço de seus co-
nhecimentos com atividades
interessantes e instigantes. Tal
qual “detetives”, precisamos
olhar, escutar, observar com
atenção o que nossas crian-
ças demonstram, o que lhes
chama a atenção. Isto nos for-
nece elementos não só para
compreender mais sobre cada
uma delas, mas também para
que possamos planejar nosso
trabalho. Se soubermos os
interesses, curiosidades, dú-
vidas, difi culdades de nossas
crianças, podemos pensar em
propostas que vão ao encon-
tro delas.
Um aspecto signifi cativo da
prática avaliativa é o registro
(escrito, fotográfi co, ou outro).
Registrar o vivido pela criança
permite que acompanhemos
suas conquistas e avanços.
É importante termos em vista
que não podemos nos base-
ar apenas na nossa memória,
porque ela é muitas vezes fa-
lha. Se não registramos nos-
sas experiências corremos o
risco de esquecer detalhes
preciosos do vivido!
A escrita, registro mais co-
mumente utilizado na escola,
é um excelente recurso para
ampliar à refl exão. Não de-
vemos escrever para “prestar
contas” aos pais ou à institui-
ção. É claro que, para os pais,
os relatórios das crianças são
excelentes instrumentos para
que eles conheçam mais so-
bre seu fi lho e sobre o trabalho
que estamos desenvolvendo,
mas isso não quer dizer que
escrevemos para mostrar “o
quanto fi zemos” nem para in-
dicar “o que a criança sabe ou
não sabe”.
Registrar por escrito nossas
experiências e as observa-
ções sobre as crianças permi-
te que possamos refl etir sobre
nossa prática, revendo nos-
sos atos, organizando idéias
e experiências, mapeando as
dúvidas, relacionando o que
vivemos com as teorias. Cecília
Warschauer, professora e edu-
cadora, acredita que o registro é
uma forma de retratar a histó-
ria vivida, de deixar marcas. É
um instrumento que favorece
a refl exão (1993: 61) e o apri-
moramento do professor.
A refl exão é o repensar a
ação pedagógica num tempo
posterior a ela. Neste momen-
to, o professor se distancia
do imediatamente vivido, po-
dendo, com essa distância,
olhar para seus atos de uma
outra forma. É por meio deste
repensar que vamos revendo
os caminhos trilhados, plane-
jando os próximos passos e
articulando os objetivos mais
gerais da Educação Infantil e a
realidade concreta de nossas
crianças.
Se surgem curiosidades so-
bre algum assunto por parte
das crianças, se registramos
suas perguntas, podemos, em
outro momento, buscar fontes
de consulta para alimentar o
trabalho. O professor não pre-
cisa ter todas as respostas!
Ele é na verdade um pesqui-
sador que vai buscando dia-
a-dia ampliar também seus
recursos e conhecimentos,
junto com suas crianças. O
professor é alguém que ques-
tiona, que organiza o grupo
em torno das necessidades
e curiosidades que surgem.
Mais experiente, vai sugerindo
caminhos, desdobramentos,
desenvolvimentos a partir das
idéias e sugestões infantis.
Enfi m, avaliar é abrir uma ja-
nela para compreender mais
profundamente nossas crian-
ças e a nós mesmos. Assim
teremos recursos para apri-
morar a educação e fazê-la
mais e mais uma experiência
rica e signifi cativa para crian-
ças e professores.
revista criança13
Referências Bibliográfi cas:
ESTEBAN, Maria Teresa (org.).
Avaliação: uma prática em bus-
ca de novos sentidos. Rio de Ja-
neiro: Editora DP& A, 2000.
HOFFMANN, Jussara. Avaliação
na pré-escola: um olhar refl exi-
vo sobre a criança. Porto Alegre:
Editora Mediação, 2000.
FREIRE, Madalena. A Paixão de
conhecer o mundo. Rio de Janei-
ro: Paz e Terra, 1983.
OSTETTO. Luciana Esmeralda.
Deixando Marcas... A prática do
registro no cotidiano da educa-
ção infantil. Florianópolis: Editora
Cidade Futura, 2001.
WARSCHAUER, Cecília. A roda
e o registro, uma parceria entre
professor, alunos e conhecimen-
to. Rio de Janeiro: Editora Paz e
Terra, 1993.
caleidoscópio
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