PARA COMEÇAR A FALAR PARA COMEÇAR A FALAR
DE TEXTODE TEXTO
KELLEN BONELLI
TEXTO DESCRITIVO
Segundo Othon M. Garcia (1973), "Descrição é a
representação verbal de um objecto sensível
(ser, coisa, paisagem), através da indicação dos
seus aspectos mais característicos, dos
pormenores que o individualizam, que o
distinguem."
Apreendemos o mundo com nossos sentidos e
transformamos nossa percepção em palavras.
Das diferenças de sensibilidade de cada
observador decorre o predomínio da
abordagem objetiva ou subjetiva.
Descrição objetiva
Na descrição objetiva não mostramos as
nossas impressões pessoais, descrevemos
o elemento da forma real que nos permite
vê-lo.
Observe, neste trecho do romance Dom
Casmurro, de Machado de Assis, uma descrição
objetiva de Capitu:
“Não podia tirar os olhos daquela criatura de
quatorze anos, alta, forte e cheia, apertada em
um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos
grossos, feitos em duas tranças, com as pontas
atadas uma à outra, à moda do tempo, desciam-
lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes,
nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo
largo.”
Descrição subjetiva
Na descrição subjetiva acabamos
retratando
o objeto de acordo com nosso ponto de
vista, ou seja, envolvemo-nos
emocionalmente, expressando o nosso
ponto de vista.
Veja um exemplo retirado do livro Inocência, do autor
Taunay.
““Caía então luz de chapa sobre ela, iluminando-lhe o rosto, Caía então luz de chapa sobre ela, iluminando-lhe o rosto,
parte do colo e da cabeça, coberta por um lenço vermelho parte do colo e da cabeça, coberta por um lenço vermelho
atado atrás da nuca.atado atrás da nuca.
Apesar de bastante descorada e um tanto magra, era Apesar de bastante descorada e um tanto magra, era
Inocência de beleza deslumbrante.Inocência de beleza deslumbrante.
Do seu rosto irradiava singela expressão de Do seu rosto irradiava singela expressão de
encantadora ingenuidade, realçada pela meiguice do olhar encantadora ingenuidade, realçada pela meiguice do olhar
sereno que, a custo, parecia coar por entre os cílios sedosos sereno que, a custo, parecia coar por entre os cílios sedosos
a franjar-lhe as pálpebras, e compridos aponto de a franjar-lhe as pálpebras, e compridos aponto de
projetarem sobras nas momosas faces.projetarem sobras nas momosas faces.
Era o nariz fino, um bocadinho arqueado; a boca Era o nariz fino, um bocadinho arqueado; a boca
pequena, e o queixo admiravelmente torneado.”pequena, e o queixo admiravelmente torneado.”
Como se descreve
De acordo com os objetivos de quem escreve, a
descrição pode privilegiar diferentes aspectos:
• pormenorização – corresponde a uma
persistência na caracterização de detalhes;
• dinamização – é a captação dos movimentos
de objetivos e seres;
• impressão – são os filtros da subjetividade, da
atividade psicológica, interpretando os elementos
observados.
Descrição de pessoas
Cabelos Compridos
_ Coitada da Das Dores, tão boazinha...
Das Dores é isso, só isso – boazinha. Não possui outra qualidade. É feia, é
desengraçada, é inteligente, é magérrima, não tem seios, nem cadeiras, nem
nenhuma rotundidade posterior; é pobre de bens e de espírito; é filha daquele
Joaquim da Venda, ilhéu de burrice ebúrnea – isto é, dura como o marfim. Moça que
não tem por onde se lhe pegue fica sendo apenas isso – boazinha.
_ Coitada da Das Dores, tão boazinha...
Só tem uma coisa a mais que as outras – cabelo. A fita da sua trança toca-lhe a barra
da saia. Em compensação, suas idéias medem-se por frações de milímetro, tão
curtinhas são. Cabelos compridos, idéias curtas – já o dizia Schopenhauer.
A natureza pôs-lhe na cabeça um tablóide homeopático de inteligência, um grânulo de
memória, uma pitada de raciocínio – e plantou a cabeleira por cima. Essa
mesquinhez por dentro. Por fora ornou-lhe a asa do nariz com um grão de ervilha,
que ela modestamente denomina verruga, arrebitou-lhes as ventas, rasgou-lhe boca
de dimensões comprometedoras e deu-lhe uns pés...Nossa Senhora, que pés! E
tantas outras pirraças lhe fez que ao vê-la todos dizem comiserados:
_ Coitada da Das Dores, tão boazinha...
(Monteiro Lobato)
b) Descrição de objetos:
Originariamente tem suas raízes na terra. Gosta de sentir o cheiro
gostoso da terra molhada e da chuva caindo, fina e renovada. Nessas
ocasiões se transforma a cada dia que passa. É muito útil, importante
e possui até árvore genealógica. Sua casa tem um aspecto áspero e
lembra muito uma caixinha de violino. Nenhum carpinteiro consegue
copiar essa construção, que pode abrigar de dois a três habitantes,
confortavelmente. Excepcionalmente pode abrigar mais de três
moradores e isso chama muito a atenção. Os habitantes dessa casa
são muito apreciados. Costumam freqüentar bares e restaurantes.
Nessas ocasiões recebem uma fina camada de maquiagem e tornam-
se sofisticados. Outras vezes, servem de companhia a boêmios até
alta madrugada ou a cinéfilos inveterados. Se possuem algum dom
musical, estes estão restritos ao mundo da ficção. Entretanto podem
provocar êxtase nos amantes, levando-os a ouvir sinfonias inteiras.
c) Descrição de ambientes:
Cidadezinha cheia de graça...
Tão pequenina que até causa dó...
Com seus burricos a pastar na praça...
Sua igrejinha de uma torre só...
Nuvens que vêm, nuvens e asas,
Não param nunca, nem um só segundo...
E fica a torre, sobre as velhas casas,
Fica cismando como é vasto o mundo !
Eu que de longe venho perdido,
Sem pouso fixo (a triste sina! ),
Ah, quem me dera ter lá nascido !
Lá toda a vida poder morar !
Cidadezinha... Tão pequenina
Que toda cabe num só olhar !
(Mário Quintana)
ELEMENTOS PREDOMINANTES NA
DESCRIÇÃO
• Frases nominais (sem verbo) ou orações
em que predominam verbos de estado ou
condição
“Sol já meio de esguelha, sol das três horas. A
areia, um borralho de quente. A caatinga, um
mundo perdido. Tudo, tudo parado: parado e
morto”.(Mário Palmério)
•Frases enumerativas: seqüência de nomes,
geralmente sem verbo
“A cama de ferro; a colcha branca, o travesseiro
com fronha de morim. O lavatório esmaltado, a
bacia e o jarro. Uma mesa de pau, uma cadeira
de pau, o tinteiro, papéis, uma caneta. Quadros
na parede.” (Érico Veríssimo)
•Adjetivação: caracterizadores qualificando
nomes
A pele da cabocla era desse moreno enxuto e
parelho das chinesas. Tinha uns olhos graúdos,
lustrosos e negros como os cabelos lisos, e um
sorriso suave e limpo a animar-lhe o rosto oval
de feições delicadas. (Érico Veríssimo)
•Figuras de linguagem: recursos expressivos,
geralmente em linguagem conotativa. As mais
usadas na descrição são a metáfora, a
comparação, a prosopopéia, a onomatopéia e
a sinestesia.
“O rio era aquele cantador de viola, em cuja alma
se refletia o batuque das estrelas nuas, perdidas
no vácuo milenarmente frio do espaço...Depois ele
ia cantando isso de perau em perau, de cachoeira
em cachoeira... “
•Sensações: sinestesia
“Os sons se sacodem, berram...Dentro dos sons movem-
se cores, vivas, ardentes...Dentro dos sons e das cores,
movem-se os cheiros, cheiro de negro...Dentro dos
cheiros, o movimento dos tatos violentos,
brutais...Tatos, sons, cores, cheiros se fundem em
gostos de gengibre...” (Graça Aranha)
Não se esqueça, então, de que:
b)Percebemos ou observamos com todos os
sentidos, e não apenas com os olhos;
c)Descrever não é enumerar o maior número
possível de detalhes, mas assinalar os
traços mais singulares, mais salientes; é
fazer ressaltar do conjunto uma impressão
dominante e singular;
d)A descrição serve como plano de fundo
para a construção de outros textos;
e)A descrição também é um texto que
expressa o ponto de vista do autor.