Saci Pererê, vulgo Perê, volta com a pulga atrás da orelha. Que ele viu os caras entrarem na
pedra, isto ele viu! Fumava há bastante tempo, sabia muito bem separar o que era alucinação do que
era real. E o que ele viu era real! Os dois caras, um garoto e um rapaz de pernas tortas, literalmente
ENTRARAM na pedra!
...
A descida era interminável! Cadu ainda não tivera chance de cuspir a bala de estranho sabor.
Não era doce, nem azeda, nem salgada, nem amarga... Mas tinha um gosto! Ele não saberia explicar
qual, mas tinha! Uma palavra lhe surgiu na cabeça. Ele tentou afastar como absurda, mas não
conseguiu: a bala tinha um gosto de “verde”! Gosto de “verde”? Sim, agora estava claro: a bala
tinha “gosto de verde”!
A descida só não se dava em completo breu porque uma luz alaranjada parecia vir do fundo
daquele poço, ladeado pela escada em espiral.
- Põe a mão na parede, vai se sentir mais seguro!
A parede parecia ser de granito, também esculpida em rocha sólida. Mesmo material da
escadaria. Estava úmida, aqui e ali aparecia um pouco de limo. Mas, apesar disto, os degraus
permaneciam incrivelmente secos! Logo Cadu descobriu o porquê: entre a parede e a escada em
espiral havia sido escavada uma pequena valeta, que acumulava a água que escorria pelas paredes e
a levavam diretamente para baixo, preservando secos os degraus de granito. “Por que aqui embaixo
tudo parece ser de granito, se a pedra por onde entrei era bem negra?”, ele pensou. Bom, era nua
nova, a noite estava bem escura. Provavelmente a pedra só parecia negra naquelas condições de
fraca iluminação. Continuou descendo...
O estranho vigiava Cadu o tempo todo, desconfiado de algo. Enfim Cadu aproveitou um
momento de distração e cuspiu a “bala verde”. Mas, embora não a tendo engolido, uma sonolência
seguida da clara impressão de que as paredes se moviam e respiravam indicava que o pouco do que
consumiu fez algum efeito. Desabou desacordado. Felizmente o seu acompanhante, atento, o
segurou. Colocou-o dentro de um saco de estopa que trazia escondido, e continuou descendo com o
garoto nas costas, dentro deste saco.
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O novo dia mal havia amanhecido quando o investigador Afonso subiu o morro em busca
de informações. Os amigos do garoto deixaram claro que ele e o desconhecido ruivo seguiram em
direção à favela! Como era de se esperar, na favela ninguém viu nada, ninguém sabia de nada...
Um garoto e um rapaz de cabelos ruivos? "Imagina, doutor! Por aqui não passou ninguém assim
não..."
Mas um moleque de pele bem negra usando boné e bermuda vermelhos se apresentou. Na
verdade, quase é impedido pelos amigos, aflitos: "Vê lá o que vai falar, cara! Ele é polícia,
entendeu? Polícia!" Mas o moleque se apresentou ao investigador apesar de todas as
recriminações dos amigos. Só que seus olhos vermelhos injetados fizeram com que o investigador
não desse, logo de cara, muita importância ao que ele porventura teria para dizer. Ainda assim,
ouviu! No pé em que estavam as coisas, qualquer informação era informação.
- Eu vi bem assim, doutor! Um menino e um rapaz de cabelo vermelho! Eles entraram na
pedra!