31. Sophia confunde o poder com cara de leão do Autocentrado com a verdadeira Luz. “A seguir,
ela olhou para baixo e viu o poder-de-luz nas partes abaixo; ela não sabia que era o do poder-tríplice
Autocentrado, mas pensou que vinha da luz que havia visto desde o princípio no alto, que era do véu
do Tesouro de Luz. E pensou consigo mesma: irei àquela região sem meu par (Syzygy)
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e tomarei a
luz fazendo dela eons-de-luz para mim, para que eu possa ir para a Luz das Luzes, que está no ponto
mais alto do Alto.”
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Ela desce aos doze eons e daí para o caos. "Pensando assim, partiu de sua própria região, o décimo
terceiro eon, e desceu aos doze eons. Os regentes dos eons perseguiram-na, ficando furiosos com ela,
porque havia pensado em grandeza. E ela saiu também dos doze eons e veio para as regiões do caos e
aproximou-se daquele poder-de-luz com cara de leão para devorá-lo. Porém todas as emanações
materiais do Autocentrado cercaram-na, e o grande poder-de-luz com cara de leão devorou os poderes-
de-luz de Sophia, purificando sua luz e engolindo-a, sendo sua matéria lançada no caos. Existia no
caos um regente com cara de leão, metade do qual é fogo e metade escuridão, que é Ialdabaoth
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,
sobre quem vos falei muitas vezes. Quando isto aconteceu, Sophia tornou-se tremendamente fraca, e
aquele poder-de-luz com cara de leão começou a trabalhar para retirar de Sophia todos seus poderes-
de-luz, enquanto todos os poderes materiais do Autocentrado cercaram Sophia, atormentando-a
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.
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Compare esta situação com o Sistema Valentiniano, em que Sophia gera "sem seu Par", bem como o Comentário sobre
Ialdabaoth, em que Ialdabaoth gera sem uma fêmea, assim como Sophia havia gerado sem um macho; Daemon est Deus
inversus. (HPB)
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O egoísmo e a cupidez de Pistis Sophia, cega pela ignorância a ponto de confundir a luz da matéria com a luz do alto, são
causas da queda da alma, pela qual esta pagará um alto preço.
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Ialdabaoth é idêntico a Pthahil do Codex Nazaraeus, o Demiurgo do sistema Valentiniano, o Proarchos dos Barbelitas, o
Grande Arconte de Basílides e os Elohim de Justinus. Ialdabaoth (o Filho do Caos) era o filho de Sophia (Achamoth) na
Cosmogênese gnóstica, em outras palavras, o Chefe das Forças Criativas e o representante de uma das classes de Pitris. Se
considerarmos a Sophia-Acima (veja "Valentino") como o Akasha e a Sophia-Abaixo (Achamoth) como seus planos
inferiores, ou materiais, seremos capazes de entender porque Ialdabaoth, o criador material, foi identificado com Jeová e
Saturno e assim acompanhar a alegoria em Irineu (Adversus, op.cit., Livro I, ch. xxiii-xxvii): Ialdabaoth, o filho de Sophia,
gera um filho de si mesmo, sem a participação de nenhuma mãe, e seu filho, por sua vez, outro filho, e este outro e assim por
diante, até que seis filhos são gerados, um do outro. Estes imediatamente começaram a lutar com seu pai pelo controle. Este,
com raiva e desespero, fitou a "purgação da matéria" abaixo e, por meio de seus filhos, gerou outro filho, Ophiomorphos
(com forma de serpente), o espírito de tudo que é mais vil na matéria. Então, inflado de orgulho, ele se estendeu em sua
esfera mais elevada e proclamou em voz alta: Eu sou Pai e Deus e não há ninguem acima de mim. Ouvindo isto sua mãe
exclamou: Não mintas, Ialdabaoth, pois o Pai de Tudo, o Primeiro Anthropos (homem), está acima de ti, como também está
o Anthropos, o Filho do Homem. E Ialdabaoth, para impedir que seus filhos dessem atenção à voz, propôs que eles criassem
um homem. Assim, os seis fizeram um gigantesco homem, que ficou estendido na terra, movendo-se como um verme (o
homem das primeiras rondas e raças). E trouxeram-no diante de seu pai Ialdabaoth, que soprou nele o "Alento da Vida" e,
desta forma, esvaziou-se de seu poder criativo. E Sophia ajudou neste desígnio (insuflando no homem uma centelha de luz
divina obtida de sua mãe Sophia-Acima), para que pudesse recuperar os Poderes-de-Luz de Ialdabaoth. Imediatamente o
homem, possuindo a centelha divina, aspirou ao Homem Celestial, do qual ela lhe havia dotado. Ialdabaoth ficou com ciúme
disto e gerou Eva (Lilith), para retirar de Adão seus Poderes-de-Luz. E os seis "Espíritos Estelares", cheios de paixão pela
beleza de Eva, geraram filhos através dela. Vendo isto, Sophia enviou a serpente (a inteligência) para fazer com que Adão e
Eva transgredissem os preceitos de Ialdabaoth, que, furioso, expulsou-os do Paraíso, mandando-os ao Mundo, juntamente
com a serpente (quarta ronda e quarta raça). Simultaneamente, retirou deles seu Poder-de-Luz, para que este não ficasse
sujeito também à "maldição". E a serpente reduziu os poderes-do-mundo sob sua influência e gerou seis filhos, que se opõem
constantemente à raça humana, o motivo da queda de seu pai (a serpente). Adão e Eva tinham inicialmente corpos puramente
espirituais, que gradualmente se tornaram cada vez mais grosseiros. Seu espírito também se tornou lânguido, pois eles não
tinham nada a não ser o alento do mundo inferior que Ialdabaoth havia insuflado neles. Porém, finalmente, Sophia devolve-
lhes seu Poder-de-Luz e eles despertaram para o conhecimento de que estavam nus.
Esta interessante alegoria, na qual a criatura torna-se mais elevada do que o criador, só pode ser compreendida se for
lembrada a identidade da essência do que está evoluindo com a essência da qual ela evoluiu. Compare: "Eu revesti-me de ti
e tu és meu Vahana até o Dia 'Esteja conosco', quando te tornarás outra vez eu mesmo e outros, tu mesmo e eu" (A Doutrina
Secreta, I, Estância vii, Sloka 7). Neste ciclo de emanações, aquilo que está acima torna-se aquilo que está abaixo e, assim,
encontramos em Pistis Sophia a referência de que Ialdabaoth está residindo no "Grande Caos que é a Escuridão Exterior",
onde, com seus Quarenta e Nove Daemons, tortura as almas más (cap. 145). Além disso, a semelhança entre Ialdabaoth e
Sabaoth-Adamas é tanta que, evidentemente, eles devem ser considerados como aspectos do mesmo poder. A riqueza
peculiar da terminologia de Pistis-Sophia torna estas correpondências uma necessidade. (HPB)
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Sophia é atraída, ou seduzida, pelo poder-de-luz com cara-de-leão, provavelmente o símbolo do egoísmo que impera no
mundo. Quando isto ocorre, aproveitando o enfraquecimento da alma, os outros poderes (desejos) da natureza material
inferior intensificam o assédio à alma.
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