durante a Idade Média, dependendo do tempo e do lugar.
31. O pão era o alimento-base da sociedade medieval, sendo que cada pessoa consumia pelo menos meio quilo por dia,
principalmente a população camponesa. Os ricos usavam-no em quantidade mais moderada, como suporte da carne. A força
desse hábito, um indicativo civilizacional, está registrada na oração do “Pai-Nosso”: “dai-nos hoje o pão de cada dia”, ou em
expressões como “ganhar seu pão”. Recorde-se, ainda, que um dos gestos mais significativos da caridade cristã ensinava a
“repartir o pão”.
32. O palafrém era, segundo uma acepção específica, o animal adestrado para ser usado principalmente pelas senhoras,
enquanto o cavalo ou o corcel, mais velozes, serviam para o torneio e para a guerra. Dentro da rigorosa hierarquia cavaleiresca,
em que cavalo e armas identificavam o cavaleiro, não se devia usar um pelo outro.
33. São tantas as obrigações morais e sociais do cavaleiro quando ingressa no que Raimundo Lúlio chamou a Ordem de
Cavalaria, que basta a sua palavra para validar um compromisso. Romper com a palavra dada é tornar-se perjuro e arriscar-se
a ser acusado de traidor.
34. Referência a uma adaga, de lâmina fina e cortante, com a qual se desferia o ferimento mortal – ou “golpe de misericórdia”–
sobre o adversário caído, para aliviar-lhe o sofrimento.
35. Uma vez ungido para ocupar o trono (v. nota 25), a pessoa do rei torna-se sagrada e feri-lo é cometer sacrilégio, por atentar
contra o representante de Deus na terra.
36. O mesmo que ermitão, é aquele que vive no deserto. Na Idade Média, a prática do eremitismo cristão entre os chamados
“Padres da Igreja” remonta a são Bento de Núrsia (autor da Regra de são Bento, do ano 530), que se retirou para o Subiaco,
Itália, antes de fundar a célebre abadia de Monte Cassino. Com as profundas transformações dos sécs.XI e XII, os ermitães
davam as costas ao mundo radicalmente, a fim de entregar-se a uma espiritualidade mais individual, mais rigorosa, em contato
direto com a divindade. Em razão de sua experiência de vida, os ermitães estavam sempre cercados por pessoas em busca de
conselhos, de apoio, de oração.
37. A espada é a arma mais representativa do cavaleiro, porque é com ela que ele é investido no ritual de sagração e é sobre
ela que ele faz os juramentos. Diz Raimundo Lúlio, de sua perspectiva cristã: a espada “é feita à semelhança da cruz, para
significar que assim como nosso Senhor Jesus Cristo venceu na cruz a morte na qual tínhamos caído pelo pecado de nosso pai
Adão, assim o cavaleiro deve vencer e destruir os inimigos da cruz” (O livro da Ordem de Cavalaria, São Paulo, Giordano,
2000, p.77). A excelência de Excalibur ainda vem acrescida dos efeitos da magia, pois contém poderes advindos do mundo das
fadas. Que Arthur diga, neste episódio, “se Deus houve por bem confiar-me a posse dessa espada” não deve causar
estranheza: não só a chamada “cultura intermediária” aponta para a intersecção de elementos pagãos e cristãos no que diz
respeito à matéria de Bretanha, como também as fadas transitam normalmente entre os dois mundos, o real e o fantástico.
38. Nos combates, de que este livro dá vários exemplos, o vencedor perdoa o vencido – ao invés de matá-lo – desde que este
prometa àquele a fidelidade vassálica, uma forma de conter possíveis rebeldias no reino. Em primeiro lugar, porque não há
derrota maior do que perder a luta, para guerreiros que andam atrás de feitos gloriosos. Em segundo, porque as relações entre
cavaleiros pertencentes a uma mesma Ordem pressupõem regras de convivência harmônica: “Senhor que em sua corte e em
seu conselho e em sua Távola faz honra a cavaleiro, faz honra a si mesmo na batalha.” (Raimundo Lúlio, op.cit., p.111.) É parte
da cortesia (v. nota 15) o respeito pela vida humana.
39. A referência aos dois filhos mais velhos, que ficarão como reféns, tem sua razão de ser dentro da tradição feudal: nos
senhorios, nos principados e nas cortes, era comum que os filhos mais velhos do vassalo fossem educados pelo Senhor, visando
ao posterior ingresso deles na Cavalaria. Essa educação começava geralmente aos sete anos e passava por várias etapas, de
pajem a escudeiro, até chegar à cerimônia do adubamento, i.e., a entrega das armas e do equipamento ao novel cavaleiro.
40. Este subterfúgio utilizado por Arthur para conquistar Guinevere talvez tenha sido inspirado em uma novela de cavalaria do
séc.XVI, intitulada Primaleón (1512), segundo texto do chamado Ciclo dos Palmeirins e continuação do Palmeirim de Olivia
(1511). Na célebre passagem (capítulo 97), o príncipe d. Duardos disfarça-se de jardineiro para conquistar o amor de Flérida.
Mais tarde, o dramaturgo português Gil Vicente dedicou ao casal uma de suas mais belas peças: Tragicomédia de d. Duardos
(1525).
41. Corresponde a uma distinção honorífica, referindo o cavaleiro já reconhecido como tal, quer por atos de bravura, quer pelo
adubamento, no qual recebeu publicamente seus equipamentos, como a espada que traz à cinta. (Adiante, à p.206, se dirá, com
o mesmo sentido: “já participei de várias lutas de armas, como compete a um cavaleiro de cinta e esporas.”)
42. Na Idade Média, a moda surgiu das novas condições de produção. Antes do séc.XI, os tecidos variavam pouco, entre a lã e
o linho. Com o desenvolvimento das indústrias têxteis, principalmente em Flandres e no norte da Itália, mais tarde também na
Inglaterra e Península Ibérica, deu-se início à fabricação de uma enorme variedade de panos, o que acompanhou o progressivo
requinte dos trajes. Note-se, na passagem em questão, como o mercador avalia Arthur, quando trajando “lã” ou “fina seda
púrpura”.
43. Na Península Ibérica, ao contrário do que seria de esperar, as armaduras continuaram a ser fabricadas mesmo com o
surgimento de novas estratégias de guerra, resultantes da artilharia pesada. Na Era dos Descobrimentos (sécs.XV-XVI), o