viii Léxico Guaraní, Dialeto Mbyá
e. A influência da língua portuguesa na ortografia Guaraní é vista, não somente no uso de
dígrafos para certos fonemas em vez de símbolos únicos (como ng, gu), como também no
fato de que três das consoantes em Guaraní possuem cada uma duas representações ortográ-
ficas (/m/ com mb e m, /n/ com nd e n, // com j e nh). Por um lado, isto facilita a transição
ao Guaraní para os que já conhecem o português (e vice-versa); salientamos que a ortografia
atual é decorrente da preferência de escritores Guaraní. Por outro lado, isso complica a
forma ortográfica de vários prefixos; por exemplo, o prefixo reflexivo verbal tem
representação fonêmica única /e/-, mas na ortografia, e portanto neste léxico, este prefixo
tem duas chamadas “variantes”: je- e nhe-. São variantes apenas quanto à fonética e
ortografia, mas não na fonologia da língua.
f. Outra consequência do emprego da ortografia prática neste léxico é a ordem alfabética
dos verbetes. Esta é baseada somente nos símbolos (letras) aparentes, sem levar em conta os
fonemas representados, seguindo o modelo dos dicionários em português. Emprega-se, pois,
a seguinte sequência: a, b, d, e, g, h, i, j, k, m, n, o, p, r, t, u, v, x, y, '.
A única exceção a esta sequência é o símbolo da oclusão glotal ('), o qual, ocorrendo em
posição inicial de um verbete, quase não entra na ordenação. Assim, 'y ‘cabo, haste’ segue þ
‘Ah!’ mas precede ya ‘salto, barco’. Essa exceção foi admitida pelo fato de que até os
próprios Guaraní muitas vezes não pronunciam, muito menos escrevem, a oclusão glotal
inicial na locução. Por isso, nos exemplos ilustrativos, não se escreve em posição inicial de
frase ou locução, nem inicial na palavra, a menos que seja comumente escrita pelos Guaraní.
Porém, visto que uma oclusão glotal inicial pode determinar a forma de prefixos, e é escrita
quando ocorrer prefixo anterior, é registrada em todo vocábulo a ser definido. Assim, por
exemplo, oja (-'oja) indica que oja ‘panela’ é escrito com a oclusão glotal inicial (') quando
precedido por outro morfema.
g. Substantivos compostos compõem duas raízes sem o sentido de posse. Geralmente, são
escritos com o hifen: jaxy-tata ‘estrela’ (lit., lua-fogo). Quando, porém, uma das raízes (ou
ambas) perde a sua independência fonológica, as duas são escritas juntas, sem hífen ou
espaço: yakã ‘rio’ (lit., ‘água cabeça’); veja na seção 2.b. acima.
h. Quanto à divisão em palavras, as seguintes normas servem de regra geral (aqui, a sub-
linhação indica o elemento referido):
Elementos escritos à parte, separados do radical por espaço, compoåm os seguintes:
- elementos átonos (javy ju
‘levantámo-nos de novo’);
- sufixos e modificadores pospostos, de duas ou mais sílabas (avy porã ‘me levantei bem’);
- outros radicais, já que não haja perda de independência fonológica em nenhum radical
(mboi pytã ‘cobra coral’, lit., ‘cobra vermelha ou pintada’).
Elementos escritos junto ao radical, sem espaço, são os seguintes:
- prefixos (jaguapy ‘sentamo-nos’);
- sufixos e modificadores pospostos, sendo tônicos e monossilábicos (javypa ‘todos
levantamo-nos’;
- outros radicais onde há perda da independência fonológica em um ou outro (yakã ‘rio’, no
qual os substantivos y ‘água’ akã ‘cabeça’ se encontram unidos fonologicamente pelo
processo de lexicalização).