Edicao 84

saomaral 4,208 views 124 slides Sep 23, 2012
Slide 1
Slide 1 of 124
Slide 1
1
Slide 2
2
Slide 3
3
Slide 4
4
Slide 5
5
Slide 6
6
Slide 7
7
Slide 8
8
Slide 9
9
Slide 10
10
Slide 11
11
Slide 12
12
Slide 13
13
Slide 14
14
Slide 15
15
Slide 16
16
Slide 17
17
Slide 18
18
Slide 19
19
Slide 20
20
Slide 21
21
Slide 22
22
Slide 23
23
Slide 24
24
Slide 25
25
Slide 26
26
Slide 27
27
Slide 28
28
Slide 29
29
Slide 30
30
Slide 31
31
Slide 32
32
Slide 33
33
Slide 34
34
Slide 35
35
Slide 36
36
Slide 37
37
Slide 38
38
Slide 39
39
Slide 40
40
Slide 41
41
Slide 42
42
Slide 43
43
Slide 44
44
Slide 45
45
Slide 46
46
Slide 47
47
Slide 48
48
Slide 49
49
Slide 50
50
Slide 51
51
Slide 52
52
Slide 53
53
Slide 54
54
Slide 55
55
Slide 56
56
Slide 57
57
Slide 58
58
Slide 59
59
Slide 60
60
Slide 61
61
Slide 62
62
Slide 63
63
Slide 64
64
Slide 65
65
Slide 66
66
Slide 67
67
Slide 68
68
Slide 69
69
Slide 70
70
Slide 71
71
Slide 72
72
Slide 73
73
Slide 74
74
Slide 75
75
Slide 76
76
Slide 77
77
Slide 78
78
Slide 79
79
Slide 80
80
Slide 81
81
Slide 82
82
Slide 83
83
Slide 84
84
Slide 85
85
Slide 86
86
Slide 87
87
Slide 88
88
Slide 89
89
Slide 90
90
Slide 91
91
Slide 92
92
Slide 93
93
Slide 94
94
Slide 95
95
Slide 96
96
Slide 97
97
Slide 98
98
Slide 99
99
Slide 100
100
Slide 101
101
Slide 102
102
Slide 103
103
Slide 104
104
Slide 105
105
Slide 106
106
Slide 107
107
Slide 108
108
Slide 109
109
Slide 110
110
Slide 111
111
Slide 112
112
Slide 113
113
Slide 114
114
Slide 115
115
Slide 116
116
Slide 117
117
Slide 118
118
Slide 119
119
Slide 120
120
Slide 121
121
Slide 122
122
Slide 123
123
Slide 124
124

About This Presentation

No description available for this slideshow.


Slide Content

REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOPEDAGOGIA • Nº 84 • 2010 • ISSN 0103-8486
EDITORIAL / EDITORIAL............................................................................................................323
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
• Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino
fundamental......................................................................................................................................325
• Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH): o que os educadores sabem?...........334
• Parceria no contexto escolar: uma experiência de ensino colaborativo para educação
inclusiva...........................................................................................................................................344
ARTIGOS DE PESQUISA / RESEARCH ARTICLES
• A vivência de professores sobre o processo de inclusão: um estudo da perspectiva da
Psicologia Histórico-Cultural.............................................................................................................352
• Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar.........................................363
ARTIGO ESPECIAL / SPECIAL ARTICLE
• Psicopedagogia no cotidiano escolar: impasses e descobertas com o ensino de nove anos......372
ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES
• O falante inocente: linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
de alto desempenho........................................................................................................................385
• Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das
funções psicológicas superiores ....................................................................................................395
• Formação de professores e inclusão escolar de pessoas com deficiência: análise de
resumos de artigos na base SciELO.................................................................................................405
• Atuação psicopedagógica no contexto escolar: manipulação, não; contribuição, sim..........................417
RESENHAs / REVIEWs
• Educação à distância ......................................................................................................................428
• Intervenções clínicas: ação integrada com a Fonoaudiologia, a Psicopedagogia,
a Arteterapia,a Psicanálise e outros saberes....................................................................................430
30
ANOS

Núcleo Espírito Santo
Coordenadora: Maria da Graça Von Kruger Pimentel
R. Elesbão Linhares, 420/601 – Canto da Praia
Vitória – ES – CEP 29057-220
(027) 3225-9978
[email protected]
Núcleo Sul Mineiro
Coordenadora: Júlia Eugênia Gonçalves
R. Deputado Ribeiro de Rezende, 494 - Centro
Varginha – MG – CEP 37002-100
(035) 3222-1214
[email protected]
Seção Bahia
Diretora Geral: Débora Silva de Castro Pereira
Av. Tancredo Neves, 3343 – Ed. Cempre – Sala 1103 –
Torre B – Caminho das Árvores
Salvador – BA – CEP 41820-021
(071) 3341-0121
[email protected]
Seção Brasília
Diretora Geral: Marli Lourdes da Silva Campos
SCLN Quadra 102 – Bloco D – sala 110
Brasília – DF – CEP 70722-540
(061) 3964-1004
[email protected]
Seção Ceará
Diretora Geral: Galeára Matos de França Silva
R. Assis Chateaubriand, 362 A – Dionízio Torres
Fortaleza – CE – CEP 60135-200
(085) 3261-0064 – 3268-2632
[email protected]
Seção Goiás
Diretora Geral: Luciana Barros de Almeida
Av. 85, 684 sala 207 – Ed. Eldorado Center –
Setor Oeste
Goiânia – GO – CEP 74120-090
(062) 3954-2178
[email protected]
Seção Minas Gerais
Diretora Geral: Regina Rosa dos Santos Leal
R. Grão Mogol, 502 / 305 – Carmo Sion
Belo Horizonte – MG – CEP 30310-010
(031) 3221-3616
[email protected]
Seção Pará
Diretora Geral: Maria Nazaré do Vale Soares
Trav. 3 de Maio, 1218/ sl 105 – São Braz
Belém – PA – CEP 66060-600
(094) 3229-0565
[email protected]
Seção Paraná Norte
Diretora Geral: Geiva Carolina Calsa
R. Montevidéu, 206
Maringá - PR - CEP 87030-470
(044) 3026-1063
[email protected]
Seção Paraná Sul
Diretora Geral: Sonia Maria Gomes de Sá Kuster
R. Fernando Amaro, 431 – Alto da XV
Curitiba – PR – CEP 80050-020
(041) 363-8006
[email protected]
Seção Pernambuco
Diretora Geral: Maria das Graças Sobral Griz
R. das Pernambucanas, 277 – Graças
Recife – PE – CEP 52011-010
(081) 3222-4375 – 3231-1461
[email protected]
Seção Piauí
Diretora Geral: Amélia Cunha Rio Lima Costa
R. Eletricista Guilherme, 815 – Ininga
Teresina – PI – CEP 64049-530
(086) 3233-2878
[email protected]

Seção Rio de Janeiro
Diretora Geral: Ana Paula Loureiro e Costa
Av. N. Sra. de Copacabana, 861 sala 302
Rio de Janeiro – RJ – CEP 22060-000
(021) 2236-2012 / Fax: (021) 2521-6902
abpp-rj@abpp_rj.com.br

Seção Rio Grande do Norte
Diretora Geral: Ednalva de Azevedo Silva
R. São João, 1392 – Lagoa Sêca
Natal – RN – CEP 59022-390
(084) 3223-6870
[email protected]

Seção Rio Grande do Sul
Diretora Geral: Fabiani Ortiz Portella
Av. Venâncio Aires, 1119/ sala 9
Porto Alegre – RS – CEP 90520-000
(051) 3333-3690
[email protected]
Seção Santa Catarina
Diretora Geral: Albertina Celina de Mattos Chraim
R. Eurico Gaspar Dutra, 445, sl 101- Estreito
Florianópolis – SC – CEP 88075-100
(048) 3244-5984
[email protected]
Seção São Paulo
Diretora Geral: Sônia Maria Colli
R. Carlos Sampaio, 304 – cj. 51- sl 03
São Paulo – SP – CEP 01333-020
(011) 3287-8406
[email protected]
Seção Sergipe
Diretora Geral: Auredite Cardoso Costa
Av. Ivo Prado, 312 – Centro
Aracaju – SE – CEP 49010-050
(079) 3211-8668/ 3211-78903
[email protected]
Sede: Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 - São Paulo - SP
Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567 - www.abpp.com.br - [email protected]
Associação Brasileira
de Psicopedagogia
NúcleoS e Seções da abPp
(Dezembro de 2010)

Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000
São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567
www.abpp.com.br - [email protected]
A Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) é
uma entidade de caráter científico-cultural, sem fins
lucrativos, que congrega profissionais militantes na área da
Psicopedagogia.
Em 12 de novembro de 1980, um grupo de profissionais já
envolvidas e atuantes nas questões relativas aos problemas da
aprendizagem fundou a Associação Estadual de
Psicopedagogos do Estado de São Paulo, a AEP.
Devido ao grande interesse em torno dessa Associação, a sua
expansão a nível Nacional surgiu como necessidade imperiosa.
Em 1986, a AEP transformou-se na ABPp e gradativamente
foram sendo criados os seus escritórios de representação por
todo o Brasil, denominados de Núcleos e Seções.
Durante estes anos, a ABPp vem cuidando de questões
referentes à formação, ao perfil, à difusão e ao
reconhecimento da Psicopedagogia no Brasil, já tendo
alcançado muitas vitórias na luta pela sua regulamentação.
Atualmente, conta com 16 Seções e 2 Núcleos, espalhados
pelo Brasil, para melhor divulgar a Psicopedagogia e
aproximar os profissionais em torno de seus objetivos comuns.
A ABPp promove conferências, cursos, palestras, jornadas,
congressos, bem como a divulgação de trabalhos sobre sua
área de atuação, por meio da revista científica
Psicopedagogia, da Revista do Psicopedagogo, do informa-
tivo Diálogo Psicopedagógico e do site www.abpp.com.br.
Oferece, ainda, descontos tanto nos eventos que
organiza quanto em eventos de terceiros, que são parceiros e
interessados nos assuntos desta área.
Preocupada com as questões sociais, a atual diretoria da
ABPp Nacional organizou um novo trabalho de cunho
sociocientífico, que visa não só ao atendimento
da população carente, promovendo a inserção social e a
divulgação da importância da prática psicopedagógica,
como também à implantação de um novo modelo de estudo
e pesquisa nesse campo. Dele poderão participar todos os
associados interessados em prestar um trabalho social.
Podem associar-se à ABPp todas as pessoas interessadas
nessa área de atuação, tendo ou não concluído a sua
especialização em Psicopedagogia.
30ANOS

Conselho Editorial Internacional
Alicia Fernández - Argentina
Carmen Pastorino - Uruguai
César Coll - Espanha
Isabel Solé - Espanha
Maria Cristina Rojas - Argentina
Neva Milicic - Chile
Vitor da Fonseca - Portugal
Conselho Editorial Nacional
Ana Lisete Rodrigues SP
Anete Busin Fernandes SP
Beatriz Scoz SP
Débora Silva de Castro Pereira BA
Denise da Cruz Gouveia SP
Edith Rubinstein SP
Elcie Salzano Masini SP
Eloísa Quadros Fagali SP
Evelise Maria L. Portilho PR
Gláucia Maria de Menezes Ferreira CE
Heloisa Beatriz Alice Rubman RJ
Leda M. Codeço Barone SP
Margarida Azevedo Dupas SP
Maria Auxiliadora de Azevedo Rabello BA
Maria Cecília Castro Gasparian SP
Conselho Executivo
Maria Irene Maluf SP
Quézia Bombonatto SP
Cristina Valdoros Quilici SP
Editora
Maria Irene Maluf SP
Maria Célia Malta Campos SP
Maria Cristina Natel SP
Maria Lúcia de Almeida Melo SP
Maria Silvia Bacila Winkeler PR
Marisa Irene Siqueira Castanho SP
Mônica H. Mendes SP
Nádia Bossa SP
Neide de Aquino Noffs SP
Nívea M.de Carvalho Fabrício SP
Regina Rosa dos Santos Leal MG
Rosa M. Junqueira Scicchitano PR
Sônia Maria Colli de Souza SP
Vânia Carvalho Bueno de Souza SP
Consultores ad hoc
Ana Maria Maaz Acosta Alvarez
Jaime Zorzi
Lino de Macedo
Lívia Elkis
Luiza Helena Ribeiro do Valle
Pedro Primo Bombonato
Saul Cypel
Sylvia Maria Ciasca

PSICOPEDAGOGIA – Órgão oficial de divulgação
da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp
é indexada nos seguintes órgãos:
1) LILACS - Literatura Latino-Americana e
do Caribe em Ciências da Saúde -
BIREME
2) Clase - Citas Latinoamericanas en Cien-
cias Sociales y Humanidades. Universidad
Nacional Autónoma de Mexico
3) Edubase - Faculdade de Educação, Uni-
camp
4) Bibliografia Brasileira de Educação - BBE
CIBEC / INEP / MEC
5) Latindex - Sistema Regional de Informa-
ción en Línea para Revistas Científicas
de América Latina, El Caribe, España y
Portugal
6) Catálogo Coletivo Nacional – Instituto
Brasileiro em Ciência e Tecnologia –
IBICT
Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia /
Associação Brasileira de Psicopedagogia. - Vol. 10, nº 21 (1991). São
Paulo: ABPp, 1991-
Quadrimestral
ISSN 0103-8486
C o n t i n u a ç ã o , a p a r t i r d e 1 9 9 1 , v o l . 1 0 , n º 2 1 d e B o l e t i m d a
Associação Brasileira de Psicopedagogia.
1. Psicopedagogia. I. Associação Brasileira de Psicopedagogia.
CDD 370.15
7) INDEX PSI – Periódicos – Conselho
Federal de Psicologia
8) DBFCC – Descrição Bibliográfica
Fundação Carlos Chagas
Editora Responsável: Maria Irene Maluf
Jornalista Responsável: Rose Batista – 28.268
Revisão e Assessoria Editorial:
Rosângela Monteiro
Editoração Eletrônica: Sollo Comunicação
Impressão: Sollo Press
O conteúdo dos artigos aqui publicados é de
inteira responsabilidade de seus autores, não
expressando, necessariamente, o pensamento
do corpo editorial.
É expressamente proibida qualquer modali-
dade de reprodução desta revista, seja total ou
parcial, sob penas da lei.
Associação Brasileira
de Psicopedagogia
www.abpp.com.br
[email protected]
Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000
São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567

Diretoria da Associação
Brasileira de Psicopedagogia
2008/2010
Conselheiras Eleitas (2008/2010)
Carla Labaki SP
Cleomar Landim de Oliveira SP
Cristina Vandoros Quilici SP
Ednalva de Azevedo Silva RN
Eloisa Quadros Fagali SP
Evelise Maria Labatut Portilho PR
Galeára Matos de França Silva CE
Heloisa Beatriz Alice Rubman RJ
Janaina Carla R. dos Santos GO
Jozelia de Abreu Testagrossa BA
Luciana Barros de Almeida Silva GO
Maria Auxiliadora de A. Rabello BA
Maria Cristina Natel SP
Maria Helena Bartholo RJ
Maria José Weyne M. de Castro CE
Marisa Irene Siqueira Castanho SP
Marli Lourdes da Silva Campos DF
Miriam do P.S.F. Vidigal Fonseca MG
Nadia Aparecida Bossa SP
Neusa Kern Hickel RS
Quézia Bombonatto SP
Rosa Maria J. Scicchitano PR
Silvia Amaral de Mello Pinto SP
Sonia Maria Colli de Souza SP
Yara Prates SP
Diretoria Executiva
Presidente
Quézia Bombonatto
[email protected]
Vice-Presidente
Cristina Valdoros Quilici
[email protected]
Tesoureira
Maria Cecília Castro Gasparian
[email protected]
Secretária Administrativa
Maria Teresa Messeder Andion
[email protected]
Diretora Científica
Nádia Aparecida Bossa
[email protected]
Diretora Científica Adjunta
Márcia Simões
[email protected]
Diretora Cultural
Yara Marlene Prates
[email protected]
Relações Públicas
Telma Pantano
[email protected]
Relações Públicas Adjunta
Edimara de Lima
[email protected]
Conselheiras Vitalícias
Beatriz Judith Lima Scoz Sp
Edith Rubinstein Sp
Leda Maria Codeço Barone Sp
Maria Cecília Castro Gasparian SP
Maria Célia Malta Campos Sp
Maria Irene Maluf Sp
Mônica H. Mendes Sp
Neide de Aquino Noffs Sp
Nívea Maria de Carvalho Fabrício Sp
Assessorias Regionais
Assessora Regional Bahia
Maria Angélica Moreira Rocha
[email protected]
Assessora Regional Ceará
Maria José Weyne Melo de Castro
[email protected]
Assessora Regional Paraná
Rosa Maria Schiccitano
[email protected]
Assessorias
Assessora de Divulgações Científicas Maria Irene Maluf
[email protected]
Assessora de Reconhecimento e Cursos
Neide Aquino Noffs
[email protected]

Associação Brasileira
de Psicopedagogia

EDITORIAL / EDITORIAL
• Maria Irene Maluf.........................................................................................................................323
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
• ..Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Knowledge of letters, syllables and words by students 1
st
and 2
nd
grades of basic education
Mayara Pessoa de Moraes; Simone Aparecida Capellini...........................................................325
• Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH): o que os educadores sabem?
Attention-deficit hyperactivity disorder (ADHD): what teachers know?
Marília Piazzi Seno ......................................................................................................................334
• Parceria no contexto escolar: uma experiência de ensino colaborativo para educação inclusiva
Partnership in the school environment: a collaborative teaching experience for inclusive
education
Andréa Carla Machado; Maria Amélia Almeida........................................................................344
ARTIGOS DE PESQUISA / RESEARCH ARTICLES
• A vivência de professores sobre o processo de inclusão: um estudo da perspectiva da
Psicologia Histórico-Cultural
The experience of teacher about the process of inclusion: a study of perspective of Historical-
Cultural Psychology
Eveline Tonelotto Barbosa; Vera Lucia Trevisan de Souza.........................................................352
• Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Literal production: when the written language becomes school object
Denise Miyabe da Silva................................................................................................................363
ARTIGO ESPECIAL / SPECIAL ARTICLE
• Psicopedagogia no cotidiano escolar: impasses e descobertas com o ensino de nove anos
Psychoeducation in everyday school dilemmas and discoveries: with teaching nine years
Fabiani Ortiz Portella; Neusa Kern Hickel..................................................................................372
ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES
• O falante inocente: linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo de alto
desempenho
The innocent speaker: pragmatic language in high functioning autism
Renata Mousinho..........................................................................................................................385
sumário

• Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das
funções psicológicas superiores
Mind map as mediation strategy for the development of higher psychological functions
Lucy Duró Matos...........................................................................................................................395
• Formação de professores e inclusão escolar de pessoas com deficiência: análise de resumos de
artigos na base SciELO
Teacher education and school inclusion of deficient people: analysis of SciELO articles’ abstracts
Marcos Vinícius de Araújo; Robson Jesus Rusche; Rinaldo Molina; Luiz Renato Rodrigues
Carreiro..........................................................................................................................................405
• Atuação psicopedagógica no contexto escolar: manipulação, não; contribuição, sim
Educational psychology practice in the school framework: not to manipulation, yes to
contribution
Idalina Amélia Mota Pontes..........................................................................................................417
RESENHAS / REVIEWS
• Educação à distância
Distance education
Geraldina Porto Witter...................................................................................................................428
• Intervenções clínicas: ação integrada com a Fonoaudiologia, a Psicopedagogia, a
Arteterapia, a Psicanálise e outros saberes.
Clinical interventions: integrated action with Phonoaudiology, Psychopedagogy, Art Therapy,
Psychoanalysis, and other knowledge
Marisa Irene Siqueira Castanho...................................................................................................430

Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 323-4
323
8
C
omo editora da revista Psicopedagogia desde janeiro de 2003, tenho
a honra de encerrar este volume, em dezembro de 2010, relembrando
aos associados da ABPp e aos nossos leitores que esta publicação,
agora inteiramente online, integra o portal de Periódicos Eletrônicos de
Psicologia (PePSIC). A PePSIC é uma fonte da Biblioteca Virtual em Saúde -
Psicologia da União Latino-Americana de Entidades de Psicologia (BVS-Psi
ULAPSI), fruto da parceria entre Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia
Brasileira (FENPB), Biblioteca Dante Moreira Leite do Instituto de Psicologia
da Universidade de São Paulo (IP/USP) e do Centro Latino Americano e do
Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME). Pode ser livremente
acessada em todas as partes do mundo pelo endereço: http://pepsic.bvsalud.
org/scielo.php?script=sci_serial&pid=0103-8486&lng=pt&nrm=iso
É possível, também, ler nossas revistas na íntegra, a partir do site da ABPp
(www.abpp.com.br), onde também estão disponíveis as Normas de Publicação
para que novos artigos nos sejam encaminhados.
Dois artigos originais abrem este número. O primeiro, encaminhado por
Mayara Pessoa de Moraes e Simone Aparecida Capellini, “Conhecimento de
letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental”,
é uma contribuição valiosa no momento em que tantas discussões se dão em
torno das questões da alfabetização em nossas escolas.
Outra questão muito debatida e importante, pelo impacto que acarreta na
vida das crianças, é tratada no artigo de Marília Piazzi Seno, “Transtorno do
Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH): o que os educadores sabem?”.
É de Andréa Carla Machado e Maria Amélia Almeida, o artigo que se
apresenta a seguir, “Parceria no contexto escolar: uma experiência de ensino
colaborativo para educação inclusiva”, cujo objetivo foi avaliar os efeitos de
uma prática de leitura pautada no ensino colaborativo em alunos de uma sala
regular, onde um dentre eles apresentava necessidades educacionais especiais.
“A vivência de professores sobre o processo de inclusão: um estudo da
perspectiva da psicologia histórico-cultural” é um interessante artigo, no qual
Eveline Tonelotto Barbosa e Vera Lucia Trevisan de Souza analisam a percepção,
os sentimentos e as vivências de professores sobre seu papel na inclusão de
alunos com necessidades educacionais especiais.
A avaliação da aprendizagem da linguagem escrita na escola e a reflexão
sobre o papel do professor mediador nesse processo são os objetos de pesquisa
em “Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar”, de
Denise Miyabe da Silva, que antecede o artigo “Psicopedagogia no cotidiano
escolar: impasses e descobertas com o ensino de nove anos”, de Fabiani Ortiz
Portella e Neusa Kern Hickel, que tão bem discorre sobre essa questão que
tanto refletiu sobre o trabalho dos psicopedagogos nos dias atuais.
Logo após temos o artigo de Renata Mousinho, “O falante inocente:
linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo de alto desempenho”,
EDITORIAL

Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 323-4
324
8
Maria Irene Maluf
Editora
no qual a autora articula a relação entre as habilidades sociais e a linguagem
pragmática apresentada por indivíduos com autismo de alto desempenho.
“Mind Map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desen-
volvimento das funções psicológicas superiores”, de Lucy Duró Matos, redire-
ciona nosso olhar para o uso desse recurso capaz de desenvolver a atenção, a
capacidade de organização, a lógica, a classificação, entre outras operações
mentais de importância para a aprendizagem.
Um artigo que poderá orientar muitos estudos foi enviado por Marcos
Vinícius de Araújo, Robson Jesus Rusche, Rinaldo Molina e Luiz Renato
Rodrigues Carreiro, “Formação de professores e inclusão escolar de pessoas com
deficiência: análise de resumos de artigos na base SciELO”. Consiste em uma
revisão bibliográfica de artigos que tratam da formação de professores para a
inclusão escolar da pessoa com deficiência, tendo como base os resumos de
artigos publicados na SciELO até o primeiro semestre de 2010.
“Atuação psicopedagógica no contexto escolar: manipulação, não; contri-
buição, sim”, de Idalina Amélia Mota Pontes, aponta para a importância da
atuação preventiva do psicopedagogo no contexto escolar, onde muitas infor-
mações e vários aspectos têm que ser observados e analisados.
“Educação à distância e ensino superior: introdução didática a um tema
polêmico” é o livro de Reginaldo C. Moraes, resenhado por Geraldina Porto
Witter, que nos conduz ao centro de uma reflexão importantíssima de nossos
dias: o uso da tecnologia na Educação. Esta edição, conta, também, com a
resenha do livro de autoria de Márcia Simões, intitulado “Intervenções clínicas:
ação integrada com a Fonoaudiologia, a Psicopedagogia, a Arteterapia, a
Psicanálise e outros saberes”, realizada por Maria Irene Siqueira Castanho.
Nesta resenha são discutidas as interfaces entre as várias ciências, que devem
trabalhar de maneira integrada na busca da melhor compreensão e abordagem
dos problemas da aprendizagem.
Todos esses trabalhos, frutos de estudos e pesquisas cientificamente abali-
zadas, nos foram generosamente enviados por seus autores aos quais agrade-
cemos em nome da ABPp, do Conselho Editorial da revista Psicopedagogia e
de nossos leitores, a quem desejamos uma boa e proveitosa leitura!
EDITORIAL

Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
325
ARTIGO ORIGINAL
RESUMO – Objetivo: Verificar e comparar o desempenho de escolares
de 1º e 2º anos do ensino fundamental sobre conhecimento de letras, sílabas
e palavras em três momentos de avaliação. Método: Participaram deste
estudo 19 escolares de ensino público municipal do 1º e 2º ano do ensino
fundamental do município de Marília-SP, de ambos os gêneros, na faixa
etária de 6 a 7 anos e 11 meses de idade. Os escolares foram distribuídos
em GI: composto por 9 escolares do 1º ano do ensino fundamental e
GII: composto por 10 escolares do 2º ano do ensino fundamental. Os
dois grupos foram submetidos à aplicação da adaptação brasileira do
Protocolo de identificação e detecção precoce de dislexia. Este protocolo
foi composto por duas partes denominadas nível de leitura e identificação
de erros específicos. Os resultados foram analisados estatisticamente,
visando à comparação de desempenho dos grupos nos três momentos de
avaliação. Resultados: Os resultados revelaram diferenças estatisticamente
significantes, evidenciando que o desempenho dos dois grupos foi superior
quando comparado o primeiro com o terceiro momento de avaliação.
Conclusão: Os resultados deste estudo permitiram concluir que, ao longo do
ano escolar, os escolares do GI e os escolares do GII adquiriram a capacidade
de conhecimento e reconhecimento de letras, sílabas e palavras, além da
capacidade de identificar e reconhecer erros de inversão, demonstrando
que os escolares sem dificuldades de aprendizagem se apropriam do
princípio alfabético do sistema de escrita do português brasileiro sendo
expostos a tarefas de leitura e escrita em contexto de sala de aula.
UNITERMOS: Leitura. Avaliação. Aprendizagem. Ensino.
Conhecimento de letras, sílabas e palavras
por escolares de 1º e 2º anos do ensino
fundamental
Mayara Pessoa de Moraes – Discente do Curso de
Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências
da Universidade Estadual Paulista - FFC/UNESP-
Marília-SP. Bolsista de Extensão Universitária – PROEX
– UNESP.
Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga. Doutora
e Pós-Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade
de Ciências Médicas da Universidade Estadual de
Campinas, FCM/UNICAMP-Campinas – SP. Docente
do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de
Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia
e Ciências da Universidade Estadual Paulista - FFC/
UNESP-Marília-SP. Correspondência
Simone Aparecida Capellini
Rua Hygino Muzzy Filho, 737 – Campus Universitário
– Marília, SP, Brasil – CEP: 17525-900.
E-mail: [email protected]
Mayara Pessoa de Moraes; Simone Aparecida Capellini

Moraes MP & C apellini SA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
326
INTRODUÇÃO
Segundo a literatura
1,2
, o conhecimento das
letras é um dos melhores antecipadores da
aprendizagem da leitura, sendo assim, crianças
com dificuldades de leitura apresentaram a
tendência de demonstrar menor conhecimento
de letras do que as crianças sem dificuldades de
leitura
3
. O reconhecimento das letras implica em
um processamento cognitivo semelhante ao da
leitura, uma vez que ambos os processos estão
associados às mesmas habilidades de proces-
samento fonológico: a consciência fonológica, a
memória de trabalho fonológica e a velocidade
de acesso às informações fonológicas
4,5
.
O conhecimento do nome das letras induz
a criança a aprender a ler por meio do pro-
cessamento parcial das relações letra-som nas
palavras, concluindo, assim, que crianças que
conhecem os nomes das letras aprendem a ler
as grafias fonéticas mais facilmente do que as
grafias visuais
6
. Outros autores
7
afirmaram que a
base fônica pode ser útil para as crianças não so-
mente pela aprendizagem da relação letra-som,
mas por fazer uma aproximação ortográfica,
dando à criança a oportunidade para descobrir
além do princípio alfabético, o conhecimento
da ortografia da língua escrita.
Para que haja compreensão do princípio
alfabético da correspondência grafo-fonêmica,
a criança necessita entender que as letras cor-
respondem a segmentos sonoros sem signifi-
cados
8,9
. A compreensão de que existe relação
entre letras e sons da fala é, segundo vários
pesquisadores, o modelo ideal do sistema al-
fabético
10-12
. Entretanto, na língua portuguesa
existem várias situações nas quais nem sem-
pre existe correspondência única, acarretando
confusões quanto à escolha do grafema a ser
decodificado ou simbolizado no ato da leitu-
ra
1,13
, por isto a necessidade do conhecimento
das letras do alfabeto e todas as suas formas de
representação sonora.
Além do fato do conhecimento de letras
favorecer o conhecimento da estrutura das
palavras, a partir da composição das mesmas
para formação de sílabas. Não podemos es-
quecer que a ausência deste conhecimento por
parte dos escolares é considerada na literatura
nacional
4-14
e internacional
15,16
um dos sinais da
dislexia, por isso é importante que os profissio-
nais que atuam na Educação estejam atentos
para a verificação deste conhecimento em fase
inicial de alfabetização.
Com base no exposto acima este estudo tem
por objetivo verificar e comparar o desempenho
de escolares de 1º e 2º anos do ensino funda-
mental no conhecimento de letras, sílabas e
palavras em três momentos de avaliação.
MÉTODO
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e
Ciências da Universidade Estadual Paulista –
CEP/FFC/UNESP, sob o nº 1134/2009.
Participaram deste estudo 19 escolares de
ensino público municipal do 1º e 2º ano do en-
sino fundamental do município de Marília-SP,
de ambos os gêneros, na faixa etária de 6 a 7
anos e 11 meses de idade. Os escolares foram
distribuídos em dois grupos:
• Grupo I (GI): composto por 9 escolares
do 1º ano do ensino fundamental de
escola pública municipal, sendo 6 do gê-
nero feminino e 3 do gênero masculino;
• Grupo II (GII): composto por 10 escolares
do 2º ano do ensino fundamental de esco-
la pública municipal, sendo 6 do gênero
masculino e 4 do gênero feminino.
Os escolares que participaram deste es-
tudo não apresentaram anotações referentes
à deficiência sensorial, motora ou cognitiva,
alterações de fala, linguagem e queixas audi-
tivas ou visuais em prontuário escolar e foram
considerados como indivíduos sem dificuldades
de aprendizagem pelos professores. O critério
utilizado pelos professores para a indicação dos
escolares sem dificuldades de aprendizagem
incluiu o desempenho satisfatório em Língua
Portuguesa e Matemática em dois bimestres
consecutivos.
Os dois grupos foram submetidos aos seguin-
tes procedimentos:

Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
327
• Termo de consentimento Pós-Informa-
do: conforme resolução do Conselho
Nacional de Saúde CNS 196/96, an-
teriormente ao início das avaliações,
os pais ou responsáveis dos pacientes
selecionados assinaram o termo de
Consentimento Pós-Informado para
autorização da realização do estudo;
• Protocolo de identificação e detecção
precoce da dislexia: foi aplicado o
Protocolo de identificação e detecção
precoce da dislexia
17
, com revisão dos
itens linguísticos realizada pelas au-
toras deste estudo. Este protocolo foi
composto por duas partes, denomina-
dos nível de leitura e identificação de
erros específicos.
A primeira parte do Protocolo, denominada
Nível de Leitura, foi subdividida em 3 subprovas:
Primeiro nível de leitura: composto por pro-
vas de identificação de nome das letras, de som
da letra, de sílaba simples;
Segundo nível de leitura: composto por pro-
vas de leitura de sílabas diretas com consoantes
de duplo sentido no som, sílabas diretas com
dígrafos, sílabas diretas com consoantes segui-
das de “u”, sílabas diretas com consoantes de
duplo som conforme a posição na palavra, síla-
bas indiretas de nível simples, sílabas indiretas
de nível complexo, sílabas complexas, sílabas
com ditongos;
Terceiro nível de leitura: composto por provas
de leitura de sílabas com ditongo de nível com-
plexo, sílabas com grupos consonantais de nível
simples, sílabas com grupos consonantais de
nível complexo, sílabas com grupos consonantais
e ditongos de nível simples, sílabas com grupos
consonantais e ditongos de nível complexo.
A segunda parte do Protocolo, denominada
de Identificação de Erros Específicos é composta
por provas de identificação de erros por inver-
sões de letras, inversões de palavras completas,
inversões de letras dentro da palavra, inversões
de ordem da sílaba na palavra, além de uma
prova com letras possíveis de serem confundi-
das pelo som no início da palavra.
O material linguístico utilizado para a
adaptação do procedimento para a realidade
brasileira foi extraído de um banco de pala-
vras de livros didáticos de 1ª série utilizados
na rede municipal de ensino da cidade de
Marília-SP. A partir deste banco de dados,
as palavras utilizadas para adaptação das
provas seguiram as regras de decodificação
do português brasileiro descrito por Scliar-
Cabral
18
.
O protocolo foi aplicado de forma individu-
al, em sala apropriada indicada pela direção
da escola, em três momentos de avaliação,
em junho, em setembro e em dezembro do
ano de 2009, com tempo médio de duração de
45 minutos, para verificação da evolução dos
escolares no domínio do conhecimento das
letras, sílabas e palavras.
Os resultados foram analisados estatistica-
mente utilizando o Teste de Mann-Whitney,
com o objetivo de verificar possíveis diferenças
entre os grupos. O Teste de Friedman foi apli-
cado com o intuito de comparar o desempenho
dos grupos nos três momentos de avaliação.
Foi utilizado o Teste dos Postos Sinalizados de
Wilcoxon, ajustado pela Correção de Bonferro-
ni, para identificar qual ou quais os momentos
de avaliação em que os grupos apresentaram
melhor desempenho.
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta a distribuição da
média, desvio padrão e valor de p referente
ao desempenho dos escolares do GI e GII, res-
pectivamente, quanto a identificação de nomes
das letras, de som da letra e de sílaba simples,
nos três momentos de avaliação. Com a aplica-
ção do Teste de Mann-Whitney, é possível que
os escolares do GI apresentaram na prova C,
composta por sílabas simples, diferenças esta-
tisticamente significantes, que indicam que nos
três momentos de avaliação os escolares deste
grupo apresentaram desempenho inferior ao
GII, sugerindo que a capacidade para a leitura
de sílabas simples é adquirida no final do pri-
meiro ano escolar.

Moraes MP & C apellini SA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
328
A Tabela 2 apresenta a distribuição da mé-
dia, desvio padrão e valor de p referente ao
desempenho dos escolares do GI e GII, respec-
tivamente, quanto ao desempenho no segundo
nível de leitura. Aplicando o Teste de Mann-
Whitney, foi possível verificar que, durante o
1º momento de avaliação, os escolares do GII
apresentam desempenho superior aos escolares
do GI na maioria das provas deste nível, com
exceção à prova de leitura de sílabas diretas
com consoantes de sons seguidas de “u”.
Além disso, nesta tabela podemos verificar
qu, no terceiro momento de avaliação, tanto
os escolares do GI como do GII apresentaram
desempenho similar para a leitura de sílabas
diretas com consoantes de duplo sentido no
som, de sílabas diretas com consoantes de
duplo som conforme a posição na palavra, de
sílabas indiretas de nível complexo, de sílabas
complexas e de sílabas com ditongos, indicando
que a capacidade para o reconhecimento das
sílabas com tais complexidades é adquirida ao
longo do primeiro ano escolar. A diferença es-
Tabela 1 – Distribuição da média, desvio padrão e valor
de p referente ao desempenho dos escolares no 1º nível de
leitura, em três momentos de avaliação.
ProvasGrupoMédiaDesvio-padrãoValor de p
A1
I 19,22 3,27
0,429
II19,70 3,97
A2
I 21,11 2,21
0,439
II21,50 2,95
A3
I 21,11 2,67
0,181
II22,60 0,97
B1
I 9,67 5,50
0,562
II 8,30 5,77
B2
I 11,44 6,23
0,107
II16,10 6,77
B3
I 17,78 5,47
0,066
II21,70 0,68
C1
I 3,78 6,20
0,048*
II13,20 9,47
C2
I 8,00 7,42
0,017*
II16,40 8,17
C3
I 13,56 8,26
0,046*
II19,80 3,62
Tabela 2 - Distribuição da média, desvio padrão e valor de p
referente ao desempenho dos escolares no 2º nível de leitura,
em três momentos de avaliação.
ProvasGrupoMédiaDesvio-padrãoValor de p
A1
I 1,22 1,92
0,013*
II 5,30 3,40
A2
I 4,44 3,17
0,242
II 5,70 3,16
A3
I 5,67 2,78
0,074
II 7,40 0,97
B1
I 0,22 0,67
0,009*
II 3,20 2,82
B2
I 0,78 1,09
0,008*
II 4,10 2,42
B3
I 2,78 2,17
0,046*
II 4,90 1,91
C1
I 0,44 1,01
0,156
II 1,50 1,72
C2
I 0,33 0,71
0,009*
II 2,20 1,69
C3
I 0,89 1,17
0,003*
II 3,10 1,20
D1
I 0,22 0,67
0,046*
II 1,90 2,03
D2
I 0,78 1,39
0,150
II 2,10 2,03
D3
I 1,89 2,03
0.066
II 3,70 1,49
E1
I 0,33 1,00
0,030*
II 2,40 2,55
E2
I 1,44 1,81
0,080
II 3,40 2,80
E3
I 2,00 2,60
0,044*
II 4,50 2,17
F1
I 0,44 1,33
0,016*
II 2,60 2,46
F2
I 1,22 1,64
0,108
II 3,30 2,91
F3
I 1,78 2,68
0,138
II 3,60 2,68
G1
I 0,00 0,00
0,017*
II 2,90 3,07
G2
I 0,00 0,00
0,007*
II 3,10 3,07
G3
I 2,33 2,45
0,063
II 4,40 2,01
H1
I 0,33 1,00
0,047*
II 4,20 4,54
H2
I 2,11 2,98
0,048*
II 6,00 4,30
H3
I 4,78 4,79
0,147
II 7,80 3,26
Legenda: A: nome da letra; B: som da letra; C: sílabas diretas
com consoantes de sons simples; 1: primeira avaliação; 2:
segunda avaliação; 3: terceira avaliação.
Legenda: A: sílabas diretas com consoantes de duplo sentido
no som; B: sílabas diretas com dígrafos; C: sílabas diretas
com consoantes seguidas de “u”; D: sílabas diretas com
consoantes de duplo som conforme a posição na palavra, E:
sílabas indiretas de nível simples; F: sílabas indiretas de nível
complexo; G: sílabas complexas, H: sílabas com ditongos; 1:
primeira avaliação; 2: segunda avaliação; 3: terceira avaliação.

Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
329
tatisticamente significante foi verificada entre
os grupos no terceiro momento de avaliação,
para a leitura de sílabas diretas com dígrafos,
de sílabas diretas com consoantes seguidas de
“u” e sílabas indiretas de nível simples, indi-
cando que a capacidade de leitura para estas
complexidades silábicas é superior no GII,
sugerindo que tal capacidade é adquirida no
segundo ano escolar.
A Tabela 3 apresenta a distribuição da
média, desvio padrão e valor de p referente
ao desempenho dos escolares do GI e GII,
respectivamente, no terceiro nível de leitura.
Analisando-a também de acordo com o Teste
de Teste de Mann-Whitney, notamos que, no
1º momento de avaliação, os escolares do GII
apresentaram desempenho superior em todas
as provas se comparado ao 2º momento de
avaliação em todas as categorias de palavras
para leitura, no entanto, ao observarmos
o 3º momento de avaliação, esta diferença
estatisticamente significante não ocorreu,
sugerindo que a capacidade de ler palavras
com sílaba com ditongo de nível complexo,
sílaba com grupos consonantais de nível sim-
ples, sílaba com grupos consonantais de nível
complexo, sílabas com grupos consonantais e
ditongos de nível simples, sílaba com grupos
consonantais e ditongos de nível complexo se
estabelece ao final do 1º ano escolar.
As Tabelas 4 e 5 apresentam a distribuição
da média, desvio padrão e valor de p referen-
te ao desempenho dos escolares do GI e GII,
respectivamente, quanto a identificação dos
erros de reversão na leitura nos três momen-
tos de avaliação. Com a aplicação do Teste
de Friedman é possível verificar que tanto
os escolares do GI como do GII não apresen-
taram na prova A (letras passíveis de serem
confundíveis pelo som no início da palavra)
diferença estatisticamente significante entre
os três momentos de avaliação, indicando
que os escolares deste estudo adquirem esta
habilidade no primeiro ano.
Tabela 3 - Distribuição da média, desvio padrão e valor
de p referente ao desempenho dos escolares no 3º nível de
leitura, em três momentos de avaliação.
ProvasGrupoMédiaDesvio-padrãoValor de p
A1
I 0,22 0,67
0,047*
II 2,50 2,68
A2
I 1,11 1,83
0,144
II 2,80 2,66
A3
I 2,44 2,83
0,157
II 4,40 2,27
B1
I 0,00 0,00
0,017*
II 2,60 2,88
B2
I 0,44 1,33
0,046*
II 2,90 3,07
B3
I 2,44 2,51
0,139
II 4,00 2,54
C1
I 0,11 0,33
0,047*
II 2,70 2,91
C2
I 0,33 1,00
0,022*
II 3,20 3,01
C3
I 2,22 2,77
0,143
II 4,00 2,54
D1
I 0,00 0,00
0,018*
II 2,00 2,63
D2
I 0,33 1,00
0,023*
II 3,00 2,87
D3
I 2,67 2,69
0,186
II 4,20 2,44
E1
I 0,00 0,00
0,017*
II 2,90 3,38
E2
I 0,22 0,67
0,023*
II 3,40 3,41
E3
I 2,44 3,43
0,177
II 4,60 2,95
Legenda: A: sílabas com ditongos de nível complexo; B:
sílabas com grupos consonantais de nível simples; C: sílabas
com grupos consonantais de nível complexo; D: sílabas com
grupos consonantais e ditongos de nível simples; E: sílabas
com grupos consonantais e ditongos de nível complexo;
1: primeira avaliação; 2: segunda avaliação: 3: terceira
avaliação.
Quanto à identificação de letras con-
fundíveis por grafia semelhante, inversões
de palavras completas, inversões de letras,
inversões de letras dentro da palavra e

Moraes MP & C apellini SA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
330
inversões de ordem da sílaba dentro da
palavra, observamos que tanto os escolares
do GI como do GII apresentaram diferença
estatisticamente significante entre os três
momentos de avaliação revelando que o
número de acertos foi aumentando ao longo
do ano letivo, demonstrando que o conhe-
cimento e reconhecimento das letras e de
seu posicionamento na palavra melhoram
com o aumento do uso de tarefas de leitura
e escrita no contexto de sala de aula.
Como foi observada diferença estatistica-
mente significante entre os três momentos
de avaliação, utilizamos o Teste dos Postos
Sinalizados de Wilcoxon, ajustado pela Cor-
reção de Bonferroni, para identificarmos qual
ou quais os momentos de avaliação em que
os grupos apresentaram melhor identificação
quanto aos erros de reversão (Tabela 6). Os
resultados revelaram que os escolares do GII
apresentaram desempenho superior na tercei-
ra avaliação nas provas B, D e E, referentes
à leitura de palavras com letras confundíveis
por grafia semelhante, inversões de letras
e inversões de letras dentro da palavra, em
relação ao primeiro momento de avaliação.
Tabela 4 - Distribuição da média, desvio padrão e
valor de p referente ao desempenho dos escolares do
GI quanto à identificação dos erros de reversão, nos três
momentos de avaliação.
Bloco de
Variá-
veis
MédiaDesvio-padrão Valor de p
A1 7,11 2,09
0,261A2 7,44 1,24
A3 8,11 2,09
B1 0,89 2,67
0,002*B2 4,22 5,22
B3 7,33 5,27
C1 0,33 1,00
0,002*C2 3,44 4,72
C3 6,78 5,63
D1 0,33 1,00
0,004*D2 2,89 4,26
D3 4,89 5,01
E1 0,11 0,33
0,029*E2 2,56 4,33
E3 5,44 5,43
F1 0,33 1,00
0,005*F2 2,78 4,41
F3 6,22 5,74
Tabela 5 - Distribuição da média, desvio padrão
e valor de p referente ao desempenho dos escolares do GII
quanto à identificação dos erros de reversão.
ProvasMédiaDesvio-padrão Valor de p
A1 8,80 1,03
0,972A2 8,60 2,27
A3 8,80 1,48
B1 5,10 5,30
< 0,001*B2 8,10 4,77
B3 10,70 2,16
C1 6,00 6,13
0,007*C2 8,60 4,90
C3 10,30 3,43
D1 4,70 5,12
0,002*D2 7,50 5,30
D3 9,30 3,92
E1 5,00 5,38
0,001*E2 7,70 4,57
E3 9,50 3,84
F1 4,60 5,36
0,004*F2 7,60 4,79
F3 9,80 3,71
Legenda: A: sílabas com ditongos de nível complexo; B:
sílabas com grupos consonantais de nível simples; C: sílabas
com grupos consonantais de nível complexo; D: sílabas com
grupos consonantais e ditongos de nível simples; E: sílabas
com grupos consonantais e ditongos de nível complexo;
1: primeira avaliação; 2: segunda avaliação: 3: terceira
avaliação.
Legenda: A: letras passíveis de serem confundidas pelo
som no início da palavra, B: letras confundíveis por
grafia semelhante, C: inversões de palavras completas,
D: inversões de letras, E: inversões de letras dentro da
palavra, F: inversões de ordem da sílaba dentro da palavra,
1: primeiro momento de avaliação, 2: segundo momento de
avaliação, 3: terceiro momento de avaliação.

Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
331
DISCUSSÃO
Os resultados deste estudo demonstraram
que, ao longo do ano letivo, tanto os escolares
do 1º ano como os escolares do 2º ano foram
capazes de desenvolver as habilidades do
processamento fonológico como a consciência
fonológica, a memória de trabalho fonológica
e a velocidade de acesso às informações fono-
lógicas, conforme descrito na literatura
4-5,10,15,17
.
O desenvolvimento desta habilidade favorece
maior conhecimento e reconhecimento ortográ-
fico, favorecendo o acionamento do mecanis-
mo de conversão letra-som necessário para a
aquisição do princípio alfabético do sistema de
escrita do português brasileiro, como também
a percepção da posição da letra na palavra
19,20
.
Os achados deste estudo corroboram a li-
teratura
1-4,12
, que concluiu que a habilidade de
reconhecimento das letras envolve processa-
mento cognitivo semelhante ao da leitura, o que
facilita o desenvolvimento da leitura em séries
iniciais de alfabetização.
Neste estudo ficou evidente que, ao longo do
ano letivo, escolares que não apresentam dificul-
dades de aprendizagem se apropriam do princípio
alfabético do sistema de escrita do português brasi-
leiro. Princípio este que é responsável pelo uso do
mecanismo de conversão fonema-grafema
1,13,21,22
,
que favorece tanto o reconhecimento e decodifica-
ção de sílabas simples, como o de sílabas comple-
xas
10,11
e no sistema da língua portuguesa, restando
somente as situações que não consistem em única
correspondência grafo-fonêmica.
Apesar do protocolo adaptado para este es-
tudo ser para identificação precoce dos sinais da
dislexia, o mesmo foi sensível para indicar que,
ao longo dos dois primeiros anos escolares, o co-
nhecimento acerca da identificação e domínio das
letras, sílabas simples e complexas e identificação
de erros específicos na sílaba e palavras foram
facilitados e favorecidos pelas experiências com
tarefas de leitura e escrita em contexto de sala
de aula. Concluindo, assim, que o processo de
aquisição e desenvolvimento da leitura até o final
do 2º ano escolar deve oferecer ao escolar sem
dificuldades de aprendizagem o conhecimento
pleno da relação fonema-grafema e da comple-
xidade silábica para formação de palavras, e que,
caso esta aquisição não ocorra, os educadores e
profissionais que atuam com escolares em fase
inicial de alfabetização podem suspeitar da pre-
sença de um dos sinais da dislexia
4,15,16
, necessi-
tando investigação psicoeducacional detalhada
e aprofundada.
Desta forma, estudos futuros deverão ser
conduzidos com uma amostra maior de esco-
lares com o perfil deste estudo para amplia-
ção do conhecimento acerca do processo de
apropriação do princípio alfabético da Língua
Portuguesa, criando assim parâmetros para o
reconhecimento de escolares de risco para a
dislexia de forma preventiva.
Tabela 6 - Distribuição do valor de p referente à compara-
ção entre os momentos de aplicação do Protocolo de identi-
ficação e detecção precoce da dislexia quanto à identificação
dos erros de reversão.
Provas
Valor de p
Grupo I Grupo II
A2 - A1 0,453 0,888
A3 - A1 0,156 1,000
A3 - A2 0,304 0,756
B2 - B1 0,068 0,018
B3 - B1 0,018 0,005*
B3 - B2 0,028 0,027
C2 - C1 0,068 0,068
C3 - C1 0,017 0,027
C3 - C2 0,028 0,066
D2 - D1 0,068 0,027
D3 - D1 0,027 0,012*
D3 - D2 0,026 0,071
E2 - E1 0,109 0,018
E3 - E1 0,043 0,012*
E3 - E2 0,078 0,026
F2 - F1 0,068 0,034
F3 - F1 0,027 0,017
F3 - F2 0,043 0,027
Legenda: A: letras passíveis de serem confundidas pelo
som no início da palavra, B: letras confundíveis por
grafia semelhante, C: inversões de palavras completas,
D: inversões de letras, E: inversões de letras dentro da
palavra, F: inversões de ordem da sílaba dentro da palavra,
1: primeiro momento de avaliação, 2: segundo momento de
avaliação, 3: terceiro momento de avaliação.

Moraes MP & C apellini SA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
332
CONCLUSÃO
Os resultados deste estudo nos possibilita-
ram concluir que, ao longo do ano escolar, tanto
os escolares do GI como os escolares do GII
adquiriram a capacidade de conhecimento e re-
conhecimento de letras, sílabas e palavras, além
da capacidade de identificar e reconhecer erros
de inversão, demonstrando que os escolares sem
dificuldades de aprendizagem se apropriam do
princípio alfabético do sistema de escrita do
português brasileiro sendo expostos a tarefas
de leitura e escrita em contexto de sala de aula.
Desta forma, o protocolo utilizado para este
estudo pode ser um instrumento auxiliar ao pro-
fessor para identificar ao final do 2º ano escolar
os escolares que apresentam sinal da dislexia,
uma vez que é esperado, conforme dados deste
estudo, que ao final do 2º ano escolar os escola-
res dominem o conhecimento e reconhecimento
de letras, sílabas simples e complexas.
SUMMARY
Knowledge of letters, syllables and words by students 1
st
and 2
nd
gra-
des of basic education
Purpose: Verify and compare the performance of students from 1
st
and
2
nd
grades of basic education in knowledge of letters, syllables and words
in three assessment periods. Methods: The participants were 19 students
from a local public school attending the 1
st
and 2
nd
years of elementary
school in Marília-SP, from both genders, aged 6-7 years and 11 months
old. The students were divided into GI: composed of 9 students from 1
st

grade, and GII: composed of 10 students from 2
nd
grade of elementary
school. The two groups were subjected to the application of the Brazilian
adaptation of the Protocol for the identification and early detection of
dyslexia. This protocol was composed of two parts, called reading level
and identification of specific errors. The results were statistically analyzed
in order to compare the performance of the groups in the three assessment
periods. Results: The results revealed statistically significant differences,
indicating that the performance of both groups was higher when the first
and third assessments were compared. Conclusions: The results of this
study lead to the conclusion that, throughout the school year, both GI and
GII students became capable of understanding and recognizing letters,
syllables and words, and also of identifying and recognizing errors of
inversion, showing that the students without learning difficulties acquired
the alphabetic principle of the Brazilian Portuguese writing system by being
exposed to the tasks of reading and writing in the context of the classroom.
KEY WORDS: Reading. Evaluation. Learning. Teaching.

Conhecimento de letras, sílabas e palavras por escolares de 1º e 2º anos do ensino fundamental
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 325-33
333
REFERÊNCIAS
1. Bravo-Valdivieso L, Villalón M, Orellana E.
Predictibilidad del rendimiento en lectu-
ra: una investigación de seguimiento entre
primer y tercer año. Rev Latinoam Psicol.
2006;38:9-20.
2. Cardoso-Martins C, Pennington B. The rela-
tionship between phoneme awareness and
rapid serial naming skill and literacy acquisi-
tion: the role of developmental period and re-
ading ability. Sci Stud Read. 2004;8(1):27-52.
3. Cardoso-Martins C, Michalick MF, Pollo
TC. Como as crianças com síndrome de
Down aprendem a ler? O papel do conhe-
cimento do nome das letras. Psicol Reflex
Crit. 2006;19:53-9.
4. Capellini SA, Padula NAMR, Santos LCA,
Lourenceti MD, Carrenho EH, Ribeiro LA.
Desempenho em consciência fonológica,
memória operacional, leitura e escrita na dis-
lexia familial. Pro Fono. 2007;19(4):374-80.
5. Silva C, Capellini SA. Eficácia do progra-
ma de remediação fonológica e leitura
no distúrbio de aprendizagem. Pro Fono.
2010;22(2):131-8.
6. De Abreu MD, Cardoso-Martins C. Alphabe-
tic access route in beginning reading acqui-
sition in Portuguese: the role of letter-name
knowledge. Read Wri. 1998;10(2):85-104.
7. De Jong PF, Olson RK. Early predictors of
letter knowledge. J Exp Child Psychol.
2004;8:254-73.
8. Capellini SA, Sampaio MN, Fukuda MTM,
Oliveira AM, Fadini CC, Martins MA. Pro-
tocolo de identificação precoce dos proble-
mas de leitura: estudo preliminar com es-
colares de 1º ano escolar. Rev Psicopedag.
2009;81(26):367-75.
9. Capellini SA, Ferreira TL, Salgado CA,
Ciasca SM. Desempenho de escolares bons
leitores, com dislexia e com transtorno do
déficit de atenção e hiperatividade em no-
meação automática rápida. Rev Soc Bras
Fonoaudiol. 2007;12(2):114-9.
10. Blaiklock K. The importance of letter kno-
wledge in the relationship between phono-
logical awareness and reading. J Res Read.
2004;27:36-57.
11. Bowey JA. Socioeconomic status differen-
ces in preschool phonological sensitivity
and first-grade reading. J Educ Psychol.
1995;87:476-87.
12. Simmons DC, Coyne MD, Kwok OM,
McDonagh S, Harn B, Kame´enui EJ. Inde-
xing response to intervention: a longitudi-
nal study of reading risk from kindergar-
ten through third grade. J Learn Disabil.
2008;41(2):158-73.
13. Alameda JR, Cuetos F. Diccionario de fre-
cuencias de las unidades linguísticas del
castellano 1995;1-2.
14. Refundini DC, Martins MA, Capellini SA.
Treinamento da correspondencia grafema-
fonema em escolares de risco para a disle-
xia. Rev Psicopedag. 2010;20(83):191-201.
15. Anthony JL, Williams JM, McDonald R,
Corbitt- Shindler D, Carlson CD, Francis
DJ. Phonological processing and emergent
literacy in spanish-speaking preschool chil-
dren. Ann Dyslexia. 2006;56(2):239-70.
16. Jong PF. Phonological awareness and
the use of phonological similarity in let-
ter–sound learning. J Exp Child Psychol.
2007;98:131–52.
17. Condemarim M, Blomquist M. Dislexia: ma-
nual de leitura corretiva. Porto Alegre: Artes
Médicas; 1989.
18. Scliar-Cabral L. Princípios do sistema alfa-
bético do português do Brasil. São Paulo:
Contexto; 2003.
19. Capellini SA, Butarelli APKJ, Germano GD.
Learning disabilities of writing in students
from 1
st
to 4
th
grades of public education.
Educ Quest. 2010;37(23):146-64.
20. Gonçalves BAG, Capellini SA. Desempe-
nho de escolares de 1ª série na bateria de
identificação de erros de reversão e inver-
são na escrita: estudo preliminar. Rev CE-
FAC. 2010.
21. Pinheiro FH, Capellini SA. Treinamento au-
ditivo em escolares com distúrbio de apren-
dizagem. Pro Fono. 2010;22(1):49-54.
22. Salles JF, Parente MAMP. Funções neuropsi-
cológicas em crianças com dificuldades de lei-
tura e escrita. Psic Teor Pesq. 2006;22:153-62.
Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e
Ciências da Universidade Estadual Paulista - FFC/
UNESP, Marília, SP, Brasil.
Fonte de auxílio: Pró-Reitoria de Extensão Uni­
versitária – PROEX – Universidade Estadual Paulista
– UNESP.
Artigo recebido: 2/10/2010
Aprovado: 11/12/2010

Seno MP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
334
ARTIGO ORIGINAL
RESUMO – Introdução: O Transtorno do Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH) é considerado pelos educadores um fator
preocupante, principalmente na fase escolar. Caracterizado pelos sintomas
de desatenção, impulsividade e hiperatividade, afeta de 3 a 5% das
crianças. É um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece
na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida.
Apesar de não existir cura, sua manifestação tende a diminuir com a idade e
com o uso de medicação. Quando a criança inicia seu contato com a leitura e
escrita, é necessário que mantenha sua atenção e concentração sustentados,
a fim de que os objetivos pedagógicos possam ser alcançados. Objetivo:
Este trabalho teve como principal objetivo pesquisar o conhecimento de
52 educadores da Rede Municipal de Ensino de um município do interior
de São Paulo/SP sobre o TDAH. Método: Foi aplicado um questionário,
cujas perguntas foram elaboradas considerando-se a importância desse
conhecimento para atuação profissional dos educadores. Conclusão:
Concluímos que, apesar do professor não ter conhecimento teórico
suficiente para discorrer com propriedade sobre o TDAH, sua prática
escolar lhe permite observar, analisar, levantar hipóteses e adaptar sua
metodologia independente do que o sistema lhe oferece; possibilitando
que esse aluno tenha suas diferenças respeitadas e seja realmente incluído
na sala de aula regular.
UNITERMOS: Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade.
Atenção. Transtornos mentais diagnosticados na infância.
Transtorno do Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH): o que os
educadores sabem?
Marília Piazzi Seno – Fonoaudióloga e Psicopedagoga,
Coordenadora do Centro de Atendimento
Multidisciplinar - CAM da Secretaria Municipal da
Educação de Marília, Marília, SP
Correspondência Marília Piazzi Seno
Rua José Freire Sobrinho, 610 – Jd. Europa – Marília,
SP, Brasil – CEP 17514-014
E-mail: [email protected]
Marília Piazzi Seno

Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
335
INTRODUÇÃO
Segundo a Classificação Estatística Interna-
cional de Doenças e Problemas Relacionados
com a Saúde
1
, o Transtorno do Déficit de Aten-
ção e Hiperatividade (TDAH) está classificado
na categoria de transtornos hipercinéticos,
descrito como “grupo de transtornos carac-
terizados por início precoce – habitualmente
durante os cinco primeiros anos de vida –, falta
de perseverança nas atividades que exigem
envolvimento cognitivo e tendência a passar
de uma atividade a outra sem acabar nenhuma,
associadas a uma atividade global desorgani-
zada, incoordenada e excessiva. Os transtornos
podem se acompanhar de outras anomalias.
As crianças hipercinéticas são frequentemente
imprudentes e impulsivas, sujeitas a acidentes
e incorrem em problemas disciplinares mais
por infrações não premeditadas de regras do
que por desafio deliberado. Suas relações com
os adultos são frequentemente marcadas por
uma ausência de inibição social, com falta de
cautela e reserva normais. São impopulares com
as outras crianças e podem se tornar isoladas
socialmente. Estes transtornos se acompanham
frequentemente de um déficit cognitivo e de
um retardo específico do desenvolvimento da
motricidade e da linguagem. As complicações
secundárias incluem um comportamento disso-
cial e uma perda de autoestima”.
O TDAH é uma síndrome heterogênica, de
etiologia multifatorial, dependente de fatores
genéticos-familiares, adversidades biológicas
e psicossociais, caracterizada pela presença de
um desempenho inapropriado nos mecanis -
mos que regulam a atenção, a reflexibilidade
e a atividade motora. Seu início é precoce, sua
evolução tende a ser crônica, sem repercussões
significativas no funcionamento do sujeito em
diversos contextos de sua vida
2
.
Caracterizado pelos sintomas de déficit de
atenção, hiperatividade e impulsividade, esse
transtorno pode ser classificado em quatro tipos
3
:
• tipo desatento – não enxerga detalhes,
faz erros por falta de cuidado, apresen-
ta dificuldade em manter a atenção,
parece não ouvir, tem dificuldade em
seguir instruções, desorganização,
evita/não gosta de tarefas que exigem
um esforço mental prolongado, distrai-
se com facilidade, esquece atividades
diárias;
• tipo hiperativo/ impulsivo: inquietação,
mexer as mãos e os pés, remexer-se
na cadeira, dificuldade em permane-
cer sentada, corre sem destino, sobe
nos móveis ou muros, dificuldade em
engajar-se numa atividade silenciosa-
mente, fala excessivamente, responde
perguntas antes delas serem formula-
das, interrompem assuntos que estão
sendo discutidos e se intrometem nas
conversas;
• tipo combinado: quando o indivíduo
apresenta os dois conjuntos de critérios
desatento e hiperativo/impulsivo;
• tipo não específico, quando as caracte-
rísticas apresentadas são insuficientes
para se chegar a um diagnóstico com-
pleto, apesar dos sintomas desequili-
brarem a rotina diária.
É o transtorno neuropsiquiátrico mais diag-
nosticado na infância, persistindo até a idade
adulta em torno de 60 a 70% dos casos
4
. Aco-
mete aproximadamente de 3 a 5% das crianças,
sendo mais usualmente encontrado em meninos
do que meninas, numa proporção de 3:1
5
.

O uso de medicamentos em indivíduos com
diagnóstico de TDAH provoca tranquilidade,
aumento no período de atenção e, por vezes,
sonolência. Essa resposta positiva não é obser-
vada em todos os pacientes, sendo que alguns
deles tornam-se mais excitados e agressivos
e as doses empregadas deverão ser tituladas
individualmente e, após ter sido encontrada a
dose ideal, esta deverá ser mantida
6
.
O TDAH vem sendo considerado pelos
educadores como um fator preocupante, prin-
cipalmente na fase escolar. Num período onde
a criança inicia seu contato com a leitura e es-
crita, é necessário que mantenha sua atenção
e concentração sustentados, a fim de que os

Seno MP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
336
objetivos pedagógicos propostos possam ser
alcançados. Na idade escolar, crianças com
TDAH apresentam maior probabilidade de re-
petência, evasão, baixo rendimento acadêmico
e dificuldade emocionais e de relacionamento
social, e pessoas que apresentam sintomas de
TDHA na infância têm uma maior probabilidade
de desenvolver problemas relacionados com
comportamento
7
.
Com relação às comorbidades associadas ao
transtorno, foi descrita a seguinte prevalência
de problemas psiquiátricos em pacientes com
TDAH comparado com grupo controle: 18 vs.
4% de depressão; 6 vs. 1% transtornos da in-
fância, 6 vs. 2% de transtorno de ajustamento, 6
vs. 1% de TOD; 5 vs. 0% de psicose, 4 vs. 1% de
TC, 2 vs. 1% de abuso de substância e 1 vs. 1%
de ansiedade. O mesmo estudo estendeu-se aos
pais de pacientes com TDAH e pais controles: 9
vs. 4% de depressão, 1 vs. 0% de transtorno da
infância; 4 vs. 2% de outros transtornos mentais;
2 vs. 1% de transtorno de ajustamento; 0 vs. 0%
de TOD; 1 vs. 1% de psicose; 0 vs. 0% de TC;
2 vs. 1% de abuso de substância e 1 vs. 1% de
ansiedade
8
.
Uma vez diagnosticado o TDAH, esse aluno
deve ser considerado como uma criança com
necessidades educacionais especiais, pois para
que tenha garantidas as mesma oportunidade
de aprender que os demais colegas de sala de
aula, serão necessárias algumas adaptações
visando diminuir a ocorrência dos comporta-
mentos indesejáveis que possam prejudicar
seu progresso pedagógico: sentar o aluno na
primeira carteira e distante da porta ou janela;
reduzir o número de alunos em sala de aula;
procurar manter uma rotina diária; propor ativi-
dades pouco extensas; intercalar momentos de
explicação com os exercícios práticos; utilizar
estratégias atrativas; explicar detalhadamente
a proposta; tentar manter o máximo de silêncio
possível; orientar a família sobre o transtorno;
evitar situações que provoquem a distração. tais
como ventiladores, cortinas balançando, carta-
zes pendurados pela sala; aproveitar situações
que exijam movimentação para escolhê-lo como
auxiliar (por exemplo, pedir que entregue os
cadernos, que vá à diretoria ou que responda
ao exercício na lousa); manter os alunos em
lugares fixos na sala, para que seja justificado
o motivo pelo qual a criança com TDAH senta
sempre naquela carteira; solicitar que os pais
procurem por atendimentos especializados que
possam complementar o trabalho pedagógico
realizado em sala de aula; encaminhá-lo para
as aulas de reforço escolar, se necessário.
Pensando na importância do papel do pro-
fessor frente a um aluno que apresenta com-
portamento indicativo de TDAH, este trabalho
teve como principal objetivo verificar o conhe-
cimento dos educadores da Rede Municipal
de Ensino de um município do interior de São
Paulo/SP sobre esse transtorno.
MÉTODO
Participaram desse estudo 52 educadores
da Rede Municipal de Ensino, sendo que 28
estavam inseridos em Escolas Municipais de
Ensino Fundamental (EMEF) e 24 em Escolas
Municipais de Educação Infantil (EMEI).
Para coleta dos dados foi aplicado um ques-
tionário contendo 17 questões (Anexo 1): 9
dissertativas, 7 com as opções “sim” e “não”
e 1 de múltipla escolha com 2 opções de res-
posta. O tempo para seu preenchimento foi de
15 minutos e a avaliadora permaneceu na sala
para que fosse garantida a individualidade das
respostas.
As questões foram elaboradas levando em
consideração a importância desse conhecimento
para atuação profissional dos educadores, uma
vez que, num momento no qual a inclusão é am-
plamente defendida por estudiosos, espera-se
que o professor esteja preparado para receber
alunos com qualquer necessidade educacional
especial e tenha condições de integrá-lo aos
demais colegas de sala no ensino regular.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quanto ao perfil dos participantes, 27 eram
professores, 18 coordenadores, 3 diretores e 4 auxi-
liares de direção. O tempo de atuação na educação

Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
337
Escola: ( ) EMEI ( ) EMEF Data: ____/____/____
Tempo de formação? _______________
Lecionou(a) para alunos com TDAH? ( ) Sim ( ) Não
Função atual: ___________________________________
1. O que significa a nomenclatura TDAH?
2. Quais são as causas do TDAH?
3. A partir de que idade é possível perceber o TDAH?
4. Quais são os comportamentos observados numa criança com TDAH?
5. Em qual sexo você acha que o TDAH ocorre co m maior frequência?
6. Quais exames são necessários para diagnosticar o TDAH?
7. Qual especialista está apto a diagnosticar o TDAH?
8. TDAH tem cura?
( ) Sim ( ) Não
9. Como é o tratamento para o TDAH?
10. Uma criança com TDAH consegue concentrar-se por bastante tempo em uma única
atividade?
( ) Sim ( ) Não
11. É possível ter TDAH sem apresentar dificuldades de aprendizagem?
( ) Sim ( ) Não
12. Quem tem TDAH apresenta maior chance de desenvolver outra alteração de saúde
mental?
( ) Sim ( ) Não
13. Os sintom as do TDAH m udam conforme a idade da pessoa?
( ) Sim ( ) Não
14. Todas as crianças com TDAH necessitam usar medicação?
( ) Sim ( ) Não
15. Você acha que o TDAH realmente existe ou a hiperatividade da criança é consequência da
falta de limites?
( ) Realmente existe ( ) É falta de limites
16. Na sua opinião, a criança com TDAH percebe que é diferente?
( ) Sim ( ) Não
17. Como o professor pode ajudar um aluno com TDAH?

ANEXO 1 - Questionário empregado na pesquisa.

Seno MP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
338
variou de 4 a 40 anos, sendo que 17 referiram já
terem lecionado para alunos com TDAH e 36, não.
Para verificar a familiaridade dos entrevista-
dos com a nomenclatura que caracteriza o trans-
torno, foram questionados sobre o significado
da sigla TDAH: 51 participantes a identificaram
e 1 não soube responder.
A Tabela 1 apresenta as respostas dos educa-
dores relacionadas aos assuntos: causa, idade em
que podem ser observados os sintomas do TDAH,
prevalência sexual do transtorno, exames e espe-
cialistas relacionados ao diagnóstico, cura, tipo
de tratamento mais indicado, possibilidade de
concentração numa única atividade, dificuldade
de aprendizagem, comorbidades, modificação
dos sintomas com o avanço da idade, necessida-
de de medicação, confusão entre TDAH e falta
de limites e autopercepção do transtorno.
Na literatura, encontramos várias possíveis
causas para o TDAH, tais como hereditariedade,
substâncias ingeridas na gestação, sofrimento
fetal, exposição ao chumbo, problemas fami-
liares, entre outros. Porém, a probabilidade de
que a criança tenha um diagnóstico de TDAH
aumenta até 8 vezes se os pais também tiverem
o transtorno
9
. A predisposição genética foi de-
monstrada em estudos usando famílias, casos de
gêmeos e adoção
10
. A Tabela 1 demonstra que 19
participantes desconhecem as causas do TDAH.
Quanto à idade em que é possível perceber
o TDAH, 16 educadores (sendo 14 de escolas do
Ensino Fundamental) achavam que os sintomas
aparecessem na fase de alfabetização. Nor-
malmente, as crianças com TDAH apresentam
uma história de vida desde a idade pré-escolar
com a presença de sintomas
11
. Na maior parte
Tabela 1 – Respostas dos educadores ao questionário investigativo.
Assunto Respostas Nº Participantes
Causa do TDAH
Desconhecem 19
Neurológica 15
Genética 6
Outras 6
Hereditariedade 5
Idade na qual iniciam
os sintomas
Na alfabetização 16
Não sabem 14
Antes dos 2 anos 12
Na pré-escola 9
Outros 1
Prevalência sexual
No sexo masculino 41
Não sabem 8
Mesma proporção em ambos os sexos 3
Diagnóstico
Exames
Eletrofisiológicos 19
Não sabem 19
Clínico 14
Especialistas
Outros 18
Neurologista 17
Neurologista ou Psiquiatra 10
Não sabem 7
Psiquiatra 6

Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
339
das vezes, se manifesta muito cedo na vida do
portador, mas apenas mais tarde, com o início
da vida escolar, é que os sintomas revelam-se
de forma mais perceptível
12
.

Sobre os comportamentos que podem ser
observados numa criança com TDAH foram
citados: inquietação, dificuldade de aprendi-
zagem, distração, desatenção, dificuldade de
concentração, fala excessiva, não para sentado,
repete a mesma coisa, agitação, mudança de
humor, impulsividade, hiperatividade, disper-
são, indisciplina, desajeitado, desmotivação,
dificuldade de interação, dificuldade de memo-
rização, irritabilidade, ansiedade, desinteresse,
dificuldade em respeitar regras.
Geralmente o TDAH está relacionado a sin-
tomas de desatenção, hiperatividade e impulsi-
vidade
13
, sendo estes manifestados nas crianças
como segue: falta de persistência nas atividades
cognitivas, falta de atenção, falta de concentra-
ção, estar no “mundo da lua”, tendência de ficar
mudando de atividades sem acabá-las, agitação
excessiva, desorganização, dispersão, impru-
dência, ficar remexendo as mãos e pés quando
sentado, não parar quieto, responder perguntas
antes de terem sido finalizadas, intromissão
descabida, perder as coisas com facilidade
11,12
.
Com relação à prevalência sexual, a maioria
dos participantes assinalou o sexo masculino. O
transtorno é mais comum nos meninos que nas
Continuação da Tabela 1
Cura
Não existe 32
Existe 14
Em branco 6
Tratamento
Medicamentoso e terapêutico 24
Medicamentoso 10
Terapêutico 10
Não sabem 8
Concentração
Não é possível 50
É possível 1
Dificuldades de aprendizagem
Pode não apresentar 36
Sempre apresentará 16
Relação com o desenvolvimento de
doenças mentais?
Não 31
Sim 17
Não sabem 4
Modificam dos sintomas com o avan-
çar da idade?
Sim 26
Não 21
Não sabem 5
Medicação
Nem sempre 34
Sempre 14
Em branco 4
TDAH existe ou é falta de limites?
Existe 51
Não existe 1
Autopercepção sobre o transtorno?
Sim 32
Não 20

Seno MP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
340
meninas
14,15
, sendo que essa proporção pode
variar de 3:1 a 5:1
16
.
Sobre os exames necessários para diagnos-
ticar o TDAH, a maior parte dos participantes
se referiu aos exames eletrofisiológicos, como
eletroencefalograma, mapeamento cerebral,
tomografia computadorizada e ressonância
magnética; porém nenhum desses exames é
capaz de fornecer um diagnóstico
17
. Os edu-
cadores lembraram ainda da importância de
uma equipe multidisciplinar para a avaliação,
que é fundamentalmente clínica, baseada em
critérios operacionais claros e bem definidos,
provenientes de sistemas classificatórios como
o DSM-IV (vide quadro clínico) ou a CID-10.
Sobre qual especialista está apto a diagnos-
ticar o TDAH, as respostas dos participantes
citaram os médicos neurologistas e psiquiatras;
mas muitos não sabiam e alguns se referiram
a outros profissionais da saúde, tais como psi-
cólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos.
Apesar desses profissionais poderem levantar a
hipótese diagnóstica, o CID somente poderá ser
estabelecido por um médico. A maioria das fa-
mílias acaba optando por procurar neurologistas
e evitam levar seus filhos em um psiquiatra, por
preconceito. Tendo conhecimento das caracte-
rísticas do transtorno, o próprio professor pode
orientar o responsável a procurar pelo médico
em busca do diagnóstico, que se confirmado
possibilitará o tratamento adequado ao aluno.
Com relação à cura do TDAH, alguns autores
acreditam que o transtorno persiste na idade
adulta em aproximadamente 50 a 70% dos
casos; embora o quadro clínico sofra algumas
modificações com o passar do tempo
18
. Como
demonstra a Tabela 1, a maioria dos entrevista-
dos assinalou que o TDAH não tem cura.
Quanto ao tratamento, grande parte dos edu-
cadores indicou o uso da medicação e muitos o
associaram ao tratamento terapêutico. Foi relata-
da a importância da participação familiar no pro-
cesso. O tratamento do TDAH é primordialmente
medicamentoso, havendo evidências robustas de
superioridade da farmacoterapia sobre o trata-
mento psicoterápico isolado
19
. Mais de 70% dos
pacientes com TDAH que procuram ambulató-
rios especializados apresentam comorbidades;
portanto, o psiquiatra clínico provavelmente terá
que escolher a intervenção psicofarmacológica
para o seu paciente levando em consideração a
presença de alguma comorbidade
20
.
Sobre a possibilidade de uma criança com
TDAH concentrar-se em uma única atividade
por um longo período de tempo, 51 assinalaram
que não é possível e apenas 1 referiu que sim. O
indivíduo com TDAH apresenta uma dificulda-
de real na concentração; porém é possível que
isso ocorra diante de atividades estimulantes,
como, por exemplo, um jogo de videogame.
Esses raros momentos de quietude levam os
pais e professores a atribuírem a dificuldade
de concentração para realização das tarefas
escolares à falta de vontade da criança.
Sobre a dificuldade de aprendizagem asso-
ciada aos casos de TDAH, cerca de 20 a 30% das
crianças com TDAH apresentam dificuldades
específicas, que interferem na sua capacidade
de aprender
21
. Em geral, o professor observa
uma discrepância entre o potencial intelectual
da criança e o desempenho acadêmico da mes-
ma, o que pode ocorrer mesmo entre as crianças
com inteligência superior à média
22
. Na Tabela
1, observamos que a maioria dos educadores
acredita que uma criança com TDAH pode não
apresentar dificuldades de aprendizagem.
Dentre os participantes, 31 acham que não
há relação entre o TDAH e as doenças mentais.
Existe baixa concordância entre informantes
sobre a saúde mental de crianças. Os profes-
sores tendem a superestimar os sintomas de
TDAH, principalmente quando há presença
concomitante de outro transtorno disruptivo do
comportamento
23
.
Quanto à variação dos sintomas de acordo
com a idade, a maioria dos participantes res-
pondeu que se alteram. A apresentação clínica
pode variar de acordo com o estágio do desen-
volvimento. Sintomas relacionados à hiperati-
vidade/impulsividade são mais frequentes em
pré-escolares com TDAH do que sintomas de
desatenção. A literatura indica que os sintomas

Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
341
de hiperatividade diminuem na adolescência,
restando, de forma mais acentuada, os sintomas
de desatenção e de impulsividade
24
.
Com relação ao tratamento do TDAH, este
envolve uma abordagem múltipla, englobando
intervenções psicossociais e psicofarmacológi-
cas
25
. No âmbito das intervenções psicossociais,
o primeiro passo deve ser educacional, por meio
de informações claras e precisas à família a res-
peito do transtorno. Muitas vezes, é necessário
um programa de treinamento para os pais, a fim
de que aprendam a manejar os sintomas dos
filhos. É importante que eles conheçam as me-
lhores estratégias para o auxílio de seus filhos na
organização e no planejamento das atividades.
Por exemplo, essas crianças precisam de um
ambiente silencioso, consistente e sem maiores
estímulos visuais para estudarem
13
. A maioria
dos participantes assinalou que o melhor trata-
mento nem sempre requer o uso da medicação.
Apesar de suas manifestações serem con-
fundidas com indisciplina
26
, o TDAH não é
causado por falta de disciplina ou controle pa-
rental, assim como não é um sinal de maldade
da criança
27
. De acordo com a Tabela 1, apenas
um educador assinalou que o TDAH não existe,
sendo o comportamento da criança justificado
pela falta de limites.
Questionados sobre a própria percepção da
criança com relação ao seu transtorno, 32 pessoas
pensam que o indivíduo percebe ser diferente e 20
acham que ele não tem essa percepção. Algumas
crianças são capazes de perceberem sua inquie-
tude a tal ponto que isso chega a incomodá-las.
Tentam modificar seu próprio comportamento,
mas não conseguem. As crianças hiperativas
podem provocar a falência emocional de uma
família. Algumas vezes, os pais ficam sem saber
como agir, porém, outras vezes, adaptam-se bem
ao estilo da criança. O que se observa comumente
é que se instalam entre os membros da família
tensões, tornando conflituosas todas as atividades
da vida cotidiana
28
.
As atitudes citadas pelos participantes como
auxiliadoras para uma criança com TDAH fo-
ram: incentivo, reforço dos comportamentos
adequados, trabalho com a família, busca de
conhecimento sobre o assunto, planejamento de
atividades interessantes, encaminhamento para
especialistas, integração aos demais colegas de
turma, favorecimento do ambiente promoven-
do tranquilidade e silêncio, apresentação de
atividades curtas, oferecimento de orientação
individual, utilização de recursos diferenciados,
não demonstração de ansiedade, brevidade nas
explicações, sentar a criança próxima à profes-
sora e distante da janela, seguir uma rotina,
proporcionar momentos de locomoção na sala
de aula, respeitar seus limites.
Um bom desempenho escolar depende,
cada vez mais, da criança permanecer sentada
e quieta, de longos períodos de concentração e
de fazer as lições escolares
22
. Para atender às
exigências desse ambiente, a criança necessita
ter controle e ajustar seu comportamento para
responder satisfatoriamente a essas demandas.
Crianças com TDAH têm esse ajuste prejudi-
cado pela falta de controle da impulsividade e,
frequentemente, apresentam em seu histórico
escolar registros de suspensão, de expulsão e
de reprovação
29
.
CONCLUSÃO
O TDAH ainda é um assunto desconhecido
pela maioria dos professores. As informações
que necessitam de embasamento teórico,
como causas, idade de manifestação, médico
especialista, cura, tratamento e comorbidades,
estão distantes dos docentes que, muitas vezes,
lecionam exatamente para esse público. Já as
questões que envolviam a prática de sala de
aula, cujas respostas podiam ser resgatadas por
acontecimentos do dia-a-dia, como prevalência
sexual, capacidade de concentração e manifes-
tações comportamentais, foram corretamente
assinaladas, demonstrando a sensibilidade do
educador mesmo quando não houve a busca
pelo assunto em específico.
As estratégias sugeridas pelos próprios par-
ticipantes visando ao progresso do aluno com
TDAH são totalmente pertinentes; apesar de
nem sempre serem aplicadas. Todas as adapta-

Seno MP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
342
ções citadas não dependem de um sistema e sim
do próprio educador, que lançando mão dos seus
recursos reúne condições para que, analisando
sua classe, adeque sua metodologia de maneira
mais produtiva possível. Houve uma variação de
respostas dependendo do local de atuação do
educador – EMEI ou EMEF. Isso ocorreu porque
suas constatações foram formuladas a partir da
faixa etária da população com que eles lidam.
Concluímos que apesar do educador não ter
conhecimento teórico suficiente para discorrer
com propriedade sobre o TDAH, sua prática
escolar lhe permite observar, analisar, levantar
hipóteses e adaptar sua metodologia indepen-
dente do que o sistema lhe oferece; possibi-
litando que esse aluno tenha suas diferenças
respeitadas e seja realmente incluído na sala
de aula regular.
SUMMARY
Attention-deficit hyperactivity disorder (ADHD): what teachers know?
Introduction: The Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD)
is considered a worry by educators, especially during school time.
Characterized by inattention, hyperactivity and impulsivity, it affects
3-5% of children. It is a neurobiological disorder of genetic cause which
appears in childhood and often accompanies the individual throughout
his life. Although there is no cure, its symptoms tend to decrease with age
and the use of medication. When children start reading and writing it is
necessary to maintain sustained attention and concentration in order to
achieve the pedagogical objectives. Objective: This study aimed to assess
the knowledge of 52 teachers of municipal schools of a city in the country
of Sao Paulo state on Attention Deficit Hyperactivity Disorder. Methods:
A questionnaire was administered taking into account the importance of
such knowledge for their professional practice. Conclusions: We conclude
that although teachers may not have enough theoretical knowledge about
ADHD, their school practice allows them to observe, analyze, hypothesize
and adapt their methodology regardless of what the system offers, therefore
enabling students to have their differences respected and be actually
included in a regular classroom.
KEY WORDS: Attention deficit disorder with hyperactivity. Attention.
Mental disorders diagnosed in childhood.
REFERÊNCIAS
1. Organização Mundial da Saúde. Classifica-
ção de transtornos mentais e de comporta-
mento da CID-10: descrições clínicas e di-
retrizes diagnósticas. Porto Alegre: Editora
Artes Médicas;1993.
2. Rohde LA, Mattos P. Princípios e práticas em
TDAH. Transtorno de Déficit de Atenção/Hi-
peratividade. Porto Alegre: Artmed; 2003.
3. American Psychiatry Association. DSM-IV-
TR – Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais; 2000.
4. Mattos P, Segenreich D, Saboya E, Louzã M,
Dias G, Romano M. Adaptação transcultural
da escala ASRS-18 (versão1.1) para avalia-
ção do transtorno de déficit de atenção e hi-
peratividade em adultos para o português.
Rev Psiq Clín. 2006;33(4):188-94.
5. Karande S. Attention deficit hyperactivity
disorder: a review for family physicians. In-
dian J Med Sci. 2005;59(12):546-5
6. Sukiennik PB (org). O aluno problema:
transtornos emocionais de crianças e ado-
lescentes. 2ª ed. Porto Alegre: Mercado
Aberto; 2000.

Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 334-43
343
7. Kaippert ACM. Hiperatividade, 2003. Dis-
ponível em:<http://www.pedagogiaemfoco.
pro.br/spdslx08.htm>. Acesso em: 5/ 3/2009.
8. Swensen AR, Birnbaum HG, Secnik K,
Marynchenko M, Greenberg P, Claxton A.
Attention-deficit/hyperactivity disorder:
increased costs for patients and their fami-
lies. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry.
2003;42(12):1415-23.
9. Biederman J, Faraone SV, Keenan K, Ben-
jamin J, Krifcher B, Moore C, et al. Further
evidence for family-genetic risk factors
in attention deficit hyperactivity disorder.
Patterns of comorbidity in probands and
relatives psychiatrically and pediatrically
referred samples. Arch Gen Psychiatry.
1992;49(9):728-38.
10. Thapar A, O’Donovan M, Owen MJ. The
genetics of attention deficit hyperactivity
disorder. Hum Mol Genet. 2005;14 Spec No.
2:R275-82.
11. Topczewki A. Hiperatividade: como lidar?
São Paulo: Casa do Psicólogo;1999.
12. Diniz NO, Sena AS. Distraído e a 1000 por
hora: guia para familiares, educadores e por-
tadores de transtorno de déficit de atenção/
hiperatividade. Porto Alegre: Artmed; 2007.
13 . Rohde LA. Benczik E. Transtorno de déficit
de atenção/hiperatividade. O que é? Como
ajudar? Porto Alegre: Artes Médicas; 1999.
14. Holmes J, Payton A, Barrett J, Harrington
R, McGuffin P, Owen M, et al. Association
of DRD4 in children with ADHD and comor-
bid conduct problems. Am J Med Genet.
2002;114(2):150-3.
15. Brazelton TB, Sparrow JD. 3 a 6 anos: mo-
mentos decisivos do desenvolvimento in-
fantil. Porto Alegre: Artmed; 2003.
16. Kaplan H, Sadock BJ, Grebb JA. Compên-
dio de psiquiatria: ciências do comporta-
mento e psiquiatria clínica. 7ª ed. Porto Ale-
gre: Artmed; 2003.
17. Conners CK. A teacher rating scale for use
in drug studies with children. Am J Psychia-
try. 1969;126(6):884-8.
18. Wender PH. Attention deficit disorder in
adults. Oxford: Oxford University Press; 1995.
19. The MTA Cooperative Group. A 14-mon -
th randomized clinical trial of treatment
strategies for attention-deficit/hyperactivi-
ty disorder. Multimodal treatment study of
children with ADHD. Arch Gen Psychiatry.
1999;56(12):1073-86.
20. Souza I, Pinheiro MA, Denardin D, Mattos
P, Rohde LA. Attention-deficit/hyperactivi-
ty disorder and comorbidity in Brazil: com-
parison between two referred samples. Eur
Child Adolesc Psychiatry (in press).
21. Goldstein S, Goldstein M. Hiperatividade:
como desenvolver a capacidade de atenção
da criança. Campinas: Editora Papyrus; 1994.
22. Benczik E, Peroni EB. Transtorno de défi-
cit de atenção/hiperatividade: atualização
diagnóstica e terapêutica: um guia de orien-
tação pra profissionais. 2ª ed. São Paulo:
Casa do Psicólogo; 2002
23. Rohde LA, Biederman J, Knijnik MP, Ket-
zer CR, Chachamovich E, Vieira GM, et al.
Exploring different information sources for
DSM-IV ADHD diagnoses in Brazilian ado-
lescents. J Attention Dis. 1999;3(2):91-3.
24. American Academy of Child and Adoles-
cent Psychiatry. Practice parameters for the
assessment and treatment of children, ado-
lescents and adults with attention deficit/
hyperactivity disorder. J Am Acad Adolesc
Psychiatry. 1997;36(10 Suppl):85S-121S.
25. Spencer T, Biederman J, Wilens T, Harding
M, O’Donnell D, Griffin S. Pharmacothera-
py of attention-deficit hyperactivity disorder
across the life cycle. J Am Acad Child Ado-
lesc Psychiatry. 1996;35(4):409-28.
26. De Luca MAS, Ciulik F. A indisciplina da
criança em casa e o TDAH: uma identifica-
ção de indícios por parte da família. Dispo-
nível em: http://www.futureschool.com.br/
artigos/artigo5.pdf Acesso em: 4/6/2010.
27. Barkley RA. Transtorno de déficit de aten-
ção/hiperatividade: guia completo e auto-
rizado para pais, professores e profissionais
da saúde. Porto Alegre: Artmed; 2002.
28. Borges SMC. Há um fogo queimando em
mim: as representações sociais da criança
hiperativa. Fortaleza: Universidade Federal
do Ceará; 1997.
29. Ciasca SM. Distúrbios de aprendizagem:
proposta de avaliação interdisciplinar. São
Paulo: Casa do Psicólogo; 2003.
Trabalho realizado no Centro de Atendimento
Multidisciplinar, Secretaria Municipal da Educação
de Marília, Marília, SP, Brasil.
Artigo recebido: 15/7/2010
Aprovado: 18/11/2010

Machado AC & A lmeida MA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
344
ARTIGO ORIGINAL
RESUMO – Objetivo: Avaliar os efeitos de uma prática de leitura
pautada no ensino colaborativo em alunos de uma sala regular. Método:
Participaram do estudo 22 alunos do 4º ano do ensino regular, dos quais
um deles apresentava necessidades educacionais especiais. Por meio da
abordagem descritiva observacional, os resultados obtidos neste estudo
foram coletados durante o processo na sala de aula. Resultados: Verificou-se
que a estratégia escolhida para a intervenção da professora – roda da leitura
– foi relevante, por possibilitar exposições linguísticas e o desenvolvimento
da esfera cognitiva, tanto do aluno com necessidade especial, bem como
para todos os demais alunos.
UNITERMOS: Ensino. Inclusão escolar. Pessoas com deficiência.
Parceria no contexto escolar:
uma experiência de ensino colaborativo
para educação inclusiva
Andréa Carla Machado – Profa. Ms., Pedagoga,
Psicopedagoga e Doutoranda do Programa de Pós-
Graduação em Educação Especial da Universidade
Federal de São Carlos (USFCar) – São Carlos, SP.
Professora do Centro Universitário de Rio Preto
(UNIRP), SP.
Maria Amélia Almeida – Profa. Dra., Professora
Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação
Especial da Universidade Federal de São Carlos –
USFCar – São Carlos, SP.
Correspondência Maria Amélia Almeida
Universidade Federal de São Carlos
Centro de Educação e Ciências Humanas,
Departamento de Psicologia
Rodovia Washington Luiz, km 235 – Cx. Postal 676
Monjolinho – São Carlos, SP, Brasil – CEP 13565-905
E-mail: [email protected]
Andréa Carla Machado; Maria Amélia Almeida

Parceria no contexto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
345
INTRODUÇÃO
Ensinar constitui a atividade principal na
profissão do docente e essa deve ser compreen-
dida como uma ‘arte’ que envolve aprendizagem
contínua e envolvimento pessoal no processo de
construção permanente de novos conhecimentos
e experiências educacionais, as quais preparam o
docente para resolver novas situações ou proble-
mas emergentes no dia-a-dia da escola e da sala
de aula. Segundo o Ministério da Educação
1
,

as
reformas educacionais e a resposta à diversidade
das necessidades educacionais dos alunos exigem
novas aptidões em termos de formação docente
2
.
Sob essa perspectiva, com o advento da
filosofia de inclusão escolar, intensificou-se a
argumentação de que todos os estudantes devem
ser escolarizados numa mesma sala de aula.
Entretanto, a prática inclusiva implica desafios
consideráveis para o professor de classe comum.
Cada vez mais se tem trabalhado o princípio de
que os professores não devem trabalhar sozinhos,
mas em equipes que apresentem propostas, cujas
funções tenham objetivos comuns para melhorar
a escolarização de todos os alunos
3
.
Assim, o poder das equipes colaborativas
4

encontra-se na capacidade para fundir habi-
lidades únicas de educadores, para promover
sentimentos de interdependência positiva,
desenvolver habilidades criativas sobre reso-
lução de problemas, promover apoio mútuo e
compartilhar responsabilidades.
Dessa forma, o trabalho colaborativo pode
diminuir distinções de papéis existentes entre
os profissionais envolvidos, a fim de que cada
um possa fazer o melhor uso possível de seus
saberes. Onde o desafio reside somente definir
um bom funcionamento da equipe, e melhor
utilizar todos os conhecimentos existentes
5
.
Um dos modelos de trabalho colaborativo que
vem sendo investigado tem sido a colaboração
entre o professor da educação regular e o do ensi-
no especial
3
. O Ensino colaborativo (Co-teaching
– termo utilizado na Língua Inglesa) proposto por
autores norte-americanos
6
considera importante
a atuação de dois ou mais profissionais dando
instruções em um mesmo espaço físico.
O ensino colaborativo tem sido utilizado
para favorecer a inclusão escolar, envolvendo a
parceria direta entre os professores da Educação
comum e especial. Tal forma de trabalho está
em crescente ascensão na literatura como uma
estratégia inclusiva
7-9
.
Professores de educação especial e regular
devem se responsabilizar pelo planejamento e
avaliação do ensino para um grupo com ou sem
necessidades educacionais especiais. Na sala
de aula, os dois professores trabalham juntos e
desenvolvem um currículo diferenciado visando
à melhoria do ambiente de aprendizagem
10
.
De modo geral, o objetivo do ensino cola-
borativo é criar opções para aprender e prover
apoio a todos os estudantes na sala de aula de
ensino regular, combinando as habilidades do
professor comum e do professor especialista
11
.
Dois estudos no Brasil tiveram o objetivo de
explorar em contextos inclusivos as possibilida-
des do ensino colaborativo e merecem aqui ser
mencionados. O primeiro deles defende que se
deve tentar buscar uma melhoria na qualifica-
ção docente no sentido de tornar as práticas pe-
dagógicas do professor do ensino comum, mais
efetivas às necessidades de alunos surdos
12
. O
estudo apresentou como objetivo implementar
e avaliar um programa de formação continuada
baseado no co-planejamento. O trabalho foi
realizado em 20 semanas, o qual envolveu: o
pesquisador e três diferentes professores regu-
lares, que realizaram encontros com intuito de
planejar estratégias que seriam realizadas ao
longo do ano. Os dados coletados envolveram
o protocolo de planejamento educacional, o
protocolo de cada unidade até de avaliação.
Após a intervenção, foram coletadas as opiniões
dos professores sobre as atividades de plane-
jamento. Entretanto, não houve envolvimento
direto da atuação colaborativa em sala de aula,
uma vez que a intervenção esteve restrita à
situação de planejamento com os professores.
Os resultados apontaram que os professores
avaliaram que as estratégias implementadas
beneficiaram não apenas seus alunos surdos,
mas todos os demais alunos da turma. Mas,

Machado AC & A lmeida MA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
346
os resultados evidenciaram também que a in-
tervenção colaborativa não foi suficiente para
solucionar as dificuldades de comunicação de
uma das professoras com um dos alunos surdos.
Outro estudo nacional envolvendo o ensino
colaborativo
7
refere-se à pesquisa realizada em
duas escolas comuns de ensino fundamental, em
quatro turmas de 1ª a 4ª séries (respectivos 2º
e 5º ano), onde estavam inseridos alunos com
deficiência intelectual. A intervenção compre-
endeu o apoio do professor do ensino especial
dentro da classe comum, a qual durou em cada
turma um ano e o estudo teve duração total de
dois anos. Após a etapa de intervenção, foram
reavaliadas as medidas de desempenho e cole-
tadas medidas de validade social baseadas nas
opiniões das professoras e das famílias sobre o
ensino colaborativo. Observou-se que todos os
seis alunos com deficiência intelectual tiveram
evolução no desempenho tanto acadêmico como
de socialização, ainda que tenha permanecido
uma discrepância em comparação ao rendi-
mento médio da turma. O ensino colaborativo
foi avaliado como efetivo enquanto estratégia
de desenvolvimento pessoal e profissional dos
professores envolvidos em práticas que visaram
à inclusão escolar.
Assim, pesquisas realizadas no Brasil e, prin-
cipalmente, em outros países, sugerem que o tra-
balho colaborativo entre professores traz várias
vantagens para escolas, professores e alunos.
As escolas tornam-se inclusivas, os professores
aprendem a refletir sobre as suas práticas, apren-
dem novas formas de enfrentar as dificuldades e
tornam-se mais autoconfiantes
3,7,13-15
.
O ensino colaborativo
13
está relacionado
com a maneira de tratar novas ideias, de im-
plementar mudanças, com os sentimentos de
integração, de solidariedade e posturas de
autoavaliação, autocrítica e de competências
reflexivas coletivas. Pesquisadores nacionais
14

apresentam evidências de que esse tipo de en-
sino (colaborativo) traz uma série de benefícios
para as escolas em que se efetiva, entre eles:
o papel de recuperar nos professores as suas
capacidades de produzir conhecimentos sobre
seu trabalho, promovendo aperfeiçoamento
contínuo e aprendizagem.
No entanto, é mister salientar que ainda são
poucos os trabalhos relacionados com esse tema
no Brasil – ensino colaborativo –, o que implica
o desenvolvimento de mais pesquisas, bem
como justifica o relato da presente experiência
profissional para uma futura replicação.
Partindo do pressuposto de que a leitura se
constitui como uma prática social e complexa,
e ratificando a importância do professor no
processo de construção das significações atri-
buídas à leitura no universo escolar, o presente
trabalho focalizou a leitura como processo de
socialização. O motivo de considerar o proces-
so de socialização com a leitura está baseado
na concepção de homem com construtor de
significados e de sociedade entendida como
construção histórico-social.
Considerando que a escola integra o conjun-
to das instituições sociais onde são difundidas as
redes de significação, tendo a leitura por objeto
e por projeto e, ainda que seu papel é oferecer
os mecanismos de acesso ao mundo da escrita
e aos registros da cultura letrada, esse trabalho
teve como objetivo avaliar o efeito de uma práti-
ca relacionada à leitura em alunos participantes
de um processo de educação inclusiva, por meio
de livros de histórias infantis, implementadas
no cotidiano da sala de aula tomando como
referência o ensino colaborativo.
MÉTODO
O processo de observação teve como pre-
missa a colaboração-intervenção. Salienta-se
que o presente trabalho refere-se a um relato
de experiência profissional.
Local e participantes
O campo de observação configurou-se numa
sala de aula da 3ª série do Ensino Fundamen-
tal (4º ano) de uma escola da rede pública de
ensino, de um município de pequeno porte do
interior paulista.
A aluna participante-alvo apresentava nove
anos de idade e necessidades educacionais

Parceria no contexto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
347
especiais, tendo como diagnóstico hemipare-
sia espástica. Na hemiparesia espástica, são
observadas alterações do movimento em meio
corpo, como por exemplo, perna e braço direitos,
sendo, na maioria dos casos, o membro superior
o mais afetado.
A professora regular tinha 55 anos de idade,
quinze anos de magistério e experiência de dez
anos com alunos com necessidades especiais.
A classe era constituída, ainda, por 21 alunos
sem necessidades especiais, pertencentes a
mesma série, com média de idade de nove anos.
Procedimentos e etapas do estudo
Primeiramente, todos os cuidados relacio-
nados aos aspectos éticos foram seguidos. Os
dados foram colhidos após a assinatura do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
pelos responsáveis pelas crianças e convênio
estabelecido com a escola.
Foi utilizada a metodologia qualitativa com
abordagem observacional descritiva. Os dados
da presente experiência foram coletados por meio
do diário de campo e diários reflexivos. No diário
de campo, as observações a priori eram anotadas,
em um caderno, pela professora/especialista, em
tópicos (na sala de aula – durante a observação),
e depois registradas, por datas, em um arquivo no
computador denominado de “Registro da prática
de leitura”. O diário reflexivo da professora/par-
ticipante era registrado por ela, em um caderno
salientando sua prática pedagógica de leitura,
e descrevendo também suas reflexões sobre a
mesma. O delineamento envolveu uma etapa pre-
liminar para a condução dos procedimentos éticos.
A pesquisa constituiu-se em duas etapas pre-
viamente elaboradas. Na primeira, a professora/
especialista entrou em contato com a professora/
participante explicitando o teor da proposta do
trabalho, o qual foi aceito sem obstáculos e com
muito entusiasmo pela mesma. Também nesta
etapa elaborou-se um roteiro para pontuar e
auxiliar nas observações em sala, corroborando,
assim, para efetuação dos registros. Na segunda
etapa, iniciaram-se os encontros e o ensino cola-
borativo propriamente dito, onde o planejamento
e as orientações deram-se em forma de diálogos,
pré-leituras seguidas de discussões sobre temas
escolhidos. Para a efetuação deste, os encontros
foram realizados extra-aula, uma vez por sema-
na. A prática construída em questão foi realizada
em dezoito aulas, as quais duraram, em média,
uma hora e meia (sempre antes do intervalo). Os
livros utilizados foram da coleção “Estrelinha” da
autora Sônia Junqueira - editora Ática. Ressalta-
se que a coleção é formada por uma série de
dezoito livrinhos, os quais são divididos em três
séries com níveis de dificuldades progressivas
de texto e ortografia, e suas histórias são estru-
turadas com começo, meio e fim.
Salienta-se que a prática de leitura descrita
neste texto como trabalho colaborativo surgiu
das reflexões, dos diálogos e do planejamento
das professoras envolvidas.
A fim de esclarecer o entendimento da cons-
trução do trabalho colaborativo, a seguir será
exposto de forma sucinta o procedimento ado-
tado em relação ao desenvolvimento da prática
da leitura, chamada de “roda de leitura”.
Inicialmente, a professora organizava a tur-
ma em uma roda e fazia a leitura em voz alta de
diferentes tipos de textos (poemas, notícias, re-
ceitas, cartas) e, por final, do livro. A professora
familiarizava os alunos com vários tipos de tex-
tos. O livro de história infantil, no entanto, tinha
lugar de destaque na roda de leitura proposta.
Dessa forma, ao propor a formação da roda, a
professora sinalizava à turma, que a atividade
tinha uma dinâmica diferente, que pressupunha
interação e diálogo. Antes de iniciar a leitura do
livro a professora sempre mostrava a ilustração
da capa e perguntava quem sabia dizer qual era
a temática. Alguns se arriscavam baseados na
ilustração. Depois que todos já sabiam o nome
da obra, ela pedia que todos falassem de que
imaginavam tratar o enredo. A professora en-
fatizava a entonação – principalmente na fala
dos personagens – para criar dramaticidade e
dar ritmo à leitura. A cada trecho importante,
ela mostrava a ilustração da página para toda
a roda, onde a trama ganhava comentários dos
alunos. Mesmo quando havia palavras difíceis,

Machado AC & A lmeida MA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
348
a professora não simplificava, pois é dessa ma-
neira que o vocabulário das crianças se amplia.
A atividade terminava com a abertura de
espaço para que todos os alunos se manifes-
tassem sobre o que tinha sido lido, como, por
exemplo, quais eram os trechos preferidos, que
parte(s) cada um achou mais engraçada. Enfim,
a professora fazia um levantamento de possíveis
dúvidas sobre o texto e sugeria uma (re)apre-
sentação de cada um para os colegas. Assim,
apareciam diferentes impressões sobre a trama.
Processamento e Análise dos dados
O diário de campo da professora/especialista
descrevia as atitudes, dúvidas e dificuldades
na construção, em parceria com a professora/
participante, do processo formativo e, particular-
mente, do processo interativo (prática da leitura).
Registraram-se neste diário as impressões da
mesma sobre o modelo colaborativo e o papel
de colaboração e parceria, bem como os limites
e possibilidades de sua ação mediadora no pro-
cesso de aprendizagem de todos os alunos. Os
registros que foram desenvolvidos no diário de
campo mesclaram informações descritivas com
reflexões pessoais. Durante as observações, a
professora/especialista fazia anotações rápidas
num bloco de notas, a fim de não perder os as-
pectos mais importantes dos encontros. Depois
que saía do campo, a mesma elaborava registros
ampliados, procurando reproduzir em detalhes o
que havia observado. Foram realizadas leituras
pormenorizadas dos registros – diários de campo.
Em seguida, os conteúdos dos diários foram des-
membrados em unidades de conteúdo, ou seja,
passagens dotadas de informações completas a
respeito de episódios vivenciados na sala de aula.
No diário reflexivo da professora/participan-
te, foi descrita a trajetória das aulas, envolvendo
a prática escolhida, nele também a professo-
ra apresentou uma interpretação pessoal do
elemento trabalhado, ou seja, enriqueceu a
descrição com comentários que expressavam
sua maneira de compreender o elemento em
questão, a prática de leitura.
Assim, os diários reflexivos produzidos pela
professora/especialista foram também anali-
sados em categorias de conteúdo, sendo neles
registradas observações da sua prática docente
e da prática de leitura em questão.
Para ambos os instrumentos foram realiza-
das a classificação das unidades delimitadas e
identificadas, assim, duas categorias para cada
manuscrito.
Diários de campo:
• relatos sobre o que o professor fez ou
disse;
• informações de qualquer natureza
sobre a aluna-alvo.
Diários reflexivos:
• descrições sobre o desempenho dos
alunos nas atividades de leitura;
• sobre si – havendo referências a própria
prática, impressões, sentimentos e ex-
pectativas sobre o ensino colaborativo.
RESULTADOS
No primeiro momento de interação entre
a professora/especialista e professora/partici-
pante, foi aportado o conhecimento científico
acerca da leitura e suas práticas diferenciadas,
buscando compreender o processo de sua aqui-
sição, estudando e discutindo também as suas
diferentes concepções e caracterizações. Isso
deu margem para o desenvolvimento de pos-
síveis estratégias práticas de intervenção com
os alunos. As reflexões realizadas durante os
planejamentos estavam sempre sustentadas na
experiência da prática cotidiana e no referencial
teórico utilizado pela professora regular:
“O primeiro encontro de ensino colabo-
rativo me permitiu refletir sobre o meu
compromisso com segurança e tranqui-
lidade no processo de ensino. Assim, as
minhas observações diante das ativida-
des dos alunos foram intensificadas e
detectei que o alfabeto foi reconhecido
pela aluna-alvo.”
Então, em um segundo momento, buscou-se
aprofundar a análise do material estudado. Foi a

Parceria no contexto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
349
partir dessa etapa que a professora mostrou-se
completamente imersa na proposta de ensino.
Ela destacou que, durante o processo, a maior
transformação em sua prática havia sido a
construção do diário reflexivo, pois quando uma
pessoa relata os fatos vividos por ela mesma,
percebe-se que reconstrói a trajetória percorrida
dando-lhe novos significados:
“O trabalho enfatizou a oralidade, es-
timulando a reflexão dos alunos, a difi-
culdade de Beatriz (nome fictício) está
evidente, o que exige meu auxílio, bem
como dos colegas de sala.”
“A reflexão girou em torno da neces-
sidade de realizar atividades claras e
concretas relacionadas ao cotidiano de
Beatriz, por isso a cada dia a minha
responsabilidade está em fiscalizar o
alcance de cada um para atingir suas
habilidades e potenciais. Observa-se que
o avanço é gradativo.”
Assim, a reflexão perante a própria prática
provoca mudanças na forma como as pessoas
compreendem a si mesmas e aos outros
12
. O
estabelecimento de uma relação amigável tam-
bém contribuiu para o processo colaborativo.
O trabalho em colaboração proporcionou
à professora um olhar mais crítico em relação
a sua prática e possibilitou o aprofundamento
sobre a prática desenvolvida. Como demonstra
o relato no diário de campo da pesquisadora:
“Relatou os acontecimentos e reflexões
particulares no diário reflexivo com maior
frequência.”
“A professora estava mais flexível às
sugestões e criou estratégias voltadas à
leitura e escrita, além do que foi sugerido
nas reuniões semanais.”
“Dialogou com maior segurança, relatou
suas atitudes em sala e refletiu sobre suas
atitudes.”
A atuação da pesquisadora nesse processo
se revelou, algumas vezes, difícil, porém lhe
permitiu olhar para a realidade profissional com
maior segurança e autonomia.
No entanto, o modelo colaborativo realizado
neste trabalho não se trata apenas de um conhe-
cimento implícito na atividade prática. Trata-se
de um diálogo entre a prática vivida e as cons-
truções teóricas formuladas em parceria reflexiva
por ambas – professora regular e professora de
educação especial. Essa ação mostrou o impacto
positivo do ensino colaborativo quando trabalha-
do de forma efetiva e comprometido.
A estratégia escolhida para a intervenção
da professora – roda da leitura – mostrou-se
positiva tanto para o aluno com necessidade
especial, bem como para todos os demais, ou
seja, toda a classe foi beneficiada.
Foi possível pontuar uma avaliação e caráter
prático sobre o ensino colaborativo do ponto de
vista dos envolvidos, pois além desse trabalho
possibilitar a reflexão da prática pedagógica,
pela professora/participante, torna-se importan-
te considerar a implementação de estratégias
colaborativas em futuras pesquisas, as quais po-
derão, por sua vez, subsidiar Políticas Públicas.
A partir das práticas de leitura pôde-se ob-
servar a satisfação dos alunos em construir nar-
rativas, e em perceber suas reais capacidades,
bem como a contribuição efetiva para sociali-
zação da ideias emergidas durante as leituras,
como demonstrado na reflexão da professora
em seu diário:
“Considerei a atividade produtiva, pois
ao longo do processo os alunos falaram
de forma espontânea sobre o tema para
o grupo.”
Esse processo (experiência) mostrou que,
com a motivação dos alunos e comprometimento
da professora e da escola, muitos problemas
podem ser amenizados, ou mesmo sanados.
DISCUSSÃO
É amplamente sabido que as aprendizagens
da leitura e da escrita são eventos importantes
na vida de uma criança. Contudo, há dados ne-
gativos em relação ao seu desenvolvimento. Da-
dos do 5º Indicador de analfabetismo funcional
(Inaf), realizado pelo Instituto Paulo Monteiro,

Machado AC & A lmeida MA
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
350
em 2005, demonstraram que 74% dos brasilei-
ros adultos não conseguem ler textos longos,
relacionar informações e comparar diferentes
materiais escritos
15
.
Atividades realizadas por meio da leitura
tornam-se um rico meio de promover o aper-
feiçoamento da mesma, bem como fortalecer a
socialização, ainda mais se essas práticas forem
construídas por meio de colaboração entre pro-
fessor e professor de educação especial.
Essa afirmação corrobora os achados da lite-
ratura, como é o exemplo da pesquisa
13
, na qual
foi observado que todos os seis alunos benefi-
ciados nas atividades desenvolvidas durante o
ensino colaborativo tiveram evolução no desem-
penho tanto acadêmico como de socialização.
No entanto, também é preciso ressaltar que
nem todos os trabalhos envolvendo colabora-
ção (modelo aqui já descrito) são passíveis de
sucesso, muitos ainda encontram dificuldades,
foi o caso encontrado no estudo
12
onde a inter-
venção esteve restrita ao planejamento. Essa
dificuldade pode dar-se pelo fato de que o
ensino colaborativo é um processo e, portanto,
depende muito da relação entre os envolvidos,
o que demanda verdadeiramente um relacio-
namento colaborativo
4
.
Por outro lado, o ensino colaborativo entre
a professora/participante e a professora/espe-
cialista, descrito neste relato de experiência,
vem ao encontro dos elementos pontuados
nos Indicadores de Qualidade na Educação
proposto pelo Ministério da Educação e nas
pesquisas realizadas na área de Educação e
Educação Especial.
Os resultados indicaram que a mediação
exercida pela professora/especialista no pro-
cesso colaborativo, na prática explicitada nesse
texto, é fundamental para auxiliar nas reflexões
das práticas pedagógicas de professores. Nesse
processo de colaboração e construção, a profes-
sora/especialista criou novas condições para
que o professor/participante realizasse as suas
atividades de forma mais lúdica.
Diante disso, há a necessidade de produzir
mais pesquisas sobre as possibilidades de cola-
boração entre educação regular e especial nas
escolas, bem como trabalhar a importância da
formação de professores para atuarem no ensino
colaborativo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento do professor com pla-
nejamento, (re)planejamento aplicando e ava-
liando estratégias, parece auxiliá-lo a pensar
na possibilidade de utilização de um espaço
realmente colaborativo e reflexivo, criando
assim um lugar diferenciado dentro da escola
8
.
A apresentação do presente relato envolven-
do o ensino colaborativo indicou que a estraté-
gia desenvolvida conjuntamente tem potencial
para melhorar a qualidade do ensino regular.
Assim, a proposta baseada no ensino cola-
borativo parece também ter promovido o de-
senvolvimento de habilidades na professora,
pois, de forma geral, por meio das análises
dos diários de campo e diários reflexivos,
notou-se que o ensino colaborativo pode
gerar efeitos convenientes, principalmente
com relação às práticas do educador de sala
regular que contém alunos com necessidades
especiais.
Quanto às perspectivas de atuação em sala
de aula, os resultados apontaram que é preciso
difundir nos contextos escolares a real contri-
buição do ensino colaborativo, garantindo que
os momentos vivenciados entre a professora/
participante do ensino comum auxiliada pela
professora/especialista possam ser refletidos
em práticas futuras.
Portanto, a contribuição do ensino colabora-
tivo caminha rumo ao pensamento pedagógico
da inclusão escolar, pois permeia questões do
cotidiano, do desempenho do professor regu-
lar e resgata atitudes que permitem a parce-
ria e a colaboração conjunta. Dessa forma, a
proposta de tal ensino é um caminho viável
e gratificante, tornando todos os envolvidos
construtores do seu próprio processo de ensino
e aprendizagem.

Parceria no contexto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 344-51
351
REFERÊNCIAS
1. Brasil. Ministério da Educação. Secretaria
Educação Especial SEESP. Educar na diver-
sidade: material de formação docente. Bra-
sília, DF: material Cynthia Duk; 2006.
2. Brasil. Ministério da Educação. Indicadores
da qualidade na educação/ Ação Educativa,
Unicef, Pnud, INEP, Seb/MEC (coordenado-
res). São Paulo, SP: Ação Educativa, 2007.
3. Fontes RS. Ensino colaborativo uma pro-
posta de educação inclusiva. Araraquara:
Junqueira&Marin Editores;2009.
4. Mendes EG. Colaboração entre ensino re-
gular e especial: o caminho do desenvolvi-
mento pessoal para a inclusão escolar. In:
Manzini EJ, orgs. Inclusão e acessibilidade.
Marília: ABPEE;2006. p.29-41.
5. Mendes EG. Caminhos da pesquisa sobre
formação de professores para inclusão esco-
lar. In: Mendes EG, Almeida MA, Hayashi
MCPI, Orgs. Temas em Educação Especial:
conhecimentos para fundamentar a prática.
Araraquara: Junqueira & Marin Editores;
2008. p 92-122.
6. Cook L, Friend M. Co-teaching: guidelines
for creating effective practices. Focus on
Exceptional Children. 1995;28(3):1-16.
7. Capellini VLMF. Possibilidades da colabo-
ração entre professores do ensino comum e
especial para o processo de inclusão escolar
[Tese de Doutorado]. São Carlos:Universidade
Federal de São Carlos; 2004.
8. Gargiulo RM. Education on contemporary
society: an introduction to exceptionality.
Nashville: Thomson Learning;2003.
9. Argueles ME, Hughes MT, Schumm JS. Co-
teaching: a different approach to inclusion.
Principal. 2000;79(4):48-51.
10. Gately S, Gately FJ Jr. Understanding co-
teaching components. Teaching Exceptio-
nal Children. 2001;33:40-7,
11. Junqueira S. Coleção estrelinha. São Paulo:
Editora Ática;2005.
12. Fullan M, Hargreaves A. A escola como or-
ganização aprendente: buscando uma edu-
cação de qualidade. 2a ed. Porto Alegre:
Artes Médicas;2000.
13. Zanata EM. Planejamento de práticas peda-
gógicas inclusivas para alunos surdos numa
perspectiva colaborativa [Tese de Doutora-
do]. São Carlos: Universidade Federal de
São Carlos; 2004.
14. Zabalza MA. Diários de aula: um instru-
mento de pesquisa e desenvolvimento pro-
fissional. Porto Alegre: Artmed; 2004.
15. Dickel A, Colussi R, Bragagnolo A, Andre-
olla N. Em um processo de formação conti-
nuada, a possibilidade de articulação entre
teoria e prática: reflexões sobre uma expe-
riência compartilhada [CD ROM]. In: Anais
do IV Seminário de Pesquisa em Educação
da Região Sul (ANPEd-Sul); 2000.
SUMMARY
Partnership in the school environment: a collaborative teaching expe-
rience for inclusive education
Objective: The aim of this work was to evaluate the effects of reading
practice relative in collaborative teaching in the students in a regular
classroom. Methods: Twenty-two students from the 4
th
grade of regular
school participated in this study, one of which was a student with special
educational needs. Through observational-descriptive approach, the results
of this study were collected during classroom process. Results: It was found
that the strategy chosen by the teacher for the intervention – the reading
wheel – was positive for both the student with special needs and the others.
KEY WORDS: Teaching. Inclusion in school. Disabled persons.
Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação
em Educação Especial da Universidade Federal de
São Carlos (USFCar), São Carlos, SP, Brasil.
Artigo recebido: 30/6/2010
Aprovado: 3/9/2010

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
352
ARTIGO DE PESQUISA
RESUMO – Objetivos: Analisar a percepção e as vivências de
professores sobre seu papel na inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais. Outro aspecto que se pretendeu investigar
diz respeito aos sentimentos vividos por professores e alunos com
necessidades educacionais especiais que, muitas vezes, resultam em
insucesso: identidades em crise; sofrimento gerado pela vergonha e/ou
culpa, pelo sentimento de incompetência; etc. Para isso, recorremos à
Psicologia Histórico-Cultural, utilizando os pressupostos de seu principal
representante, Vygotsky, além de autores como Rey, Souza, entre outros,
que partem dessa mesma base. Método: Nossa investigação tem se dado
com professores de uma escola pública do município de Campinas-SP, em
que foram realizadas entrevistas semi-estruturadas e observações em vários
espaços da escola. Resultados e Conclusão: Os resultados indicaram que
os professores possuem percepções que se contrapõem aos pressupostos da
educação inclusiva, como uma visão do aluno com necessidades especiais
como incapaz, que necessita de tratamento médico por meio de remédios,
colocando no aluno a origem e a solução dos problemas que vivem em sala
de aula. Além disso, percebemos que os professores também são afetados
com essa questão, pois o fato de não saberem como trabalhar com o aluno
provoca mal-estares que os levam a buscar fora de sua sala de aula e de
sua prática docente as causas para o insucesso que vivenciam.
UNITERMOS: Educação especial. Educação. Psicologia educacional.
Inclusão escolar.A vivência de professores sobre o processo
de inclusão : um estudo da perspectiv a da
P
sicol ogia Histórico-Cultural
Eveline Tonelotto Barbosa – Graduanda em Psicologia
pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
Pesquisa realizada com bolsa de Iniciação Científica
pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo – FAPESP.
Vera Lucia Trevisan de Souza – Professora do
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em
Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Campinas – PUC-Campinas.
Correspondência
Vera Lucia Trevisan de Souza
Pontifícia Universidade Católica de Campinas –
PUCCAMP
Av. John Boyd Dunlop, s/n° – Jd. Ipaussurama –
Campinas, SP, Brasil – CEP: 13060-904
E-mail: [email protected]
Eveline Tonelotto Barbosa; Vera Lucia Trevisan de Souza

Professores e a inclusão
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
353
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo apre-
sentar os resultados de uma pesquisa em que se
discutiu e analisou as percepções e as vivências
dos professores sobre o processo de inclusão e
suas implicações para o desenvolvimento do
professor e dos alunos envolvidos com a inclu-
são de pessoas com necessidades educacionais
especiais em classes regulares. Para alcançar
esses objetivos, adotou-se a perspectiva teórico-
metodológica da Psicologia Histórico-Cultural,
que toma como objeto de estudo o sujeito histó-
rico, que se constitui na relação com a cultura.
Reconhecemos que, para a inclusão se
concretizar, é necessária uma mobilização em
vários âmbitos, como o político, o social e o
institucional, no entanto, como nossa proposta
era discutir o papel do professor nesse processo,
priorizamos a análise da importância de seu pa-
pel nesse contexto, ressaltando, contudo, que a
questão da inclusão não pode ser tomada como
responsabilidade unicamente do professor.
Para Camisão
2
, o empenho do professor na
busca por resolver os problemas que se colocam
em sua prática interfere, de forma decisiva, no
desenvolvimento do aluno com necessidades
especiais. Desta forma, o sucesso ou não da
inclusão depende, em grande medida, das ati-
tudes e crenças do professor.
As crenças exprimem percepções e pensa-
mentos que funcionam como filtros na inter-
pretação da realidade, podendo influenciar o
comportamento do professor em relação a esse
aluno
2
. Assim, as crenças que o professor tem
sobre os alunos com necessidades especiais
influenciam o seu modo de ensiná-los.
Essas crenças são resultantes das representa-
ções que foram construídas ao longo da história
sobre a criança com necessidades especiais que,
muitas vezes, têm em sua base rótulos e estig-
mas. Assim, ao entrar na escola tanto esse sujeito
como os professores terão que se defrontar com
essas representações e enfrentar o desafio de
superá-las. Em razão disto, as representações
que o professor tem acerca deste aluno definirá a
forma de relação entre eles e, em consequência,
as possibilidades de desenvolvimento do aluno.
Rey
11
entende representação social como
o conhecimento mobilizado pelas pessoas
“comuns”, na comunicação da vida cotidiana,
sobre o conhecimento de questões do universo
reificado, ou seja, sobre saúde e doença, de-
sigualdade social, educação, entre outros. As
representações sociais são verdadeiras teorias
do senso comum, que se objetivam como sentido
para as pessoas na medida em que geram um
contexto de inteligibilidade.
Essa inteligibilidade reflete o conhecimento
como “verdades” absolutas e são responsáveis
pela organização do tecido social de um deter-
minado contexto histórico. As representações
sociais são um tipo de conhecimento, mas não
conhecimento cognitivo e sim social
11
.
Nesse sentido, as representações dos pro-
fessores sobre seus alunos com necessidades
especiais são baseadas no senso comum e
também na imagem passada pelos professores
anteriores, interferindo na concepção inicial do
professor. Essas crenças e representações são
devidas à desinformação a respeito do tema,
bem como das “deficiências”
5
.
Para ir um pouco além, podemos recorrer à
teoria da identidade de Ciampa
3
, que diz que,
antes mesmo de nascer, o indivíduo já está inse-
rido em um mundo, em um grupo social, que lhe
atribui uma série de expectativas, determinações
e representações prévias, ou seja, o indivíduo
já tem uma identidade pressuposta. Quando
essas expectativas são mantidas pelo grupo, há
uma reposição de algo que já está dado. Para o
indivíduo, superar a identidade pressuposta não
é algo fácil. A superação implica o rompimento
com aquilo que se configura como hábito padro-
nizado, sobretudo as representações.
Nesse sentido, há que se pensar que os alunos
com necessidades educacionais especiais têm
uma identidade pressuposta, a qual é carregada
de preconceitos e limitações, e o aluno precisa
“nadar contra a corrente” para superar essa
identidade que foi objetivada pela sociedade.
Além das marcas que a “exclusão” causa no
aluno, há que se pensar nos sentimentos vividos
pelos professores que estão envolvidos em pro-
cessos de inclusão, resultantes do insucesso, como
sofrimento gerado pela vergonha e/ou culpa pelo
sentimento de incompetência, por exemplo.
Segundo Souza
13
, o professor tem consigo a
conscientização de que ensinar faz parte do seu

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
354
papel de educador. Não obstante, há também o
juízo alheio que o cobra pelo seu papel, ou seja,
a sociedade pressiona o professor para que cum-
pra seu papel de educador. Essa pressão ocorre
porque os professores estão inseridos em um con-
texto social, tendo uma identidade pressuposta
que conforma as expectativas, as determinações
e as representações prévias de seu papel.
A partir disso, o professor constrói sua identi-
dade profissional constituída pela representação
que tem de si e do que os demais atores sociais
atribuem a ele, no que se refere ao seu trabalho,
ou seja, é a constante reposição que o professor
faz da identidade de educador pressuposta.
Segundo Luna e Baptista
8
, em cada momento
manisfesta-se apenas uma parte da totalidade
do indivíduo. Entretanto, como o indivíduo é
uma totalidade, cada identidade se reflete em
outra identidade, que o indivíduo também pos-
sui. Nesse sentido, quando a identidade profis-
sional está em crise, a totalidade também sofre.
A partir dessas considerações, pode-se pen-
sar que o professor também precisa ser olhado
como sujeito que necessita de subsídios, de con-
dições especiais, para desenvolver o trabalho
de inclusão. Nesse sentido, compreender sua
vivência sobre a inclusão permite identificar
suas necessidades e investir em sua formação.
Logo, o entendimento da percepção e da
vivência dos professores sobre os alunos com
necessidades educacionais especiais, a análise
dos preconceitos existentes e a conscientização
dos professores sobre seu papel na inclusão
são fatores importantes e determinantes para o
processo de desenvolvimento educacional pleno
desses alunos.
MÉTODO
A presente pesquisa foi realizada em uma
escola municipal no interior do estado de São
Paulo e participaram do presente estudo qua-
tro professoras, sendo duas de sala regular que
possuem alunos em processo de inclusão, e duas
professoras da Educação Especial. Como forma
para coletar os dados utilizou-se de observações
na sala de aula das professoras e também em
outros espaços da escola, como refeitório, pátio,
etc. Além das observações, também se realizaram
entrevistas semi-estruturas com as quatro pro-
fessoras, para um maior aprofundamento sobre
suas percepções e vivências. As entrevistas foram
gravadas e transcritas logo em seguida e as ob-
servações foram registradas em diário de campo.
RESULTADOS
O papel do professor na inclusão: formação
preparo
Apesar de o presente estudo ter como objeti-
vo o conhecimento e a discussão da percepção e
da vivência dos professores sobre seu papel na
inclusão, é de extrema importância considerar
o processo de formação desses professores,
pois, segundo alguns estudos
2,5,6
, as crenças
e representações que os professores possuem
sobre o aluno com necessidades especiais estão,
muitas vezes, vinculadas ao conhecimento que
possuem acerca da temática, adquiridos por
ocasião de sua formação.
Esse aspecto apareceu nas falas das profes-
soras entrevistadas (nomes apresentados são
fictícios), que relatam a “falta de formação para
trabalhar com a inclusão escolar”:
É interessante essa posição do professor
de chegar e ter um aluno com necessidade
especial. Ele olha para o aluno e pensa:
o que vou fazer? Porque nós não temos
nenhuma formação, nem nós que somos
mais antigas, nem os novos. Então não
sabemos como essa inclusão vai aconte-
cer. Então, entregam para você o diário
de classe e você vai para a classe e se
vira (Maria).
Eu me sinto assim, meio que sem condi-
ções, não tenho preparação para traba-
lhar com a inclusão (Ilana).
Conforme se pode observar, as duas pro-
fessoras entrevistadas, que atuam em classes
regulares em que se encontram alunos com ne-
cessidades especiais, expressam a percepção de
que para trabalhar com a inclusão é necessária
uma formação específica e que, sem a qual, o
professor passa a ser uma vítima no processo,
tão excluído quanto o aluno, visto não acreditar
que tenha condições de levar adiante sua tarefa.
Contudo, as professoras de Educação Especial,
cuja função é atender esses alunos ditos incluídos
em alguns horários ao longo da rotina escolar,

Professores e a inclusão
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
355
individualmente e pontualmente, se contrapõem
à posição de vítima das professoras Maria e Ilana,
por entenderem que elas não se interessam ou
não se comprometem com o processo de inclusão,
deixando essa tarefa para os especialistas:
Então eu acho que o professor tem que
estudar mais, é uma classe que, além de
desunida, não vai estudar, só vai quando
vai perder alguma coisa. Além de que,
eu não acredito nesse governo paterna-
lista que dá tudo para o professor, que é
obrigado a te dar um curso de formação
para o trabalho e em horário de trabalho,
porque se você oferecer fora do horário
de trabalho, a pessoa não vai! (Luciana).
Colocam um outro profissional especiali-
zado para tentar suprir essa defasagem
do professor, porque se todos professores
recebessem capacitação em Educação
Especial não precisaria da gente aqui
(das professoras da Educação Especial).
Então eles não te dão o curso, mas co-
locam profissionais na escola. Eu não
aceito essa fala do professor, de que não
é capacitado para atender o aluno, não
aceito. E ainda quando a gente quer dar
uma ajuda, eles não aceitam (Luciana).
Letícia, a outra professora de classe especial,
relatou em vários encontros que tem muita di-
ficuldade em propor alguma atividade para as
professoras que têm alunos de inclusão, pois
muitas vezes elas não aceitam. Relatou, tam-
bém, que muitos dos professores preferem que
ela tire o aluno da sala, do que trabalhar eles
próprios com o aluno, a partir das orientações
que Letícia pode oferecer (observações regis-
tradas em Diário de Campo).
Nas falas e relato acima, evidenciam-se as
contradições que costumam envolver os pro-
cessos de inclusão nas escolas: as professoras
das salas regulares dizem não ter preparo e
nem condições adequadas para trabalhar com
os alunos especiais, enquanto as professoras da
Educação Especial entendem que, na verdade,
o que falta às professoras de classes regulares é
interesse e compromisso com o processo. Diante
disso, podemos perguntar o que significam es-
sas contradições? Será de fato falta de interesse?
Como apontam vários estudos
4,15,12
, parece
que a formação de professores, oferecida em
cursos de graduação ou formação continuada
necessita ser melhorada no que concerne aos
seus conteúdos e métodos, principalmente em
relação ao atendimento à diversidade. Também
não se pode negar a falta de condições adequa-
das para o exercício do trabalho dos docentes,
resultado, muitas vezes, da queda do investi-
mento público e da deterioração das condições
de trabalho desses profissionais, conforme
apontado por alguns professores.
Diante dessas questões, Freitas
4
aponta a im-
portância de melhor formação dos professores,
relatando a necessidade de políticas públicas
que valorizem o trabalho docente, por meio de
formação continuada e melhores condições de
trabalho, salário e plano de carreira.
Contudo, no caso de nossa pesquisa, ainda
que considerando esses aspectos relativos à pro-
fissão como essenciais à promoção de uma ação
pedagógica de qualidade, nos perguntamos,
muitas vezes, sobre o real interesse das profes-
soras em promover a mudança de suas práticas.
Freitas
4
relata que uma materialização de polí-
ticas públicas que ofereça melhores condições de
trabalho aos professores não é tarefa fácil e que
necessita, principalmente, da participação dos
próprios professores. Portanto, é necessário um
maior envolvimento dos docentes na construção
de políticas públicas, pois são eles que enfrentam
as barreiras e dificuldades do dia-a-dia da sala
de aula. Apesar dessa importante consideração,
parece que os professores não estão muito en-
volvidos com essas questões, conforme observa
a pesquisadora em seu relato no diário de campo:
Professora Maria relata que Márcio dá
muito trabalho, pois não quer ficar dentro
da sala de aula, além de falar muito alto
e querer tirar a roupa dentro da sala, e
isso está atrapalhando o desempenho
dos outros alunos. Maria, no decorrer
da aula, me perguntou se existia alguma
lei que regulamentava a frequência de
Márcio na sala de aula, e que também
deveria ter alguma lei para defender
os outros alunos, pois estavam sendo
prejudicados pelo contato com Márcio
(Observações registradas em Diário de
Campo – 30/7/2009).

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
356
A fala da professora apresenta aspectos rele-
vantes, no que concerne à sua percepção sobre
inclusão: um deles é o fato de não conhecer as
políticas públicas de inclusão. Nesse sentido,
fazemos o seguinte questionamento: Como
uma professora poderá participar do processo
de construção de políticas públicas, a fim de
melhorar suas condições de trabalho, se ela
mesma não tem conhecimento dessas políticas?
Não queremos com isso dizer que todas as
professoras não têm esse conhecimento, mas
essa ocasião chamou-nos muito a atenção, por-
que essa professora é tida como referência em
processo de inclusão na escola, pelos inúmeros
alunos que já atendeu, mesmo não tendo ne-
nhuma especialização.
Além disso, essa fala revela uma outra per-
cepção de aluno com necessidades especiais:
de que sua presença prejudica o desempenho
dos outros alunos.
Diante da complexidade revelada no proces-
so de inclusão, fica clara a urgência de medidas
a serem tomadas, sobretudo no que se refere
ao professor. Apesar da grande quantidade
de pesquisas que têm como foco o professor,
e dos inúmeros cursos de capacitação ofereci-
dos pelas redes de ensino, parece que pouco
tem se revertido em mudanças efetivas das
práticas educativas. Há necessidade, portanto,
de estudos mais aprofundados que desvelem
os aspectos que sustentam representações e
percepções que interferem negativamente nas
práticas de inclusão.
As vivências e as percepções de inclusão e
de aluno com necessidades especiais
Após uma breve contextualização sobre
a formação e preparo dos professores para
a inclusão escolar, segundo suas vivências e
percepções, cabe questionar em que medida
as representações sobre a formação e as con-
dições materiais de sua realização influenciam
sua vivência e percepção sobre os alunos com
necessidades educacionais especiais.
Antes de responder a esses questionamen-
tos, é importante uma discussão prévia sobre
os resultados. A primeira ideia trazida pelas
professoras foi de que o processo de inclusão é
válido por questões políticas e sociais.
Então... eu acho que o processo de inclu-
são é válido [...], mas é claro que tudo é
em cima de interesses. O Brasil não en-
trou nesse processo de inclusão porque
ele percebeu que o deficiente precisava
sair da estagnação, da segregação que
ele estava, mas ele entrou porque o go-
verno recebe verba do exterior. Então a
inclusão favorece o país (Luciana).
É aí que entra no legal da inclusão […]
porque, pelos professores, eles estariam
na sala com os alunos ditos “normais” e
os “anormais” estariam em instituições,
trancados, e ninguém queria saber o que
estava acontecendo lá... ainda bem que
os mandaram para as escolas, para o pes-
soal bater com essa realidade (Letícia).
Olha, eu acho que a inclusão é válida.
Não exatamente para a criança, ela é
válida para os outros aprenderem a con-
viver com aquela criança e acabar com
o preconceito, as diferenças [...] Então
eu acho mais importante para isso, para
eles serem respeitados nessa parte, ago-
ra, quanto à aprendizagem, na escola
normal não vai... é muito difícil! (Ilana).
Observa-se como as professoras de Educação
Especial, Luciana e Letícia, assumem uma postu-
ra mais crítica em relação à inclusão: uma ques-
tiona os reais motivos das políticas públicas em
promovê-la, enquanto a outra critica a postura
dos professores e aprova as políticas na medida
em que “obrigam” a escola a se envolver com a
questão da Educação Especial. De outro lado, a
professora Ilana, de classe regular, entende que
a inclusão é válida por promover a socialização
não só do aluno, mas dos demais atores da escola
e revela que a inclusão não inclui, pois entende
que a aprendizagem do aluno não ocorre e não
tem como ocorrer. Esse fato conduz a outro ques-
tionamento: será possível incluir apenas promo-
vendo a socialização do aluno? Acreditamos que
não, pois incluir equivale a propiciar ao sujeito
incluído o acesso a todos os bens de cultura ofe-
recidos aos demais alunos. Logo, se é possível às
demais crianças aprenderem, para que a inclusão
se efetive, o aluno com necessidades especiais
também deve acessar esses conhecimentos,
apropriando-se deles e cabe à escola encontrar
formas de promover essa apropriação.

Professores e a inclusão
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
357
Esses resultados corroboram as ideias de Go-
mes e Rey
6
sobre o processo de inclusão, quando
dizem que os professores limitam a questão da
inclusão escolar de alunos com necessidades edu-
cacionais especiais apenas a uma possibilidade
de socialização e a interesses alheios, que frisam
a delimitação, massificação e padronização do
desenvolvimento humano. Portanto, com base nas
falas das professoras, fica evidente a tendência
de se considerar a inclusão escolar como uma
possibilidade de socialização e que tem em sua
base alguns interesses políticos, apresentando-se,
portanto, muito mais relacionada ao objetivo de
aproximação e convivência de tais alunos com o
restante da sala e com o professor do que um real
desenvolvimento cognitivo e social do sujeito.
É claro que essa possibilidade de interação
social dos alunos com necessidades educacionais
especiais visando ao seu bem-estar social e dos
demais atores da escola é um fator importante,
mas não pode se limitar a isso, sem investir no
desenvolvimento cognitivo/social, como se estes
se estruturassem como processos dicotômicos
6
.
Podemos observar essa questão da dicotomia
entre cognitivo/social claramente nas seguintes
falas das professoras: Ele é uma criança de difícil
adaptação, tanto social como pedagógica (Maria);
Então eu acho que a inclusão é válida sim, mas
para a parte do social, do cognitivo não (Ilana).
Vygostsky
14
também nos ajuda a compreen-
der essa questão, quando traz a ideia de que o
aluno com necessidades educacionais especiais
é beneficiado sim com o processo de inclusão
em seu aspecto cognitivo e social, pois ele não
é menos desenvolvido do que aqueles que não
possuem necessidades educacionais especiais,
mas um sujeito que se desenvolve de outro
modo. Portanto, o autor considera o aspecto in-
dividual do desenvolvimento do sujeito, em que
cada um, dependendo de sua condição física,
psicológica e social, desenvolve-se de forma
singular, própria, mas sempre se desenvolve.
Assim, os alunos com necessidades educa-
cionais especiais atingem o desenvolvimento da
mesma forma que os demais alunos; contudo,
de um modo diferente, por outra via, com outros
meios que ele denomina de compensação e cabe
à escola acessar esses meios e modos singulares
para poder promovê-lo.
Vygostsky
14
discute a ideia de que a inclu-
são do aluno com necessidades especiais é
importante, mas que é preciso que o professor
tenha conhecimento sobre as especificidades do
desenvolvimento desses alunos, para que estes
possam se beneficiar do processo de inclusão,
atingindo níveis mais elevados de desenvolvi-
mento. O problema que vemos nesta ideia do
autor é a forma como ela aparece na escola: os
professores querem conhecer o diagnóstico do
aluno, ou seja, sua deficiência e não seu poten-
cial de desenvolvimento.
Além dessa visão limitada e dicotômica do
processo de inclusão, aparece uma concepção de
inclusão como “impossível”, sustentada somente
nas “faltas” dos alunos, no que os professores
chamam de “problemas”, cuja ação possível é
a medicalização, logo, não depende da escola:
Ele não sabe ler, não sabe escrever, ele
não quer aprender, os outros fazem para
ele, ele não tem interesse, ele é muito
agressivo, muito provocativo e, além de
tudo, é uma criança chata […]. Quando
a criança não aprende, alguma coisa
tem [...] e é complicado você chegar no
pai e falar que seu filho tem problema,
é complicado. E hoje em dia parece que
têm muitas crianças assim, porque, às
vezes, é alguma coisa biológica, que
precisa de algum remédio. O médico
disse que ele tem déficit de atenção, deu
hiperatividade, deu um negócio assim,
aí passou remédio, Ritalina, e a mãe não
deu, porque ela falou que ela deu, só que
deu 3 dias e ele virou um bicho [...] então
se ele teve uma reação assim tão grande,
é porque ele tem alguma coisa (Ilana).
Fica evidente que a professora se exime de
sua responsabilidade de educadora, colocando
a culpa da não aprendizagem apenas no aluno.
É como se a escola se resumisse a ela e ao aluno
e, se ela não dá conta, o problema está no aluno.
Em nenhum momento menciona o orientador, as
professoras de Educação Especial, o diretor, os
órgãos de saúde que têm parceria com a escola
ou mesmo a família como parceira no encaminha-
mento das dificuldades que observa e vive com
o aluno. Esse fato nos chamou muito a atenção:
parece que o professor tem tomado para si a tarefa
de promover a inclusão de forma solitária, o que

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
358
se revela um paradoxo, pois de outro lado, ele se
queixa de falta de condições, mas não as deman-
dam, as cobram dos demais atores, tomando-as
como justificativa para eximir-se de sua parcela
de responsabilidade. A questão que fica é a mais
relevante de todas: como fica esse aluno? Quais
sentidos de escola, educação, ensino e aprendiza-
gem ele configura nessa relação em que é taxado
com tantos adjetivos depreciativos? O que fazer
para evitar que, em nome da inclusão, se pratique
uma exclusão perversa?
Se de um lado se observa a exacerbação das
diferenças nas concepções sobre o aluno de in-
clusão, de outro há concepções de que o aluno
com necessidades especiais é igual aos demais,
ignorando-se suas singularidades:
Então a gente trata como uma criança nor-
mal, uma criança que tem dificuldade de
aprendizagem, mas a gente sabe que não
é bem por aí (Ilana).
Hoje são normais, para mim são nor-
mais... (Maria).
A inclusão é difícil em uma escola comum,
porque aqui ele não é diferente, ele não
pode ficar no refeitório o tempo dele,
porque os outros não têm o tempo dele...
é porque as crianças têm 15 minutos para
comer e 15 para brincar (Letícia).
Além de ficar evidente a concepção de in-
clusão como “tratar os alunos de modo igual,
ignorando suas especificidades”, também é
possível observar que as professoras não co-
nhecem as políticas que orientam as práticas
inclusivas. Segundo a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva
1
, a proposta de inclusão tem como ob-
jetivo: “Assegurar a inclusão escolar de alunos
com deficiência, transtornos globais do desen-
volvimento e altas habilidades/superdotação,
orientando os sistemas de ensino para garantir:
acesso ao ensino regular, com participação,
aprendizagem e continuidade nos níveis mais
elevados do ensino; transversalidade da moda-
lidade de Educação Especial desde a educação
infantil até a educação superior;
oferta do aten-
dimento educacional especializado;
formação
de professores para o atendimento educacional
especializado e demais profissionais da educa-
ção para a inclusão; participação da família e da
comunidade;
acessibilidade arquitetônica, nos
transportes, nos mobiliários, nas comunicações
e informação;
e articulação intersetorial na im-
plementação das políticas públicas (grifo nosso).
Observa-se que o documento aponta a neces-
sidade de considerar a especificidade e a necessi-
dade de cada aluno, e não colocar todos os alunos
como iguais, como foi apontado pelas professoras.
Diante dessa discussão, pode-se pensar que
essas percepções dos professores sobre alunos
com necessidades educacionais especiais se
sustentam em fortes representações sociais,
que têm em sua base, sobretudo, o preconceito
decorrente do desconhecimento sobre os alunos
e o próprio processo de inclusão. Ou, ainda, que
mesmo tendo conhecimentos efetivos sobre as
deficiências e os processos de inclusão, as re-
presentações são tão fortes que se sobrepõem
aos conhecimentos científicos.
As vivências e as implicações dessas percep-
ções nos próprios professores e nos alunos
As análises apresentadas até aqui suscitam a
seguinte questão: qual é o impacto das percepções
dos professores no desenvolvimento dos sujeitos
envolvidos no processo de inclusão (alunos)?
Ainda, como o professor vivencia esse processo?
Como já dissemos, Ciampa
3
aponta que,
antes mesmo de nascer, o indivíduo já é tribu-
tário de uma identidade pressuposta. Se essa
identidade é reposta pela manutenção das
expectativas em relação ao indivíduo, torna-se
muito difícil superá-la, o que só seria possível
com o rompimento do hábito padronizado.
Conforme discutido no tópico anterior, os
alunos com necessidades educacionais espe-
ciais têm uma identidade pressuposta, atribuída
pela sociedade e pelos professores, a qual é
carregada de preconceitos e limitações, decor-
rentes, muitas vezes, da falta de conhecimento
sobre o tema, inserindo grande dificuldade para
o aluno se constituir como capaz de aprender e
conviver na escola.
Assim, pode-se questionar de que maneira o
aluno com necessidades educacionais especiais
se percebe e se constrói nessas relações com
todos os outros de seu entorno, o que confere
à questão da concepção ou percepção grande
relevância no processo de inclusão.

Professores e a inclusão
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
359
Segundo Papalia
10
, essas percepções depre-
ciativas, que o professor tem do aluno, podem
provocar grandes marcas em sua autoestima. Ou
seja, esse julgamento depreciativo pode promo-
ver no aluno uma percepção de si como incapaz,
cujas dificuldades nunca poderão ser superadas,
e essa ideia de que o problema está nele pode
persistir por todo o ciclo vital do sujeito. Portanto,
o professor, quando não focaliza o potencial da
criança, pode desmotivá-la não somente em seu
processo de aprendizagem acadêmica, mas tam-
bém em outros aspectos de seu desenvolvimento.
Contudo, é necessário considerar também
a vivência do professor nesse processo. Muitas
vezes, ele manifesta sofrimento, desgaste, des-
controle e outras emoções decorrentes de um
sentimento de incompetência por não conseguir
êxito com os alunos.
É desgastante! Nossa, nem fala, frus-
trante! Você não vê o retorno que tanto
espera [...] A gente se sente muitas vezes
abandonada, principalmente na área da
saúde. A gente se sente abandonada
porque não tem para onde correr ou a
quem recorrer (Letícia).
Eu acho que eu não fiz um bom trabalho.
Eu não sei, eu me sinto assim, meio que sem
condições, não tenho preparação (Ilana).
Deve ter órgãos em Campinas que dão
assistência para o professor, nem se for
para eu ir lá, no nono andar e encostar lá
e dizer: eu estou aqui, estou precisando
de auxílio, o que eu faço com essa criança
que eu não consigo fazer inclusão! (Maria).
Evidencia-se, nessas falas, o sofrimento das
professoras manifestado pela frustração, pelo
sentimento de abandono. Foi isso que vimos,
também, nos momentos que passamos na es-
cola: a professora fica sozinha com o aluno, no
meio de todos os outros e tem de dar conta dele
e de todos os outros.
Vale aqui ressaltar o caso da professora
Maria, que parece ter se apropriado de uma
identidade de professora que sabe trabalhar
com a inclusão:
Ano retrasado eu tive 5 alunos especiais
na sala, desde visão subnormal, alunos
com outras síndromes que eu não sei o
nome, a característica eu não me lembro,
mas tive alunos com grandes dificuldades
e eu consegui alfabetizá-los […]. Então,
em minha experiência com 5 especiais
em uma sala normal, eu consegui fazer
com que a classe aprendesse os concei-
tos necessários. Como os outros alunos,
os especiais também se desenvolveram,
então hoje eu digo que eu consegui ven-
cer essa batalha [...], mas no caso que eu
vivencio hoje, é um outro desafio que eu
estou enfrentando, porque é uma criança
de difícil adaptação, mas com os outros
alunos eu venci essa etapa (Maria).
Interessante a contradição revelada na fala
da professora: de um lado ela acredita no su-
cesso da inclusão, ainda que a conceba como
uma batalha, e a situação vivida por ela – 5
alunos especiais em uma classe regular com
uma única professora – teria tudo para levar
ao fracasso. Logo, aparece uma concepção um
tanto idealizada do processo, que esconde as
dificuldades que as diferenças produzem em
qualquer prática educativa. De outro lado,
em uma situação que teoricamente seria mais
adequada (só um aluno com necessidades
especiais), a professora declara que não está
conseguindo promover sua inclusão e alega
como motivo a dificuldade de adaptação da
criança. Será que inclusão para ela é a criança
adaptar-se às condições oferecidas por ela em
sala de aula? Atualmente, essa professora tem
uma turma de 4º ano, com 32 alunos e um aluno
de 14 anos que possui Síndrome de Down. De
acordo com ela, e pelo que observamos, não
consegue fazer com que ele aprenda os conhe-
cimentos que julga importantes, além de não
conseguir fazer com que esse aluno fique em
sala de aula. Desde o começo do ano letivo,
notamos que a professora Maria manteve-se
bastante abalada com o caso desse aluno, uma
vez que, como abordado anteriormente, ela era
até então considerada a melhor professora para
realizar o processo de inclusão.
Assumindo a perspectiva de constituição da
identidade proposta por Ciampa
3
, acreditamos
poder dizer que a identidade docente se cons-
trói na relação com o social, pelo exercício de
sua atividade de ensinar. Logo, o insucesso da
atividade do professor põe em xeque sua iden-
tidade, provocando sofrimento.

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
360
Sendo assim, a questão que se apresenta em
relação à professora Maria é em que medida o
fato de sentir-se fracassada na inclusão desse
aluno, interferirá em suas ações pedagógicas em
sala de aula, não só com ele, mas com todos os
outros? Com base nas observações realizadas,
notamos que, assim como os alunos sofrem
com a inadequação do processo, os professores
também se ressentem do que vivem, visto que
a professora Maria, que não tivera nem uma
licença médica nos últimos anos, já se afastou
várias vezes neste ano. Isso sem falar em certa
amargura que expressa em suas falas nas reuni-
ões de Trabalho Pedagógico Coletivo que temos
acompanhado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O acesso às percepções dos professores sobre
os alunos com necessidades educacionais espe-
ciais nos permite afirmar que as percepções dos
docentes investigados não se coadunam com os
pressupostos da educação inclusiva. Conforme
se demonstrou na análise, essas percepções se
sustentam em crenças que têm em sua base a
incapacidade dos sujeitos para frequentar o en-
sino regular, visto necessitarem de atendimento
de especialistas ou mesmo de medicação. Essa
constatação nos leva a concluir que o processo
de inclusão nessa escola está ocorrendo de for-
ma perversa, causando sofrimento aos alunos
com necessidades educacionais especiais e aos
professores, não se constituindo, portanto, como
ações promotoras de desenvolvimento.
Os dados acessados na pesquisa revelam os
conflitos desencadeados pela inclusão de alunos
com necessidades especiais: o fato de não saber
como trabalhar com o aluno leva o professor a
buscar fora de sua sala de aula as causas para
o insucesso que vivencia. Assim, muitas vezes,
trava-se uma luta entre os professores, e neste
caso, as professoras da Educação Especial e as
de classes regulares, que, ao invés de se unirem,
aproveitando uma política pública que visa pro-
mover a inclusão (independentemente de ser ou
não a mais adequada), optam por competir entre
si, em um jogo de culpabilização e desresponsa-
bilização que em nada contribui para o processo
de inclusão, mas, ao contrário, cria um clima pre-
judicial a todos os alunos e professores da escola.
Também constatamos que na escola não se
exercita a escuta, visto que os professores têm
uma visão cristalizada sobre o que e quem são
o aluno, a escola e a família, o que inviabiliza
o diálogo e a reflexão. Resultam desse fato as
dificuldades de comunicação, compreensão e
sensibilidade em todas as instâncias de relações.
No momento em que concluímos o presente
artigo, tomamos contato com uma matéria do
jornal Folha de São Paulo
7
(23/5/2010) intitu-
lada: “A cada dia, um professor se licencia por
dois anos”, em que são retratados problemas de
saúde enfrentados por professores da rede pú-
blica estadual de São Paulo: perda da voz, dis-
túrbios psicológicos como depressão, ansiedade,
síndrome do pânico, entre outros. Diz a matéria
que instâncias governamentais reconhecem a
necessidade de melhorar as condições de saúde
dos professores da rede. Para tanto, planejam
tomar a seguinte medida:
Segundo o governo antecipou
à Folha, o
novo programa, chamado SP Educação
com Saúde,
formará equipes com mé-
dicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos,
psicólogos, nutricionistas e enfermeiros,
que circularão pelas escolas estaduais.
Algumas equipes ficarão fixas nas di-
retorias de ensino.
As especialidades
escolhidas coincidem com as áreas em
que os docentes mais têm problemas –
como lesões nas cordas vocais, dores na
coluna e distúrbios psicológicos
– e são
as maiores causas de absenteísmo.
Os profissionais das equipes serão da
entidade filantrópica Santa Marcelina.
O
servidor que tiver algum problema de
saúde diagnosticado será encaminhado
ao Hospital do Servidor Público para
tratamento
(2010, Maio, 23 - grifo nosso).
Interessante notar como as instâncias go-
vernamentais querem ajudar na saúde do pro-
fessor – oferecem profissionais especializados
para ajudar o professor, como se o problema
estivesse neles e não nas condições materiais
em que exercem suas atividades. Guardadas as
devidas proporções, essa concepção em muito
se assemelha às dos professores de que o pro-
blema da inclusão é do aluno ou das famílias.
Assim, considera-se o problema de saúde desses

Professores e a inclusão
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
361
profissionais no âmbito individual, ou seja, no
professor, e não em suas relações e condições
de trabalho.
O que constatamos nesse estudo é que a ex-
posição permanente dos professores ao fracasso
no processo de inclusão/exclusão gera grande
sofrimento, o que, a nosso ver, está na base do
adoecimento que relata a matéria e que presen-
ciamos na escola. Logo, adoecimento gerado
não pelo aluno com necessidades especiais ou
por suas famílias, mas pelas condições em que
realizam ou tentam realizar suas ações docentes,
as quais envolvem aspectos organizacionais, ins-
titucionais, sociais, políticos, identitários, dentre
outros. Acreditamos ser possível considerar que
o processo de medicalização ao qual se refere
Moyses e Collares
9
não ocorre somente com os
alunos ditos “problemáticos”, que precisam ser
medicados e tratados de forma individual. Parece
que os professores também estão correndo esse
risco, visto que, como se lê na referida repor-
tagem, as instâncias governamentais querem
“tratar” o professor. Haverá medicação para os
gestores e as famílias e deste modo os problemas
serão solucionados? O problema da Educação
deve ser curado pela Medicina? E o papel da
Psicologia, da Sociologia, da própria Educação
e suas teorias, sobretudo relativas à inclusão,
em nada contribui para o enfrentamento dos
problemas observados na escola?
Enfim, esses questionamentos são sem dúvida
de extrema importância para o avanço do processo
de inclusão e entendemos que tanto a Psicologia
como a Educação têm um grande papel nesse
processo, ao passo que poderão oferecer contribui-
ções para a compreensão das relações complexas
e conflitantes envolvendo o processo de inclusão
e tentar promover melhores condições de trabalho
e desenvolvimento aos sujeitos envolvidos, como
professores, alunos, gestão, entre outros.
SUMMARY
The experience of teacher about the process of inclusion: a study of
perspective of Historical-Cultural Psychology
Objectives: Examine the perceptions and experiences of teachers about
their role in the inclusion of student with special educational needs. Another
aspect that was intended to investigate regards to the feelings experienced
by teachers and student with special educational needs, which often result
in failure: identities in crisis, suffering caused by shame and /or guilt, the
feeling of incompetence, etc. For this, we used the Historical-Cultural
Psychology, using the assumptions of its main representative, Vygotsky, and
authors such as Rey, Souza, among others from the same basis. Methods: Our
investigation has been given to teachers at a public school in Campinas-SP,
which were realized semi-structured interviews and observations in several
areas of the school. Results and Conclusion: Results indicate that teachers
have perceptions that are opposed to the assumptions of inclusive education,
as a vision of students with disabilities as incapable, in need of medical
treatment through medication, placing in students the origin and solution
of problems lived at the classroom. Thus, we realized that teachers are also
affected with this issue, because the fact of not knowing how to work with
the student causes malaise that leads them to search outside their classroom
and teaching practice for causes for the failure they experience.
KEY WORDS: Education, special. Education. Psychology, educational.
Inclusion in school.

Barbosa ET & S ouza VLT
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 352-62
362
REFERÊNCIAS
1. Brasil. Política Nacional de Educação Espe-
cial na Perspectiva da Educação Inclusiva.
2008. Ministério da Educação. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/
pdf/politica.pdf Acesso em: 3/3/2009.
2. Camisão IFF. Percepção dos professores
do ensino básico acerca da inclusão edu-
cativa de alunos com necessidades educa-
tivas especiais [Dissertação de mestrado].
Braga,Portugal: Universidade do Minho, Ins-
tituto de Educação e Psicologia;2004. 159p.
3. Ciampa AC. A estória do Severino e a histó-
ria da Severina: um ensaio de Psicologia So-
cial. 4ª ed. São Paulo:Brasiliense;1994. p.248.
4. Freitas HCL. A (nova) política de formação
de professores: a prioridade postergada.
Educ Soc. 2007;28(100):1203-30.
5. Freitas SN, Castro SF. Representação social e
educação especial: a representação dos pro-
fessores de alunos com necessidades educa-
tivas especiais incluídos na classe comum do
ensino regular; 2004. Disponível em: http://
educacaoonline.pro.br. Acesso em 29/8/2010
6. Gomes C, Rey FLG. Inclusão escolar: repre-
sentações compartilhadas de profissionais
da educação acerca da inclusão escolar. Psi-
col Ciênc Prof. 2007;27(3):406-17.
7. Jornal Folha de São Paulo. A cada dia, um
professor se licencia por dois anos. 2010.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.
Trabalho realizado na Pontifícia Universidade Católica
de Campinas – PUCCAMP, Campinas, SP, Brasil.
Artigo recebido: 2/9/2010
Aprovado: 18/11/2010
br/saber/739498-a-cada-dia-um-professor-
se-licencia-por-dois-anos.shtml.
8. Luna IN, Baptista LC. Identidade profissio-
nal: prazer e sofrimento no mundo do traba-
lho. Psicol Rev. 2001;12(1):39-51.
9. Moysés MA, Collares CAL. O lado escuro
da dislexia e do TDAH. In: Meira MEM,
Tleski S; Facci M, org. Exclusão e inclusão:
falsas dicotomias. São Paulo:Casa do Psicó-
logo;2009. p.42.
10. Papalia DE. Desenvolvimento humano. Por-
to Alegre:Artmed;2000. p.684.
11. Rey FG. Sujeito e subjetividade. São
Paulo:Thomson;2003. p.290.
12. Saviani D. Formação de professores: as-
pectos históricos e teóricos do proble-
ma no contexto brasileiro. Rev Bras Educ.
2009;14(40):143-55.
13. Souza VLT. As interações na escola e seus
significados e sentidos na formação de valo-
res [Tese de Doutorado]. São Paulo:Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, Facul-
dade de Educação;2004. 284p.
14. Vygotsky LS. Obras completas. Tomo Cinco.
Cuba: Editorial Pueblo y Educación;1995.
p.304.
15. Vitalino CR. Análise da necessidade de pre-
paração pedagógica de professores de cur-
sos de licenciatura para inclusão de alunos
com necessidades educacionais especiais.
Rev Bras Educ Espec. 2007;13(3):399-414.

Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
363
ARTIGO DE PESQUISA
RESUMO – Introdução: O presente trabalho analisa, por meio de
pesquisa longitudinal, a produção textual de crianças da 4ª série do ensino
fundamental de uma escola pública do município de Rolândia/PR. Objetivo:
O objetivo do trabalho foi avaliar a aprendizagem da linguagem escrita
na escola e refletir sobre o papel do professor mediador nesse processo.
Método: Para tanto, foram analisados os primeiros textos do ano letivo que
faziam parte de uma avaliação solicitada aos professores pela Secretaria
Municipal de Educação com a finalidade de verificar o nível de escrita dos
alunos. A análise dos textos prosseguiu durante os meses de abril, maio e
junho, a fim de verificar se houve mudanças na escrita das crianças através
da mediação do professor. Conclusão: A pesquisa permitiu concluir que
quase não há mediação do professor no trabalho de escrita dos textos em
sala de aula. Para que haja melhora qualitativa na produção textual, é
necessária uma mudança na concepção de ensino da linguagem escrita.
UNITERMOS: Redação. Estudos de linguagem. Aprendizagem.
Produção textual: quando a linguagem
escrita se torna objeto escolar
Denise Miyabe da Silva
Denise Miyabe da Silva – Pós-graduação em
Psicopedagogia pela Universidade Estadual de
Londrina-UEL, Psicopedagoga da Universidade
Norte do Paraná, no NAPp (Núcleo de Ação
Psicopedagógica), prestando atendimento aos
discentes com dificuldades de aprendizagem.
Correspondência Denise Miyabe da Silva
Rua Voluntários da Pátria, 633 – Jardim Andrade –
Londrina, PR, Brasil – CEP 86061-120
E-mail: [email protected]

Silva DM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
364
Introdução
O ensino da linguagem escrita na escola tem
permanecido “enjaulado” a práticas tradicio-
nais, a mais conhecida de todas é o ensino da
língua portuguesa em etapas.
A preocupação central dessa metodologia,
tão utilizada na escola, tem sido colocada na
ortografia e na gramática, deixando em segundo
plano a construção e compreensão textual, prin-
cipalmente quanto ao aspecto discursivo, um
enfoque que tem gerado consequências sérias,
como a transformação da escrita de objeto social
em objeto escolar, tendo como reflexo produções
textuais sem significado, apenas um amontoado
de palavras no papel. Segundo Gonçalves
1
, “No
dizer de Pécora, o que ocorre é que a escola, na
sua trajetória histórica, falseia as condições de
escrita e não fornece ao estudante as ferramen-
tas de uma prática interativa da língua. [...] com
esse falseamento, a escrita torna-se um exercí-
cio penoso que cristaliza o discurso. Exemplos
disso são as frases-feitas, argumentos de senso
comum que, frequentemente, aparecem em
textos dos educandos.”
Outra consequência foi evidenciada pela a
última Pesquisa Nacional por Amostra de Do-
micílios (PNAD
2
) 2009, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), que revelou que
o índice de analfabetos funcionais corresponde
a 20,3% da população com mais de 15 anos.
Weisz
3
ressalta a necessidade de “admitir que
nossa incapacidade para ensinar a ler e escrever
tem sido responsável por um verdadeiro genocí-
dio intelectual”. A autora alerta que nem sempre
o professor sabe a diferença entre copiar e escre-
ver e assim acaba promovendo o “bom copista” e
retendo os que lêem e escrevem precariamente,
o que explica porque tantos alunos chegam à
4ª série sem compreensão leitora de um texto
simples e até mesmo sem saber escrever.
Os exames nacionais e internacionais que
avaliam a Educação no Brasil (PISA
4
, Prova
Brasil
5
) evidenciam a dificuldade que os alu-
nos têm em produzir textos de qualidade e
de compreender o que lêem. Uma das causas
apontadas para esse fenômeno crescente é, para
muitos, a redação escolar ou produção de texto
da maneira como vem sendo ensinada.
Diante desse contexto, a construção desta
pesquisa foi motivada, em particular, por minhas
experiências como educadora, principalmente
pelos momentos de produção de texto junto aos
alunos. Momentos em que, como mediadora,
percebia que a maior dificuldade nem sempre
era a forma do dizer, mas o próprio dizer.
Dessa forma, este estudo se propõe a refletir
sobre a língua escrita para além da sua forma,
debruçou-se sobre seu conteúdo, pois conside-
ramos que os “erros” quanto a forma, conteúdo
e contexto, cometidos por crianças que ainda
estão na condição de aprendizes, são na verdade,
“preciosos indícios de um processo em curso de
aquisição da representação escrita da lingua-
gem, registros de momentos em que a criança
torna evidente a manipulação que faz da própria
linguagem, história da relação com que ela (re)
constrói ao começar a escrever/ler” (Abaurre al.
6
).
Assim, foram analisadas as produções textu-
ais de crianças da 4ª série do Ensino Fundamen-
tal, com o objetivo de avaliar a aprendizagem
da linguagem escrita na escola e refletir sobre
o papel mediador do professor no trabalho pe-
dagógico com a escrita em sala de aula.
METODOLOGIA DE PESQUISA
Este estudo se constitui como uma pesquisa
sobre a produção escrita de crianças da 4ª série
do ensino fundamental e do papel mediador do
professor no trabalho pedagógico com a escrita
em sala de aula.
As produções textuais analisadas são de crian-
ças de 4ª série do Ensino Fundamental de uma
escola da Rede Pública Municipal de Ensino de
Rolândia, cidade localizada no norte do Paraná.
Para análise foram usados textos de 11 dos
20 alunos da 4ª série. A escolha dos textos foi
aleatória. A análise então foi dividida em duas
etapas, a primeira denominada “A escrita:
Momentos Iniciais” e a Segunda, “A Escrita
no Primeiro Semestre”. Inicialmente, foram
analisados os textos que faziam parte de uma
avaliação solicitada aos professores pela Secre-

Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
365
taria Municipal de Educação com a finalidade
de verificar o nível de escrita dos alunos no
início do ano escolar.
Em seguida, foi realizado um estudo lon-
gitudinal das produções escritas pelos alunos
ao longo do primeiro semestre de 2009. Na
segunda etapa, das 11 crianças ficaram apenas
10, pois uma delas se mudou.
As propostas de produção de texto feitas pela
professora incluem, reescrita, biografia, leitura
de imagens, texto coletivo, texto informativo,
reprodução, narração e dissertação.
No total, foram coletados e analisados 97
textos de 11 alunos. Todos os textos foram pro-
duzidos em sala de aula durante o período de
abril, maio e junho.
Neste trabalho, a abordagem de pesquisa
escolhida foi a qualitativa interpretativa, dado
o interesse de compreender como a escrita
das crianças se manifesta na produção textual
por meio de suas escolhas, conhecimento e no
próprio dizer.
Esta pesquisa analisa as produções textuais
através da perspectiva enunciativo-discursivo,
que considera a linguagem escrita em sua re-
lação com a história (conhecimento) e com a
sociedade, com seus diversos usos e apropria-
ções, o que permitiu compreender os sentidos
produzidos pelo ensino escolar na interação com
as condições socioculturais das crianças.
Assim, neste estudo, observaram-se dois
momentos diferentes, o primeiro que evidencia
o que a criança pode e sabe fazer com a escrita
sem a interferência do professor e, o segundo,
em que o professor faz a mediação através da
“correção” das produções textuais.
ANÁLISE DO CORPUS
A análise das produções textuais no início do
ano letivo permite verificar o que cada criança sabe
sobre a linguagem escrita, além de revelar pontos
que precisam ser trabalhados em sala de aula.
Os textos analisados neste estudo são “pre-
ciosos indícios” que dão pistas da relação sujeito
e linguagem escrita ao longo do processo de
aprendizagem e permitem observar não só o
que as crianças são capazes de produzir sem a
interferência do professor, mas também as esco-
lhas por determinados gêneros discursivos, suas
hipóteses, dúvidas e idéias a respeito da escrita.
Transcrição e análise dos textos
Por se tratar de uma pesquisa de análise qua-
litativa extensa, aqui serão apresentados apenas
os textos produzidos por 2 das 11 crianças, es-
pecificamente, parte do conjunto de textos de
Gisele e Breno (os nomes das crianças foram
mudados para proteger suas identidades).
Transcrição e análise dos textos de Gisele
Texto 1
Para a produção deste texto, a professora
deu aos alunos apenas o título: “O Deserto da
Arábia”. A escolha quanto ao melhor tipo de
texto, sua finalidade e tudo o mais ficou a cri-
tério da criança.
O Deserto da Arábia
Num belo dia Arábia a rainha do deserto
resolveu cassar o seu ouro que a anos enterrou.
Então muntou no seu camelo e foi cassar o
seu ouro.
Arábia tentou achar seu ouro mas eta não
achou. Arábia ficou dia e noite cassando seu ouro.
Passaram 3 dias Arábia voltou para casa pois
ela estava esausta.
Quando chegou na sua casa foi descansar.
A quele dia estava muito quente.
Arabia não sabia o que fazer então foi pasear
La fora ficou um bom tempo paseando até que
ela Arábia encontrou um X marcado no chão e
começou a cavar então lá estava o ouro e contou
para seus amigos e ela virou a rainha do dezerto
mais popular.
Texto produzido em fevereiro de 2009
O gênero textual escolhido por Gisele foi
narração, provavelmente por ser esse gênero
discursivo algo que domine razoavelmente e
esteja dentro de sua zona de conforto, prin-
cipalmente por se tratar de uma proposta de
produção com pouca orientação. Contudo,

Silva DM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
366
logo a criança se complica, demonstra o po-
bre conhecimento que tem a respeito do tema
solicitado. O deserto da Arábia se transforma
em Arábia, a rainha do deserto.
Desde o início, percebemos que não há co-
erência na conduta da personagem principal
que se mostra “burrinha”, afinal, dificilmente
alguém, ainda que fictício, é capaz de esquecer
o local onde enterrou ouro, ainda mais se esse
lugar for seu próprio quintal, que para com-
pletar estava sinalizado com um “X”. Segundo
Costa
7
, “as ações, na prosa narrativa de ficção,
têm que parecer verdadeiras, mesmo que elas
não ocorram na realidade”.
Notamos, também, que a criança não tem
um bom domínio do gênero, pois já no primeiro
parágrafo, o qual usualmente serve para apre-
sentação dos personagens e cenário, introduz o
enredo e o desenvolve nos parágrafos seguintes
emendando-o no desfecho.
Dentre os vários problemas apresentados,
somam-se a repetição, erros ou alterações or-
tográficas de diferentes tipos (muntou, cassar,
pasear, etc.), pontuação, etc.
Texto 2
Nesta atividade, a proposta era produzir um
texto a partir da leitura de imagens compostas
por quatro quadros (Figura 1), que retratavam
atividades próprias dos índios, sendo que a or-
ganização da sequência dos quadros e a escolha
do título ficavam a critério dos alunos. O tema
“índios” foi escolhido pela proximidade da data
comemorativa.
Canguri e seu animais
Lum belo dia ensolarado bem quente sem
luvens no céu, Canguri um índio que estava
com seus animais da floresta.
Então canguri foi até á floresta mais longe e
buscou alguns maracujá.
Foi até sua cas de palha e começou fazer um
suco porque na quele dia estava muito quente.
Canguri foi voltar para a outra floresta com
seus amigos animais, mais pisou numa pedra que
cigurava uma madera e a casa caiu mais ele não
desanimou e voutou abrincar com seus animais.
Texto produzido em abril de 2009
No primeiro parágrafo, as orações não têm
ligação, assim como algumas ações. Há mo-
mentos em que a leitura que faz da imagem
demonstra a falta de domínio do código visual,
como no segundo parágrafo, as frutas que o ín-
dio colheu eram maçãs e não maracujás. Apesar
de Gisele não perder o fio condutor da história,
sua leitura, às vezes, se mostra fragmentada,
provavelmente devido à tênue ligação que faz
entre os quadros.
Apresenta, ainda, problemas com pro -
gressão, aspectos gramaticais, erros e al-
terações ortográficas de diferentes tipos,
pontuação, etc.
Texto 3
Nesta atividade, a professora dá o título:
“Saúde pública confirma caso de transmissão
do vírus” e as seguintes palavras: gripe suína,
gripe A, vírus, hospital, mortos, contaminação,
comércio, exterior, comercialização. A proposta
era que as crianças, a partir das palavras dadas,
produzissem um texto sobre a gripe A (H1N1),
também conhecida como gripe suína.
Saúde Confirma casa de transmissão do vírus
A gripe suína pode causar uma grande causa
gravel como pasar a gripe para o outro etc.
Quando pegamos a gripe suína temos que
correr ao hospital se não estaremos no risco da
morte.
Texto produzido em maio de 2009
Figura 1 – Quadros apresentados aos alunos para produção do texto.

Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
367
Gisele desenvolveu o texto informativo em
apenas dois parágrafos, o primeiro é redundante
e óbvio, não traz nenhum dado novo a respeito da
gripe A (H1N1). Na verdade, ao usar o etc., a trata
como uma gripe comum, como se o leitor soubesse
do que ela está falando. No segundo parágrafo,
ao tentar usar a expressão “risco de morte”, ver-
são midiática alternativa a “risco de vida”, acaba
criando uma nova expressão “no risco da morte”,
que é claro tem uma conotação diferente.
De modo geral, notamos que os textos de
Gisele têm certa fluência, tem um fio condutor,
uma ideia central, mas também apresentam
limitações quanto a coerência, recursos lin-
guísticos, conjunções, tempo verbal, pontuação
e, principalmente, no próprio dizer, sempre
transparecendo um conteúdo empobrecido e
de senso comum.
Transcrição e análise dos textos de Breno
Texto 1
O deserto da Arábia
Num dia musinto quente estavo pasando
no deserto encontrei un canelo eu tentei pega
o canelo mais não consegui andei mais upouco
encontrei outro camelo tentei pegar masnão
concegui eu estva com nuita sede, elonge eu
vi um riu, fuicorrendo peresebi uma miragem.
Texto produzido em fevereiro de 2009
Breno produziu um texto narrativo, desenvol-
veu sua história em apenas um parágrafo, o qual
iniciou com letra minúscula. Seu texto apresenta
uma estrutura típica de uma narração, introduz
os personagens e o contexto, estabelece os fatos
numa sucessão com começo, meio e fim, porém,
talvez por não compreender o significado de
parágrafo, não o vemos demarcado, provavel-
mente por causa da maneira errônea com que
a noção de parágrafo vem sendo ensinada na
escola. Não é incomum professores lembrarem
seus alunos do parágrafo explicando-o como
sendo “deixar espaço depois da margem”.
Breno ainda não compreende o parágrafo como
sendo uma unidade de discurso formada por
uma sequência de frases, sendo que um novo
parágrafo deve ser iniciado quando se muda de
assunto, no caso da narração, quando mudam
os acontecimentos, as ações, etc.
O texto tem coerência, contudo algumas
ideias não foram bem exploradas. Por exemplo,
“num dia musinto quente estavo pasando no
deserto encontrei un canelo eu tentei pegar o
canelo”. O leitor pode se perguntar “por que
ele estava passando pelo deserto? De onde ele
vinha? E ainda em outro momento do texto
aparece, “eu estavo com muita sede, e longe eu
vi um riu, fuicorrendo peresebi uma miragem”.
Outra ideia pouco explorada e novamente os
questionamentos, o que acontece com o perso-
nagem? Morre de sede? É resgatado?
Nesse texto faltam elementos de coesão,
conectivos de discurso que estabeleceriam
ligação de uma frase a outra, produzindo o en-
cadeamento semântico, como em “fuicorrendo
peresebi una miragem”.
Resumindo, seu texto tem coerência, faz sen-
tido, mas também apresenta limitações quanto a
pontuação, ortografia, vocabulário e gramática,
além de demonstrar que sua escrita tem forte
influência da oralidade.
Texto 2
Nessa atividade, a professora propôs a repro-
dução da história “E era onça mesmo” de Mon-
teiro Lobato, após ter trabalhado com o texto.
E era onça mesmo
O rabico estava andando pela floresta e viu
umas pegadas garndes.
Depois foi corendo para avisar para o Pedrinho.
Então o Pedrinho tefé um palno de ir casar
a omça es comdida do duas velinhas.
Entan ele foi calanando.
Texto produzido em maio de 2009
A reprodução, segundo Condemarín e Cha-
dwick
8
, requer que se escreva o substancial do
conteúdo, mobiliza e desenvolve a memória, a
habilidade de sintetizar, de verbalizar para si mes-
mo, de reformular e de se expressar pela escrita.

Silva DM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
368
Breno selecionou algumas ideias principais,
porém deixou de fora outras importantes, como
o que aconteceu com Pedrinho? Não soube
relacionar as ideias do autor com suas próprias
palavras, perdendo por vezes a essência de
algumas ideias, além de não se prender a ne-
nhum detalhe.
Texto 3
A professora solicitou esta produção após as
atividades realizadas no Dia do Desafio.
O dia do desafil
Fonos para Pasa carlo Branco
Cheganos la e Bincanos
E depois fena para Escola
Texto produzido em junho de 2009
Breno desenvolveu o texto em apenas três
linhas. Percebe-se que ele não compreendeu
o significado do Dia do Desafio, de forma que
contou, em poucas palavras, o que fez nesse dia
e não o que o mesmo representa.
Analisando o conjunto de textos de Breno
compreendemos a difícil relação que tem com a
linguagem escrita. Para ele escrever parece ser
algo penoso, até mesmo as situações de cópia.
Em suas produções textuais, não apresenta a es-
trutura própria de cada gênero, não sabe utilizar
os tempos verbais, faz uso excessivo de pronomes
pessoais e sujeitos explícitos, sua escrita continua
apresentando forte influência da oralidade, além
de um repertório de conectivos bastante limitado.
Do primeiro texto produzido no começo do
ano até esse momento não se nota mudança
na maneira com que Breno manipula a escrita,
pois continua a desenvolver suas produções
em poucas linhas, sem explorar suas ideias. É
bem provável que chegue ao final do ano letivo
produzindo textos em apenas algumas linhas.
O que revelam os textos
Estes textos apresentam dificuldades
próprias de escritores iniciantes que não se
vêem como autores, não percebem a produ-
ção textual como um processo que deve ser
monitorado por eles, e não somente pela pro-
fessora, mas se dão por satisfeitos com uma
única versão de seus textos, o qual entendem
como produto final.
De modo geral, todas as crianças demons-
traram, nas atividades de leitura de imagens,
predominância da leitura pontual e descritiva,
quadro a quadro, quando na verdade as ilustra-
ções, para as crianças desta série, já deveriam ser
vistas como “janelas”, inspirando-as a dar vida às
cenas, tendo em mente o conjunto da narrativa.
Apresentam uma sequência de ideias e acon-
tecimentos bastante confusa; não produzem
ligação entre um assunto e outro; misturam os
tipos e gêneros textuais; fazem uso excessivo de
conjunções e sujeitos explícitos; têm um reper-
tório bastante limitado; controlam a produção no
nível da frase, apresentando grande dificuldade
em pensar no todo, na macroestrutura, além da
total ausência de planejamento e pobreza de
recursos linguísticos.
Percebe-se que não aconteceu nenhuma
grande e significativa mudança nos textos dos
alunos, do começo do ano letivo até este mo-
mento, mesmo após a ação intermediativa do
professor. Provavelmente, por não ser também
a sua ação significativa e direcionada a auxi-
liar as crianças a superarem suas dificuldades
objetivando uma melhora qualitativa de suas
produções.
A quase ausência da tarefa de reescrita, com
exceção a um dos textos de Gisele, e a falta
de revisão pelo próprio aluno, demonstra que
essa não é uma solicitação comum por parte do
professor, de modo que as situações de revisão
se limitam a correções ortográficas decorrentes
das intervenções diretas da professora nos mo-
mentos de correção. Segundo Souza e Osório
9
,
“a natureza da intervenção que o professor
realiza, na produção textual do aluno, tem re-
lação direta com a maior ou menor qualidade
desse produto. Portanto, essa ação do professor
não tem um fim em si mesma, mas só adquire
significação se conduz o aluno à reescrita de
seu texto com o objetivo de buscar uma escrita
qualitativamente melhor”.

Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
369
A ausência da prática da revisão orientada e
reescrita dos textos que analisamos, como uma
das etapas da produção textual, faz com que
uma pergunta ecoe em nossas mentes. Rees-
crevendo, o que mudaria?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os problemas encontrados nas produções
de textos analisadas neste estudo vão além dos
aspectos notacionais e discursivos. Estão tam-
bém no próprio dizer, ou seja, no conteúdo, no
conhecimento de mundo empobrecido, o que
demonstra a ausência de bens culturais para
além da mídia.
Assim, compreendemos que a escrita, en-
quanto objeto escolar, aprisiona a mente das
crianças. O despreparo e, consequentemente,
a incapacidade dos professores de ensinar “tem
sido responsável por um verdadeiro genocídio
intelectual”
3
. Dessa forma, no trabalho pedagó-
gico com a escrita, a escola não tem assegurado
aos alunos o domínio eficiente da linguagem
escrita, o que nos levou a refletir e repensar
o papel da escola e do professor mediador no
ensino da linguagem escrita.
O papel da escola no ensino da escrita
envolve grandes responsabilidades, sendo a
maior e mais importante delas dar às crianças as
ferramentas necessárias para utilizar a lingua-
gem escrita em sua completude e concretude.
Espera-se que durante o processo de ensino-
aprendizagem da escrita na escola a criança
saia da posição de “bom copista” e reprodutor
de frases feitas, para se transformar em autor,
por meio de uma metodologia que explore a lin-
guagem escrita em sua totalidade e em seu uso
real, numa concepção dialógica e interacionista.
Nesta perspectiva, o professor mediador é
aquele que está preparado para trazer a re-
flexão e a compreensão dos diversos gêneros
textuais e sua construção, a fim de formar es-
critores capazes de expressar pela escrita suas
intenções, sentimentos, necessidades e tudo
o mais, com autonomia, pois “ao instituir uma
prática intersubjetiva, através de uma prática
pedagógica que leve em conta a reflexão, será
possível resgatar um discurso mais pessoal, mais
autêntico de nossos sujeitos”
1
. Para tanto, deve
ter bem claro o propósito de que e para que são
solicitadas as produções textuais, assim como as
formas de correção, pois a prática pedagógica de
tal professor implica utilizar de uma estratégia de
correção que vá além da indicação de erros ou
resolução dos mesmos para o aluno, deixando-o
apenas com a tarefa de copista. Pressupõe uma
estratégia que indica a causa do erro, eviden-
ciando assim o processo e não o produto.
Sendo assim, a avaliação contínua do conhe-
cimento dos alunos e do trabalho do professor
são indispensáveis para nortear o plano de ação
docente. A experiência e história de vida, o ní-
vel socioeconômico cultural e os conhecimentos
trazidos pelos alunos são bases importantes para
o trabalho pedagógico. O trabalho pedagógico
deve agir a partir de e sobre esta “bagagem”
das crianças, de maneira que venha preencher
as “lacunas conceituais” e fornecer elementos,
conhecimentos intelectuais, científicos e cultu-
rais, a fim de ajudá-las a reelaborarem o seu co-
nhecimento e elaborar um novo repertório, mais
amplo e mais intelectualizado, que sirva a elas
não só para uso eficaz da escrita enquanto objeto
social, mas também como instrumento de acesso
autônomo na participação no mundo letrado.
Na atual conjuntura, nem todos os professores
estão preparados para tal trabalho com a escrita
em sala de aula. É possível recorrer a uma diversi-
dade de fatores para explicar a falta de preparo do
professor para atuar como mediador no trabalho
pedagógico com a escrita em sala de aula. Por isso,
é importante destacar o papel do psicopedagogo
na escola, o de assessor psicopedagógigo, que
desempenha sua ação junto aos professores, no
sentido de auxiliá-los e orientá-los no trabalho
com a escrita em sala de aula, desde a análise
interpretativa e qualitativa das produções das
crianças, a fim de promover práticas metodológi-
cas significativas, de acordo com as dificuldades
que as turmas apresentam, até a construção de um
espaço que permita a reflexão sobre a linguagem
escrita, oferecendo, assim, condições adequadas
para uma aprendizagem significativa.

Silva DM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
370
Esses objetivos, no entanto, não serão al-
cançados do dia para noite, exigem do psico-
pedagogo e do professor muita persistência,
já que a criança acostumou-se a esperar que
seus textos sejam corrigidos e monitorados pelo
professor, até porque as situações de escrita na
escola não têm sido para fins sociais e sim para
serem corrigidas.
Desenvolver um trabalho real e significativo
com a escrita tem se mostrado um desafio, já que
a escola tem produzido analfabetos funcionais em
massa. Isso denuncia que os problemas de “ensi-
nagem” têm alcançado os altos níveis da Educa-
ção e nos leva a compreender que o trabalho com
a linguagem escrita não pode mais se restringir
à forma de dizer, mas deve provocar mudanças
no próprio dizer, e isto exige uma mudança na
concepção de ensino da linguagem escrita.
SUMMARY
Literal production: when the written language becomes school object
Introduction: The present work analyzes, through longitudinal research,
the literal production of 4
th
grade children of elementary school of a public
school in Rolandia city. Objective: The objective to evaluate the learning
skill of written language in the school and to reflect on the role of the
mediating teacher in this process. Methods: It was analyzed the first texts
of the school year with the purpose to verify the level on the writing skill
of the students. It was part of a request from the City Board of education to
the teachers at the public school. The analysis of the texts continued during
April, May until June, to verify if it had changes in the writing skill of the
children through the mediation of the teacher. Conclusion: The research
allowed to conclude that almost haven’t mediation of teacher in the work
of writing of texts in the classroom. To obtain a qualitative improvement
in the literal production, it is necessary to make changes in the conception
of teaching in the written language.
KEY WORDS: Writing. Language arts. Learning.

Produção textual: quando a linguagem escrita se torna objeto escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 363-71
371
REFERÊNCIAS
1. Gonçalves AV. A produção de texto numa
perspectiva dialógica. PLURAL: Revista da
Academia Araçatubense de Letras, Araça-
tuba 2000.
2. Pesquisa Nacional por Amostra de Domi-
cílios – PNAD, Instituto Brasileiro de Ge-
ografia e Estatística – IBGE. Disponível
em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em
5/3/2009.
3. Weisz T. A saída é a formação do professor
alfabetizador. Revista Nova Escola. Editora
Abril, Edição Especial n.22, p.17, mar/2009.
4. Programa Internacional de Alunos – PISA,
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira - INEP/MEC.
Disponível em: < http:/ /www.inep.gov.
br/internacional/pisa/novo>. Acesso em:
5/3/2009
5. Prova Brasil, Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira­
– INEP/MEC. Disponível em: <http: //
www.provabrasil.inep.gov.br>. Acesso em
03/2009.
6. Abaurre MBM, Fiad RS, Mayrink-Sabison
MLT. Cenas de aquisição da escrita: o sujei-
to e o trabalho com o texto. Campinas: Asso-
ciação de Leitura do Brasil (ALB): Mercado
de Letras;1997.
7. Costa PG. Roteiro de Análise de Narrativas.
Faculdade Fortium, 2008. Disponível em:
<http:// www.fortium.com.br> Acesso em:
01/07/2009.
8. Condemarín M, Chadwick M. A escrita
criativa e formal. Porto Alegre: Artes Médi-
cas;1987.
9. Souza TB, Osório AMN. A mediação peda-
gógica na produção de texto: um diálogo
possível e necessário. In: ANPED, 26, Po-
ços de Caldas, 2003. Disponível em:<http://
www.anped.org.br/reunioes/26/inicio.
htm>. Acesso em: 1/8/2009.
Trabalho realizado na Universidade Estadual de
Londrina – UEL, Londrina, PR, Brasil, derivado de
monografia da autora apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Psicopedagogia, realizado sob
orientação de Rosa Maria Junqueira Scicchitano.
Artigo recebido: 5/9/2010
Aprovado: 21/10/2010

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
372
ARTIGO especial
RESUMO – A Ampliação do Ensino Fundamental para nove anos vem
provocando discussões e impasses, apesar de ser uma prática corrente em
uma parcela das escolas privadas do país. A recomendação atual é a não
antecipação de conteúdos e sim uma readequação das condições estruturais
e pedagógicas, para que, efetivamente, possa ocorrer qualificação no
ensino fundamental. No ensejo de contribuir para a reflexão sobre o tema,
articulamos três movimentos: buscar depoimentos de profissionais inseridos
no cotidiano escolar privado e público; organizar interlocuções teóricas
situando o pensamento e a ação da Psicopedagogia em suas interfaces
com Educação, Pedagogia e História Social, para assim problematizar o
lugar da infância em nossa sociedade atual e, desse modo, compreender,
psicopedagogicamente, as relações de aprendizagem que se apresentam
nesta nova configuração escolar. O terceiro movimento articula os
depoimentos e as interlocuções, objetivando compreender como se trama
no cotidiano escolar a temática abordada.
UNITERMOS: Psicopedagogia. Família. Criança. Aprendizagem.
Psicopedagogia no cotidiano escolar:
impasses e descobertas com o ensino
de nove anos
Fabiani Ortiz Portella – Pedagoga, Orientadora
Educacional; Especialista em Psicopedagogia
Clínica; Mestre em Educação; Docente Universitária;
Organizadora de livros na área da Psicopedagogia;
Presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia
(2ª gestão); Membro Titular da ABPp Nacional.
Neusa Kern Hickel – Psicóloga e Psicopedagoga, MS.
Psicologia Social e Institucional, participante do Grupo
de Pesquisa Aprendizagem e Subjetividade, UFRGS.
Docente do Uniritter. Conselheira Nacional da ABPp
pelo RS, integrante do Conselho Científico da ABPp/RS
Correspondência Fabiani Ortiz Portella
Rua Luiz Afonso, 269 – Cidade Baixa – Porto Alegre,
RS, Brasil – CEP 90050-310
E-mail: [email protected]
Fabiani Ortiz Portella; Neusa Kern Hickel

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
373
INTRODUÇÃO
O Plano Nacional de Educação formulado
pelo MEC para o período 2001-2010 articulou
uma das mais ousadas políticas educacionais
previstas na LDB: a Ampliação do Ensino Funda-
mental para nove anos. Posteriormente, a Secre-
taria de Educação Básica – SEB/MEC elaborou
orientações pedagógicas baseada em amplas
discussões com estados e municípios brasileiros,
visando a sua implementação com qualidade. No
entanto, como adverte a SEB, tal meta não seria
de simples execução: devemos estar atentos para
o fato de que a inclusão de crianças de seis anos
de idade não deverá significar a antecipação dos
conteúdos e atividades que tradicionalmente fo-
ram compreendidos como adequados à primeira
série. Destacamos, portanto, a necessidade de se
construir uma nova estrutura e organização dos
conteúdos em um ensino fundamental, agora de
nove anos (MEC, 2006)

*.
O desafio que assumimos é aproximar nosso
olhar e nossa escuta de alguns espaços escola-
res, buscando a contribuição de outros olhares
e escutas de profissionais e de referenciais té-
oricos da Psicopedagogia e outros que com ela
fazem interlocução. Assim, o presente trabalho
pretende pensar e escrever a cerca de um tema
relativamente novo na área da Educação.
Nas últimas décadas, a alfabetização tem
sido tema central de debates, pesquisas e
produções teórico-metodológicas e didáticas,
grandemente motivados pela necessidade
de melhoria de nossos precários índices de
aproveitamento. Embora tenha havido um
significativo aumento desses índices (20% do
alunado não obtêm promoção), atualmente,
se deve considerar que cresce entre os “apro-
vados” o número de analfabetos funcionais.
Como vemos, também os dilemas e os debates
polêmicos fazem parte da questão. Dentre os
pensadores voltados à temática, referimos as
produções de Emília Ferreiro e Ana Teberosky
(1985), Telma Weisz (1988) e Esther Grossi
(1991)
**. Desse modo, compreendemos que os
questionamentos sobre a escolaridade em nove
anos fomentam tanto novas questões sobre a
alfabetização, como as polêmicas atuais sobre
a Educação nessa área.
No ensejo de contribuir para a reflexão sobre o
tema escolaridade em nove anos, articulamos três
movimentos: o primeiro foi buscar depoimentos
de cinco psicopedagogas inseridas em espaços
escolares privados e públicos, em funções pe-
dagógicas diversas, com diferentes experiências
educacionais e cujas escolas pertencem a distintas
condições sociais; o segundo se fez com interlocu-
ções teóricas da Psicopedagogia com outras áreas
de conhecimento, favorecidas por seu caráter
inter e transdisciplinar; e, no terceiro movimento,
tratamos de articular os depoimentos e as interlo-
cuções, objetivando compreender como se trama
no cotidiano escolar a temática abordada.
* Em 6/2/2006, foi sancionada a Lei nº 11.274 que regulamenta o ensino fundamental de 9 anos. Essa modalidade visa assegurar
a todas as crianças um tempo maior de convívio escolar, maiores oportunidades de aprender e, com isso, uma aprendizagem com
mais qualidade. As legislações pertinentes ao tema são: Lei Nº 11274/2006, PL 144/2005, Lei 11.114/2005, Parecer CNE/CEB Nº
6/2005, Resolução CNE/CEB Nº 3/2005, Parecer CNE/CEB Nº 18/2005. O CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO- CÂMARA
DE EDUCAÇÃO BÁSICA, através da RESOL UÇÃO Nº 3, DE 3 DE AGOSTO DE 2005, define normas nacionais para a ampliação do
Ensino Fundamental para nove anos. No seu artigo 2º explicita: Art.2º A organização do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos e
da Educação Infantil adotará a seguinte nomenclatura: Etapa de ensino - Educação Infantil - Creche: Faixa etária - até 3 anos de
idade - Pré-escola: Faixa etária - 4 e 5 anos de idade. Etapa de ensino - Ensino Fundamental de nove anos - até 14 anos de idade.
Anos iniciais - Faixa etária de 6 a 10 anos de idade - duração 5 anos. Anos finais - Faixa etária de 11 a 14 anos de idade - duração
4 anos. A Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino funda-
mental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. (MEC, 2006).
** Pode–se consultar de E. Ferreiro e A. Teberotsky: Psicogênese da Língua Escrita, Porto Alegre: Arte Médicas. 1985; de T. Weisz:
Diálogo entre Ensino e Aprendizagem, São Paulo: Ática, 1996; de E. Grossi: Didática dos Níveis (Pré-Silábico, Silábico, Alfabético),
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
374
Assim, o segmento que corresponde às inter-
locuções teóricas está subdivivido em três seções:
• Objetos de pensamento e de ação da
Psicopedagogia, no qual situamos nos-
sa compreensão sobre a Psicopedago-
gia Clínica e suas práticas em relação
à escola;
• Interlocuções entre Psicopedagogia,
Educação e Pedagogia, se subdivide
na apresentação de relações sociais e
de aprendizagem no espaço escolar,
no qual diferenciamos compreensões
sobre o aprender na perspectiva peda-
gógica e psicopedagógica e, família e
escola – no qual discorremos sobre essa
delicada relação cujo eixo é a aprendi-
zagem;
• Interlocuções entre Psicopedagogia e
História Social: as conexões entre as
invenções da escola, da família e da
infância, onde contamos com a contri-
buição da análise sociohistórica para
problematizar o lugar da infância em
nossa sociedade atual e, desse modo,
compreender, psicopedagogicamente,
as relações de aprendizagem que se
apresentam nesta nova configuração es-
colar proposta pela ampliação do ensino.
O segmento correspondente ao primeiro
movimento se apresenta em Diálogos com psi-
copedagogas: o ensino de nove anos, no qual
situamos nossas convidadas e seus espaços de
trabalho e relatamos seus depoimentos.
Por fim, no terceiro movimento, elaboramos
considerações sobre os aportes teóricos em
consonância com os depoimentos, registrando
singelos pensamentos sobre esta experiência.

OBJETOS DE PENSAMENTO E DE AÇÃO
DA PSICOPEDAGOGIA
Para entender o que é Psicopedagogia, deve-
se ir além da simples junção de conhecimentos
oriundos da Psicologia e da Pedagogia, conforme
definição reducionista do senso comum. Psico-
pedagogia é um campo do conhecimento que se
propõe a integrar conhecimentos e princípios de
diferentes Ciências, com a meta de construir a
melhor e mais aprimorada compreensão sobre
as muitas variáveis implicadas no processo de
aprendizagem. Hoje, a Psicopedagogia Clínica
está voltada a toda e qualquer situação que en-
volva o acontecimento da aprendizagem e suas
vicissitudes, pois se originou como resposta a
uma demanda, cada vez maior, em relação ao fra-
casso escolar e aos problemas de aprendizagem.
O aprender está presente incondicionalmente,
desde que nascemos e se desenvolve ao longo da
vida. Segundo Pozo
1
, “podemos dizer que em nos-
sa cultura a necessidade de aprender se estendeu
a quase todos os rincões da atividade social. É a
aprendizagem que não cessa”. Portanto, a apren-
dizagem permeia a vida e está em permanente
acontecimento através de múltiplas e significati-
vas interações, das quais transforma informações
em conhecimentos e, a partir desses, promove a
integração de saberes. A aprendizagem muda o
sujeito e o mundo em concomitância.
Se a aprendizagem é de fato inerente à vida,
por que muitas vezes ela passa a ser um proble-
ma para muitos de nós? Afirmamos a aprendi-
zagem em sua possibilidade, porém seu fluxo
não é linear: os fatores que participam de sua
construção são múltiplos. A compreensão dos
problemas de aprendizagem demanda a mesma
complexidade, assim como a busca transdis-
ciplinar é exigência no entendimento de seus
processos. Na aprendizagem, tanto a sua fluidez
como sua interrupção põem em jogo a constitui-
ção da autoria, incidindo nesse vértice o objeto
de pensamento e de ação da Psicopedagogia.
As práticas da Psicopedagogia em relação à
escola ocorrem no sentido de prevenir dificul-
dades, de promover os aspectos facilitadores da
aprendizagem, buscando construir estratégias
de intervenção junto à equipe pedagógica, para
o atendimento das necessidades educativas
dos alunos. Inerente às práticas está a postura
clínica que envolve a escuta e o olhar atento
às modalidades e aos esquemas de ação e
significação dos sujeitos implicados na relação
de aprendizagem. Em se tratando de espaço
escolar considera-se, ainda, os elementos que

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
375
conformam social e culturalmente sua institui-
ção, o que complexifica o campo de ação do
psicopedagogo, pois no contexto escolar é im-
portante considerar a singularidade da estrutura
educativa e, sobretudo, sua função social.
A Psicopedagogia Clínica no âmbito escolar
tem como objetivo assegurar e/ou ampliar as
possibilidades de aprendizagem em todas as
relações escolares. Como assessor ou membro
da equipe, o psicopedagogo, sobretudo, consti-
tui uma escuta. Tendo a escuta como estratégia
principal, participa das discussões sobre aspec-
tos concernentes à aprendizagem, promovendo
situações em que os diversos segmentos possam
refletir sobre suas práticas e seus dilemas. Desse
modo, contribui para mediações entre os dife-
rentes grupos envolvidos na relação do ensino
e da aprendizagem, colaborando na formação
continuada dos professores. A ampliação de
conhecimentos sobre o aluno enquanto apren-
dente e sobre os processos de aprendizagem
em sua complexidade pode ser conjugada com
as ações didático-pedagógicas que facilitam
a aprendizagem e que, da perspectiva psico-
pedagógica, valorizam a autoria de alunos e
professores enquanto ensinantes e aprendentes.

INTERLOCUÇÕES ENTRE PSICOPEDA -
GOGIA, EDUCAÇÃO E PEDAGOGIA
Relações sociais e de aprendizagem no
espaço escolar
O dia-a-dia da vida escolar estabelece as pri-
meiras relações sociais, afetivas e cognitivas fora
do ambiente familiar. Visto assim, é um cotidiano
a ser explorado, permeado de inúmeros desafios,
que pode se constituir como um ambiente favorá-
vel para criar interações em prol de várias formas
de aprendizagem. No entanto, o ingresso na vida
escolar é acompanhado das mais variadas tramas
vivenciais, desde situações que ensejam a socia-
lização e a aprendizagem em primeira instância,
como aquelas geradas pela necessidade de afastar
precocemente as crianças pequenas dos cuidados
familiares. A insersão no ambiente educativo
infantil, segundo cenário das relações sociais da
criança, é o momento em que, geralmente, ocor-
rem as primeiras interações com outras pessoas,
quando o sujeito, ao expor-se a outros desafios,
diversifica seu processo de socialização com a
possibilidade de desenvolver novas habilidades.
Embora uma considerável parcela das pro-
postas escolares privilegie o desenvolvimento
cognitivo, na perspectiva da Psicopedagogia
Clínica compreende-se aprendizagem como
uma articulação entre o conhecimento e o saber,
de forma singular, realizada através da relação
estabelecida entre ensinante e aprendente
*
em suas histórias de vida, pressupondo-se aí a
diversidade de objetos de conhecimento.
A Psicopedagogia, como campo de conheci-
mento, estuda a aprendizagem, buscando en-
tender os processos, as relações, as significações
e as situações contextuais de sua ocorrência. A
partir da compreensão desses processos, parti-
cipa da elaboração de estratégias favorecedoras
de seu desenvolvimento e de alternativas para
superar fatores o que entravam. Desse modo, em
relação ao cotidiano escolar, a Psicopedagogia
busca o contato com as múltiplas relações de
aprendizagem, procurando contribuir para o
estabelecimento de situações saudáveis** nos
vínculos entre os envolvidos na construção do
conhecimento. Seus profissionais levam em
conta os aspectos socioculturais da circunvi-
zinhança escolar, a variedade dos espaços da
escola, além daquele que mais lhe caracteriza
– a sala de aula.
* Os conceitos de ensinante e aprendente são específicos da Psicopedagogia e foram introduzidos por A. Fernandez (1991) em A
Inteligência Aprisionada. Referem a singularidade das relações para além dos papéis históricos de professor-aluno, dando conta
de lugares flexíveis por onde circula a aprendizagem. Por outro lado, esse deslocamento indica a triangulação dos lugares e das
significações em relação a um terceiro vértice apresentado como o objeto de conhecimento.
** Situações saudáveis referem ações promotoras de efetiva aprendizagem.

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
376
Assim, a Psicopedagogia considera todas as
variáveis citadas como oportunas para comparti-
lhar conceitos e valores básicos que se produzem
na convivência, visando ao desenvolvimento de
um currículo, cuja intervenção didático-peda-
gógica privilegie, ao mesmo tempo, o reconhe-
cimento através da autoria de pensamento* e a
valorização da diversidade. Nessa perspectiva,
também a relação escola-família e suas diferen-
tes atribuições na constituição dos processos
de aprendizagem deve ser referida como fator
interveniente nos fluxos que lhe são favoráveis.
Família e escola
O papel da família foi e continua sendo
fundamental na educação de crianças e isso
inclui o acompanhamento envolvido e interes-
sado pela vida escolar de seus filhos e, melhor
ainda, quando essa incumbência é feita amo-
rosamente. As relações entre família e escola
pressupõe exercício de autoridade e reconhe-
cimento de seus mútuos papeis sociais para
com a aprendizagem. No entanto, as mudanças
sociais, culturais e econômicas, desde meados
do século XX, têm alterado substancialmente
os modos de vida, as configurações familiares
e incidem diretamente nessa relação com a es-
cola, requerendo um permanente diálogo para
que os contratos entre ambas as partes possam
atualizar-se e explicitar suas responsabilidades
em benefício da educação das crianças.
Atualmente, faz-se necessário abrir espaços
para o estabelecimento de conexões entre famí-
lia e escola – às duas instituições – cabe a análise
das mudanças provocadoras de não saber que
nos tornam vulneráveis aos aspectos iatrogêni-
cos da globalização. Escola e família, por meio
de seus agentes, correm os riscos da omissão e
da dissolução das referências enquanto adulto
responsável, mas, têm o poder, com sua criati-
vidade, de buscar novas formas de cuidado e
de exercício de autoridade.
As relações do complexo universo que en-
volve o aprender sustentam as relações entre a
família e a escola, considerando as possibilidades
e os entraves que podem ocorrer, na perpectiva
das parcerias estabelecidas ou não. Turkenicz
2

indica alguns fatores, tais como o aumento signi-
ficativo da expectativa de vida, a diminuição da
natalidade, o aumento dos índices de separações
e divórcios, resultando em novas configurações
familiares e parentais. Ainda salienta que, a
família constitui um dos poucos valores seguros
e desejados por homens, mulheres, crianças e
adolescentes de todas as condições sociais.
Significações sociais, afetivas e cognitivas
nas relações escolares
As funções até aqui atribuídas ao espaço e ao
cotidiano escolar assinalam aspectos promotores da
aprendizagem, contudo, em suas tramas habitam
outras – as funções que dão conta de sua gênese
social e dos mandatos culturais que se manifestam,
sobretudo, no reprodutivismo e nas estratégias de
exclusão, questões que dentre outras fazem parte
da problemática educacional do Brasil. Esses pro-
blemas mais amplos indicam antigos padecimentos
sobre as desigualdades sociais, culturais e econô-
micas da nação e interferem na distribuição de
bens, não só econômicos, mas sobretudo, culturais
e, nos índices de aproveitamento escolar. No con-
texto dessa amplitude adere um novo desafio e os
problemas dele decorrentes, com a implementação
da escolaridade em nove anos.
A escola continua tendo potencial para
ser espaço privilegiado de acesso aos bens
culturais, mediante a interação de pessoas de
diferentes segmentos, tais como os que com-
põem a chamada comunidade escolar, sempre
que os vínculos entre elas possam sustentar os
mais fundamentais princípios de sua existência.
Enquanto instituição, a escola pode continuar
lutando para sustentar sua função social mais
positiva: o acontecimento da aprendizagem.
* Autoria é considerado objeto prioritário, portanto básico e peculiar da Psicopedagogia. Consulte especialmente A. Fernandez em
O Saber em Jogo. Porto Alegre: Artmed, 2001.

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
377
Nesse sentido, a escola mantém a oportuni-
dade de criação constante de um cotidiano ar-
ticulado com seu tempo, seja pela renovação de
valores morais, seja pela consolidação de valores
fundamentais que se implicam na construção
conceitual das mais variadas áreas de conheci-
mento. A alfabetização e o letramento são porta
de entrada para aceder aos bens culturais e, nesse
sentido, sua efetivação é uma questão de inclusão.
Este relevante papel social voltado para a pro-
dução de aprendizagem envolve a constituição
de espaços para ensinar a pensar e, tudo que
daí possa decorrer. Refletir, pesquisar, avaliar e
auto-avaliar-se são ações mais intensas quando
vividas em formas cooperativas que exercitam a
cidadania. É desse modo que os sujeitos apren-
dentes – professores e alunos –, podem tornar-se
conhecedores de si mesmos, autores de suas
próprias metas e meios. Isso significa que os par-
ticipantes desse processo aprendem e ensinam
a conviver e a interagir ao mesmo tempo que
constróem conhecimentos e integram saberes.
O ingresso nos ciclos de formação do ensino
fundamental de crianças aos 6 anos faz com que
nos deparemos com a concretude dos dilemas da
atual proposta. Embora a idade, propriamente dita,
não deva ser o critério principal, pois como refe-
rência biológica é importante, mas não suficiente
para encontrarmos a melhor alternativa pedagó-
gica. Cabe ressaltar que a questão requer análise
histórico-social junto ao componente biológico, pois
a aprendizagem não se faz sem contexto.
O que está em jogo é exatamente o sentido de
infância e o tratamento que queremos dar a ela.
Como contexto nacional temos os argumentos de
que o Brasil é o último país da América Latina
a dar início ao processo escolar antes dos sete
anos e, que a medida deixaria mais equilibrada
a oportunidade de acesso à alfabetização entre
alunos frequentadores de escolas privadas e pú-
blicas. No entanto, os profissionais da educação
têm consciência da diferença de tratamento na
educação infantil e no ensino fundamental para
uma criança de seis anos. Nós, profissionais da
Psicopedagogia, defendemos o direito ao lúdico
como equivalente ao direito de aprendizagem e
compatível com as necessidades simbólicas da
criança. Também, os pesquisadores têm disponi-
bilizado pertinentes avaliações, como Barbosa
3
,
que destaca a necessidade de se ter em conta
as diferentes culturas que marcam a educação
infantil e o ensino fundamental: enquanto a edu-
cação infantil oferece propostas diversificadas e
abrangentes e olha a criança de um modo mais
integral, o ensino fundamental oferece propostas
mais homogêneas e olha a criança como aluno.
Seguindo uma abordagem interdisciplinar,
Barbosa
3
refere as sutilezas que diferenciam os
conceitos de criança, infância e aluno. Criança
corresponde ao ser humano de pouca idade; in-
fância é o modo como esse ser pode ou não viver
sua vida nesse período e, aluno é um sujeito pro-
duzido por longo processo de disciplinarização e
aculturação. Por este prisma, iniciar mais cedo não
deve ser equivalente a ingressar em um esquema
escolar cujo sistema de avaliação, em sua maioria,
é competitivo. É preciso ter presente que a infância
teve garantidos os seus direitos no país, através
da Constituição, da ECA e da LDB. E, o Sistema
Nacional de Educação estabelece as ações peda-
gógicas para o que está convencionado como in-
fância, determinando proposições que contemplem
a multiplicidade e a diversidade de seus sujeitos,
bem como o reconhecimento de suas capacidades
cognitiva, criativa, estética, expressiva e emocional.
INTERLOCUÇÕES ENTRE
PSICOPEDAGOGIA E HISTÓRIA SOCIAL
As conexões entre as invenções da escola,
da família e da infância
A emergência de um novo discurso sobre
a escola – o ensino em nove anos - enseja a
reflexão sobre alguns aspectos que considerem
a história social da atividade escolar e o signifi-
cado sócio-cultural desse espaço. Nesse sentido,
uma variedade de conceitos, tais como os de
infância, de família e escola, se emaranham em
suas genealogias, tornando inviável qualquer
tentativa de análise que os dissocie. Com a
Psicopedagogia e sua possibilidade transversa-
lizar, podemos buscar para essa análise aqueles

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
378
pontos de confluência teórica onde se imbrica
a complexidade da aprendizagem.
Por um lado podemos indicar a articulação da
escrita como criadora de uma necessidade ances-
tral de transmissão, pois, como refere Huertas
4
,
o surgimento das primeiras culturas urbanas, no
delta do Tigre e Eufrates
*, gerou formas de viver
que requeriam seu registro organizado e detalha-
do. O armazenamento de registros administrativos,
contas e transações agrícolas não podia contar ape-
nas com a memória, e assim, com a escrita nasce a
necessidade de formar escribas e, para tanto, foram
criadas as “casas de tabuinhas”, registro histórico
de espaço para o ensino da escrita.
Tais espaços contribuem para a sistematiza-
ção da transmissão e podem ser compreendidos
em sua dimensão de aprendizagem, tendo em
vista a utilização de métodos que incluíam a
prática de cópia e recópia pelos aprendizes, até
que fossem capazes de reproduzir o sistema da
escrita. Apenas os socialmente privilegiados
tinham acesso a essas práticas, dedicando-se
muitos anos ao domínio deste código, sob severa
disciplina. Em diversas culturas, a escrita consti-
tui-se como memória de civilização, tornando-se
objetivo primordial da aprendizagem formal.
Também entre os gregos, nos primórdios da
civilização ocidental, os espaços de transmissão
são referidos em seu limitado acesso, aos adul-
tos, principalmente, para o ensino da filosofia.
O estudo da iconografia contribui através das
obras de Rafaelo Sanzio, com Aula em Atenas
e de Rembrandt, com Aula de Anatomia
**.
Já Huertas
4
*** refere um significado bastante
inusual para escola: tempo de ócio. Salienta-se,
contudo, que esses espaços nos quais os gregos
adultos desfrutavam de tempo livre eram espaço
abertos.
Da mesma forma, um grande espaço aberto
é a obra de Bruegüel, que viveu entre 1525 e
1569, denominada Jogos, ela tanto simboliza os
modos como ocorriam as aprendizagens – trocas
totalmente espontâneas, entre as várias faixas
etárias, como indica formas de viver – as resi-
dências abertas, para um espaço que pode ser
entendido como a rua. Mais curioso nessa obra
medieval é a ausência de crianças, isto é, elas ali
estão, não com as feições como nós as represen-
tamos, mas no modo como eram compreendidas
naquela época: adultos em miniatura, conforme
nos aportam os importantes estudos de Ariès
5
.
Com as pesquisas sobre a história social de
Ariès, aprendemos que infância e família são con-
ceitos criados entre os séculos XIX e XX, ambos
crivados de propósitos nada inocentes. As concep-
ções então vigentes dão conta do tempo reduzido
de infância e do ingresso precoce nas atividades
dos adultos. Se nos primeiros anos havia certa
atenção, às vezes, tratamentos equivalentes a um
animalzinho de estimação, a predominância das
ações estavam voltadas aos cuidados alimentares
e, mesmo a transmissão educativa ocorria fora do
controle familiar. Embora estejamos encontrando
nossas próprias formas de desconstituir a infância,
nos impactamos com o anonimato e com o infan-
ticídio tolerado pela moralidade neutra, como o
foi até o fim do século XVII.
Quando a civilização conquista um novo lu-
gar para a criança - a infância, também suscita
uma outra concepção de família, agora forjada
* Próximo ao atual Iraque.
** Os pintores Rafaelo Sanzio, que viveu entre 1483 e 1530, em sua obra Aula em Atenas e, Rembrandt, que viveu entre 1606 e
1669, em sua obra Aula de Anatomia, nos legaram o registro da presença dos adultos nos seus espaços (www.br.geocities.com);
já Velazquez produziu Las niñas, entre 1634-1635 http://www.museoprado.es
*** O autor indica o ensino das letras para crianças e destaca a etimologia da palavra escola: (...) as crianças gregas iniciavam
suas aprendizagens de leitura e escrita e a SKHOLE, literalmente ócio e tempo livre, foi o nome atribuído aos primeiros grupos de filósofos
reunidos em torno de um mestre de prestígio. Convém ressaltar a ironia etimológica da origem da palavra escola, com a aprendizagem da
leitura e escrita para o grupo de adultos liberados de suas atividades produtivas, dedicando seu tempo livre para atividade filosófica. (...).

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
379
pelas demandas pré-industriais. A emergência
das concepções de infância e família atende à
diminuição drástica da população européia que
se fazia sentir nos campos e nos exércitos. Várias
forças sociais se voltam para a necessidade de
reconfiguração de papéis que vão incidir sobre a
criança, a mulher e, finalmente, sobre a família.
Em parte, está formado o cenário para a inven-
ção da escola. Enquanto à mulher é atribuído o
papel de mãe – tornado sublime pela consolidação
da imagem sagrada da mãe de Deus, a vida social
no século XIX se polariza em torno da família e
da profissão. A família, então, se organiza em
torno da criança que passa a centralizar cuidados,
o controle da natalidade e a exigência de espa-
ços privados. Altera-se o índice de mortalidade
infantil, a criança obtém direito ao batismo, ao
nome próprio, aos cuidados do corpo morto. A
obra de Ariès, rica em indicações iconográficas
utilizadas em sua pesquisa, destaca a consagração
da infância pela presença imagética da alma: a
Madona
* segura uma criança embrulhada em
panos, deixando a nudez para os inominados.
Durante a Idade Média e até o século XVIII,
aquilo que se configuraria como conhecimento
era transmitido mediante convivência, nas quais
ocorria a mistura de idades e a comunicação do
saber-viver e do saber-fazer. Porém, a crescente
industrialização e outras formas de trabalho nos
meios em urbanização exigiam, novamente, que
as crianças fossem tomadas aos cuidados não
familiares. Desse modo, temos mais um elemen-
to para a conformação da escola, que, segundo
Varela e Uria
6
, nasceu no interior de sociedades
estratificadas e hierarquizadas e perpetuou-se
às sociedades atuais, pouco se adequando às
demandas de justiça e igualdade.
Como vemos, não é de hoje que se faz dos
movimentos da escola o vetor de muitos estudos.
Segundo Varela e Uria
6
, é necessário remontar-se
a história, buscando discursos e práticas. A escola
pública, gratuita e obrigatória, instituiu-se na pas-
sagem entre os séculos XIX–XX, porém forjou-se
desde o século XVI, e para conhecer como se mon-
taram suas peças é preciso rastrear continuidades
obscuras, certos encaixes, articulações de interes-
ses e relações de poder. Sobretudo, é preciso com-
preender como vem ocorrendo sua manutenção e
sua mudança ao longo dos anos, como importante
fator de entendimento da escola hoje.
As condições sociais de aparição da escola
indicam cinco principais elementos: definição
do estatuto da infância; criação de um espaço
específico destinado à educação de crianças; um
corpo de especialistas sobre a infância; destruição
de outros modos de educação; institucionalização,
propriamente dita, da escola, ou seja, a imposi-
ção da obrigatoriedade escolar decretada pelos
poderes públicos e sancionada pela legislação
6
.
Nos primórdios dessa história, a escola
assume a educação integral e as crianças são
separadas dos adultos. A predominância das
escolas, mesmo as públicas, sob cuidados de
congregações religiosas contribuiu para o ca-
ráter de moralização e religiosidade vinculado
à educação. Diferente, pois, das escolas gregas
para adultos, nas quais a forma de acesso ao
conhecimento era a partir de problemas práticos
da vida: a academia de Platão recorria ao método
socrático maiêutico que se baseava nos diálogos,
dirigindo-se mais à persuasão do que à repeti-
ção. Huertas
4
relata que, nas escolas religiosas,
o ênfase ficava centrado no ensino da leitura,
da escrita e do cálculo. Mesmo assim, a escola
ensinava a ler e escrever não como um meio de
ter acesso a outros saberes, mas sim como um
fim em si mesmo. Já Varela e Uria
6
destacam que
desde seu surgimento a escola foi segmentada
conforme a hierarquia social, desde sempre de-
terminada pelas condições econômicas.
Se pensadores como Montessori, Pestalozzi
e Fröebel dentre outros, conforme indicados
por Jean Piaget
7
, difundem perspectivas mais
abonadoras para a escola, deslocando os valores
* São exemplares as Madonas de Botticelli, que viveu entre os anos de 1445 e 1510. (http://www.pitoresco.com.br/universal/
botticelli/botic.htm).

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
380
mesquinhos do mero controle social para os que
engrandecem esse espaço e seus profissionais, na
segunda metade do século XX as transformações
da escola são mais evidentes. As escolas públicas
foram reconhecidas pela qualidade de seu ensi-
no, mas cabe salientar que recebiam as classes
consideradas média e alta. Somente, quando
ganha força o movimento pela educação como
direito de todos e ocorre o ingresso massivo de
classes socioeconômicas desfavorecidas é que se
torna evidente a que população se destinava seu
ensino. Desde então, se aprofunda a segmenta-
ção entre escolas públicas e privadas em relação
às classes sociais e a qualificação do ensino.
A Constituição de 1988 consolida o acesso,
no entanto, abre a porta para outros dilemas,
pois o direito de aprender ainda não é reco-
nhecido. Nesse cenário se agrega a globaliza-
ção, a hegemonia capitalista, a mudança na
disposição das informações, o que dá à escola
mais outro sentido: deixar de ser um espaço
privilegiado em relação à informação e sua
transmissão.
As análises formuladas sob a perspectiva só-
cio-histórica* adquirem sua real dimensão dian-
te de velhos e novos problemas da educação, à
medida em que compreendemos a infância, a
escola e a família como concepções construídas
e, portanto, mutáveis em cada sociedade. Assim,
frente aos desafios e dilemas advindos da atual
proposição de ensino em nove anos cabe uma
pergunta fundamental – trata-se de reiterar
nosso saber sobre a criança em relação a cada
época: quem são as crianças de hoje?
DIÁLOGO COM PSICOPEDAGOGAS: O
ENSINO DE NOVE ANOS
Com o intuito de vincular uma discussão
teórico-prática, utilizamos o recurso de entre-
vistas com profissionais em Psicopedagogia
atuantes no âmbito escolar público ou privado.
Convidamos as colegas – membros associados
da ABPp/RS: Denise Maia, Magali Lima Mo-
raes, Marcia Dimer, Susi Sá e Tania Franciosi,
considerando suas vinculações ao tema, suas
experiências profissionais, suas presenças no
dia-a-dia da escola, seus lugares como refe-
rências junto aos fundamentos teóricos e aos
saberes da Psicopedagogia.
Para a realização deste ensaio encaminha-
mos um convite justificando a escolha do tema
e das colegas, acrescido de um roteiro, no qual
explicitamos questões que poderiam ser atendi-
das, conforme a entrevistada o desejasse.
Nosso objetivo foi utilizar um instrumento
de entrevista semi-estruturada (Quadro 1). Para
análise das perspectivas apresentadas pelas
colegas procuramos agrupar suas considerações
de acordo com a relevância despertada pelas
questões.
Quadro 1 – Questões possíveis para compor um
ROTEIRO
• Como entendes essa providência legal quanto ao
seu efeito em relação a crianças, pais e professores?
• A escola em que trabalhas já tinha uma prática
voltada para o início da alfabetização aos seis anos?
• Como começou, como foi o processo?
• Pensas que as escolas que estão começando agora
estão em desvantagem?
• Essa medida equivale ao trabalho desenvolvido na
chamada “pré-escola”?
• Como estão reagindo os pais com as mudanças?
• Os professores de tua escola como têm feito para
atender às demandas de formação, de planejamento
e de práticas?
• Soubemos que os pais ainda estão em dúvida se o
filho “pulou” um ano e com isso irá se prejudicar, ou
se o currículo “desceu” e com isso o filho começa
a aprendizagem escolar mais cedo. Observas esse
tipo de consideração?
• Essa nova situação tem proporcionado oportu-
nidades de discussão sobre potenciais diferentes
experiências e ritmos dos alunos em relação à
aprendizagem escolar?
• Qual é sua posição sobre o tema?
* Essa análise sempre conduz a situações paradoxais: assinalam a mutabilidade conceitual e os deslocamentos em função das
forças sociais e das demandas econômicas, ao mesmo tempo em que faz perdurar certos dispositivos que se reproduzem em
formatos diferentes conforme a época.

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
381
Diante da implementação legal e o desen-
cadeamento das atividades escolares voltadas
para o ensino em nove anos, sintetizamos os
relatos das psicopedagogas em relação às
temáticas que compunham as questões. As es-
colhas feitas pelas convidadas contempla com
mais ou menos ênfase os temas, de modo que
nossa análise se estabeleceu de acordo com
essa tendência. A relevância dos aspectos mais
abordados está exposta no Quadro 2.
Quadro 2 – Demonstrativo dos aspectos temáticos de maior prevalência nas entrevistas realizadas com
cinco psicopedagogas sobre ensino fundamental em nove anos – Porto Alegre, 2009.
Principais efeitos
da providência
legal
• Garantir dois anos de trabalho na alfabetização;
• Garante o acesso das crianças de 6 anos na escola;
• Nos coloca em patamares similares aos dos demais países sul-americanos e europeus;
• Amplia simultaneamente o acesso e reforça a obrigatoriedade da matrícula;
• Oferece vantagem para criança de escola particular que vem de uma educação infantil e
já trabalhou as habilidades que contribuem para a leitura e escrita;
• Pode ser vantagem na escola pública se for oportunizado à criança o espaço de brincar
e socializar-se ao ambiente escolar e assim, entrar para a primeira série com seis anos
como acontecia há anos no ensino particular;
• As pessoas ainda estão muito confusas;
• Reflexão que estamos fazendo e os vários olhares que estamos nos dispondo a dar;
• Possibilidade de flexibilizar o tempo para a alfabetização, que estava engessado em 1 ano.
A lei e a
alfabetização
• Já começava antes: para a criança que completava 6 anos até dezembro do ano anterior
à primeira série;
• Currículo pelo Método Montessori propõe alfabetizar a partir do momento em que cada
aluno demonstra interesse e motivação;
• No primeiro ano dos ciclos havia um trabalho de desenvolvimento de habilidades, porém,
como as crianças já tinham entre 7 e 8 anos de idade, algumas professoras, no 2º se
mestre, introduziam uma prática voltada para o início da alfabetização.
Significações
para as escolas
• Grande alteração nas escolas públicas;
• Pensar que a qualidade não se resolve simplesmente começando mais cedo;
• É uma proposta nova; necessita dedicação;
• É um trabalho diferenciado, que envolve um novo planejamento, novas metas, e, um
aspecto muito importante, a obrigatoriedade.
• Na escola particular, a criança já teve educação infantil, desenvolveu as habilidades pre
vistas, então, já poderia ir para a 1ª série e terminar antes o ensino fundamental, entrar
no ensino médio e passar no vestibular, sem cursinho.
Primeiro ano
e educação infantil
• Não pode confundir: a lei é bem clara nesse sentido – não se trata de estender a educação
infantil, o trabalho de 1º ano deve ter foco na alfabetização, mas com mais tempo;
• Se há confusão a criança perde porque – nos casos em que, não teve educação infantil,
foi pouco estimulada, chega numa escola que quer alfabetizar;
• É preciso garantir que as crianças brinquem;
• É importante descobrir as habilidades escolares, conhecer caderno com linhas, aprender
a ficar sentado junto com aprender a ler;
• Que se possa repensar a educação infantil como um período de constituição de um sistema
de representação e de simbolização que são básicos para a saúde mental do ser humano
e para o qual o brincar é fundamental e precisa ser respeitado e não abreviado ou ignorado.

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
382
Continuação do Quadro 2
Significações
para os pais
• Alguns pensam que é só mais um ano para pagar de escola;
• Alguns acham que pode ajudar em termos de vestibular: talvez seu filho chegue ao
ensino médio mais preparado e consiga passar no vestibular mais cedo;
• Os pais estão atentos às mudanças, acompanhando o desempenho e a postura de seus
filhos(as); procuram esclarecer suas dúvidas e tomam consciência do processo;
• Os pais (educação infantil) cobram dos professores trabalhos de alfabetização que prepare
a criança para fazer uma primeira série com menos dificuldades.
Posições sobre
os professores
• Estudar: a escola organizou grupos de estudos semanais, os professores estão estudando
e adequando o currículo;
• As formações são políticas ou para cumprir o calendário, os professores precisam lutar;
• Em escola particular se sentem pressionados, temem que aumente a perda do tempo de
brincar para as crianças;
• Precisam pensar em estimular a riqueza da diversidade e da participação envolvendo o
aluno; há mais tempo para trabalhar um vasto leque de conteúdos;
• Refletir sobre as vantagens para todos, pois as crianças têm mais tempo para se alfab
tizar e para trabalhar conteúdos básicos;
Lugar da criança
e da infância
• Um tempo maior para respeitar os diferentes tempos das crianças, menos pressão em
termos de resultados e com abertura para o lúdico;
• Pensar nas crianças: até então, tinham que esperar um ano mais para iniciar o ensino
fundamental e, muitas vezes, estavam também privadas de um bom trabalho na ed
cação infantil;
• Oferecer à criança um ambiente escolar que reflita seu próprio mundo, respeitando seu
ritmo, suas diferenças e individualidades, suas possibilidades e limitações;
• Que haja respeito pelo ritmo próprio, pela singularidade e para a constituição do sujeito;
FINALIZANDO
Compartilhar as contribuições de profissio-
nais cuja proximidade com os espaços escolares
e a formação em Psicopedagogia, bem como
as reflexões oriundas dessa escuta e da busca
por elementos conceituais é o que corresponde,
nesse ensaio, aos aspectos conclusivos, caso
ressultasse de uma pesquisa. Simplesmente
explicitamos e socializamos as nossas preocu-
pações e as de várias outras profissionais no
intuíto de contribuir para uma reflexão ampla
e duradoura, tal como merece o tema.
Consideramos as posições e as experiências
diferenciadas de cada uma como parte da di-
versidade de olhares, das suas próprias escutas,
dos espaços socioculturais de suas inserções.
Contudo, nos abstemos de qualquer pauta com-
parativa entre as suas posições, entre as da cada
uma e as nossas e todas as proposições teóricas.
Mais do que finalizar com indicações e
recomendações conclusivas, salientamos a
necessidade permanente do diálogo entre nós
psicopedagogas/os; nossa com segmentos de
professores e pais. Acreditamos na perspectiva
de que todos estamos aprendendo com esse novo
desafio educacional e que as trocas entre pares e
díspares sustenta a qualidade das nossas ações
e a coresposabilidade que tais aprendizagens
promovem como efeito de autoria nos processos
de subjetivação do qual fazemos parte.
Nos parece pois sensato continuar perguntan-
do sobre quem são as crianças hoje e no que se
sustenta essa pergunta – crianças são “atravessa-
das” pelos efeitos de infância produzidos em pro-

Psicopedagogia no cotidiano escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
383
cessos sociais, culturais de cada época/sociedade.
Os nossos discursos e as nossas práticas estão,
neste exato momento, constituindo uma história.
Está sob nosso poder atender aos aspectos
que se entrelaçam em diversas polêmicas sobre a
infância: o que pode haver entre perder o lúdico
com a entrada no sistema escolar fundamental e
os acessos que as crianças dispõem hoje e que a
tornam mais familiarizadas com a escrita e seus
suportes? O que pode haver entre as discrepân-
cias da distribuição de acessos, pois sabemos
que as crianças de classes populares são as mais
desprovidas de ambientes “alfabetizadores”?
Nesse sentido e, finalizando, seguimos o
pensamento de Barbosa e Horn
8
, para as quais
precisaríamos ultrapassar a dicotomia, ou seja:
o novo suscita um lugar novo e outra posição
de ação. Não podemos continuar pensando na
separação – de um lado a educação infantil, de
outro, o ensino fundamental. Estamos convoca-
dos a pensar em algo novo, que, da perspectiva
pedagógica, se configure como inventivo e inte-
grador entre alfabetização e letramento, no qual
se afirma o direito ao lúdico, o uso de linguagens
simbólicas, a efetivação de relacionamentos
afetivos e de ocupação com o meio ambiente
natural e social, cuja intencionalidade contri-
bua para a organização do tempo e do espaço
em projetos significativos. E, sob a perspectiva
psicopedagogógica, é mais uma vez o olhar e a
escuta sobre os processos, os entrecruzamentos,
as vicissitudes entre as singularidades dos que
deles participam que demarcam nosso território
de ação. A defesa ao lúdico extrapola os aspec-
tos cognitivos demandados pela escolaridade,
ela se coloca em uma dimensão de maior radi-
calidade na conjuntura da aprendizagem em
espaços e tempos ao longo da vida. Trata-se do
direito de aprender de acordo com a própria
singularidade.
SUMMARY
Psychoeducation in everyday school dilemmas and discoveries: with
teaching nine years
Magnification of elementary school for nine years has been provoking
discussions and impasses, despite being a current practice in a parcel
of private schools in the country. The current recommendation is to not
anticipating content and yes a readjustment of structural and pedagogical
conditions so that, effectively, there may be a qualification in elementary
school. The opportunity to contribute to the reflection on the theme
articulate three movements: seeking testimonials from professionals
entered into everyday private and public school; organize conversation
theoretical standing thought and action of Psychoeducation on its interfaces
with Education, Pedagogy and Social History, so the place of childhood
problematizing in our current society and thereby understand, learning
relations that present themselves in this new school setting. The third
movement articulates the testimonials and the conversations in order to
understand how the plot in everyday school the theme addressed.
KEY WORDS: Psychoeducation. Family. Child. Learning.

Portella FO & H ickel NK
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 372-84
384
Trabalho realizado no consultório privado das auto­
ras, Porto Alegre, RS, Brasil.
Artigo recebido: 15/6/2010
Aprovado: 27/10/2010
REFERÊNCIAS
1. Pozo JI. Aprendizes e mestres: uma nova
cultura da aprendizagem. Porto Alegre: Art-
med;2002.
2. Turkenitz A. Famílias ocidentais no século
XX. In: Franceschini I, Portella FO, org. Fa-
mília e aprendizagem relações necessárias.
2ª ed. Rio de Janeiro: Wak; 2008.
3. Barbosa MCS. Culturas escolares, culturas
de infância e culturas familiares. In: Educa-
ção e sociedade. Campinas: 2007. Vol. 28.
4. Huertas J. A. Motivación querer aprender.
Buenos Aires: Aique;2001.
5. Ariès P. História social da criança e da famí-
lia. Rio de Janeiro: Zahar;1978.
6. Varela J, Uria F. Arqueologia de la escuela.
Madrid: Piqueta;1991.
7. Piaget J. Psicologia e Pedagogia. 9ª ed. Rio
de Janeiro: Forense Universitária;1998.
8. Barbosa MCS, Horn MGS. Projetos peda-
gógicos na educação infantil. Porto Alegre:
Artmed; 2008.

Linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
385
ARTIGO DE REVISÃO
RESUMO – Introdução: Existe uma relação estreita entre as habilidades
sociais e a linguagem pragmática. Objetivo: Tendo em vista que a
“inocência” apresentada por indivíduos com Autismo de Alto Desempenho
(AAD), que apresenta correlação direta com prejuízos nas habilidades
sociais, este artigo tem como objetivo definir quais aspectos da linguagem
contribuem para isso. Método: Para tal, lança mão da Teoria Cognitiva da
linguagem, uma vez que preconiza uma ponte entre aspectos linguísticos,
cognitivos e sociais. O paralelo entre o Falante Inocente de Fillmore (1979)
e dados de pesquisas anteriores (Mousinho, 2003; 2010) e testemunhos
extraídos de autobiografias de indivíduos com AAD (Grandin & Scariano,
1986; Williams, 1992) foi a articulação escolhida para o objetivo traçado.
UNITERMOS: Transtorno autístico. Linguagem. Comportamento social.
O falante inocente: linguagem
pragmática e habilidades sociais no
autismo de alto desempenho
Renata Mousinho – Fonoaudióloga. Doutora e mestre
em Linguística pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Professora da Graduação em Fonoaudiologia
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Coordenadora do projeto ELO:
escrita, leitura e oralidade UFRJ.
Correspondência Renata Mousinho
Av. das Américas, 2678 – casa 11 – Barra da Tijuca –
Rio de Janeiro, RJ, Brasil – CEP: 22640-102
E-mail: [email protected]
Renata Mousinho

Mousinho R
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
386
INTRODUÇÃO
Existe uma relação estreita entre as ha-
bilidades sociais e a linguagem pragmática,
comumente conceituada como o uso social da
língua. Falar de forma gramaticalmente correta
é insuficiente para ser uma pessoa hábil social-
mente. Linguagem usada em contexto social
exige habilidades interacionais e cognitivas.
Para advogar em favor deste ponto de vista,
Fillmore
1
propôs o termo “falante inocente”
para retratar um indivíduo que reconhece estru-
turas gramaticais, sem, no entanto, estabelecer
inferências.
Dificuldades nas habilidades sociais e prag-
máticas estão no cerne das dificuldades no
autismo. Descrito desde 1943 por Leo Kanner,
trata-se de um transtorno do desenvolvimento
caracterizado por apresentar dificuldades, ba-
sicamente, em três áreas: déficits nas habilida-
des sociais, no uso comunicativo da linguagem
verbal e não-verbal, e comportamentos restritos
e repetitivos. As dificuldades pragmáticas em
geral e as dificuldades na compreensão da
linguagem figurada mais especificamente têm
sido pesquisadas com mais frequência na última
década, tanto no Brasil quanto no exterior
2-5
.
Tendo em vista que o “falante inocente”
apresenta correlação direta com alguns pre-
juízos nas habilidades sociais observados no
Autismo de Alto Desempenho (AAD), este ar-
tigo objetiva discutir os aspectos da linguagem
pragmática que contribuem para isso. Para tal,
vai lançar mão da Teoria Cognitiva da lingua-
gem, que preconiza uma ponte entre aspectos
linguísticos, cognitivos e sociais. O paralelo
entre o Falante Inocente de Fillmore
1
e dados de
pesquisas anteriores
6,7
e testemunhos extraídos
de autobiografias de indivíduos com AAD
8,9
foi
a articulação escolhida para o objetivo traçado.
O AUTISMO DE ALTO DESEMPENHO
Os dois pioneiros da descrição do autismo
são Leo Kanner (Estados Unidos), com publica-
ção datada de 1943, e Hans Asperger (Áustria),
cujo trabalho foi escrito no idioma alemão, em
1944. O trabalho deste segundo pesquisador
não foi amplamente divulgado neste período,
dada à dificuldade de leitura deste idioma em
diversos países. De qualquer forma, nos dois
trabalhos, os autores chamaram atenção para
crianças que apresentavam características co-
muns notáveis, presentes provavelmente desde
o nascimento. Eles enfatizaram aspectos rela-
cionados à forma particular de comunicação,
à dificuldade de adaptação ao meio social, às
estereotipias motoras e ao caráter enigmático e
irregular das capacidades intelectuais
10
.
A definição de autismo, ou psicopatia autís-
tica, dada por Asperger, parece ser mais ampla
do que a de Kanner, pois ele incluiu inicialmente
tanto pacientes com lesões orgânicas graves,
como pacientes próximos da “normalidade”.
Asperger (in Wing
11
) descreveu crianças com
uma alteração fundamental, manifestada por
meio de seus comportamentos e modos de ex-
pressão, que gera dificuldades consideráveis e
bem típicas na integração social: a singularidade
do olhar, a mímica facial pobre, a utilização da
linguagem de forma pouco natural, falam mais
como adultos do que como crianças, a falta de
humor, o pedantismo, a invenção de palavras, a
impulsividade de difícil controle, dificuldade em
aprender o que os adultos ou professores ensi-
nam, os centros de interesse bastante pontuais,
e a capacidade frequentemente presente para
a lógica abstrata. O autor citou, igualmente, al-
gumas peculiaridades da linguagem não verbal,
como a falta de contato olho a olho e alterações
de gestos, postura e qualidade vocal.
Muitas pesquisas se desenvolveram desde
então, permitindo verificar que tais compor-
tamentos podem se mostrar mais ou menos
intensos, abrangendo uma amplitude bastante
grande de sujeitos, o que possibilita usar o
termo Transtorno do Espectro Autístico
12
. A
diferenciação entre a Síndrome de Asperger e
o Autismo de Alto Desempenho também tem
sido bastante discutida nos últimos tempos, e há
variáveis que prejudicam tal distinção, dispondo
as duas condições em um campo dimensional
13
.
Este foi o posicionamento escolhido para o de-
senvolvimento do presente artigo, que vai se

Linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
387
focar em indivíduos autistas sem dificuldades
gramaticais, a fim de que as habilidades prag-
máticas e sociais possam ser melhor discutidas.
UMA REVISÃO SOBRE LINGUAGEM
PRAGMÁTICA E HABILIDADES SOCIAIS
NO AAD
Estudos realizados por Ozonoff et al.
14
com-
pararam as funções executivas e a cognição
social em autistas de alto funcionamento aos
controles semelhantes no que se refere a QI
verbal, QI de desempenho, idade, sexo e raça.
Observou-se que o grupo de autistas de alto
funcionamento, em comparação com o grupo
controle, evidenciou prejuízo nas tarefas que
envolviam funções executivas e de planejamen-
to. Os resultados sugeriram 3 possibilidades:
existência de dois déficits primários no autismo,
um na Teoria da Mente e outro na função exe-
cutiva, ou os déficits da função executiva são
primários e os déficits da Teoria da Mente são
secundários, ou ainda, os dois déficits derivam
de alguma deficiência mais básica nas funções
pré-frontais.
Ozonoff e Miller
15
propuseram um estudo
abordando as contribuições de estudos do he-
misfério direito para a compreensão dos déficits
de comunicação no autismo. Critérios sensíveis
a lesões do hemisfério direito foram utilizados
em adultos autistas sem retardo mental e em
controles. A bateria experimental incluiu me-
didas para humor, inferência e compreensão
indireta. Se as piadas demandassem reinter-
pretação e uma reanálise do material prévio, a
dificuldade era bastante grande, o que, segundo
os autores, apontava para um déficit na flexi-
bilidade cognitiva. Os resultados do teste de
inferência também foram compatíveis com a hi-
pótese de dificuldade de flexibilidade cognitiva,
uma vez que as respostas corretas suscitavam
a capacidade de reinterpretar a informação em
uma nova perspectiva. Os dados forneceram
indícios empíricos para similaridades entre o
grupo de autistas de alto desempenho e pessoas
com lesões específicas do hemisfério direito, o
que permite pensar que o hemisfério direito
pode estar envolvido nos déficits sociais e de
comunicação do espectro autístico.
Mousinho
7
analisou as habilidades semânti-
co-pragmáticas de sujeitos AAD, considerando
parâmetros da Linguística Sociointeracional
e também da Linguística Cognitiva. No que
diz respeito aos parâmetros interacionais,
Gumperz
16
resumiu o conceito de “pistas de
contextualização” como sendo todos os traços
linguísticos que contribuem para a sinalização
de pressuposições contextuais, sejam elas ver-
bais ou não-verbais. Goffman
17
propôs o termo
“footing” como uma mudança no enquadre
de eventos, sendo a mudança de “footing”
marcada pela linguagem de forma verbal ou
por meio de marcadores paralinguísticos. Bate-
son
18
demonstrou que durante uma interação é
necessário distinguir o enquadre que delimita
o enunciado, como sendo, por exemplo, uma
discussão ou uma piada.
No que diz respeito às habilidades semântico-
pragmáticas associadas à compreensão da lin-
guagem figurada, as noções abordadas foram:
• projeção – “mapping”
19,20
, que se
refere à faculdade humana de produ-
ção, transferência e processamento
do significado; presente em estrutu-
ras como metonímias;
• mesclagem – “blending”
20
, que é a
conexão entre domínios conceptu-
ais, que projetam parcialmente suas
estruturas formando um terceiro
espaço, o espaço mescla, com estru-
tura emergente própria; presente em
estruturas como metáforas;
• mudança de enquadre – “frame-
shifting”
21
, que é um processo de
operação de reanálise semântica
que reorganiza a informação exis-
tente em um novo modelo cognitivo
(frame); presente em estruturas con-
trafactuais e piadas.
Houve dificuldade em todos os parâmetros
avaliados, o que impacta diretamente o desen-
volvimento das habilidades sociais nos sujeitos
avaliados.

Mousinho R
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
388
O CONCEITO DE FALANTE INOCENTE
DE FILLMORE
No intuito de contrapor a noção de falante/
ouvinte ideal em uma comunidade linguística
homogênea, Fillmore
1
sugeriu uma segunda
idealização, que chamou de falante/ouvin-
te inocente (innocent speaker/hearer). Para
caracterizá-la, descreveu a capacidade que
esse indivíduo teria para reconhecer estrutu-
ras gramaticais e processos que envolvessem
os morfemas e o significado de cada um, sem
que fosse capaz de estabelecer inferências
entre o que diz e o que o outro ouve. Seria ca-
paz de dizer tudo o que é passível de ser dito.
Entretanto, seu discurso seria lento, cansativo
e pedante.
Dentre suas limitações, apresentaria o dis-
curso baseado na composicionalidade. O falante
inocente não seria capaz de atribuir significados
à reunião de alguns morfemas, pois tenderia
apenas a somar o significado de seus cons-
tituintes. Um exemplo, facilmente traduzido
para o português, é a diferença entre carce-
reiro (jailer) e prisioneiro (prisoner). Cárcere e
prisão apresentam significados similares, mas
ao se acrescentar o sufixo eiro, e todas as suas
possibilidades de uso, deixam de ter o mesmo
significado, fato dificilmente assimilado pelo
falante/ouvinte inocente.
O falante/ouvinte inocente também apresen-
taria dificuldades com expressões idiomáticas
(lexical idioms). Se ouvisse, por exemplo, a
expressão “Your goose is cooked” (Seu ganso
está cozinhando), que poderia corresponder
em português a “Sua batata está assando”, ele
poderia ficar: preocupado com o ganso (no caso
em inglês) se ele tivesse um; feliz, caso tivesse
trazido para o jantar um ganso ou uma batata;
confuso, caso não tivesse nem um, nem outro.
O falante/ouvinte inocente não se utilizaria
de colocações lexicais, que não estejam base-
adas necessariamente em relações de sentido.
Para ilustrar, o termo “blithering idiot at all”
(blightering do termo bligth – má sorte, mal-
dição; idiot – idiota; at all – absolutamente, de
modo algum), aproximando-se do português
como um “idiota completo”, expõe a impos-
sibilidade de se extrair o significado do todo,
a partir do significado isolado das palavras. A
adaptação de algumas expressões para deter-
minados tipos de situações seria extremamente
complicada para os falantes/ouvintes inocen-
tes. Não haveria associações situacionais para
expressões como “This hurts me more than it
hurts you” (Isso me machuca mais do que a
você). No entanto, poderiam ser utilizadas,
eventualmente, locuções opacas como “speak
of the devil” (fala do diabo), reconhecidas de
forma automática.
O falante/ouvinte inocente seria inábil para
construções metafóricas e não veria razão para a
linguagem se construir metaforicamente. Ao se
propor, hipoteticamente, a sentença metafórica
“I’ll stand behind you” (Eu ficarei atrás de você),
em português mais utilizado como “Eu estarei
ao seu lado”, ao invés de ser interpretado como
uma frase para confortar ou dar suporte, poderia
desencadear a procura de uma pessoa atrás de
si, no caso do inglês, ou ao seu lado, no caso do
exemplo em português.
De um modo geral, o falante/ouvinte inocen-
te não usaria mecanismos interpretativos para
comunicação indireta, ou seja, significar uma
coisa, dizendo outra, ou princípios de coerência
de texto que levam a ler as entrelinhas. Se fosse
possível supor que ele gosta de ser lisonjeado,
ele se sentiria dessa forma ao ouvir “You have
a very lovely left eye” (Você tem um belo olho
esquerdo). Em português, teria o similar “O
branco dos olhos é bonito”, fazendo referência
ao resto do corpo que não deve ter essa carac-
terística.
O falante/ouvinte inocente teria dificuldade
para entender a estrutura de texto, ou seja, situar
trechos de textos de acordo com os tipos propos-
tos. Um exemplo é a estrutura de carta no Japão,
em que o preâmbulo sempre contém comentários
sobre a estação. Dificilmente, ele compreenderia
que as folhas caídas pelo chão do jardim estariam
relacionadas a essa convenção.
Essa descrição do falante/ouvinte inocente
torna-se especialmente interessante, na medida

Linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
389
Tabela 1 - Falante/ouvinte inocente X indivíduos com AAD.
FALANTE/OUVINTE INOCENTE INDIVÍDUO AAD
1 Discurso lento, cansativo e pedante Discurso pedante, unilateral, prosódia monótona
2
Baseia-se na composicionalidade
(morfemas e palavras)
Costuma responder pela soma de Partes,
sem realizar a mescla
3
Dificuldades com expressões idiomáticas Tende a pensar nelas ainda na forma
experenciada
4
Inadequação de expressões a Situações
(apenas opacas)
Usa expressões colocadas, mesmo que não sejam
opacas, o que fica inadequado
5
Inabilidade para construções metafóricasPoucos realizam o processo de Mesclagem neces-
sária às metáforas
6
Não usa mecanismo interpretativos para comu-
nicação indireta
Dificuldades com funções pragmáticas -
projeção nem sempre realizada
7
Dificuldade para entender a Estrutura de textoNem sempre a moldura comunicativa é clara,
incluindo a de textos
em que se observa que várias características de
pacientes com AAD são similares a caracterís-
ticas desse indivíduo idealizado por Fillmore
1
,
analogia que será realizada na próxima seção.
FALANTES/OUVINTES INOCENTES DE
FILLMORE E PESSOAS COM AAD: ESTÁ
SE FALANDO DO MESMO SUJEITO?
É incrível notar as semelhanças dos falantes/
ouvintes inocentes com a caracterização dos
pacientes com AAD, sobretudo ao se pensar que
a grande difusão do texto de Asperger, ao ser
traduzido para o inglês, se deu nos anos oitenta,
logo depois da publicação do texto de Fillmore
1
,
em 1979, que nunca escreveu sobre autismo.
Para se traçar um paralelo mais cuidadoso en-
tre essas duas situações, serão comparadas, na
Tabela 1, as características principais da pro-
posta deste autor, associadas às características
propostas por diversos estudiosos da área
2-5,22
.
Cada um dos itens selecionados na Tabela 1,
numerados de 1 a 7, será discutido a partir de da-
dos e resultados de pesquisas prévias baseadas
na Linguística Cognitiva
5,6
, quando os sujeitos
não estiverem identificados, bem como em des-
crições contidas em autobiografias de sujeitos
AAD, mais especificamente Temple Grandin
8
e
Donna Williams
9
.
1. Discurso lento, cansativo e pedante /
discurso pedante, unilateral, prosódia mo-
nótona
Estas são características descritas desde o
primeiro trabalho de Asperger, traduzido para
o inglês em 1991
23
. O pedantismo é também
um dos itens a serem observados no diagnós-
tico clínico pela Associação Americana de
Psiquiatria
24
e pela Organização Mundial de
Saúde
25
. Ao falar sobre o incômodo que sente
ao conversar, um dos pacientes explicita clara-
mente esse comportamento linguístico típico:
“...eu tenho mania de usar palavras difíceis
fora de hora... porque eu vejo as pessoas fa::
ter uma conversa assim ampla’ fluente’ enten-
deu” E eu quero me igualar a essas pessoas
e eu não consigo. Fica me faltando palavras
difíceis pra pra/ ... pra enfeitar’ ´pra enfeitar
a conversa”.
Uma conversa com um paciente com AAD
pode ser um tanto quanto cansativa, igualmen-
te, pelo caráter unilateral, sem a reciprocidade
típica dos diálogos, como no exemplo abaixo
em que o interlocutor propõe um novo tópico,
mas o paciente fala algo que não se relaciona
nem ao que estava sendo dito antes, mantendo
o enquadre, nem à nova proposta, mostrando
não se alinhar ao discurso.

Mousinho R
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
390
(Falando sobre a cidade de Petrópolis, as-
sunto que surgiu a partir da conversa sobre o
boliche e a distância onde ele se localizava)
L.S.: é lá onde antigamente a repórter Maria
Valente estava fazendo uma reportagem na
Globo.
Interlocutor: é mesmo’’ Eu não sei. E lá onde
fica o Museu Imperial’ você já ouviu falar da
Rua Teresa que é uma rua de roupas’’.
L.S.: é.
Interlocutor: então’ é lá. É muito’ muito longe
daqui’ aí acontece que eu não sei onde fica o
tal do/
L.S.: sabe qual novela da Globo estreou no
lugar de Esplendor?
Interlocutor: hã’’
2. Esse item uniu duas características pro-
postas por Fillmore, que têm a mesma natu-
reza, a do discurso baseado na composicio-
nalidade, seja de morfemas ou de palavras.
Como observado em Mousinho
6
, ques-
tionados sobre o significado das metáforas
propostas por sintagmas nominais não-com-
posicionais, pacientes AAD responderam pela
soma de partes, sem realizar a mescla, como
ilustrado a seguir: AMOR FERIDO como “...
amor que ss está doente”, AMOR MODERNO,
como amor “... que se moderniza”, AMOR
LOUCO, “... que faz loucuras” ou ainda
AMOR FORTE “... é o amor que faz força”.
Às vezes, nem mesmo a soma das partes é
realizada, e observa-se que a explicação é
calcada em apenas uma das partes, como na
resposta para AMOR SEGURO “ É quando
uma pessoa segura alguma coisa”. Fica claro
que tais interpretações não são suficientes
para abarcar todo o significado do discurso,
colocando em xeque o pressuposto de que o
significado está unicamente nas palavras.
3. Dificuldades com expressões idiomáti-
cas/ tendem a pensar nelas ainda na forma
experenciada
Em Grandin e Scariano
8
, exemplifica-se
o provável comportamento de uma criança
com esse transtorno do desenvolvimento,
mediante a expressão americana “hoje vai
chover canivetes”, na qual ela provavelmen-
te se protegeria sob uma mesa, baseando-se
na forma experencial. Um outro exemplo é a
explicação de AMOR PERIGOSO utilizada por
alguns pacientes, que tomam como referência
a forma experenciada, como em “...parece
que tá com uma corda aqui (mostrando a
figura) uma corda aqui no meio do coração”.
Outro paciente, ao ser questionado sobre o
que seria AMOR PERIGOSO respondeu que
é “quando a pessoa tá machucada” e ao se
perguntar como, a resposta foi “caindo no
chão”; ou ainda em AMOR FERIDO com a
explicação “é que está com a lágrima” ou em
AMOR LOUCO com a explicação “parece que
tá com a língua pra fora”. Outro exemplo é
a forma como um adolescente reagiu diante
da pergunta se já tinha comido O PÃO QUE
O DIABO AMASSOU. Ele alegou nunca ter
comido uma coisa horrível como aquela, que
jamais iria comer e que, se comesse, vomita-
ria. Também nesse exemplo a interpretação
se volta para o campo experencial, com base
na experiência corporal, sem que o espaço da
mescla possa ser atingido.
4. Inadequação de expressões a situações
(apenas opacas)/ usam expressões coladas,
mesmo que não sejam opacas, o que fica
inadequado
Uma passagem em Grandin e Scariano
8
es-
clarece o uso bizarro de algumas expressões,
mostrando como Temple passa a se utilizar
de termos cujo significado desconhecia, sim-
plesmente por considerá-los sonoros, repe-
tindo, sem parar, de forma obsessiva. Temple
Grandin
8
conta um trecho de sua vida em que,
desconhecendo o significado, passou a repetir
incessantemente um palavrão justamente pela
força que as pessoas davam quando falavam,
o que parecia bastante atraente. Demorou até
perceber o constrangimento causado em al-
guns profissionais de sua escola, até que eles
lhe falaram abertamente. Essa situação ilustra

Linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
391
claramente o impacto da linguagem pragmática
nas habilidades sociais.
Em uma situação de interação espontânea
em uma consulta, um paciente buscou a mudan-
ça de tópico somente para utilizar uma expres-
são muito repetida pela mídia na época “Cigarro
faz mal à saúde”, que ficou inapropriada em seu
discurso, mesmo na tentativa de encontrar um
contexto para justificá-lo. A conversa girava em
torno da apresentadora de televisão Angélica,
quando repentinamente um paciente fala:
P.J.: você fuma ou não”
Interlocutor: não
P.J.: não fuma”
Interlocutor: não
P.J.: porque cigarro faz mal à saúde
Interlocutor: é eu não gosto de cigarro
P.J.: cigarro cigarro faz mal à saúde”
Interlocutor: faz
P.J.: mas tem artista que fuma”
Interlocutor: tem
P.J.: tem muitos ou poucos artistas que fumam”
Interlocutor: eu acho que tem:: mais ou menos
P.J.: hum:: mas se algum artista fumar eu vou
falar que faz mal à saúde
Logo após, mudou-se novamente de tópico,
ficando esse trecho descontextualizado na
tentativa de diálogo. Vale observar que a pos-
tura é ingênua, pois o paciente não percebe
que a moldura comunicativa típica de um en-
contro de um fã com um artista não permitiria
o alerta de que fumar faz mal à saúde. Além
de tudo, em nossa sociedade quase todos co-
nhecem os malefícios do tabaco, incluindo os
artistas, e, se o paciente pudesse se colocar
no ponto de vista dos artistas fumantes, mais
uma vez perceberia o quão imprópria seria
sua observação.
5. Inabilidade para construções metafóri-
cas/ poucos realizam o processo de mescla-
gem necessário às metáforas
Mais uma vez o exemplo de Temple
8
, descri-
to no capítulo III, poderá exemplificar a dificul-
dade na compreensão de metáforas. Ela relatou
não compreender o que significava “uma janela
para o paraíso”, frequentemente dito por pes-
soas a sua volta. Certo dia entrou em contato
diretamente relacionado à experiência, ao se
deparar com a visão de uma linda paisagem,
conseguindo, então, correlacioná-la à metáfora.
Em contexto de avaliação, em alguns mo-
mentos, pacientes explicitaram essa dificuldade
específica com a compreensão de metáforas,
como nos dois trechos a seguir, o primeiro
referente à metáfora “O amor naufragou” e a
segunda, resposta de dois pacientes, mediante
a expressão “... é uma gata”:
AMOR NAFRAUGOU
Interlocutor: quando a gente fala assim: o
amor daqueles dois naufragou. O que que a
gente quer dizer”
A.Y.: não sei não sei
... É UMA GATA
Interlocutor: a Xuxa é uma gata’’
C.L.: é (2.5)
Interlocutor: porquê’’
C.L.: não sei ...
Interlocutor: Vem cá, diz pra mim, vc acha a
Ana Paula Arósio uma gata?
L.S.: Ela é uma gata
Interlocutor: Volta pra Ana Paula Arósio...
Não, tô lá na Ana Paula Arósio ainda. Eu acho
ela um jaburú
L.S.: Não sei
Interlocutor: Vc acha ela uma gata ou jabu-
ru? Fala pra mim
L.S.: Sei lá ... Que, ué vamos ver se mudamos
o assunto
Os pacientes percebem que não compreen-
dem o significado, que solicita o processamento
de mesclagem, que eles não conseguem reali-
zar espontaneamente. No caso do testemunho
de Temple, ela pode fazer a mescla depois de
escutar muitas vezes a metáfora e entrar em
contato com sua base experencial.
6. Não usam mecanismos interpretativos
para comunicação indireta/ dificuldades

Mousinho R
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
392
com funções pragmáticas – projeção nem
sempre de fácil realização
Ao referir os testemunhos de pessoas adultas
com AAD, pode-se identificar essa dificuldade
em Williams
9
, quando a mesma refere que seus
amigos a convidam para “tomar um cafezinho”
e ela recusa por não gostar de café, e não per-
ceber a intenção do encontro social.
No exemplo de um adolescente, em que foi
dado o estímulo, “O porteiro avisou a polícia:
o edifício está reclamando do barulho do vizi-
nho”, quando questionado sobre quem havia
reclamado de fato, primeiro disse que aquilo
não estava escrito “Ah eu eu não vi (++) não
tem não tem escrito isso não” (mostrando que
necessita dele estar explícito para que possa
responder), e quando se insistiu sobre quem é
que na verdade estava reclamando do barulho
do vizinho, a resposta foi “deve ser o o o por-
teiro”. Da mesma forma ocorre nos exemplos
abaixo, em que um mesmo paciente responde
a duas propostas sem utilizar recursos de inter-
pretação indireta:
Na primeira página do jornal estava estam-
pada a notícia: “O Maracanã comemorou o gol
do Brasil” – Quem, na verdade, comemorou?
T: o Maracanã
Interlocutor: o Maracanã comemora”
T: maracá/ quem comemorou o gol do Brasil”
Interlocutor: como é que o Maracanã come-
mora”
T: (7 seg) Copa do mundo
O técnico de futebol fez o seguinte comen-
tário: “O camisa dez fez um golaço” - Quem,
na verdade, fez o gol?
Interlocutor: quem fez um golaço”
T: (...)
Interlocutor: foi a camisa que fez”
T: o técnico de futebol
Interlocutor: quem fez o gol”
T: o técnico
7. Dificuldade para entender a estrutura de
texto/ nem sempre a moldura comunicativa
é clara, incluindo a de textos
O desabafo de um dos pacientes, tentando
relativizar as dificuldades escolares apresenta-
das ao longo de sua vida, ao falar da disciplina
de filosofia, pode exprimir como ninguém suas
limitações “... é meu ponto fraquíssimo... porque
é uma matéria que que requer muita::: inter-
pretação..... a matéria interpretativa é o x do
problema.” Da mesma forma, ao ser perguntada
porque era difícil a parte de interpretação, a res-
posta de uma paciente com AAD foi “... porque
tem que ler o texto..... tem que responder...”. A
dificuldade acadêmica apresentada por todos
eles, apesar de uma inteligência considerada
normal através de testes clássicos de QI, pode
ser em grande parte gerada com essa inabili-
dade com textos, base da escolaridade formal,
além de todas as outras dificuldades linguístico-
cognitivas já apontadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A linguagem pragmática está direta e inti-
mamente relacionada às habilidades sociais. Em
Autistas de Alto Desempenho estas são questões
que se evidenciam.
Dentre as dificuldades pragmáticas de indi-
víduos com AAD, ilustradas a partir das carac-
terísticas do “Falante Inocente”, destacam-se
o discurso lento, cansativo e pedante, baseado
na composicionalidade, inadequação no uso
e compreensão de expressões e metáforas,
dificuldades com expressões idiomáticas, com
mecanismos interpretativos para comunicação
indireta e com interpretação de textos.
A semelhança entre a idealização do
“falante inocente” de Fillmore
1
(1979), e as
dificuldades vividas por pacientes com AAD,
é mais um fator que corrobora a escolha da
Linguística Cognitiva, que une aspectos lin-
guísticos, cognitivos e sociais. As dificuldades
nas habilidades pragmáticas e sociais em
pacientes com Autismo de Alto Desempenho
não seriam passíveis de serem abordadas por
linhas mais formalistas, cujas preocupações
estivessem focadas na boa formação dos as-
pectos gramaticais, ignorando informações do
contexto social.

Linguagem pragmática e habilidades sociais no autismo
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
393
SUMMARY
The innocent speaker: pragmatic language in high functioning autism
Introduction: There is a close relationship between social skills and
pragmatic language. Objective: Considering that the “innocence”
experienced by individuals with High Functioning Autism (HFA), that
has a direct correlation with impairment in social skills, this paper aims
at defining which aspects of language can to contribute to this behavior.
Methods: This paper uses the cognitive approach of language, which links
linguistic, cognitive and social domains. The parallel between the speaker
Innocent of Fillmore (1979) and data from previous research (Mousinho,
2003; 2010) and cores extracted from autobiographies of individuals with
High Functioning Autism (Grandin & Scariano, 1986; Williams, 1992) was
chosen for the joint goal.
KEY WORDS: Autistic disorder. Language. Social behavior.
REFERÊNCIAS
1. Fillmore C. Innocence: a second idealiza-
tion for linguistics. Proceedings of the Fifth
Berkeley Linguistics Society. Berkeley: Uni-
versity of Califórnia; 1979.
2. Mackay G, Shaw A. A comparative study of
figurative language in children with autistic
spectrum disorders. Child Language Tea-
ching and Therapy. 2004;20(1):113-32.
3. Loukusa S, Leinonen E, Kuusikko S, Jussila
K, Mattila ML, Ryder N, et al. Use of context
in pragmatic language comprehension by
children with Asperger syndrome or high-
functioning autism. J Autism Dev Disord.
2007;37(6):1049-59.
4. Leon V, Siqueira M, Parente M, Bosa C. A
especificidade da compreensão metafóri-
ca em crianças com autismo. Psico PUCRS.
2007;38(3):269-77.
5. Mousinho R. A construção de sentido na
Síndrome de Asperger. In: Ferrari L, (org).
Espaços mentais e construções gramaticais:
do uso linguístico à tecnologia. Rio de Ja-
neiro: Imprinta; 2009. p.111-24.
6. Mousinho R. Aspectos linguístico-cogni-
tivos da Síndrome de Asperger: projeção,
mesclagem e mudança de enquadre [Tese
de Doutorado]. Rio de Janeiro: Departa-
mento de Lingüística, Universidade Federal
do Rio de Janeiro; 2003. 225p.
7. Mousinho R. Habilidades semântico-prag-
máticas no autismo de alto desempenho. In:
Capovilla F, Montiel J, eds. Porto Alegre:
Artes Médicas. (no prelo)
8. Grandin T, Scariano M. Emergence: labeled
autistic. Kent: Arena Press; 1986. 183p.
9. Williams D. Si on me touche, je n’existe plus.
Paris: Éditions Robert Laffond;1992. 311p.
10. Frith U. Autism and Asperger syndro-
me. Cambridge: Cambridge University
Press;1991. 247p.
11. Wing L. Asperger and his syndrome. In:
Fritth U, ed. Autism and Asperger syndro-
me. Cambridge: Cambridge University
Press;1991. p.93-121.
12. Klin A. Autism and Asperger syndrome: an
overview. Rev Bras Psiquiatria. 2006;28(Supl
I):S3-11.
13. Landa R. Early communication develop-
ment and intervention for children with
autism. Ment Retard Dev Disabil Res Rev.
2007;13(1):16-25.
14. Ozonoff S, Pennigton B, Rogers S. Executive
function deficits in high-functioning autistic
individuals: relationship to Theory of Mind. J
Child Psychol Psychiatry. 1991;32(7):1081-105.
15. Ozonoff S, Miller JA. Exploration of right-
hemisphere contributions to the pragma-
tic impairments of autism. Brain Lang.
1996;52(3):411-34.

Mousinho R
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 385-94
394
Trabalho realizado na Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Artigo recebido: 5/8/2010
Aprovado: 28/10/2010
16. Gumperz J. Discourse strategie. London:
Cambridge University Press; 1982. 218p.
17. Goffman E. Footing. In: Forms of talk. Phi-
ladelphia: University of Pennsylvania Press;
1981. p.124-59.
18. Bateson G. Uma teoria sobre brincadeira e
fantasia. Cadernos do IPUB. 2005;35-49.
19. Fauconnier G, Turner M. Blending as a cen-
tral process of grammar. In: Goldberg A, ed.
Conceptual structure, discourse, and lan-
guage. Stanford: CSLI Publications;1996.
p.113-31.
20. Fauconnier G. Mappings in though and lan-
guage. Cambridge: Cambridge University
Press; 1997. 187p.
21. Coulson S. Semantic leaps. Cambridge:
Cambridge University Press;2001. 304p.
22. Attwood T. Asperger’s syndrome: a guide
for parents and professionals. London: Jes-
sica Kingsley Publishers; 1998. 223p.
23. Asperger H. Autistic psychopathy in chil-
dhood. In: Fritth U, ed. Autism and Asper-
ger syndrome. Cambridge: Cambridge Uni-
versity Press;1991. p.37-92.
24. Associação Americana de Psiquiatria. Ma-
nual diagnóstico e estatístico de transtornos
mentais - DSM lV. 4ª ed. Porto Alegre: Artes
Médicas;2002. 880p.
25. Organização Mundial de Saúde. Classifica-
ção de transtornos mentais e de comporta-
mento da CID – 10. Porto Alegre: Artes Mé-
dicas;1993. 351p.

Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
395
ARTIGO DE REVISÃO
RESUMO – Introdução: A sociedade contemporânea passa por um
momento sem precedentes na história da humanidade, principalmente,
no que tange a produção de conhecimento, que se traduz numa dinâmica
de múltiplas relações. Contudo, a educação, mais precisamente o processo
ensino-aprendizagem quase não avançou. Dentre outros problemas,
o abuso da medicalização e a falta de recursos didático-pedagógicos
têm sido freqüentes no meio educacional. Diante desse cenário é
necessário investigar novas possibilidades de intervenção à prática
didático-pedagógica tendo como objetivo instrumentalizar os educadores
com recursos capazes de dar suporte à formação integral do indivíduo,
garantindo o desenvolvimento de sua autonomia. Objetivo: O objetivo do
presente estudo foi investigar o “Mind Map” como atividade de mediação
para auxiliar a prática psicopedagógica. Método: A metodologia adotada foi
uma pesquisa descritiva com revisão bibliográfica baseada em autores que
escreveram sobre a temática explorada. Resultados: Os resultados obtidos
mostraram que o Mind Map pode ser usado como atividade mediadora
voltada a desenvolver as funções psicológicas superiores já que possibilita
ao indivíduo focar a sua atenção; organizar conceitos por categoria;
desenvolver o raciocínio indutivo e dedutivo; desenvolver a memória
voluntária; relacionar conceitos; ampliar a percepção e a capacidade de
reflexão. Conclusão: Os resultados mostraram a eficiência da estratégia
pesquisada no desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

UNITERMOS: Atenção. Memória. Criatividade
Mind Map como instrumento psicopedagó-
gico de mediação para o desenvolvimento
das funções psicológicas superiores
Lucy Duró Matos – licenciada em Pedagogia,
MBA em Gestão de Pessoas, e Pós-graduada em
Psicopedagogia e Medicina Comportamental pela
Universidade Federal de São Paulo. Possui formação
no Programa de Enriquecimento Instrumental (PEI)
pelo Centro Brasileiro de Modificabilidade Cognitiva e
Master-Practitioner em Programação Neurolinguística
(CBMPEI), PNL pela Actius Desenvolvimento e
Liderança.
Correspondência
Lucy Duró Matos
Av. Otacílio Tomanik, 343 ap.51b – Butantã – São
Paulo, SP, Brasil – CEP: 05363-000
E-mail: [email protected]
Lucy Duró Matos

Matos LD
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
396
INTRODUÇÃO
O mundo atravessa profundas mudanças so-
ciais, culturais, políticas, filosóficas, institucionais
e educacionais e a transformação de uma socie-
dade industrial para uma sociedade de serviço é
comprovada a cada dia. Novos recursos tecnológi-
cos estão surgindo e a quantidade de informações
disponibilizadas a cada dia, em tempo real, em
todo mundo é surpreendente. Surgem novas re-
alidades científicas e outras vão sendo superadas.
Contudo, o avanço tecnológico e as infor-
mações produzidas pouco contribuíram com o
processo ensino e aprendizagem. Pelo contrário,
segundo Cortella
1
, a sala de aula quase não so-
freu alteração, há décadas a sua configuração
é a mesma, com exceção de raríssimos casos.
Até pouco tempo, a responsabilidade sobre
o fracasso no processo de aprendizagem era
voltado ao alunado, haja vista a reprovação
escolar, recurso seletivo, favorecendo uns em
detrimento de outros. Atualmente, a atribuição
da responsabilidade sobre o fracasso é dirigida
a diversas fontes: alega-se que crianças e jovens
da sociedade contemporânea estão submetidos
a um cenário de superestimulação permanente,
presente nos meios de comunicação de massa;
que as salas de aula estão, cada vez mais, lota-
das; que os salários dos professores continuam
defasados; que há uma precariedade de recursos,
sejam eles de ordem metodológica ou tecnológi-
ca; que o número de famílias desestruturadas é
maior; que os pais ou são permissivos e ausentes,
ou autoritários e agressivos e que as políticas pú-
blicas pouco fazem para a melhoria da educação.
Embora o paradigma atual implique a iden-
tificação de “culpados”, até o momento, os
resultados demonstram que a “culpabilidade”
não trouxe avanço, pelo contrário, o número
de crianças e jovens com dificuldade de apren-
dizagem aumenta significativamente. Assim,
entendemos que o objetivo para a solução do
problema não está na “caça às bruxas”, como
em uma visão maniqueísta de busca a culpados.
É necessária uma atitude frente aos problemas
relatados. Quem sabe começar pela assunção de
responsabilidade e iniciativa, partindo daquele
que tem o conhecimento do assunto àquele que
escolheu estar à frente do processo de ensino e
aprendizagem: o(a) profissional da educação,
como mediador, fazendo uso de instrumentos de
mediação voltados à formação do conhecimento
em uma ação educativa?
Nessa direção, o presente estudo apresenta
uma revisão bibliográfica que buscou investigar
e analisar por meio de uma pesquisa de nature-
za teórico-conceitual, o “Mind Map”
2
ou Mapa
Mental como atividade mediadora para o desen-
volvimento das funções psicológicas superiores
3
.O
problema da pesquisa é: de que forma o “Mind
Map”
2
ou Mapa Mental como nova possibilida-
de de registrar o conhecimento pode contribuir
com o desenvolvimento das funções psicológi-
cas superiores?
Seu objetivo foi identificar novos recursos
para auxiliar a prática do profissional da educa-
ção no processo ensino e aprendizagem, frente
às demandas do mundo contemporâneo.
Ao registrar o conhecimento utilizando o
“Mind Map”
2
, o indivíduo desenvolve as fun-
ções psicológicas superiores, ou seja, foca a
sua atenção ao buscar o conceito-chave para
elaborar seu mapa; organiza os conceitos por
categoria; desenvolve uma dinâmica de pensa-
mento parte-todo e todo-parte, quando pratica
o raciocínio indutivo e dedutivo; entende o
sentido de classificar e comparar como base de
planejamento; otimiza a memória voluntária já
que faz uso de imagens e símbolos; relaciona
conceitos; amplia a percepção e a possibilidade
de reflexão ao desenvolver uma visão macro de
um dado problema.
Em função dos limites que o artigo traz em si,
o assunto será tratado de uma maneira mais ob-
jetiva, serão destacados os conceitos relevantes
para a pesquisa: aprendizagem e conhecimento,
educação, mediação do conhecimento e “Mind
Map”
2
como objeto dessa mediação.
O método utilizado apoiou-se em uma
revisão bibliográfica descritiva. Os dados da
presente pesquisa foram coletados em auto-
res que escreveram a respeito da temática
explorada.

Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
397
REVISÃO DA LITERATURA
A aprendizagem é o meio pelo qual o indi-
víduo apropria-se do conhecimento que, por
sua vez, é construído histórico-culturalmente
3
.
O desenvolvimento humano acontece com
base em estruturas geneticamente determina-
das, Maturana e Varela
4
conceituam que:
“... cada vez que, nos organismos de
uma mesma espécie, se desenvolvem
estruturas independentes das peculiari-
dades de suas histórias de interação, diz
que tais estruturas estão geneticamente
determinadas e que os comportamentos
que elas possibilitam são instintivos”.
Quando o bebê nasce, aprende a alimentar-se,
manipulando e sugando o seio materno que, em
contrapartida, lhe oferece estímulos suficientes
para motivá-lo a continuar processando o movi-
mento. Embora seja um comportamento instintivo,
é na tentativa de obter o alimento que o recém-
nascido aprende a mamar. Entretanto, todo seu de-
senvolvimento cognitivo se dá ontogeneticamente.
Quando, pouco depois de nascer, o bebê
pressiona o peito de sua mãe e suga o
mamilo, ele o faz independente de ter
nascido de parto natural ou cesariana,
ou de se veio ao mundo num luxuoso
hospital de Santiago ou no interior.
Ao contrário, se as estruturas que tornam
possíveis determinadas condutas nos
membros de uma espécie se desenvol-
vem somente se há uma história particu-
lar de interações, diz que as estruturas
são ontogenéticas e que as condutas são
aprendidas
4
. (grifo do autor)
Um exemplo ilustrativo é o episódio das
crianças resgatadas (ou arrancadas) em uma
aldeia na Índia ao serem encontradas com uma
família de lobos que as havia criado em total
isolamento do contato de humanos. Quando
foram encontradas, não tinham nenhum com-
portamento humano, não sabiam caminhar so-
bre os pés e moviam-se apoiadas nos cotovelos
e joelhos simultaneamente, de quatro, assim
como os lobos. Só queriam comer carne crua e
tinham hábitos noturnos A mais nova morreu
pouco depois de ser encontrada e a maior viveu
apenas 10 anos
4
.
O caso traz consigo o entendimento da cons-
tituição do humano no homem a partir da sua
relação com a cultura.
Feuerstein conceituou o que aconteceu no
caso relatado como a ‘síndrome da privação
cultural’, entendida como ausência ou insu-
ficiência de interações sociais específicas que
mobilizem o aparato cognitivo do indivíduo a
se desenvolver. Inclusive, o que lhe permitiu
elaborar este conceito foi o fato de ter vivido,
durante a Segunda Guerra Mundial, em cam-
pos de concentração nazistas com crianças,
cujos pais morreram em câmaras de gás. Eram
crianças de 8, 9 anos, completamente analfabe-
tas. Feuerstein refere que elas não conseguiam
organizar seu pensamento nem suas ações
5
.
Depois de desenvolver um trabalho com elas,
durante 7 anos baseado em sua teoria “a experi-
ência da aprendizagem mediada”, essas crianças
tornaram-se adultos inteligentes. O relato baseado
na experiência de Feuerstein demonstra o quanto
a interferência humana e cultural é importante no
desenvolvimento cognitivo do indivíduo
5
.
Conforme o autor, cultura “é um processo me-
diante o qual aprendizagens, atitudes e valores
são transmitidos de uma geração para outra”
5
.
Para Maturana e Varela
4
, o sistema nervoso
está em constante mutação estrutural, ou seja,
possui uma plasticidade que lhe permite de-
senvolver-se na relação com o meio. O sistema
nervoso transforma-se com as relações. Além
disso, em geral, tem a mesma configuração nos
indivíduos de uma mesma espécie.
Entre o zigoto fecundado e o adulto – no pro-
cesso de desenvolvimento e diferenciação celu-
lar – à medida que se multiplicam os neurônios
vão se ramificando e se conectando, segundo
uma arquitetura que é própria da espécie
4
.
Se o meio é a condição prévia de desenvol-
vimento de todos os seres humanos, mesmo aos
que apresentam necessidades especiais, todos
têm condições de aprender. É evidente que a
plenitude da condição de aprender está relacio-
nada a um funcionamento biológico adequado.

Matos LD
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
398
A dor provocada pelos tombos, muitas vezes,
não impede a criança de aprender a andar. O
ato de falar também é um processo de intera-
ção. Portanto, é comum que os seres humanos
passem pelo processo do aprender a mamar, a
andar, a falar, a beber, a comer e, assim, suces-
sivamente. Aprender é inerente ao humano
4
.
A vida é um processo de conhecimento, e é
importante entender como os seres vivos conhe-
cem o mundo. “Conhecer é uma ação efetiva, ou
seja, uma efetividade operacional no domínio
de existência do ser vivo”
4
.
Até o século passado, “o conhecimento era
visto como uma representação fiel da realidade,
independente da presença do conhecedor”, a
teoria predominante privilegiava a objetividade
em detrimento da subjetividade
4
.
Com a contribuição de muitos estudiosos,
hoje, o mundo, e, consequentemente, tudo o
que lhe é pertinente, começa a ser percebido e
entendido como algo integrado.
De modo análogo, é exemplificado que ao
dar um passeio pela praia, ao fim do percurso,
o indivíduo estará diferente, por sua vez, a praia
também com suas pegadas impressas na areia
4
.
Assim [...] se a vida é um processo de conhe-
cimento, os seres vivos constroem esse conhe-
cimento não a partir de uma atitude passiva e
sim pela interação. Aprendem vivendo e vivem
aprendendo. Pode-se dizer que modificam o
mundo e são modificados por ele.
Desse modo, o indivíduo não está restrito
a simples reflexos, estímulo-resposta e, muito
menos, é modelado socialmente. Segundo Rego
6
,
embora a questão da constituição humana ainda
seja motivo de debates e discussões no campo
da Psicologia, do ponto de vista teórico pode-se
afirmar que as abordagens inatistas e ambienta-
listas estão praticamente superadas. Atualmente,
admite-se que a individualidade não é constitu-
ída a priori nem é dada pela pressão social. A
formação humana transcorre em um processo de
mediação na relação do homem e meio cultural.
Logo, a concepção de educação bancária
cunhada por Freire
7
, na qual sugere que o(a)
professor(a) deposita conteúdos, de forma uni-
lateral, na cabeça de seus alunos, para depois
sacá-los no dia da prova, está descredenciada.
O educador(a) e os recursos didáticos fun-
cionam como mediadores entre o aluno e o
conhecimento. É com a sua contribuição que o
aluno como individualidade se constitui
9
.
A aprendizagem acontece a despeito de seu
objetivo e como ela ocorre na inter-relação com
o meio, ela acontece todo o tempo
1
. O educador
tem uma grande responsabilidade no processo
ensino e aprendizagem, além de ser considerado
modelo, é por seu intermédio que os eventos
ganham significado.
De acordo com a Psicopedagogia existe uma
importância no posicionamento do ensinante
e do aprendente, na relação entre ambos, na
interface sujeito e objeto do conhecimento,
portanto, no processo de mediação
10
.
A concepção de Fernandes
10
refere que a Psi-
copedagogia ainda não detém aportes significati-
vos sob a ótica da aprendizagem para entender a
relação mãe e filho, considerada a primeira pre-
sença na vida de um indivíduo. Conduzindo esse
processo para a sala de aula, o aluno transforma
o conhecimento que incorpora, mas, por sua vez,
transforma a situação educativa, o professor e seus
companheiros. O aluno transforma-se e com sua
transformação transforma o outro. Isso ocorre na
mediação com o objeto do conhecimento
10
.
A respeito da apropriação do objeto do
conhecimento pelo sujeito, a autora citada
10

relata uma passagem que oferece condições de
entendimento sobre o aprender. É um diálogo
que presenciou entre duas irmãs:
- Vou aprender a nadar – disse Silvina
com a alegria de seus seis anos recém
refeitos.
- Vai nadar? – intervém a irmã, três anos
mais jovem.
- Não, vou aprender a nadar.
- Eu também vou brincar na piscina.
- Não é o mesmo. Eu vou aprender (grifo
da autora) a nadar – diz Silvina.
- O que é aprender?
- Aprender é...como quando o papai me
ensinou a andar de bicicleta. Eu queria
muito andar de bicicleta. Então...papai

Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
399
me deu uma bici...menor do que a dele.
Me ajudou a subir. A bici sozinha cai,
tem de segurar andando...
- Eu fico com medo de andar sem ro-
dinha.
- Dá um pouco de medo, mas papai
segurava a bici. Ele não subiu na sua
bicicleta grande e disse: ‘Assim se anda
de bici...’ Não, ele ficou correndo ao
meu lado sempre segurando a bici...
muitos dias e, de repente, sem que eu
me desse conta disso, soltou a bici e
seguiu correndo ao meu lado. Então eu
disse: Ah...APRENDI!”
Uma mulher que escutava a cena de lon-
ge não pode deixar de ver a alegria do
“aprender”(grifo da autora) pronunciado,
que havia se trasladado até o corpo da
menor e aparecia do brilho dos seus olhos.
- Ah! Aprender é quase tão lindo quan-
to brincar – respondeu.
- Sabe, papai não fez como na escola.
Não me disse ‘Hoje é dia de aprender a
andar de bicicleta. Primeira aula: andar
direito. Segunda aula: andar rápido.
Terceira aula: dobrar. Não tinha um
boletim onde anotar: muito bem, exce-
lente, regular... porque, se tivesse sido
assim, não sei, algo em meus pulmões
não teria me deixado aprender.
O diálogo entre as duas irmãs traduz a im-
portância da mediação contemplada, tanto pelo
instrumento cultural, a bicicleta, como pelo pai,
o mediador responsável pela apropriação do
conhecimento pela menina em um processo
educativo. E o andar de bicicleta é apenas uma
entre as inúmeras faces dessa apropriação.
De acordo com a perspectiva histórico-
cultural, esta apropriação acontece na relação
do indivíduo com o meio social. Dessa forma, o
homem produz o conhecimento sobre si mesmo
e sobre o mundo que o rodeia.
Como bem ressalta Oliveira
9
, com base em
Vigotsky, os significados são produzidos pelas
interações dos indivíduos em um ambiente
histórico-cultural, em uma relação mediada.
“Mediação, em termos genéricos, é o proces-
so de intervenção de um elemento intermediário
numa relação: a relação, então deixa de ser
di-
reta
e passa a ser mediada por esse elemento”
9
(grifo da autora).
No caso homem e meio, de um lado está o in-
divíduo e, do outro, o objeto do conhecimento. O
mediador encontra-se na interface sujeito e objeto.
Para Vigotski
11
, o mediador está no fator
cultural que pode ser representado por signos
ou instrumentos. Estes fornecem significados
à ação, conferindo um sentido ao homem,
portanto, exercem um papel fundamental na
constituição do sujeito.
É importante destacar que esta ação do
sujeito não é indiferente, como na perspectiva
pavloviana. Isso fica claro quando Vigotsky
11
,
a partir da analogia da ligação telefônica de
Pavlov, referindo-se ao reflexo condicionado e
incondicionado, afirma que se alguém resolver
amarrar um barbante no dedo para lembrar-se
de algo, existirá nessa ação uma associação con-
dicionada temporária, mas não há como negar
que existe um autor, que de forma deliberada
resolveu usar esse recurso para lembrar algo.
“Este é o aspecto que distingue as formas su-
periores das formas inferiores”.
A invenção e o uso de signos como
meios auxiliares para solucionar um
dado problema psicológico (lembrar,
comparar coisas, relatar, escolher, etc.)
é análoga a invenção e o uso de instru-
mentos, só que agora no campo psicoló-
gico. O signo age como um instrumento
da atividade psicológica de maneira
análoga ao papel de um instrumento no
trabalho. Um sistema de regras pode ser
um meio (signo) empregado para haver
um controle de comportamento
11
.

“Os instrumentos psicológicos alteram o
modo de o ser humano perceber, analisar, resol-
ver problemas, etc., ou seja, modificam as fun-
ções cognitivas humanas”
9
.

Ainda considera que:
“...são inúmeras as formas de utilizar
signos como instrumentos que auxiliam
no desempenho de atividades psicoló-
gicas. Fazer uma lista de compras por
escrito, utilizar um mapa para encon-

Matos LD
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
400
trar um determinado local, fazer um
diagrama para orientar a construção
de um objeto e dar um nó num lenço
para não esquecer um compromisso são
apenas alguns exemplos de com cons-
tantemente recorremos a mediação de
vários tipos de signos para melhorar as
nossas possibilidades de informações e
de controle da ação psicológica”
9
.

A cultura oferece ao ser humano uma linha
de instrumentos, para que ele possa dar conta
de agir sobre o mundo em um sentido definido:
estes são os instrumentos culturais. Os instru-
mentos culturais são divididos em dois grandes
grupos: ferramentas culturais e instrumentos
psicológicos ou meios simbólicos
5
.
As ferramentas culturais são todos os instru-
mentos, meios materiais que transformam os ob-
jetos do mundo, dando poder de ação ao homem,
tais como: a roda, o trator, a guitarra elétrica,
dentre outros. A ferramenta cultural é tida como
um objeto social, sua função é intervir na ação
humana, em sua relação com o mundo, de modo
que facilite esse processo. Por exemplo, ao utilizar
um martelo, o homem precisa empregar um meio
simbólico que defina seu uso, da mesma forma ao
tocar guitarra, é preciso aprender o sistema de no-
tas musicais e suas respectivas posições no braço
da guitarra. Ou seja, ao tentar dominar o objeto
ou instrumento cultural o homem está pensando
este objeto, enquanto pensa está se constituindo
5
.
Da mesma forma, o sistema de símbolos, cuja
função é organizar os signos em estruturas com-
plexas e articuladas, pode contribuir com o de-
senvolvimento dos processos mentais superiores
ou funções psicológicas superiores. Além de mo-
dificar a forma como o homem relaciona-se com
a realidade, alterando sua própria constituição.
Por intermédio da mediação feita a partir dos
instrumentos psicológicos, símbolos e os signos
de uma cultura que são alteradas as funções
cognitivas humanas. Por meio dessas funções,
o homem desenvolve suas capacidades e ha-
bilidades e amplia seu campo de percepção
5
.

A presença humana é fundamental no pro-
cesso de experiência da aprendizagem mediada
e estabelece três critérios para que esta ocorra:
intencionalidade por parte do mediador e re-
ciprocidade por parte do mediado, significado
e sua construção, estimulada pelo mediador, e
transcendência, ou seja, a possibilidade de apli-
car o conceito aprendido de maneira contextuali-
zada. Dessa forma, é configurada a mediação de
intencionalidade e de reciprocidade, mediação
de significado e mediação de transcendência
5
.

Feuerstein afirma que se pode entender o
mediador tanto como elemento cultural como
ação humana.

Assim, o profissional da educação
pode contar com o Mind Map ou Mapa Mental
2
,
como recurso ou estratégia de mediação, capaz
de contribuir com o desenvolvimento das fun-
ções psíquicas superiores.

Até o momento, os conceitos apresentados
foram: a aprendizagem, o conhecimento, a
educação e a mediação do conhecimento, como
processo de constituição humana.
Para investigar o Mind Map
2
ou o Mapa Men-
tal fomos à quem de direito desenvolveu o con-
ceito: Buzan
2
.

O referencial teórico do autor está
apoiado sobre as bases da Neurociência. Sendo
assim, é preciso conhecer, mesmo que de forma
superficial, o funcionamento do cérebro humano,
com base na perspectiva do autor, para aproximar
e entender o processo pelo qual os Mind Maps
2
ou
Mapas Mentais podem se transformar recursos de
mediação auxiliares à prática psicopedagógica.
A vida surgiu na Terra há 3.500,000 anos,
porém a humanidade apenas conhece a localiza-
ção do cérebro há 500 anos. Os antigos filósofos
acreditavam que ele encontrava-se no coração e
no estômago, mas só nos últimos 30 anos fizeram
as grandes descobertas a respeito desse órgão
2
.
O peso do cérebro é de, aproximadamente,
350g no bebê e 1,4 kg no adulto, possui, por
volta de, 100 bilhões de células, ou neurônios.
Cada neurônio é capaz de fazer de 10 a 200 mil
sinapses
12
ou conexões.
Ao combinar apenas as dez primeiras tarefas
realizadas por uma pessoa, em uma manhã,
em cada sequência possível, o resultado seria
3.628.800 (três milhões seiscentos e vinte e oito mil
e oitocentos) combinações diferentes. Transpondo
esse resultado para as conexões entre os neurô-
nios o número representaria a combinação de 100
bilhões de neurônios com 10 mil sinapses
13
. Com

Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
401
base nessa hipótese, seria possível afirmar que o
cérebro é dotado de um enorme potencial? Para
responder a esta pergunta é preciso estuda-lo
2
.
Entre as décadas de 1960 e 1980, em um
laboratório da Califórnia, foi realizada uma
pesquisa que mudou o paradigma vigente sobre
o conhecimento do cérebro humano. Segundo
Buzan
2
, em 1981, Roger Sperry, do Califórnia
Institute of Technology, recebeu o prêmio Nobel
de Medicina, e Robert Ornstein ganhou fama
mundial, por terem descoberto que as duas me-
tades do cérebro, “os dois hemisférios cerebrais,
que estão ligados por um conjunto imensamente
complexo de fibras nervosas, designado corpo
caloso, são essencialmente responsáveis por
diferentes tipos de atividade mental”.
“Na maioria das pessoas, o hemisfério
esquerdo é responsável pelo funcionamento
lógico, pelas palavras, raciocínio, operações
numéricas, linearidades, funcionamento analí-
tico, etc., as chamadas atividades ‘acadêmicas’
2
.


Enquanto o hemisfério direito é responsável
pelo “ritmo, imagens mentais e imaginação,
cores, sonho acordado, reconhecimento de fa-
ces e reconhecimento de padrões ou
mapas”
2

(grifo nosso). As descobertas feitas até agora
demonstraram que o cérebro humano tem muito
mais potencial do que previamente se pensava
2
.
Para Buzan
2
“o discurso verbal era entendido
como um processo linear entre pessoas. Durante
as últimas centenas de anos, o senso comum
pensou que a mente humana funcionava de
forma linear, em jeito de elaboração de listas”.
A justificativa estava na observação da forma
de comunicação verbal, na qual a palavra é
proferida sequencialmente, uma após a outra
e assim se traduz na palavra impressa, dando
origem a uma linearidade verbal e escrita.
As pessoas aprenderam na escola a escrever
apenas de forma linear por meio de frases ou
listas verticais. A aceitação desta forma de re-
gistrar as ideias é tão antiga que muito pouco
foi questionado a esse respeito. Todavia, pes-
quisas recentes demonstram o quanto o cérebro
é multidimensional.
O pressuposto de que o homem é capaz de
operar mentalmente sobre o mundo supõe um
processo de representação mental e com ele sua
relação com o mundo em um processo mediado.
Ao se observar como as palavras viajam
do locutor ao interlocutor e como este último
processa internamente as informações, pode-
se chegar à seguinte conclusão: as palavras
recém-chegadas ao cérebro provocam toda uma
dinâmica de relações em um processo contínuo
intrincado e multifacetado.
Cada pessoa atribui um sentido às palavras. Vi-
gotski
3
chama esse processo de linguagem interior.
“A linguagem interior é um movimento dinâmico,
instável, fluido”, pessoal e intransferível. Uma
única palavra pode despertar o entendimento de
um universo semântico de tal expressividade que
seria impossível traduzi-la em sentido oposto, ou
seja, da linguagem interior para a palavra.
Palavra e pensamento não se separam, fun-
cionam de uma maneira integrada, com base
em conceitos chaves, portanto as anotações se
organizadas e registradas de maneira análoga,
ou seja, “fluida, instável e dinâmica”
3
, com uso de
imagens sob forma de desenhos e fotos, símbolos,
ilustrações, diagramas, etc., poderiam traduzir um
desenvolvimento maior da expressão, contribuin-
do para a organização do pensamento
3
.
“Mind Map”
2
é um instrumento desenvolvido
para registrar o conhecimento de maneira multidi-
mensional, visual e lúdica. É uma ferramenta que
possibilidade a reflexão sobre um determinado
assunto já que permite articular ideias, partindo
de uma visão global, a ter rapidez perceptiva,
velocidade de raciocínio, relações figurativas,
memória voluntária, relações semânticas, etc.
Existem algumas leis fundamentais na con-
fecção de um mapa mental, conforme Buzan
2

orienta: inicia-se no centro, com o conceito
principal, sob forma de imagem, de preferência
bastante apelativa, esta desenvolve a criativi-
dade. As palavras devem ser escritas em letra
bastão para facilitar a compreensão, além disso,
devem ser colocadas sobre linhas, e cada linha
deve estar ligada a outras linhas. Deve-se colocar
apenas uma palavra por linha e estas represen-
tam conceitos pertinentes ao tema principal. É
importante que os conceitos sejam hierarquiza-
dos. (Anexo 1).

Matos LD
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
402
Cada linha e palavra devem ser feitas de
uma cor, para desenvolver a criatividade,
agradar a visão e estimular os processos do
hemisfério direito. O objetivo é possibilitar a
relação dos conceitos periféricos com o tema
central. Assim, o processo de construção do
Mapa feito com auxílio de signos; símbolos;
imagens; sinais como setas, pontos de excla-
mação, asteriscos; formas geométricas; três
dimensões; imagens criativas e cores além
de facilitar a memória voluntária, permite
relações importantes para fim de reflexão. A
utilização de símbolos facilita a compreensão,
assim como imagens e cores têm um signifi-
cado especial. Como já foi citado, o cérebro
pensa de uma forma complexa
2
.
Segundo nosso entendimento, se for soli-
citado a uma pessoa que pense em chocolate,
imediatamente o cérebro buscará uma forma
chocolate que envolverá uma série de fenô-
menos e lembranças, ela poderá pensar em
barras de chocolate - com ou sem papel - ou
em um bolo de chocolate, ou brigadeiro, é
provável que não pense nas letras ou na pa-
lavra chocolate.
As investigações sobre o cérebro desenvol-
vidas por Sperry, Ornstein e Zaidel confirmam
estas afirmações. As técnicas de organização
do pensamento e elaboração de apontamentos
realizadas com o objetivo de atender às neces-
sidades do cérebro, como um todo, deveriam
incluir não só palavras, mas também imagens,
cores números, ordenação, sequência, linhas,
dimensão, símbolos, etc
2
.
Dessa forma, o indivíduo poderia desen-
volver melhor a sua percepção ao utilizar um
conjunto de meios simbólicos para representar
graficamente seu pensamento, já que conceitos
expressos por meio de signos e símbolos enri-
quecem o diálogo interno.
Assim, para favorecer o potencial do cé-
rebro, em sua totalidade, deve-se levar em
consideração a dinâmica expressa nas relações
entre os elementos que constituem o todo,
integrando-os de uma forma articulada.
Os “Mind Maps”
2
ou Mapas Mentais auxiliam
a tendência do cérebro humano de buscar resolu-
ção a um contexto iniciado e permite uma sequ-
ência infinita de tentativas com o uso de símbolos,
desenhos e palavras. Flexibiliza o pensamento
para mover-se em diversas direções, despertando
a criatividade, favorecendo as relações.
Quando se finaliza um “Mind Map”
2
, todos
as informações necessárias encontram-se à
disposição da memória voluntária. O cérebro
tem acesso a todo o conjunto, simultaneamen-
te, possibilitando, além da visão global, uma
melhor articulação entre ideias.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao contrário dos sistemas tradicionais de
anotações, como textos e listas, o “Mind Map”
2
não adota um esquema de registro linear (Anexo
2). Tendo a característica simbólica de um neu-
rônio, ele reproduz de forma análoga, a essa
célula, a conexão a outras no cérebro, formando
uma rede natural de conexões que se irradiam
em torno de um conceito principal.
Funciona co m uma combinação de pala-
vras e imagens que permite registrar os dados
com maior agilidade e eficiência, explorando o
potencial do cérebro.
Desse modo, ao registrar o conhecimento
utilizando o “Mind Map”
2
, o indivíduo
d e s e n v o l v e a s f u n ç õ e s p s i c o l ó g i c a s
superiores, ou seja, foca a sua atenção ao
buscar o conceito-chave para elaborar seu
ANEXO 1
Arroz
Feijão
Milho
Grãos
Alface
Escarola
Brócolis
Verduras
Carne
Frango
Peixe
Proteínas
Frutas
Banana
Maçã
Mexerica
Beterraba
Cenoura
Pimentão
Legumes

Mind map como instrumento psicopedagógico de mediação para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
403
ANEXO 2
Avaliação
Progressiva
Objetivo
Reestruturação
Feedback
Globalizado
Capitalista
Pós-industrial
Multinacionais
Complexidade
Desmatamento
Aquecimento
Violência
Desigualdades
Formação
Banalização
Ambientais
Sociais
Culturais
Problemas
Contemporâneo
Proune
Reune
Capes
Cotas
Negros
Indígenas
Pobres Políticas públicas
Formativa
Interdisciplinaridade
Consciência crítica
Autonomia
Construção
Ser
Foco
Cooperativa
Compartilhada
Visão fragmentada
Espeficifista
Memorização
Ter
Foco
Competitiva
Linear
Cartesiana
Educação
Tradicional
Formação
didático-pedagógica
Dimensão
Conceitual
Procedimental
Atitudinal
Básica
Educação - Níveis
Afetividade
Consciência Model
o
Compromisso
Responsabilidade
Desenvolvimento Humano
Educação infantil
Ensino Fundamental
Ensino Médio
Ensino Técnico
Pós-graduação
Educação superior
Conhecimento técnico
Doatica
Estratégias
Recursos
voluntária já que faz uso de imagens e
símbolos; relaciona conceitos; amplia a
percepção e a possibilidade de reflexão
ao desenvolver uma visão macro de um
dado problema. Os resultados mostraram a
eficiência da estratégia pesquisada.
mapa; organiza os conceitos por categoria;
desenvolve uma dinâmica de pensamento
parte-todo e todo-parte, quando pratica
o raciocínio indutivo e dedutivo; entende
o sentido de classificar e comparar como
base de planejamento; otimiza a memória
SUMMARY
Mind map as mediation strategy for the development of higher
psychological functions
Objective: The aim of this study was to identify a strategy to contribute to
the mediation process focused on the development of higher psychological
functions. Method: The methodology adopted was a descriptive literature
review based on articles and writers on the theme explored. Results: The
results showed that, by registering the knowledge using the Mind Map, the
individual can: integrate both of the brain hemispheres, as he uses words,
images and also colors; focus his attention when pursue the concept key for
preparing his map; organize the concepts by category; develop the formal
logic, when practices the inductive and deductive reasoning; understands
the meaning of sort, compare and serialize as a basis for planning; and
enhances perception to develop a macro view of a problem. Conclusion:
The results given above show the efficiency of the researched strategy in
developing the higher psychological functions.
KEY WORDS: Attention. Memory. Creativeness.

Matos LD
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 395-404
404
REFERÊNCIAS
1. Cortella MS. A escola e o conhecimento. 7
a

ed. São Paulo:Cortez;1998.
2. Buzan T. Saber pensar. 4
a
ed. Comemorati-
va 21 anos. Lisboa:Presença;1995.
3. Vigotsky LS. A construção do pensamento
e da linguagem. Trad. Bezerra P. São Paulo:
Martins Fontes; 2001.
4. Maturana HR, Varela F. A árvore do conhe-
cimento: as bases biológicas da compreensão
humana. 6
a
ed. São Paulo: Palas Athena; 007.
5. Gomes CM. Feuertein e a construção mediada
do conhecimento. São Paulo: Artmed; 2002.
6. Rego TCR. A indisciplina e o processo
educativo: uma análise na perspectiva
vygotskiana. In: Aquino JG, org. Indiscipli-
na na escola. 11ª ed. São Paulo:Summus;
1996. p. 101-27.
7. Freire P. Educação como prática da liberda-
de. 17
a
ed. Rio de Janeiro:Paz e Terra; 1979.
8. Ferreira ABH. Miniaurélio século XXI: o
minidicionário da língua portuguesa. Co-
ordenação e edição Anjos M, Ferreira MB.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 2000.
9. Oliveira MK. Vygotsky: aprendizado e de-
senvolvimento: um processo sócio-históri-
co. 2
a
ed. São Paulo: Scipione; 1997.
10. Fernandes A. Os idiomas do aprendente:
análise das modalidades ensinantes com
famílias, escolas e meios de comunicação.
Porto Alegre: Artmed; 2001.
11. Vigotsky LS. A formação social da mente: o
desenvolvimento dos processos psicológi-
cos superiores. São Paulo: Martins Fontes;
2003.
12. Lent R. Cem bilhões de neurônios: con-
ceitos fundamentais de Neurociência. Rio
Janeiro:Atheneu; 2005.
13. Dryden G, Vos J. Revolucionando o apren-
dizado. São Paulo: Makron Books;1996.
Trabalho realizado na empresa Evoluir Educacional,
São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 30/5/2010
Aprovado: 7/8/2010

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
405
ARTIGO de revisão
RESUMO – Objetivo: Apresentar uma revisão bibliográfica de artigos
que tratam da formação de professores para a inclusão escolar da pessoa
com deficiência, tendo como base os resumos de artigos publicados
na SciELO até o primeiro semestre de 2010. Método: Foram utilizados
descritores a partir da combinação de três palavras-chave e seus derivados:
professores, inclusão escolar e formação e analisou-se: instituição dos
autores, revistas que publicaram os artigos, ano de publicação, palavras-
chave, temática ou problemática, objetivos, tipo de deficiência, referenciais
teóricos, instrumentos, sujeitos, resultados e conclusões. Resultados: Com
relação à formação dos profissionais da Educação, ainda parece prevalecer
uma valorização da formação continuada, embora a preocupação com a
formação inicial já esteja presente. A análise dos resumos aponta para a
presença de ações formativas baseadas em processos de desenvolvimento
e aprendizagem da docência, no entanto, a racionalidade técnica ainda
se faz presente. Quanto ao processo de formação dos professores sobre
a inserção dos deficientes no ambiente escolar, a discussão se mantém
de forma generalista. Como continuidade dessa pesquisa os textos serão
analisados na íntegra. Tal análise possibilitará compreender a relação entre
a produção científica acadêmica e os documentos das diretrizes de políticas
públicas de inclusão, além da relação entre o currículo e a organização
dos espaços e tempos escolares.
UNITERMOS: Docentes. Inclusão escolar. Pessoas com deficiência.
Formação de professores e inclusão
escolar de pessoas com deficiência: análise
de resumos de artigos na base SciELO
Marcos Vinícius de Araújo – Psicólogo pelo Mackenzie,
Mestre e Doutorando em Distúrbios do Desenvolvimento,
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade
Presbiteriana Mackenzie, Professor Assistente II do Curso
de Psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Robson Jesus Rusche – Psicólogo pela PUC-SP, Mestre
e Doutor em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento
Humano (USP). Professor Adjunto I do Curso de Psicologia,
Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade
Presbiteriana Mackenzie.
Rinaldo Molina – Psicólogo pela UNESP, Mestre (UFSCAR) e
Doutor (FE-USP) em Educação. Professor Adjunto I do Curso
de Psicologia, Centro de Ciências Biológicas e da Saúde,
Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Luiz Renato Rodrigues Carreiro – Psicólogo pela UFF, Mestre
e Doutor em Fisiologia Humana pelo ICB-USP. Professor
Adjunto I do Programa de Pós-Graduação em Distúrbios
do Desenvolvimento, Centro de Ciências Biológicas e da
Saúde, Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Correspondência Prof. Dr. Luiz Renato Rodrigues Carreiro Universidade Presbiteriana Mackenzie Centro de Ciências Biológicas e da Saúde P r o g r a m a d e P ó s - G r a d u a ç ã o e m D i s t ú r b i o s d o Desenvolvimento Rua da Consolação, 896, Prédio 38 / Térreo – Centro – São Paulo, SP, Brasil –CEP 01302-907 E-mail: [email protected]
Marcos V inícius de Araújo; Robson Jesus Rusche; Rinaldo Molina; Luiz Renato Rodrigues Carreiro

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
406
INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é apresentar uma
revisão bibliográfica de artigos que tratam da
formação de professores para a inclusão escolar
da pessoa com deficiência, tendo como referên-
cia os artigos publicados na base de dados da
SciELO até o primeiro semestre de 2010.
As pesquisas de caráter bibliográfico têm como
finalidade mapear a produção acadêmica nos di-
versos campos do conhecimento. Ferreira
1
aponta
que, nos últimos quinze anos, tem se produzido
um conjunto significativo de pesquisas conhecidas
pela denominação estado da arte ou estado do
conhecimento
2-8
. Tais pesquisas contribuem para
o aprimoramento das reflexões a respeito das prá-
ticas educacionais no próprio campo de trabalho,
além de auxiliarem os estudos e outras pesquisas
na construção da práxis e do planejamento das
políticas públicas em Educação.
A discussão teórica que permeia a análise
dos resumos estudados neste trabalho está pau-
tada nas concepções de formação permanente,
desenvolvimento e aprendizagem profissional
dos professores, inclusão e educação especial
na perspectiva da educação inclusiva. Tais
concepções foram extraídas principalmente da
legislação vigente em Educação e de autores
da área educacional.
Para a discussão dos resumos foram tomados
os seguintes pontos: instituição dos autores,
revistas que publicaram os artigos, ano de
publicação, palavras-chave, temática ou pro-
blemática, objetivos gerais, tipo de deficiência,
referenciais teóricos, instrumentos, sujeitos,
resultados e conclusões apresentados.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA
A INCLUSÃO DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA
A constituição do paradigma da inclusão
ocorreu a partir de compromissos históricos as-
sumidos de forma coletiva pelos movimentos de
luta internacional por direitos sociais como, por
exemplo, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos (1948), o Pacto Internacional dos Di-
reitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), a
Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), a
Conferência Mundial sobre Educação para Todos
(1990) e o Relatório para a UNESCO da Comis-
são Internacional sobre Educação para o Século
XXI (1996). Inclusão, nesse sentido, significa
compartilhar o processo de humanização, numa
experiência de construção coletiva que coloca
todos na condição de sujeitos. Nesse processo,
descoisificam-se as pessoas, possibilitando que
se tornem sujeitos de suas próprias vidas
9
.
Foi na Declaração de Salamanca (1994) que a
educação de crianças e jovens com necessidades
educativas especiais se aproximou da educação
inclusiva, ao defender que as pessoas com neces-
sidades educativas especiais devem ter acesso
às escolas regulares, e estas devem se adequar
por meio de uma pedagogia centrada na criança,
capaz de ir ao encontro de suas necessidades.
Considerando-se os princípios inclusivistas
contidos na Declaração de Salamanca (1994)
e na Constituição da República Federativa do
Brasil
10
, entende-se por educação inclusiva
a construção de uma escola para todos com
oportunidades iguais e respeito à diversidade.
Esta proposta está inserida nos movimentos
sociais que lutam por uma escola democrática,
que se concretize como espaço de acesso aos
conhecimentos historicamente acumulados pela
sociedade e que é construção de todos.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência (2006) foi realizada com a
intenção de promover, proteger e assegurar o
desfrute pleno e equitativo de todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais por parte
de todas as pessoas com deficiência e promo-
ver o respeito pela sua inerente dignidade.
Pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de natureza física, intelectual ou
sensorial que, em interação com diversas bar-
reiras, podem obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade.
A Constituição da República Federativa do
Brasil
10
introduziu as ideias inclusivistas em
nosso país, entretanto, foi em 1996 com a promul-
gação de Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB)
11
que se efetivaram concre-
tamente essas políticas sociais de inclusão na

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
407
educação escolar. Nela o atendimento às pessoas
com deficiência tratar-se-ia de uma modalidade
de educação escolar que permeia todos os níveis,
desde a educação básica até a educação superior,
incluindo as demais modalidades: educação de
jovens e adultos e educação profissional.
Todas essas mudanças trouxeram por consequ-
ência a necessidade de transformação na qualidade
do trabalho educacional. Nesse sentido, o professor
como aquele que teria diretamente contato em sala
de aula com o aluno foi considerado um elemento
chave para o sucesso dos processos de mudança
propostos. Essa constatação trouxe uma grande
preocupação com a formação dos professores.
Na LDB
11
, tivemos a regulamentação da for-
mação dos professores com indicações para a sua
formação inicial (Art. 62) e continuada (Arts. 1,
67, 80, 87) e, especificamente ao atendimento
às pessoas com deficiência, ao indicar para a
necessidade de “professores com especialização
adequada em nível médio ou superior, para aten-
dimento especializado, bem como professores
do ensino regular capacitados para a integração
desses educandos nas classes comuns” (Art. 59).
Dois anos depois, foram apresentados os “Pa-
râmetros Curriculares Nacionais: Adaptações
Curriculares - Estratégias para a Educação de
alunos com necessidades educacionais espe-
ciais”
12
, que indicaram como meta principal,
para se viabilizar um modelo de escola inclu-
siva, a criação de programas se formação e ca-
pacitação dos professores das classes regulares
para transformar sua prática educativa.
No ano de 2001, foram instituídas as “Diretrizes
Nacionais para a Educação Especial na Educação
Básica”
13
, que, juntamente com as “Diretrizes Cur-
riculares Nacionais para a Formação de Docentes
da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, em nível médio, na modalidade Nor-
mal”
14
, as “Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Professores da Educação Básica, em
nível superior, curso de licenciatura de graduação
plena”
15
e as “Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Curso de Graduação em Pedagogia, licen-
ciatura”
16
, orientaram as instituições formadoras
dos professores em torno de uma preocupação de
que essas prevejam e contemplem em sua organi-
zação curricular conteúdos sobre as especificidades
dos alunos com deficiência.
No ano de 2008, se define uma “Política Na-
cional de Educação Especial na perspectiva da
educação inclusiva”
17
que tem como pressuposto
que a educação inclusiva seria uma ação política,
cultural, social e pedagógica, desencadeada em
defesa do direito de todos os alunos de estarem
juntos, aprendendo e participando, sem nenhum
tipo de discriminação. E, propôs-se uma série de
ações escolares que objetivaram orientar as insti-
tuições sobre as condições de acessibilidade dos
alunos, necessárias à sua permanência na escola
e prosseguimento acadêmico, tais como formação
permanente dos educadores, rede de apoio para
as pessoas com deficiência na escola e na comu-
nidade, adequação curricular, entre outras ações.
Por fim, no ano de 2009, foram instituídas as
“Diretrizes Operacionais para o Atendimento
Educacional Especializado na Educação”
18
. Seu
Art. 12 pontuou que, para atuar na educação
especial, o professor deve ter formação inicial
que o habilite para o exercício da docência e
formação específica para a Educação Especial,
discriminando, no Art. 13, as atribuições do pro-
fessor no atendimento educacional às pessoas
com deficiência. Apesar da importância de tais
processos na inserção da pessoa com deficiência
na escola, o direcionamento dado à formação
dos professores empreendido pelas políticas
públicas sofreu várias críticas.
Historicamente, o gerenciamento dos órgãos
públicos sobre a Educação e, consequentemente
sobre a formação docente, se deu a partir de uma
tutela político-estatal que centralizou as decisões
sobre a profissão docente, desconfigurando e
afastando o poder decisório e a liberdade do
professorado. Sempre à procura de mecanismos
cada vez mais sutis de controle na regularização
da profissão docente, prolongou-se a constituição
de uma tutela científico-curricular
19
, que afirmou
e expandiu a concepção de que o trabalho do-
cente teria características meramente técnicas, e
poderia ser substituído, por exemplo, pelo livro
didático e pelas novas tecnologias.
Silva e Castro
20
afirmaram que, no que se
referiu às atuais tendências para a formação

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
408
dos profissionais da educação, existiu um des-
compromisso com a formação inicial e uma
valorização da formação continuada em serviço
que ocorreria, na maioria das vezes, à distância.
Para Brzezinski
21
, houve uma contraposição
entre o projeto da sociedade política que colo-
cou em prática os princípios da qualidade total
e a sociedade civil organizada em entidades
educacionais reunidas no movimento nacional
de educadores, que lutam por princípios da qua-
lidade social. Tal autora
21
se refere ao sentido
procedimental implícito nas políticas públicas
voltadas à “reciclagem” e ao “treinamento em
serviço”, termos tão usados nos anos de 1970.
“Treinamento foi uma modalidade de formação
continuada presencial de inspiração tecnicista
que norteou a reciclagem de professores” (p.
1146), só que agora com foco na educação à
distância (EaD). Além disso, indicou para o fato
desses procedimentos serem utilizados “não
para complementar os processos formativos pre-
senciais dos professores, mas sim para substituir
a formação inicial” (p. 1146).
Há consenso também que esses termos
apóiam o processo de formação no modelo da
racionalidade técnica, que, além de separar a
formação inicial da continuada, vê a atividade
do profissional como instrumental, dirigida
apenas para a solução de problemas mediante
a aplicação rígida de técnicas pedagógicas
20,22-23
.
Nóvoa
19
definiu dois formatos para a forma-
ção: os estruturantes, “organizados previamente
a partir de uma lógica de racionalidade científi-
ca e técnica”, que seguem a lógica apresentada
acima, e os construtivistas, que caminham no
fortalecimento do profissional professor, a par-
tir da defesa de que a produção de processos
formativos definidos como formação perma-
nente
9,27
e desenvolvimento e aprendizagem
profissional da docência
28
indicariam para a
educação ao longo da vida e para os compromis-
sos institucionais educacionais dos professores.
A partir dessa perspectiva, a formação inicial
basear-se-ia em experiências de campo que pre-
cedem o trabalho em cursos acadêmicos, as expe-
riências precoces incluídas nos cursos acadêmicos
e as práticas de ensino e os programas de inicia-
ção
29
. A formação continuada seria um processo
de compreensão pelo professor das concepções
implícitas às suas práticas docentes, bem como o
comprometimento explícito com a mudança e com
a construção contínua de sua formação, buscando
dar significado ao seu trabalho
24
.
MÉTODO
A pesquisa bibliográfica representa uma me-
todologia valiosa para estudar os retrocessos, as
rupturas, os saltos e avanços dos fundamentos
e concepções de um determinado campo do
conhecimento. A partir deste tipo de estudo é
possível detectar o debate de ideias, o conjunto
de perspectivas do conhecimento e as tensões e
conflitos no processo de produção dos saberes
de uma determinada área.
A história do conhecimento apresenta con-
tinuidades e descontinuidades que podem ser
evidenciadas no decorrer de uma pesquisa
bibliográfica. Esta implica em uma sistemati-
zação dos saberes do campo em estudo, que
permite apreender o movimento existente na
elaboração dos paradigmas que norteiam as
políticas nas diversas áreas do saber e campos
de atuação.
A produção histórica dos saberes acumu-
lados pela humanidade está em constante
transformação, portanto a sistematização deste
movimento necessita ser documentada, a fim
de contribuir para o aprimoramento das teorias,
métodos e práticas sociais, contribuindo assim
para evitar a cristalização do conhecimento.
Nos últimos quinze anos, no Brasil e em outros
países, tem se produzido um conjunto signi-
ficativo de pesquisas do tipo estado da arte
ou estado do conhecimento
1
. Tais pesquisas
representam formas de tratamento da pesquisa
bibliográfica.
Procedimentos
Foram feitas buscas sistemáticas na base
de dados SciELO (www.scielo.br), utilizando-
se descritores a partir da combinação de três
palavras-chave de acordo com a Tabela 1. Esse

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
409
conjunto de palavras-chave foi selecionado
visando encontrar artigos que versassem a res-
peito da formação docente para a inclusão do
deficiente. Não foi determinado o ano inicial para
data de publicação dos artigos inseridos na pes-
quisa, porque se buscou avaliar todos os artigos
incluídos no banco de dados até junho de 2010.
Para cumprir as finalidades desta pesquisa,
foram definidos três tipos de descritores, a fim de
permitir a busca dos artigos na base de dados esco-
lhida, denominados de Sujeito, Verbo e Predicado,
aludindo-se a uma sintaxe dos sentidos e à relação
entre tais descritores. Estes últimos são formados
por palavras-chave extraídas do campo da inclusão
e da formação de professores. Tais palavras foram
organizadas por meio de uma perspectiva histórica
de sua utilização nas políticas educacionais.
Por fim, decidiu-se separá-las em três grupos
que se inter-relacionam para dar conta das pos-
síveis qualidades da ação de formar. Foi nesse
raciocínio que foram constituídas as categorias
de Sujeito, como aquele que realiza a ação de
formar; Verbo, como as várias modalidades
desta ação e; Predicado, como a característica
ou qualidade de cada modalidade da ação, ou
melhor, a quê se dirige a ação. A Tabela 1 de-
monstra como se concretizou tal organização.
Todas as combinações das 3 colunas de
palavras foram pesquisadas em todas as partes
do texto. Assim, houve um total de 702 (6 x 13
x 9) combinações possíveis. Desse total, foram
excluídos os artigos repetidos, restando 114, dos
quais foram selecionados 24 em função do título
e das palavras-chave que deveriam ter relação
direta com os objetivos desta pesquisa.
Esses 24 artigos tiveram seu resumo detalha-
damente avaliado de acordo com uma ficha para
categorização temática que analisou: (1) Institui-
ção dos autores; (2) Nome do Periódico e ano de
publicação; (3) Palavras-chave; (4) Tema/proble-
mática; (5) Objetivo geral; (6) Referencial teórico;
(7) Método/ Amostra; (8) Resultados/conclusões.
A análise detalhada dos resumos acabou por
excluir mais seis artigos por tratarem a questão
da formação como conclusão do trabalho e
não como objetivo central da pesquisa. Para a
análise final desse trabalho foram selecionados
então 18 resumos de artigos
30-47
.
Tabela 1 – Descritores utilizados para a pesquisa.
Em cada busca foi utilizada uma combinação de três palavras, uma de cada coluna.
Sujeito Verbo (Ação) Predicado
1. Docentes 1. Formação 1. Inclusão
2. Docente 2. Capacitação 2. Necessidades especiais
3. Professor 3. Reciclagem 3. Integração
4. Professores 4. Desenvolvimento profissional 4. Diversidade
5. Educador 5. Educação continuada 5. Diferença
6. Educadores 6. Requalificação 6. Educação especial
7. Especialização 7. Classe especial
8. Aprimoramento 8. Aluno especial
9. Aperfeiçoamento 9. Necessidades educativas especiais
10. Escola especial
11. Deficiência
12. Educador especial
13. Educação inclusiva

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
410
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Do total de artigos analisados, verificou-
se que, com relação à instituição dos autores
(Figura 1), a maior parte (n=15) foi produzida
por autores de instituições públicas, da área da
Educação (n=13) das regiões Sudeste (n=14) e
Sul (n=4). Historicamente, há uma concentração
de produção de conhecimento em instituições
públicas, o que se retrata também na temática
deste artigo. Além disso, é possível pensar que
a preocupação com a formação de professores
está centrada nos departamentos de Educação.
Não foram observados em nossa pesquisa
autores ligados a departamentos de Psicologia,
isso pode indicar que tais departamentos estão
inseridos de forma incipiente em tal discussão.
A base de dados estudada representa, dentro
do contexto nacional de divulgação do conheci-
mento científico, uma das mais relevantes, com
revistas que apresentam expressiva aderência
ao tema estudado e impacto dentro da comuni-
dade científica nacional.
O fato das regiões sul e sudeste possuírem a
maior concentração de programas de pós-gra-
duação pode justificar a presença significativa
de artigos oriundos dos estados de São Paulo,
Rio de Janeiro, Santa Catarina e Paraná.
Com relação às revistas que publicaram os
artigos (Tabela 2), observa-se maior concentra-
ção deles na Revista Brasileira de Educação Es-
pecial, com 8 artigos, seguido pela Paidéia, com
2. Observou-se, também, que os artigos foram
publicados entre 1998 e 2009, com uma concen-
tração maior a partir de 2005 (Figura 2), sendo
que antes de 2005 foram encontrados apenas 2
artigos. Historicamente, há uma distância entre
a constituição dos princípios das declarações
universais e a consolidação destes nas diretrizes
das políticas públicas nacionais, o que pode ex-
Tabela 2 – Número de artigos publicados por Área e por Revista.
Revista Área da revista Numero de artigos
Revista Brasileira de Educação
Especial
Educação 8
Paidéia Interdisciplinar 2
Revista Brasileira EducaçãoEducação 1
Revista Brasileira Ensino de FísicaEducação 1
Interface Comunicação Saúde Edu -
cação
Interdisciplinar 1
Arquivos Brasileiros de Oftalmo-
logia
Saúde 1
Revista CEFAC Interdisciplinar 1
Cadernos CEDESEducação 1
Educação em RevistaEducação 1
Psicologia: Teoria e Pesquisa Psicologia 1
Total 18
Figura 1 – Número de artigos analisados em função do
tipo de instituição dos pesquisadores (Pública, Particular ou
Internacional); Área (Psicologia, Educação e Saúde) e Estado
(São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Santa Catarina).

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
411
plicar a data de início das publicações em 1998 e
a maior concentração dessas publicações a partir
de 2005, o que aponta para uma ampliação das
discussões nas práticas escolares.
As palavras-chave de cada artigo foram or-
ganizadas de acordo com as categorias: Defici-
ências (n=6), sendo que maior parte (n=5) delas
se referia à deficiência visual; Inclusão Escolar
de Pessoas com Deficiência (n=24), sendo que
uma parte expressiva refere-se à educação
especial ou necessidades especiais (n=13) e ao
paradigma da inclusão (n=9). Houve um artigo
que utilizou a palavra-chave baixo rendimento
escolar, o que indica a presença ainda de termos
ou expressões utilizadas que são anteriores ao
paradigma da educação inclusiva.
Observa-se uma dispersão muito grande
na categoria Formação de Professores (n=16),
no entanto, a palavra formação aparece várias
vezes (n=11), o que indicaria a consolidação do
termo. Outros termos, tais como capacitação,
consultoria e programa e aperfeiçoamento (n=4),
ainda continuam a aparecer, apesar de toda dis-
cussão teórica sobre o significado na prática dos
mesmos. Pós-graduação e educação à distância,
diferente do que apontam os documentos oficiais,
aparecem apenas uma vez cada, indicando pou-
ca preocupação com o estudo da temática desta
pesquisa no campo da formação inicial.
A categoria Prática Docente (n=9) pode ser
somada com Prática de Ensino do Professor (n=6),
dois pontos são relativos à intervenção nessa prá-
tica (Intervenção precoce e Intervenção reflexiva)
e apenas um (Interação entre professor-aluno)
evidencia a relação professor-aluno. Isso aponta
para a preeminência da racionalidade técnica nesta
área, mesmo que a visão interacionista já esteja si-
nalizada nessa discussão, mas ainda de forma sutil.
A Saúde (n=6) aparece como preocupação
significativa, sendo que dois pontos tratam da
saúde do escolar, dois são relativos a disciplinas
específicas (educação física e fisioterapia) e dois
relativos ao diagnóstico. Em Educação escolar
(n=5), há dispersão entre os itens, todavia desta-
camos a presença dos termos: gestão, organiza-
ção escolar e currículo, que podem indicar uma
preocupação com a transformação dos tempos
e espaços escolares no paradigma da inclusão.
Frente à escolha dos temas e das proble-
máticas de estudo, a visão da racionalidade
técnica ainda permanece principalmente no
que diz respeito às categorias Formação Téc-
nica (n=2) e Instrumentalização do professor
(n=3). As novas perspectivas de formação
estão expressas nas preocupações a respeito
da verificação do Conhecimento do Profes-
sor (n=3) e da Reflexão prática/crítica (n=3).
Outras temáticas, tais como Política Pública
(n=3) e Discussão Curricular (n=3), aparecem
indicando uma crescente relevância para esses
temas e evidenciado o que pode denotar uma
preocupação com a compreensão de como o
fenômeno da formação de professores na área
de inclusão vem se colocando na prática social,
o que, por sua vez, indica uma visão reflexiva
em contraponto à instrumental. Os artigos na
categoria Discussão Curricular denotam o iní-
cio dessa discussão na preparação dos cursos
de Formação Inicial. É importante ressaltar que
foi localizada apenas uma pesquisa de Revisão
Bibliográfica (n=1), o que, como já dissemos,
aponta para a juventude do tema.
Com relação aos objetivos gerais dos artigos
estudados, centram-se na discussão do nível de
formação, sendo 7 artigos referentes à forma-
ção inicial, 3 referentes a cursos de Pedagogia,
1 de Licenciatura em Física, 2 relacionados à
Licenciatura em Pedagogia e 1 do Centro de
Formação e Aperfeiçoamento do Magistério
(CEFAM). Além desses, 11 artigos tinham seus
objetivos relacionados à formação continuada,
sendo apenas um deles relacionado a cursos de
especialização.
Figura 2 – Número de artigos publicados por ano.

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
412
Quanto ao nível de formação, há predomínio
da Formação Continuada (n=11) sobre a For-
mação Inicial (n=7). Tal característica também é
descrita por Silva e Castro
20
, ao afirmarem que
existe um descompromisso com a segunda e uma
valorização da primeira. Tal discussão corrobora
com a literatura da área de formação de profes-
sores, que aponta para uma cisão entre teoria e
prática e, talvez, para uma necessidade premen-
te nas práticas escolares de instrumentação e
reflexão crítica que está chegando aos poucos à
formação inicial
22
. A proposta de inclusão parece
ter surgido primeiramente nas leis e nas práticas
da escola pública e, posteriormente, passou a ser
preocupação dos espaços acadêmicos.
Com relação ao tipo de deficiência, observou-
se apenas 1 artigo associado à deficiência física,
4 à deficiência visual, 1 à deficiência auditiva/
surdez e 1 ao déficit de linguagem. Os outros
11 artigos não explicitaram o tipo de deficiência
estudada. Muito provavelmente, em função da
juventude da temática estudada, encontramos
problemáticas expressas de forma genérica,
talvez em decorrência da necessidade de se
compreender o paradigma da inclusão a partir
de temas mais gerais, tais como a diferença, o
preconceito, antes de poder lidar com as espe-
cificidades da deficiência no ambiente escolar.
Apenas 4 dos 18 artigos apresentam nos
resumos seus referenciais teóricos, tais como
menção a autores ou linhas teóricas. São eles:
Psicologia sócio-histórica; Ayala Manolson;
Hannah Arendt e Abordagem ecológica. Os
outros 14 artigos não apresentam autores ou
linhas teóricas na descrição do resumo.
A categorização dos métodos utilizados foi fei-
ta com base na nomenclatura dada pelos autores
dos artigos presentes nos respectivos resumos.
Verificou-se a presença da preocupação com os
princípios e documentos teóricos da inclusão,
evidenciado pelo número de artigos na categoria
Teórico (n=5). As demais categorias indicam a
necessidade do registro da prática: Descritiva
(n=1), Audiogravação (n=1), Filmagem (n=3).
Entrevista (n=1), Questionário (n=3) apontam
para a captura do ponto de vista dos sujeitos das
pesquisas. O aspecto quantitativo e de medição
aparece de forma modesta na categoria Escala
(n=1). Uma maior aproximação e preocupação
com a intervenção sobre a prática expressou-se
nas categorias Encontros Reflexivos (n=2) e Pla-
nejamento e Execução de aula (n=1). O método
não foi explicitado em seis estudos analisados.
Quanto à amostra de sujeitos de cada uma das
pesquisas analisadas, foram encontrados profes-
sores da educação básica regular (n=6), alunos
com necessidades especiais (n=3), professores
do ensino superior (n=1), alunos do ensino mé-
dio CEFAM (n=1), professores itinerantes (n=1),
pais de alunos (n=1), alunos de licenciatura em
Física (n=1), documento (n=1) e não explicitado
(n=6), demonstrando maior preocupação com a
educação básica e depois com o aluno com de-
ficiência. O restante expressa uma diversidade
de sujeitos, o que denota um início do contato
da temática com outros aspectos relevantes ou,
talvez, o diálogo com outros sujeitos e outras
preocupações não menos importantes, tais como
a relação com os pais, a questão das licenciaturas,
do ensino superior, entre outras.
Analisando a categoria resultados, estes foram
organizados pelo nível de formação, ou seja, ini-
cial e continuada. Em relação àqueles organizados
em torno da formação inicial (n=7), encontramos
3 que não explicitaram os resultados e 1 que
explicita de forma genérica. Nos demais artigos
(n=3), encontramos 2 que abordaram o impacto
da formação no aluno e 1 relativo à análise cur-
ricular. Destes, o primeiro concluiu que houve
mudança de atitude social do aluno com relação
à inclusão, mas que ainda há necessidade de
inserir atividades capazes de modificar atitudes
sociais dos alunos no currículo escolar; o segundo
apontou para dificuldades dos futuros professores
em romper com o modelo pedagógico tradicional,
embora demonstrem criatividade em superar a
especificidade da deficiência apresentada pelos
alunos; o terceiro partiu da análise do currículo de
um curso de formação e concluiu que a compreen­
são do fenômeno educacional relacionada ao
aluno com diagnóstico de deficiência baseia-se
no modelo médico-psicológico.
Na categoria formação continuada, foram en-
contrados 11 estudos, sendo que 3 deles aponta-
ram para a falta de conhecimento dos professores
para a inclusão de alunos com deficiência. Destes
três, apenas 1 estudo indicou a necessidade de
capacitação dos professores como fator facilitador

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
413
da inclusão e 2 deles apontaram para o interesse
dos professores em participar de programas de
formação. A efetividade do processo de formação
continuada dos professores foi apresentada em 8
artigos. O primeiro se refere a fatores facilitado-
res da inclusão, ao apoio do governo por meio de
cursos de formação, de auxílio técnico pedagógico
especializado, de adaptação do espaço físico e do
material didático; formação reflexiva do professor
(n=3); mudança na prática em sala de aula (n=1);
demonstração da possibilidade do uso da infor-
mática na educação especial (n=1); indicação de
que a participação dos alunos com deficiência nas
aulas auxilia na inclusão da comunidade escolar
(n=1) e; a consultoria especializada contribui para
a capacitação dos professores (n=1).
É importante ressaltar ainda que, dentre os
resumos estudados, evidenciou-se a possibili-
dade da organização de programas de formação
pedagógica. Outro, ao avaliar monografias de
especialização em deficiência mental e edu-
cação especial, concluiu que a maior parte foi
desenvolvida na escola, com alunos especiais e
pesquisas de intervenção, cuja maior incidência
de temas foi a de investigações relacionadas a
procedimentos de ensino.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não foram observados autores ligados a
departamentos de Psicologia, o que merece
destaque, pois os profissionais desta área estão
ligados, historicamente, à temática da inclusão e
do desenvolvimento e da aprendizagem, o que
seria de se esperar que estivessem pesquisando
também a formação de professores para a inclusão
de pessoas com deficiência nos espaços escolares.
A maior concentração de artigos a partir
de 2005 pode indicar uma distância entre a
realização dos compromissos internacionais,
sua consolidação nas diretrizes das políticas
públicas nacionais, as práticas escolares e, por
fim, a pesquisa em torno dessas práticas. O que
implicaria na necessidade de uma relação mais
estreita da academia com as lutas dos movimen-
tos sociais e a consequente promulgação dos
princípios e diretrizes internacionais.
Ainda há presença de termos utilizados
para se referir à formação de educadores que
são anteriores à construção do paradigma da
educação inclusiva. Neste sentido, constata-se a
dificuldade histórica de se consolidar princípios
nas práticas escolares, sendo que a academia
não poderia estar isolada desse processo.
Nos resumos estudados, a relevância para a
educação básica é maior, mas já aparecem estu-
dos a respeito da necessidade de se aprimorar os
cursos de formação inicial. Há a necessidade de
instrumentalização dos educadores, contudo a
visão interacional já está sinalizada, mesmo que
de forma sutil, apontando para uma visão mais re-
flexiva e, portanto, para a construção progressiva
de uma práxis escolar na formação de educadores.
Um terço dos resumos relaciona a formação
com questões de saúde, mas poucos especificam
o tipo de deficiência em foco. A maior parte
(n=5) se refere à deficiência visual. Talvez o
modelo médico-psicológico não seja tão evi-
dente nestas pesquisas. É emergente que se
compreenda o paradigma da inclusão a partir
de temas mais gerais, tais como a diferença, o
preconceito, antes de poder lidar com as espe-
cificidades da deficiência, ou seja, da educação
escolar da pessoa com deficiência na perspec-
tiva da educação inclusiva.
Com relação aos resumos estudados, apenas
4 explicitam o referencial e 5 deles definem o
método como teórico. Qual a razão dessa peque-
na preocupação com aspectos tão importantes
da pesquisa? O método não foi explicitado em
seis estudos analisados. Por que os resumos não
expressam elementos tão relevantes?
Quanto ao processo de formação dos pro-
fessores sobre a inserção dos deficientes no
ambiente escolar, a discussão ainda se mantém
de forma generalista, preparando-os para as
questões gerais relacionadas à inclusão, não
aprofundando as diferenças específicas para
inclusão das várias deficiências.
O conteúdo dos resumos não fornece ele-
mentos suficientes para uma análise aprofun-
dada, porém a continuidade natural dessa pes-
quisa é a análise do texto na íntegra. Tal análise
possibilitará compreender a relação entre a
expressão da produção científica acadêmica
e a produção de documentos que configuram
as diretrizes das políticas públicas de inclusão
e o problema da relação entre o currículo e a
organização dos espaços e tempos escolares.

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
414
REFERÊNCIAS
1. Ferreira NS. As pesquisas denominadas “es-
tado da arte”. Rev Educ Soc. 2002;79:257-
72.
2. Morosini MC. Educação superior em perió-
dicos nacionais (1968-1995). Série Estado do
Conhecimento, nº 3. Brasília: MEC/INEP/
Comped; 2001.
3. Haddad S. Educação de jovens e adultos
no Brasil (1986-1998). Série Estado do
Conhecimento, n. 8. Brasília: MEC/Inep/
Comped; 2002.
4. Castro MLS, Werle FOC. Estado do conhe-
cimento em Administração da Educação:
uma análise dos artigos publicados em pe-
riódicos nacionais 1982-2000. Ensaio: Aval
Pol Públ Educ. 2004;12(45):1045-64.
5. Morosini MC. Estado do conhecimento sobre
internacionalização da educação superior:
conceitos e práticas. Educar. 2006;28:107-24.
6. Pérez SGPB, Freitas SN. Estado do conheci-
mento na área de altas habilidades/ super-
dotação no Brasil: uma análise das últimas
décadas. In: Caxambu:32a reunião anual da
ANPED;2009.
7. André MED. A produção acadêmica sobre
formação de professores: um estudo compa-
rativo das dissertações e teses defendidas
nos anos 1990 e 2000. Form Doc. 2009; 1
(1). Disponível em: http://formacaodocente.
autenticaeditora.com.br/artigo/exibir/1/7/1
Acesso em: 10/9/2010
8. Brzezinski I. Pesquisa sobre formação de
profissionais da educação no GT 8/Anped:
SUMMARY
Teacher education and school inclusion of deficient people: analysis of
SciELO articles’ abstracts
Objective: The objective of this paper is to present a bibliographic
review of articles that deal with the theme of teacher education for the
inclusion of deficient people in schools, using abstracts of articles published
in SciELO website up to the first semester of 2010. Methods: We used the
descriptors combining three keywords and their derivatives: teachers,
inclusion in school and formation. Then it was analyzed the following:
institution of the authors, periodicals that published the article, year of
publishing, keywords, theme or problem the article deals with, objective,
types of deficiency, theoretical references, instruments, subjects, results,
and conclusions. Results: Concerning the formation of educational
professionals it seems to prevail a valorization of continuous formation,
although a preoccupation with initial formation stars to come about. The
abstracts’ analyses indicate the presence of formative actions based in
processes of development and learning of educators meantime the technical
rationality could still be found. About the process of teacher formation
concerning the insertion of deficient people in the school environment, the
discussion remains generalist. As a follow-up of this research we intend
to analyze the entirety of the articles. Such an analysis will enable us to
understand the relation between the expression of the scientific academic
production and the documents of public policies parameters for inclusion
as well as the relation between the curriculum and the organization of
space and time at school.
KEY WORDS: Faculty. Inclusion in school. Disabled persons.

Formação de professores e inclusão escolar
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
415
travessia histórica. Form Doc. 2009;1(1).
Disponível em: http://formacaodocente.au-
tenticaeditora.com.br/artigo/exibir/1/6/1
Acesso em: 10/9/2010
9. Freire P. Pedagogia da autonomia. 40ª ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra;2009.
10. Brasil. Constituição da República Federati-
va do Brasil. Brasília: República Federativa
do Brasil;1988.
11. Brasil. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Brasília: MEC;1996.
12. Brasil. Parâmetros curriculares nacionais:
Adaptações Curriculares / Secretaria de Edu-
cação Fundamental. Secretaria de Educação
Especial. Brasília: MEC / SEF/SEESP; 1998.
13. Brasil. Resolução CNE/CEB Nº 2, de 11 de
setembro de 2001. Institui Diretrizes Nacio-
nais para a Educação Especial na Educação
Básica. Brasília: MEC; 2001.
14. Brasil. Resolução CEB Nº 2, de 19 de abril
de 1999. Institui Diretrizes Curriculares Na-
cionais para a Formação de Docentes da
Educação Infantil e dos anos iniciais do En-
sino Fundamental. Brasília: MEC; 1999.
15. Brasil. Parecer CNE/CP nº 9, de 8 de maio
de 2001. Institui Diretrizes Curriculares Na-
cionais para a Formação de Professores da
Educação Básica, em nível superior, curso
de licenciatura, de graduação plena. Brasí-
lia: MEC; 2001. (Instituída pela Resolução
CNE/CP nº 1, de 18 de fevereiro de 2002).
16 . Brasil. Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de
maio de 2006. Institui Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Graduação em Pe-
dagogia, licenciatura. Brasília: MEC; 2006.
17. Brasil. Política Nacional de Educação Espe-
cial na perspectiva da educação inclusiva.
Documento elaborado pelo Grupo de Tra-
balho nomeado pela Portaria Ministerial nº
555, de 5 de junho de 2007, prorrogada pela
Portaria nº 948, de 9 de outubro de 2007.
Brasília: MEC; 2008.
18. Brasil. Resolução nº 4, de 2 de outubro de
2009. Institui Diretrizes Operacionais para o
Atendimento Educacional Especializado na
Educação. Brasília: MEC;2009.
19. Nóvoa A. Formação de professores e profissão
docente In: Nóvoa A, org. Os professores e sua
formação. Lisboa: Dom Quixote; 1997. p.15-34.
20. Silva AR, Castro AMDA. Formação con­
tinua­da de professores: uma nova configu-
ração a partir da lógica do mercado. Quaes-
tio. 2008;10(1/2):185-208.
21. Brzezinski I. Políticas contemporâneas de
formação de professores para os anos ini-
ciais do ensino fundamental. Educ Soc.
2008;29(105):1139-66.
22. Zeichner KM. A formação reflexiva de pro-
fessores: idéias e práticas. Lisboa-Portugal:
Educa;1993.
23. Schön DA. Educando o profissional reflexi-
vo: um novo design para o ensino e a apren-
dizagem. Porto Alegre: Artmed; 2000. 256p.
24. Meneses CMA. Educação continuada de
educadores: superando ambiguidades con-
ceituais. Revista da FAEEBA, Educação e
contemporaneidade 2003;12(20):311-20.
25. Marin AJ. Educação continuada: introdução
a uma análise de termos e concepções. In:
Collares CAL, Moysès MAA, eds. Educação
continuada. São Paulo:CEDES;1995.
26. Candau VM. Formação continuada de pro-
fessores: tendências atuais. In: Candau VM,
ed. Magistério: construção cotidiana. Rio de
Janeiro: Vozes;2003.
27. Freire, P. Política e educação. São Paulo:
Cortez;1997.
28. Molina R, Lima SML. Desenvolvimento e
aprendizagem profissional da docência: no-
vos conceitos, outros caminhos. Rev Educ.
2008;1:89-108.
29. García CM. Pesquisa sobre formação de
professores: o conhecimento sobre aprender
a ensinar. Rev Bras Educ. 1998;9:51-75.
30. Aguiar JS, Duarte E. Educação inclusiva:
um estudo na área da educação física. Rev
Bras Educ Espec. 2005;11(2):223-40.
31. Camargo EP, Nardi R. Dificuldades e alter-
nativas encontradas por licenciandos para
o planejamento de atividades de ensino de
óptica para alunos com deficiência visual.
Rev Bras Ensino Fís. 2007;29(1):115-26.
32. Cartolano MTP. Formação do educador no
curso de pedagogia: a educação especial.
Cad CEDES. 1998;19(46):29-40.
33. Dall’aqua MF, Takiuchi N, Zorzi JL. Efe-
tividade de um treinamento de professo-
res de uma escola de educação especial
usando os princípios dos métodos Hanen
e V.O.E.: veja, ouça e espere. Rev CEFAC.
2008;10(4):433-42.
34. Dall’acqua MJC. Atuação de professores do
ensino itinerante face à inclusão de crianças

Araújo MV et al.
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 405-16
416
com baixa visão na educação infantil. Pai-
déia. 2007;17(36):115-22.
35. Franco M. Educação superior bilíngue para
surdos: o sentido da política inclusiva como
espaço da liberdade: primeiras aproxima-
ções. Rev Bras Educ Espec. 2009;15(1):15-30.
36. Gasparetto MERF, Temporini ER, Carva-
lho KMM, Kara-José N. O aluno portador
de visão subnormal na escola regular: de-
safio para o professor? Arq Bras Oftalmol.
2001;64(1):45-51.
37. Leite LP, Aranha MSF. Intervenção refle-
xiva: instrumento de formação continua-
da do educador especial. Psic Teor Pesq.
2005;21(2):207-15.
38. Marquezine MC, Tramontina VM. Produ-
ção científica dos alunos egressos do cur-
so de especialização da Universidade Es-
tadual de Londrina. Rev Bras Educ Espec.
2006;12(1):101-22.
39. Michels MH. Gestão, formação docente e in-
clusão: eixos da reforma educacional brasi-
leira que atribuem contornos à organização
escolar. Rev Bras Educ. 2006;11(33):406-23.
40. Michels MH. Paradoxos da formação de
professores para a Educação Especial: o
currículo como expressão da reiteração do
Trabalho realizado na Universidade Presbiteriana
Mackenzie, Centro de Ciências Biológicas e da
Saúde, Programa de Pós-Graduação em Distúrbios
do Desenvolvimento, São Paulo, SP, Brasil.
Apoio Financeiro: Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 31/8/2010
Aprovado: 3/11/2010
modelo médico-psicológico. Rev Bras Educ
Espec. 2005;11(2):255-72.
41. Omote S, Oliveira AAS, Baleotti LR, Martins
SESO. Mudança de atitudes sociais em rela-
ção à inclusão. Paidéia. 2005;15(32):387-96.
42. Pena FF, Rosolém FC, Alpino AMS. Contri-
buição da Fisioterapia para o bem-estar e
a participação de dois alunos com distrofia
muscular de Duchenne no ensino regular.
Rev Bras Educ Espec. 2008;14(3):447-62.
43. Peterson PJ. Inclusão nos Estados Unidos: filo-
sofia, implementação e capacitação de profes-
sores. Rev Bras Educ Espec. 2006;12(1):3-10.
44. Pletsch MD. A formação de professores para
a educação inclusiva: legislação, diretrizes
políticas e resultados de pesquisas. Educ
Ver. 2009;33:143-56.
45. Silva SC, Aranha MSF. Interação entre pro-
fessora e alunos em salas de aula com pro-
posta pedagógica de educação inclusiva.
Rev Bras Educ Espec. 2005;11(3):373-94.
46. Vitaliano CR. Análise da necessidade de pre-
paração pedagógica de professores de cur-
sos de licenciatura para inclusão de alunos
com necessidades educacionais especiais.
Rev Bras Educ Espec 2007;13(3):399-414.
47. Wataya RS. O uso de leitores de tela no Te-
lEduc. Interface. 2006;10(19): 227-42.

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
417
ARTIGO DE REVISÃO
RESUMO – No complexo processo que envolve a aprendizagem,
revela-se significante a atuação preventiva do psicopedagogo no contexto
escolar, onde muitas informações e vários aspectos têm que ser observados
e analisados. Ter conhecimento de como o aluno constrói o seu saber,
compreender as dimensões das relações com a escola, com os professores,
com o conteúdo e relacioná-los aos aspectos afetivos e cognitivos, permite
um fazer mais fidedigno ao psicopedagogo. Deve-se considerar que o
desenvolvimento do aprendente se dá de forma harmoniosa e equilibrada
nas diferentes condições orgânica, emocional, cognitiva e social.
UNITERMOS: Instituições acadêmicas. Psicopedagogia. Família.
Atuação psicopedagógica no contexto
escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Idalina Amélia Mota Pontes
Idalina Amélia Mota Pontes – Graduada em Pedagogia
com Habilitação em Administração Escolar pela
Universidade Estadual do Ceará; Especialista em
Psicopedagogia pela Faculdade Christus, Fortaleza, CE.
Correspondência Idalina Amélia Mota Pontes
Fortaleza, CE, Brasil

Pontes IAM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
418
INTRODUÇÃO
A modernização do sistema educativo,
atual, passa por uma descentralização e por
um investimento das escolas como espaços de
formação e não de frustração. Um dos primei-
ros passos do psicopedagogo seria realizar um
diagnóstico buscando a história da escola, para
entender melhor sobre a rede de movimentos e
a identidade dessa instituição. Estabelecendo a
partir daí um trabalho de ação preventiva que
amenize ou impeça as dificuldades de apren-
dizagem, articulando uma postura de diálogos
e contribuindo para que as mudanças possam
acontecer na comunidade escolar.
DIAGNOSTICANDO NA INSTITUIÇÃO
ESCOLAR
A atuação psicopedagógica na escola implica
num trabalho de caráter preventivo e de asses-
soramento no contexto educacional.
Segundo Bossa
1
, “pensar a escola à luz da
Psicopedagogia, significa analisar um processo
que inclui questões metodológicas, relacionais e
sócio-culturais, englobando o ponto de vista de
quem ensina e de quem aprende, abrangendo a
participação da família e da sociedade”.
No diagnóstico psicopedagógico, é essencial
que se considere as relações entre produção es-
colar e as oportunidades reais que a sociedade
dá às diversas classes sociais. A escola e a socie-
dade não podem ser vistas isoladamente, pois o
sistema de ensino (público ou privado) reflete a
sociedade na qual está inserido. Observa-se que
alunos de baixa renda ainda são estigmatizados,
na questão do aprendizado, como deficientes.
Ao chegar numa instituição escolar, muitos
acreditam que o psicopedagogo vai solucionar
todos os problemas existentes (dificuldade de
aprendizagem, evasão, indisciplina, desestímu-
lo docente, entre outros). No entanto, o psico-
pedagogo não vem com as respostas prontas. O
que vai acontecer será um trabalho de equipe,
em parceria com todos que fazem a escola
(gestores, equipe técnica, professores, alunos,
pessoal de apoio, família). O psicopedagogo
entra na escola para ver o “todo” da instituição.
Barbosa
2
afirma que “a escola caracteriza-se
como um espaço concebido para realização do
processo de ensino/aprendizagem do conhe-
cimento historicamente construído; lugar no
qual, muitas vezes, os desequilíbrios não são
compreendidos”.
A aprendizagem escolar, durante várias dé-
cadas, foi vista como algo distante do prazer e
entendida como um mal necessário.
Então, o grande desafio das escolas, nos dias
de hoje, é despertar o desejo dos alunos para
que possam sentir prazer no aprender.
A opinião de Barbosa
2
é clara quando argu-
menta que:
“Transformar a aprendizagem em pra-
zer não significa realizar uma atividade
prazerosa, e sim descobrir o prazer no
ato de: construir ou de desconstruir o
conhecimento; transformar ou ampliar
o que se sabe; relacionar conhecimentos
entre si e com vida; ser co-autor ou autor
do conhecimento; permitir-se experi-
mentar diante de hipóteses; partir de um
contexto para a descontextualização e
vice-versa; operar sobre o conhecimento
já existente; buscar o saber a partir do
não saber; compartilhar suas descober-
tas; integrar ação, emoção e cognição;
usar a reflexão sobre o conhecimento
e a realidade; conhecer a história para
criar novas possibilidades”.
Barbosa
2
ressalta, ainda, que “a Psicopeda-
gogia, como área que estuda o processo ensino/
aprendizagem, pode contribuir com a escola na
missão de resgate do prazer no ato de aprender
e da aprendizagem nas situações prazerosas”.
O psicopedagogo sabe que para aprender
são necessárias condições cognitivas (abordar o
conhecimento), afetivas (estabelecer vínculos),
criativas (colocar em prática) e associativas
(para socializar).
Deve-se estar atento frente às grandes mu-
danças que ocorreram nas propostas educacio-
nais. Atualmente, o conhecimento científico só
tem sentido se for ligado ao social, engajado ao
cotidiano, onde através dele se possa encontrar

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
419
soluções. A reforma educacional brasileira é
extremamente exigente. Os paradigmas dessa
reforma estão centrados na verdade aberta,
no conhecimento múltiplo, transdisciplinar. As
mudanças não acontecem na mesma proporção,
nem na mesma velocidade. A apropriação leva
um tempo até ser introspectada, compreendida
e colocada em prática. As mudanças (a intro-
dução no novo) num ambiente escolar têm que
ser escalonadas e sucessivas, priorizando-se e
hierarquizando-se as ações.
O velho paradigma de que muitos são
oriundos apresenta uma escola cartesiana,
fragmentada, de pensamento dominante, com
verdades absolutas (fechadas), reprodução do
conhecimento. O grande problema da escola é
que ela dá um conteúdo e exige resposta “úni-
ca”. Analogicamente falando, a escola procede
da seguinte forma: um grupo de crianças vai
andando pela calçada e, de repente, depara-se
com um cavalete obstruindo a passagem. Daí,
a escola adianta-se e retira o cavalete do meio
ou manda que todos passem por baixo. Agindo
assim, não permite que a criança descubra o que
fazer para transpor o obstáculo. Ela poderia ter
a ideia de passar por baixo, escalá-lo, passar do
lado, retirá-lo ou outras. No entanto, a escola
impede o aluno de levantar hipóteses, de trans-
gredir. Existem várias formas de se responder a
uma questão ou vários caminhos de se chegar a
ela, pois não existem respostas “prontas”.
Como declara Barbosa
2
:
“É tarefa difícil para o professor pro-
vocar a inquietação num sistema tradi-
cional, em que não é permitido ousar,
ser artista ou cientista, e sim no qual a
reprodução, apesar de todos os discur-
sos modernos, continua sendo o objetivo
principal de nossas escolas”.
Hoje, na escola, tem que haver partilha, co-
operação, questionamento, reflexão, oportuni-
dade do outro se colocar – o processo é coletivo.
Para que o psicopedagogo realize um diag-
nóstico numa instituição escolar, sugere-se que
se observem as características organizacionais,
bem como a abordagem da cultura da escola
3
.
Quando o psicopedagogo entra numa escola,
muitas coisas têm que ser levadas em conta,
pois, por trás de uma fachada, pode-se encon-
trar uma escola “desorganizada”. Diretor pouco
envolvido com o trabalho, professores pouco
motivados (dão aulas de acordo com o salário
que recebem). Então, qual a cultura que está
por trás dessa situação? Situações assim, não são
fáceis de se perceber, porque não são visíveis.
Ou seja, as bases conceptuais da escola estão
inseridas numa zona de invisibilidade (não está
explícito). Uma das bases é a “cultura”, que
exprime valores, crenças e ideais de um grupo.
Isso significa dizer, que as escolas produzem
uma cultura que lhe é própria. A cultura não
é um sistema de ligações, mas uma rede de
movimentos, numa perspectiva interacionista.
Esse seria o primeiro passo a se tomar, ou
seja, buscar a história dessa instituição para pro-
curar entender como acontece o seu movimento.
O psicopedagogo tem que tomar conhecimento
do documento que dar o perfil que identifica a
escola – o Projeto Político Pedagógico (PPP), que
é uma obrigação de toda escola. O PPP é quem
comanda a energia e a vida da escola. Os profes-
sores, principalmente, têm que conhecê-lo, até
para saber com o que eles estão compactuando.
Realizar o PPP de forma coletiva é trabalho-
so: ouvir os outros, refletir com os outros. O que
de fato acaba acontecendo em muitas escolas
é a direção convocar apenas a equipe técnica
para montar o PPP, sem a participação dos pro-
fessores. Deve-se romper com essa postura do
trabalho “solitário”. Tem-se que dar espaço para
que todos possam discutir, interagir, modificar,
construir. Muitas vezes, até o diretor resolve
fazê-lo sozinho ou “copiar” de algum colega.
Mas, se o PPP identifica a escola, não poderá
ser copiado, pois cada escola tem suas caracte-
rísticas próprias, até mesmo o meio onde está
inserida – a realidade de cada escola é diferente,
tem suas peculiaridades.
Quando o diretor da escola não sabe montar
o PPP, poderá contratar um serviço de assesso-
ria, para orientá-lo na elaboração, através de
dados e informações (filosofia, meio em que

Pontes IAM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
420
está inserida, tipo de clientela que atende,
aspectos pedagógicos) fornecidos de acordo
com a realidade da escola. Sua estrutura física:
prédio, dimensão e organização dos espaços,
recursos materiais; estrutura administrativa:
gestão (direção), equipe técnica, corpo discente
e docente, pessoal auxiliar, tomadas de deci-
sões, participação da comunidade, relação com
as autoridades centrais e locais (Secretarias de
Educação); estrutura social: relação entre alu-
nos, professores e funcionários, responsabilida-
de e participação dos pais, democracia interna,
cultura organizacional da escola, clima social.
A modernização do sistema educativo passa
pela descentralização e por um investimento das
escolas como lugar de formação.
Como declara Bassedas
4
:
“A escola, como instituição social, pode
ser considerada de forma ampla e, de
acordo com a teoria sistêmica, como um
sistema aberto que compartilha funções
e que se inter-relaciona com outros
sistemas que integram todo o contexto
social. Entre esses sistemas, o familiar é
o que adquire o papel mais relevante à
educação e assim, na atualidade, vemos
a escola e a família em inter-relação
contínua, mesmo que nem sempre
sejam obtidas atuações adequadas, já
que, muitas vezes, agem como sistemas
contrapostos mais do que como sistemas
complementares”.
Dentro do sistema escolar existem vários
subsistemas que entre si interagem, numa rede
de movimentos, onde a informação deve circular
em todas as direções, contemplando o sistema
como um todo.
O tipo de escola onde todas as decisões
têm que passar por uma única pessoa torna o
trabalho amarrado, preso. Tem que haver des-
centralização do poder para que o sistema possa
fluir e, para isso, todos os subsistemas têm que
se interagir mutuamente.
O poder de decisão tem que estar mais pró-
ximo dos centros de intervenção, responsabili-
zando diretamente os atores educativos. Assim,
na ausência do diretor, não há necessidade de
esperar que o mesmo chegue para que se to-
mem certas decisões. Dentro da escola deverá
ter uma pessoa que se responsabilize e tome as
iniciativas inerentes a cada setor.
O papel dos estabelecimentos de ensino
como organizações funciona numa tensão di-
nâmica (a interrelação não é estática): entre a
produção e a reprodução; entre a liberdade e a
responsabilidade.
O psicopedagogo vai questionar o que mais
está acontecendo na escola: produção ou re-
produção do conhecimento? Sabe-se que existe
a reprodução do conhecimento, mas a escola
tem que garantir um espaço para a produção
do mesmo.
Qual o espaço de construção, de produção
que o professor tem na escola? Muitos profes-
sores aproveitam para se acomodarem atrás
do discurso de “não poder fugir do programa”.
Esse professor não foi estimulado a criar conhe-
cimento, ou seja, enquanto aluno não teve essa
matriz. Quem passou por uma escola que deu
espaço para a produção do pensamento?
Quanto à questão da liberdade em sala de
aula, o professor pode ministrar o conteúdo
da forma que achar conveniente. Só que essa
liberdade está atrelada ao sentido de auto-
nomia, que implica numa responsabilidade.
Então, o professor tem que usar essa liberdade
e autonomia, para poder propiciar muito mais
a questão da produção ou criação. O professor
resiste à mudança em sua forma de ministrar
aula com medo de não dar certo – essa dúvida o
impede de mudar. Quando o professor perceber
que, além de ensinar, tem que aprender como é
que se aprende, sua postura transformar-se-á.
De acordo com Nóvoa
3
, o olhar centrado nas
organizações escolares deve contextualizar to-
das as instâncias e dimensões presentes no ato
educativo. Para haver a compreensão é necessá-
rio que haja contextualização. O contexto ajuda
a entender e a explicar o que está acontecendo.
Na perspectiva de Nóvoa
3
, a capacidade
integradora pode conceder à análise das organi-
zações escolares um papel crítico e estimulante,

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
421
evitando uma assimilação tecnocrática ou um
esvaziamento cultural e simbólico.
Isso quer dizer que, quanto mais desintegra-
dos forem os subsistemas, menos entrosamento
vai existir neles. Nesse clima de desintegração,
vai acontecer esvaziamento cultural e simbó-
lico (empobrecimento e perda da capacidade
de simbolizar o conhecimento de outra forma,
em outras situações), por exemplo, quando o
professor fica amarrado ao planejamento, bem
como, quando ocorre uma assimilação exces-
sivamente tecnocrática (os diretores têm que
tomar decisões autoritárias).
Para fazer um diagnóstico institucional, o
psicopedagogo vai questionar como se realiza
a gestão na escola. Se realmente existe demo-
cracia. Como fluem as relações. São aspectos
que o psicopedagogo terá que observar. E isso
não é pouca coisa, é muita coisa!
A institucionalização dá-se de forma proces-
sual, ou seja, não acontece de uma hora para
outra. É toda uma história, todo um caminho,
que vai obter um resultado bom ou ruim, mais
ou menos aceitável. É esse processo de insti-
tucionalização que vai viabilizar as mudanças
organizacionais, podendo também ser de ma-
neira negativa ou positiva.
A cultura é fruto de uma rede de movimen-
tos, ou seja, daquelas interações entre os subsis-
temas de um sistema. É esse funcionamento que
vai possibilitar o processo de institucionalização.
Caso a rede não funcione ou não seja realmente
uma rede (apenas se faz mera aplicações entre
os subsistemas), tornar-se-á truncada, deixando
de gerar mudanças substanciais.
Não resta dúvidas de que há resistência às
mudanças, pois é algo que dá trabalho, que “de-
sequilibra” e têm algumas que ameaçam mais,
exigem mais esforço, demandam mais tempo.
O professor está acostumado com a sua prática
cotidiana engessada, não quer mudar, pois do
jeito que está sempre deu certo, porque mudar
assusta, é trabalhoso (tem que estudar mais,
buscar coisas para alterar o seu planejamento).
Então, entra numa identidade que a Psicologia
Social chama de “identidade da mesmice”.
Bassedas
4
destaca que “é importante assi-
nalar que em todos os sistemas abertos existem
sempre tendências contrapostas à estabilidade
e à mudança”.
Enfatiza, ainda, Bassedas
4
que:
“Geralmente, os sistemas tentam man-
ter um equilíbrio entre as tendências
que produzem uma transformação e
aquelas que tendem à manutenção da
estabilidade, com a finalidade de con-
seguir uma homeostase, um equilíbrio
que lhe permita “sobreviver”.
O psicopedagogo é chamado justamente
para ver o que está acontecendo com aquela
escola, porque a rede de movimento não está
funcionando e por essa razão as mudanças não
estão ocorrendo.
Uma das características de um sistema, seja
ele qual for, é de manter a homeostase, isto é,
o movimento de equilíbrio. Às vezes, o que é
o equilíbrio? É uma situação de comodidade,
parada. E se alguém propõe uma mudança,
gera o desequilíbrio. Daí se perde esse aparente
equilíbrio, o que manifesta uma inquietação.
Como é esse olhar da mudança na escola?
Sabe-se que a maioria das escolas não é essa
maravilha de rede de movimentos. O desafio do
psicopedagogo é mobilizar para que haja esse
movimento, para que a mudança consiga ocorrer.
Na instituição escolar algumas “manifesta-
ções” são identificadas e acabam por retratarem
o que se passa no ambiente escolar
3
. Essas ma-
nifestações serão melhor explicadas a seguir.
As manifestações verbais e conceptuais
compreendem os “heróis” (que pode ser bom ou
ruim) e as “histórias”, ou seja, é a identificação
de mitos (algo inatingível) e das narrativas, que
marcam a vida da escola.
No diagnóstico, o psicopedagogo terá que
indagar que narrativas são essas e como vai
identificar heróis, mitos e crenças.
O que é o mito? O mito do incompetente
ou do supercompetente. O mito do bicho pa-
pão, que pode ser o bode expiatório da escola.
Quando alguém chega para o psicopedagogo
e diz que quando for falar com o diretor, por

Pontes IAM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
422
exemplo, deve ir bem preparado para essa oca-
sião. Observa-se aí, o mito (diretor) e a narrativa
(advertência). Então, são essas narrativas que
têm que fluir para que o psicopedagogo entre
em contato. Assim, poderá ajudar o grupo a
desconstruir o mito e entrar em contato com
o personagem. Quando se coloca alguém que
pertence à relação numa posição de mito, a
atuação inviabiliza-se.
As manifestações visuais e simbólicas são os
elementos que têm uma forma material passível,
portanto, de serem identificados através de uma
observação ocular. São os murais, os painéis, os
cartazes feitos pelos alunos.
Como a escola lida e dá vazão a essas mani-
festações visuais? Por meio da semana esportiva
e cultural, das olimpíadas, da semana da leitura,
do uso do laboratório de ciências e informática,
das oficinas. Essas atividades estão na zona da
visibilidade. Então, o que o psicopedagogo vê,
o que isso lhe conta.
As manifestações comportamentais são os
elementos susceptíveis de influenciar o com-
portamento dos atores da organização: as ati-
vidades normais da escola e o modo como são
desempenhadas, bem como, o conjunto de nor-
mas e regulamentos que as orientam. Incluem-
se aqui os rituais e cerimônias que fazem parte
da vida organizacional da instituição.
São, por exemplo, a realização de acolhidas
ou não; o uso de filas ou não; a prática da reza
ou não. As reuniões são sistemáticas ou esporá-
dicas? Os professores queixam-se das reuniões
que são demais ou que são de menos? Tudo
isso são manifestações comportamentais. O
psicopedagogo vai ponderar essas possibilida-
des na instituição, ou seja, se deseja fazer essa
construção ou se naquele momento a escola
externa que não tem condições, procrastinando
por um momento mais adequado.
Os elementos da cultura organizacional têm
de ser lidos na sua interioridade, mas também
nas interrelações com a comunidade envolven-
te. Se a cultura tem um papel de integração, é
também um fator de diferenciação externa. Há
de se identificar (ou construir) as modalidades
de integração com o meio social. Por exemplo,
um projeto pedagógico onde os pais e a comuni-
dade contribuam para ajudar pessoas carentes.
Como afirma Enguita (apud Goméz & Sa-
cristan
5
, 1998:
“A escola é uma trama de relações
sociais materiais que organizam a ex-
periência cotidiana e pessoal do aluno/a
com a mesma força ou mais que as re-
lações de produção podem organizar as
do operário na oficina ou as do pequeno
produtor no mercado. Por que então
continuar olhando o espaço escolar
como se nele não houvesse outra coisa
em que se fixar além das idéias que se
transmitem?”
A escola não deixa de ser uma comunidade
em si mesma, que estabeleceu ao longo de sua
história relações de afeto entre professores e
alunos, entre seus membros e a família. O ob-
jetivo em comum que se observa na escola está
voltado para a família, bem como, estabelecer
condições favoráveis ao desenvolvimento inte-
gral dos alunos (dos filhos).
O psicopedagogo vai fazer uma “leitura”
nas entrelinhas, das narrativas, do currículo
oculto, da dinâmica entre os atores da escola,
das possibilidades de mudança, da necessidade
de ajuda, dos trabalhos realizados, das dificul-
dades detectadas, dos vínculos estabelecidos,
dos comportamentos e atitudes.
Concorda Bassedas
4
que a observação “é
considerada um recurso muito peculiar do diag-
nóstico psicopedagógico”.
Então, no diagnóstico, a observação é um
instrumento que o psicopedagogo utiliza-se
para atuar na instituição escolar. Porque, na
escola, o psicopedagogo não vai fazer testes com
os alunos, nem com ninguém. Além de conside-
rar os aspectos de comunicação e interação es-
senciais para o processo de aprendizagem. É por
essa razão que a observação é fator primordial.
Na instituição escolar, observa-se que ora
se é depositante, ora se é depositário. Esse mo-
vimento de depósito começa na família, com o
projeto inconsciente dos pais, que acabam por

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
423
marcar um lugar para cada um de seus filhos,
conforme as necessidades que, imaginariamen-
te, o grupo primário (família) pretende preen-
cher com aquele que chega
6
.
Segundo Pichon-Rivière (apud Grossi & Bor-
din
6
), “a estrutura dos grupos se compõe pela
dinâmica dos 3D. O depositado, o depositário
e o depositante”.
Em termos diagnósticos na instituição, o
psicopedagogo deve tentar detectar quais são
esses elementos: depositados - expectativas,
alegrias, medos, confiança, frustrações, triste-
zas; depositários - aluno/família, filho/escola
(professor), professor (escola)/pais; depositantes
- escola (professor), família, aluno.
É a partir do diagnóstico realizado que o
psicopedagogo poderá propor e executar a sua
intervenção. E a meta da intervenção psico-
pedagógica é a construção de uma identidade
própria da escola.
Trabalhar em co-responsabilidade, vislum-
brando uma proposta transdisciplinar requer,
principalmente, predisposição às trocas e pre-
paro para o diálogo.
INTERVENÇÃO NA ESCOLA: UM OLHAR
PSICOPEDAGÓGICO
O objeto de estudo da Psicopedagogia é
sempre o sujeito aprendente e esta aprendi-
zagem está sempre relacionada com o próprio
sujeito, com o sujeito e o objeto, com o sujeito
e o meio, portanto sistematicamente. Isto quer
dizer que o psicopedagogo está comprometido
com qualquer modalidade de aprendizagem e
de ensino e não só a exercida na escola.
Cabe ao psicopedagogo entender como se
constitui o sujeito, como este se transforma em
suas diversas etapas de vida, quais os recursos
de conhecimento de que ele dispõe e a forma
pela qual produz conhecimento e aprende em
relação ao grupo e sua reação frente a este.
O impedimento para aprender não está
atrelado aos fatores orgânicos, mas, também
ao estado emocional, que determina e permeia
todo tipo de relação, sendo esta uma proposta
educacional ou não.
A atuação psicopedagógica tem como base o
pensar, a forma como o aprendente pensa e não
propriamente o que aprende. É buscar compre-
ender como eles utilizam os elementos do seu
sistema cognitivo e emocional para aprender.
Na escola, a tarefa do psicopedagogo visa
fortalecer a identidade da instituição, bem como
resgatar suas raízes, ao mesmo tempo em que pro-
cura sintonizá-la com a realidade que está sendo
vivenciada no momento histórico atual, buscando
adequá-la às reais demandas da sociedade.
A intervenção psicopedagógica vem, no
curso de sua história, acontecendo na assistên-
cia às pessoas que apresentam dificuldades de
aprendizagem, por meio do diagnóstico e da
terapêutica. Frente ao desempenho acadêmico
insatisfatório e com o objetivo de esclarecer a
causa das dificuldades, os alunos são encami-
nhados ao psicopedagogo, pelas escolas que
frequentam. Desde o princípio, a questão é cen-
trada no aprendente que não aprende. Agora,
a atenção do psicopedagogo não está centrada
apenas no aprendente, mas no contexto em que
se realiza a aprendizagem.
A psicopedagogia institucional está atenta
à compreensão dos mecanismos inconscientes
de uma organização, identificando sua rigidez,
bloqueios e possibilidades de aprender
7
.
Ressalta Barbosa
2
que “na instituição escolar,
convive-se com o ensinar e com o aprender de
uma forma muito dinâmica, não sendo possível,
na prática, haver uma intervenção que recaia
somente sobre o aprender”.
Barbosa
3
, ainda, complementa:
“Quando dizemos que a Psicopedago-
gia se preocupa com o ser completo,
que aprende, não podemos esquecer
que faz parte da compleitude deste ser
a capacidade de aprender em intera-
ção com aquilo ou aquele que ensina;
e que a ação de ensinar não é sempre
exercida pelo professor, assim como a
de aprender não é de responsabilidade
somente do aluno”.
O trabalho do psicopedagogo na escola é de
prevenção das dificuldades de aprendizagem.

Pontes IAM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
424
Ou seja, vai fazer um trabalho institucional: ave-
riguar a formação dos professores; o currículo
que está sendo dado e se está sendo adequado
às necessidades dos alunos. E a partir dessas
necessidades, se o professor está ou não prepa-
rado para atender ao aluno. O psicopedagogo
vai intervir na formação do professor, supervisor
ou orientador pedagógico.
Há exemplos em que os professores são mais
bem preparados que o supervisor. Então como
pode o supervisor coordenar um trabalho peda-
gógico junto aos professores, se nem ele sabe
(ou tem conhecimento) para mediar essa prática?
O papel do psicopedagogo na escola é, além
de realizar uma orientação educacional, propor
a intervenção no currículo, no projeto político
pedagógico, na metodologia de ensino do pro-
fessor, nas formas de aprender do professor.
O psicopedagogo poderá contribuir para
que haja uma boa comunicação entre escola e
família, favorecendo a um clima de confiança
e estabelecendo um elo construtivo. Pois esse
dueto nem sempre é harmônico, podendo o
psicopedagogo deparar-se com situações con-
flitantes, tensas e pouco produtivas.
Para auxiliar na aprendizagem do aluno,
faz-se necessário que os pais estejam integrados
à escola, sendo importante que ambos falem a
mesma linguagem e trabalhem em conjunto.
Barbosa
2
afirma que:
“A atuação psicopedagógica junto
a um grupo ou instituição, para ser
operante, precisa interpretar os papéis
desempenhados, a forma como foram
atribuídos e assumidos, assim como as
expectativas que se encontram latentes
neste movimento de atribuir e aceitar
o papel. [...] A tarefa de cada um deve
estar voltada para o aprender, desde a
direção até a portaria ou o serviço de
limpeza”.
Neste sentido, na instituição escolar, o
trabalho do psicopedagogo terá como meta
a integração da tarefa objetiva e subjetiva,
promovendo uma mediação que possibilite a
realização eficaz da tarefa.
Uma escola rígida aponta e delimita padrões
de comportamento. No entanto, percebe-se que,
mesmo assim, os alunos rebelam-se. Outra es-
cola que não tem tanta rigidez, pelo contrário, é
mais liberal, mais aberta, propõe-se a lidar com
os questionamentos que os alunos colocam, de
repente, fraqueja, porque está havendo muita
indisciplina, começando-se a perder o controle
da situação.
Na realidade, o sintoma está aparecendo
nas duas instituições, tanto na que assume cla-
ramente uma postura de rigidez, como naquela
que se propõe a ser liberal, democrática.
Então, é essa a questão que tem que ser ana-
lisada. Ou seja, qual o sentido que está fazendo
para os alunos essas regras tão demarcadas,
delimitadas, impostas com clareza? Como esses
alunos estão entrando em contato com isso?
A escola até que pode ser liberal, democrática,
desde que as pessoas que assumem a direção
tenham pelo menos o mínimo de controle dos
acontecimentos. A ação democrática significa está
sempre dialogando, negociando, senão perde-se
a rédea e não se consegue dar conta da situação.
Qual o sentido que esses alunos estão atri-
buindo à concepção de democracia? E para
a direção, coordenação, qual o sentido que
está fazendo esta reação dos alunos que já é
de insubordinação, de depredação da escola
(quebra, destrói, rabisca)? Então, tem-se que
ir buscar, “lá atrás”, essas reservas de sentido.
O psicopedagogo pode ajudar os que fazem a
escola a tomarem consciência desse acervo,
dessas reservas de sentido.
No trabalho com a escola, após o diagnósti-
co, o psicopedagogo vai realizar a intervenção
apoiando-se na utilização de recursos que
promovam a operatividade dos vários grupos e
instâncias da instituição.
A intervenção psicopedagógica vai fazer
com que o aprender na escola esteja sempre em
movimento, sem esquecer de acompanhar o mo-
mento histórico e prevenindo a cristalização de
vínculos, que só dificultam o desenvolvimento.
O caráter preventivo vislumbra o sentido de
reconstruir processos, definir papéis, valoriza

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
425
novos conhecimentos, novas formas de apren-
der / ensinar, novas formas de avaliar o conhe-
cimento, bem como, pessoas, papéis, processos,
produtos, objetivos
7
.
Com relação ao trabalho dos psicopedagogos
na escola, Fernández
8
ressalta que:
“[...] precisam utilizar os conhecimentos
e a atitude clínica para situarem-se em
outro lugar, diferente ao que têm no
consultório. A experiência de consul-
tório pode servi-lhes muitíssimo para
situarem-se diante de professores,
alunos e de si mesmos como alguém
que propicia espaços de autoria de
pensamento. [...] o psicopedagogo é
alguém que convoca todos a refletirem
sobre sua atividade, a reconhecerem-se
como autores, a desfrutarem o que têm
para dar. Alguém que ajuda o sujeito a
descobrir que ele pensa, embora perma-
neça muito sepultado, no fundo de cada
aluno e de cada professor. Alguém que
permita ao professor ou à professora
recordar-se de quando era menino ou
menina. Alguém que permita a cada
habitante da escola sentir a alegria de
aprender para além das exigências de
currículos e notas”.
No entanto, o psicopedagogo nunca deve
confundir “intervir” com “interferir”. No in-
tervir a intenção é de ajudar a pensar para se
alcançar a resposta. Já o interferir está centrado
na manipulação da ação do outro.
A escola tem que aprender a trabalhar com
as dificuldades, porque senão corre o risco de
cair no vício da rotulação. Ou seja, o profes-
sor detecta quinze alunos com dificuldade de
aprendizagem e já encaminha todos para a clí-
nica. Claro que não! Tem que primeiro verificar
se há outras formas de trabalharem-se os con-
teúdos. O aluno pode não está rendendo bem
nos estudos, até por um problema na dinâmica
familiar. Então, como a escola amenizaria isso?
Quando um aluno declara que não gosta de
tal professor é uma maneira do psicopedagogo,
através dessa fala, deflagrar um problema de
aprendizagem. Porque se o aluno não gosta do
professor, provavelmente, não se apropriará
da matéria. No caso de um professor cativante,
sensível, acolhedor, motivador poderá levá-lo a
entender a matéria. Mas, se o professor tem uma
característica antipática ou de indiferença, o aluno
não será motivado de forma alguma, devido a essa
postura inadequada de quem se diz educador.
Uma atividade convencional, tradicional,
quando trabalhada de forma lúdica, torna-se
mais digestiva, mais leve.
O psicopedagogo tem que se preocupar com
o que está sendo depositado e como vai fazer
para “limpar” esses depósitos. Então, simbo-
licamente, seria isso que o psicopedagogo vai
ajudar a realizar, ou seja, mediar essa limpeza.
Outro cuidado que o psicopedagogo terá que
ter é como vai agir para entender a linha de ra-
ciocínio do outro. Todo ponto de vista tem uma
origem, então o psicopedagogo terá que enten-
der de onde foi retirado e tentar compreender a
partir daí. Com essa postura não dá para taxar
de “errado” a linha de raciocínio de alguém.
Ao invés disso, deve-se sugerir que ele fale e
comente sobre sua linha de raciocínio, para que
se possa entender. Com isso o psicopedagogo
poderá argumentar que o que ele está falando
pertence a uma linha tal de raciocínio e que a
do outro já leva para um caminho diferente. Isso
nada mais é que uma abertura para a conver-
sação, para a pergunta circular.
Para Fernández
8
:
“Nossa escuta não se dirige aos conte-
údos não-aprendidos, nem aos apren-
didos, nem às operações cognitivas
não-logradas ou logradas, nem aos
condicionantes orgânicos, nem aos in-
conscientes, mas às articulações entre
essas diferentes instâncias. [...] Não se
situa no aluno, nem no professor, nem
na sociedade, nem nos meios de co-
municação como ensinantes, mas nas
múltiplas relações entre eles”.
Na realidade, a questão do fracasso escolar ou o
problema de aprendizagem sempre vão estar pre-
sentes nas instituições escolares, revelando-se com

Pontes IAM
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
426
baixo ou alto índice, de forma amena ou alarmante,
com um discurso camuflado ou tangencial, apon-
tando “culpados” ou rotulado comportamentos.
O psicopedagogo deverá trabalhar todas
as questões que obstaculizam o ensinar e o
aprender no “entre”, interagindo, vinculando,
articulando e cuidando.
CONCLUSÃO
Alguns paradigmas existentes na escola
devem ser repensados. A escola deve ter: uma
política de igualdade, que garanta oportunida-
des; ética da identidade, para afirmar-se na sua
individualidade e saber respeitar a diversidade
do outro; estética da sensibilidade, proporcio-
nando o interagir. E é nesse contexto que entra
o trabalho do psicopedagogo como articulador
e promotor de ações que gerem mudanças,
mesmo que de início sejam acanhadas, mas
que, dentre outras, principalmente, minimizem
os problemas relativos à aprendizagem.
O psicopedagogo tem que se autorizar sair
da acomodação e questionar os anseios e as
expectativas em relação à própria formação, ao
seu trabalho, a sua vida.
O olhar psicopedagógico tem que está diri-
gido à individualidade do aluno, bem como sua
atuação em grupo. Há a necessidade de tirar
o professor de um lugar que o considera sim-
plesmente como um transmissor de informação,
fato este que é abraçado por vários docentes.
Precisa-se preencher as lacunas da formação do
professor, não por meio de receitas prontas, mas
de cursos de formação continuada, vislumbran-
do uma visão de homem como sujeito pensante
e desejante.
Não existem fórmulas mágicas, prontas para
se vencer as dificuldades de aprendizagem dos
alunos. Essas dificuldades muitas vezes são
sintomas de que algo não vai bem, podendo
ser identificado e até amenizado pelo educador,
contando com o apoio do psicopedagogo.
Não existe atuação psicopedagógica na esco-
la sem a postura do ouvir, do falar e do propor.
A intervenção do psicopedagogo tem que está
regada do seu saber, da sua criatividade, da sua
perspicácia, para que tenha condições de adap-
tar o trabalho a que se propõe, de acordo com
as necessidades e possibilidades do contexto
educacional em que está atuando.
O psicopedagogo vai trabalhar de forma
preventiva para que sejam detectadas as dificul-
dades de aprendizagem, antes que os processos
se instalem, bem como, na elaboração do diag-
nóstico e trabalho conjunto com a família frente
às ocorrências provenientes das dificuldades no
processo do aprender. No entanto, não se pode
falar em aprendizagem desconsiderando-se os
aspectos relevantes na vida desse aluno que se
relaciona e troca, a partir do estabelecimento
de vínculos.
A prática psicopedagógica que respeita a
individualidade do sujeito na rotina escolar é
fundamental. A tentativa de sanar o sintoma
sem compreender suas causas não surte o efeito
desejado.

Atuação psicopedagógica no contexto escolar : manipulação , não; contribuição, sim
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 417-27
427
Trabalho realizado em Fortaleza, CE, Brasil. Artigo recebido: 9/9/2010
Aprovado: 23/11/2010
REFERÊNCIAS
1. Bossa NA. A Psicopedagogia no Brasil: con-
tribuições a partir da prática. Porto Alegre:
Artes Médicas; 1994.
2. Barbosa LMS. A Psicopedagogia no âmbito
da instituição escolar. Curitiba: Expoente;
2001.
3. Nóvoa A. As organizações escolares em
análise. Lisboa:Dom Quixote;1995.
4. Bassedas E et al. Intervenção educativa e diag-
nóstico psicopedagógico. Tradução: Neves BA.
3ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 1996.
SUMMARY
Educational psychology practice in the school framework: not to mani-
pulation, yes to contribution
The educational psychologist has a significant, preventive role in the
complex learning process within the school framework, in which much
information and many aspects must be taken into account and analyzed.
Knowing how the student builds his/her knowledge, understand the
dimensions of the relationships with the school, the teachers and the taught
contents and linking them to the affective and cognitive aspects enable
the educational psychologist to perform a more accurate work. It must be
considered that the student’s development happens in a harmonious and
balanced fashion in the different organic, emotional, cognitive and social
fields.
KEY WORDS: Schools. Psychoeducation. Family.
5. Goméz AI, Sacristan JG. Compreender e
transformar o conhecimento e a experi-
ência. 4ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas;
1998.
6. Grossi EP, Bordin J. Paixão de aprender. Pe-
trópolis: Vozes;1993.
7. Fagali HQ. Múltiplas faces do aprender: no-
vos paradigmas da pós-modernidade. 2ª ed.
São Paulo: Unidas; 2001.
8. Fernández A. O idioma do aprendente:
análise das modalidades ensinantes com
famílias, escolas e meios de comunicação.
Tradução Hickel NK. Porto Alegre: Artes
Médicas; 2001.

Witter GP
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 428-9
428
RESENHA
Geraldina Porto Witter – Doutora em Ciências, Livre-
docente em Psicologia Escolar; Professora Emérita da
UFPa, do UNIPE e da UNICASTELO, Coordenadora
Geral da Pós-Graduação Stricto Sensu da UNICASTELO
e Membro da Academia Paulista de Psicologia.
Correspondência
Geraldina Porto Witter Av. Pedroso de Moraes, 144, apto 302
Pinheiros – São Paulo, SP, Brasil – CEP 05420-000
E- mail: [email protected]
Educação à distância
Resenha: Geraldina Porto Witter

Resenha do livro: Moraes RC. Educação à distância e ensino superior: introdução didática a um tema polêmico.
São Paulo: Editora Senac; 2010. 120p
O surgimento dos microcomputadores e da
Internet ampliaram as possibilidades de atendi-
mento a segmentos maiores da população. Ao
mesmo tempo, o que pode representar uma ação
de democratização do ensino, vista por alguns
como meio de redução de custos, conforme cres-
ceu a Educação à Distância (EaD), também au-
mentaram as polêmicas decorrentes de seu uso.
O livro aqui resenhado tem por foco o uso
da EaD no Ensino Superior e as polêmicas que
emergiram. Foi escrito por Reginaldo C. Moraes,
docente da UNICAMP. Em nota da editora, há
esclarecimento de que o livro está inserido no es-
forço da mesma para, nos moldes de outros países,
contribuir com o empenho do SENAC na EaD.
A obra compreende Introdução, cinco ca-
pítulos e considerações a guisa de conclusão.
Como apêndice, apresenta três modelos de EaD
propostos em documentos da University of Ma-
ryland: Sala de aula distribuída, Aprendizado
Independente e Ensino aberto e sala de aula.
Na Introdução, o autor enfoca o que educa-
ção, desenvolvimento e inovação apresentam
em comum, que são conceitos subjacentes ao
apresentado e discutido no livro. Contrasta o
que em países carentes de desenvolvimento
não se avançou ou seguiu caminho distinto dos
países em que o ritmo do progresso foi mais
avançado e, ao mesmo tempo, mais abrangente.
O primeiro capítulo é dedicado às definições
de universidade, de ensino superior e de EaD.
São feitas apresentações sucintas, mas claras, e
ao mesmo tempo, subjacentes ficam as possibi-
lidades de variação e flexibilidade.
No capítulo seguinte, o autor trata de alguns
desenvolvimentos em EaD no exterior. É de inte-
resse especial para justificar a necessidade desta
forma de ensino-aprendizagem ao longo da vida,
face ao curto prazo de validade do conhecimento
na atualidade, decorrente do rápido evoluir das
ciências e tecnologias. Entretanto, faz alerta so-
bre pontos de estrangulamentos possíveis. Tem
por referência as universidades abertas.
O tema tem continuidade no capítulo 3, em
que faz uma apresentação de algumas experiên-
cias internacionais de EaD, apresentando van-
tagens e limitações de várias propostas, áreas
abrangidas e inovações, apresentadas de forma
objetiva. É o capítulo mais volumoso, apresen-
tando um panorama de realizações pertinentes
e indicando aspectos a requererem a atenção
dos estudiosos e pesquisadores da área, bem
como, aos que definem políticas para a área.
No penúltimo capítulo, o autor retoma a
consideração geral de que a EaD tem segui-
do quatro abordagens: histórico-descritiva,
analítico-teórica, pragmático-normativa e
apologético-promocional. Destaca-se a busca

Educação à distância
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 428-9
429
de elaboração de referenciais teóricos, o que
implica em considerar uma concepção de
aprendizagem, modelos de ensino e as caracte-
rísticas institucionais compatíveis com o que se
pretende concretizar. Há, ainda, a considerar
perspectivas diversas, a equipe, associações,
redes e pólos presenciais.
O último capítulo é voltado para aspectos
mais técnicos, concernentes à organização de
cursos em EaD, levando em consideração os
recursos disponíveis no que diz respeito às tec-
nologias e à gestão. Subjacente está a questão
de custos com desenvolvimento, implantação,
operação, manutenção e infraestrutura. Há na
literatura várias sugestões para redução e/ou
contenção de custos no que concerne ao corpo
docente, tecnologia e tamanho da turma ou clas-
se. De qualquer forma, a tendência é que o custo
de um curso tenda a se manter estável, depois
de algum tempo, a ficar progressivamente mais
barato para o aluno. Quanto maior a turma, mais
barato fica. Neste mesmo capítulo, o autor trata
de problemas de organização.
O livro se fecha com o texto Algumas con-
siderações a guisa de conclusão, apresentando
a educação como uma cadeia de valor, sendo
relevante, em sua opinião, a intervenção do se-
tor, como: formação de quadros (professores, tu-
tores, especialistas em mídia), apoio e estímulo
para a produção de material instrucional básico,
programas de estímulo e regulação, certifica-
ção, difusão dos cursos e avaliação. Fecha com
algumas sugestões do que é possível fazer nas
instituições convencionais dedicadas ao ensino
superior, entre elas estão: criação de centros de
EaD, estímulo aos docentes para uso de EaD,
previsão de recursos e apoio técnico, integração
de projetos, cuidado dos direitos autorais dos
materiais produzidos, arquivamento eficiente
do realizado, acesso a várias plataformas e
criação de banco de cadastro do realizado e dos
docentes envolvidos. São sugestões úteis para
administração e preservação da história.
É um livro de leitura útil e agradável, que
apresenta uma perspectiva geral, apontando
pontos positivos e negativos. Viabiliza ao leitor
tomar suas decisões com base em informações
bem organizadas. Certamente, é um comple-
mento apreciável para a introdução ou revisão
da matéria que conta com farta bibliografia,
conforme o leitor mais interessado poderá cons-
tatar nas bases bibliográficas.
Resenha realizada na Universidade Camilo Castelo
Branco – UNICASTELO, São Paulo, SP, Brasil.
Artigo recebido: 19/11/2010 Aprovado: 28/11/2010

Castanho MIS
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 430-2
430
RESENHA
Intervenções clínicas : ação integrada com
a Fonoaudiologia , a Psicopedagogia , a
Arteterapia , a Psicanálise e outros saberes
Marisa Irene Siqueira Castanho – Psicóloga,
psicopedagoga, doutora em Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano pelo IPUSP. Docente do
Programa de Pós-Graduação stricto sensu Mestrado
em Psicologia Educacional do Centro Universitário
FIEO – UNIFIEO. Conselheira eleita por São Paulo
da Associação Brasileira de Psicopedagogia - ABPp,
desde 1999. Pesquisadora do CNPq, autora de
artigos científicos nas temáticas da aprendizagem,
do desenvolvimento humano, da educação formal e
não-formal. Correspondência Marisa Irene Siqueira Castanho Rua Loreto, 61, apto. 81 – V. Sto. Estéfano – São Paulo,
SP, Brasil – CEP 04152-130
E- mail: [email protected]
Resenha: Marisa Irene Siqueira Castanho
Resenha do livro: Simões M. Intervenções clínicas: ação integrada com o Fonoaudiologia, a Psicopedagogia, a Arteterapia, a
Psicanálise e outros saberes. Rio de Janeiro: Wak Editora;2010.
A Psicopedagogia, área interdisciplinar de
conhecimento, prática e pesquisa, tem se conso-
lidado a partir da ação reflexiva de profissionais
engajados no atendimento de uma demanda
social e educacional cada vez mais emergente.
A especificidade da ação psicopedagógica não
se reduz a uma prática diagnóstica dos proble-
mas de aprendizagem e à aplicação de técnicas
para sanar deficiências de aprendizagem. Tal
visão reducionista orientada à normatização e
à adaptação dos indivíduos tem sido revista e
ampliada por meio de uma práxis transforma-
dora dos sujeitos envolvidos no processo.
Contra a fragmentação dos conhecimentos
e na direção da construção de uma identidade
profissional, na interface da Fonoaudiologia,
da Psicanálise, da Psicopedagogia e de outros
campos de saberes, Márcia Simões apresenta
este texto como exemplo de diálogo interdisci-
plinar. Orientada pela intuição, pela emoção e
pela razão, pelo amor e pelo respeito ao outro,
a autora expõe sua experiência sofrida e deste-
mida na busca de compreensão da manifestação
dos sintomas de dificuldade de linguagem e de
aprendizagem de um menino-adolescente.
Márcia Simões é fonoaudióloga pela Univer-
sidade de Mogi das Cruzes (SP); especialista
em Linguagem com enfoque psicanalítico pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP); psicopedagoga clínica pelo Centro
Universitário FIEO (UNIFIEO); tem licenciatura
plena em Biologia (UNIFIEO) e é mestre em
Psicologia pela Universidade São Marcos (SP).
Neste livro, Márcia apresenta o relato de um
caso de difícil quadro nosográfico, para o qual
os procedimentos adotados exigiam constante
revisão, pesquisa e atualização. Expõe o longo
percurso de estudos, reflexões e busca de par-
cerias, movida pela coragem de trilhar caminhos
desconhecidos na superação do próprio não-
saber diante do sofrimento do outro.
A obra se organiza em Introdução e 10 ca-
pítulos, além de Prefácio, Apêndice, Posfácio e
dos testemunhos de cinco dos profissionais que

Intervenções clínicas : ação integrada
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 430-2
431
atuaram no caso. O Prefácio é escrito por Quézia
Bombonatto, presidente nacional da Associação
Brasileira de Psicopedagogia, a qual ressalta a
qualidade do texto e a maneira singular como
Márcia expõe sua trajetória em direção à cons-
trução de sua identidade profissional, encontran-
do seu lugar de terapeuta e o lugar do sujeito
aprendente, desmistificando “alguns dogmas
consensuais (...) da relação terapêutica”.
No Apêndice, a autora traz uma síntese
conceitual da Distrofia Muscular Miotônica,
também conhecida como Distrofia Muscular de
Steiner ou Miotonia Atrófica, doença genética,
caracterizada pelas modificações progressivas
degenerativas das fibras esqueléticas, afetan-
do vários sistemas do organismo, entre eles,
o digestório, com dificuldades na mastigação
e deglutição, o respiratório, com predomínio
na dificuldade de articulação das palavras, e
outras manifestações de difícil diagnóstico, e
cujo conjunto de sintomas afetava o paciente
do caso relatado por Márcia.
O Posfácio é de Josias DeBenedetti, advoga-
do, professor universitário e doutor em Direito
Constitucional, antigo amigo de escola, teste-
munha do esforço pessoal de Márcia na supe-
ração das próprias dificuldades de expressão
do pensamento em palavras, meta prioritária
trabalhada por ela junto ao paciente. Por último,
apresentam-se os depoimentos de Maria Teresa
Andion, psicopedagoga e arteterapeuta, de Ma-
ria Inês Tassinari, fonoaudióloga e psicanalista,
de Rubens Wajnsztejn, neurologista, de Silvia
Koury Jerez Ferrara, ortodondista e de Kaio
Julio César Pezzutti, ator e diretor de teatro, a
respeito da conduta ética e profissional de Már-
cia na busca de um diagnóstico, bem como de
suas participações na articulação das múltiplas
leituras e acompanhamentos que o caso requeria.
Na Introdução, em narrativa marcada pela
liberdade de estilo, a autora traça os fios da
tessitura de sua história pessoal e a de Valen-
thin, o caso clínico apresentado. Ela, menina
do interior, em decorrência de um estrabismo
tinha dificuldades de se situar no espaço, era
tida como desatenta, preguiçosa e desastrada,
com sérias consequências em sua aprendiza-
gem: não conseguia ler e escrever. Ele, 16 anos,
filho mais velho de uma família de três irmãos,
era considerado vagabundo e desatento, havia
passado por diferentes avaliações fonoaudio-
lógicas e tratamentos na área, sem resultados
favoráveis ao quadro de distúrbios de lingua-
gem e de comunicação que se agravava. Segue
contando sua trajetória pessoal, como, ainda
menina, descobriu os livros do pai e, sozinha, foi
“lidando com o emaranhado das letras”. Narra
seu percurso de formação profissional chegando
ao campo da Educação e da Fonoaudiologia,
áreas que, não por acaso, lhe possibilitam lidar
com as dificuldades e patologias da leitura, da
fala e da escrita e, posteriormente, por meio de
cursos de especialização em Psicopedagogia e
Psicanálise, amplia seus conhecimentos e capa-
cidade de compreensão do humano.
Nos capítulos 1 e 2, Márcia apresenta as
circunstâncias que engendraram o contexto no
qual Valenthin lhe é designado como pacien-
te. Na época atuava como fonoaudióloga na
primeira Equipe Interdisciplinar da Secretaria
de Educação do Município de Osasco, era
assessora técnica dessa secretaria, com inter-
locução com a Secretaria de Saúde. Valenthin
veio encaminhado como um caso de inclusão
pelo coordenador de uma escola particular, com
base em relatório psicológico que indicava sua
inserção em uma escola especial. O coordena-
dor buscava orientação, face à complexidade
do caso. Os primeiros contatos com a escola,
com os pais e com as terapeutas anteriores
confirmavam, a cada nova entrevista, a gra-
vidade e recorrência de sintomas: distúrbios
articulatórios, de disfluência e dificuldades de
aprendizagem, de respiração oral e alterações
na voz, agravados, segundo as especialistas,
pela situação familiar, cujos pais lutavam há
dez anos contra o câncer do filho mais novo,
naquele momento, em estado terminal.
No capítulo 3, Márcia descreve as impressões
do primeiro contato com Valenthin: voz trêmula
e estrangulada, não direção do olhar, tensão
postural, auto-referência negativa de alguém

Castanho MIS
Rev. Psicopedagogia 2010; 27(84): 430-2
432
cansado de não ser entendido e ser considerado
como um fracassado, vagabundo e preguiçoso.
Nesse e nos encontros seguintes, ele expressa
suas queixas, o peso de sua responsabilidade
como filho mais velho, a dor da perda do irmão
doente, a comparação por não ser tão inteligente
como o outro, as dores físicas e psíquicas de seu
quadro sintomático. Diante do turbilhão de tais
demandas, a autora se vê desorientada frente a
um não saber, e apresenta com humildade que
a saída provável estaria na possibilidade de res-
ponder às perguntas do próprio paciente: ‘Você
acredita em milagre? Será que dá para você ser
minha ‘psicopedafono’?”. Para ele, a saída seria,
de um lado, a fé, de outro, a capacidade de Már-
cia ser diferente das fonoaudiólogas anteriores
que, segundo ele, só repetiam exercícios e mais
exercícios dos quais estava cansado. Tem início,
assim, o longo percurso na busca de subsídios e
supervisões para encontrar resposta para as per-
guntas feitas e, principalmente, localizar-se no
lugar de uma demanda explicitada: ser “psico”,
“peda”, “fono”.
A cada novo capítulo, do quarto ao oitavo,
Márcia surpreende o leitor com seu trabalho
incansável no caminhar gradativo, por meio de
ensaios, acertos e erros, os quais estruturam o
pensar e o agir terapêuticos. Seu relato clínico
ultrapassa a formalidade teórica e se destaca
pela sensibilidade para com o sofrimento da
evolução do quadro, a despeito das inúmeras
tentativas de compreensão dos sintomas e da
busca incessante de recursos que pudessem
ajudar Valenthin na superação de suas difi-
culdades. Destacam-se a arte como recurso
terapêutico, o trabalho com fotografias para
elaboração de sua história pessoal e lugar ocu-
pado na família, a reflexão a partir de histórias
bíblicas e o encontro com a arte cênica. Todos
esses recursos se associavam aos duros exercí-
cios fonoarticulatórios necessários pelo agrava-
mento dos sintomas. Ressalta-se a coragem de
Márcia de encontrar subsídios, em especial em
Françoise Dolto, na obra “O evangelho à luz da
Psicanálise”, cuja experiência com a utilização
de textos bíblicos deu sustentação à continui-
dade de seu trabalho com Valenthin.
Como fechamento da narrativa, nos capí-
tulos 9 e 10, se concretiza a formalização do
diagnóstico de Distrofia Muscular de Steiner,
cuja descrição nosográfica trazia alívio para a
angústia do paciente, até o momento sem res-
postas para suas inúmeras perguntas. A aliança
terapeuta-cliente resultou na força para querer
e suportar o diagnóstico, por mais temerário que
fosse, pela possibilidade de apropriação de um
saber para o enfrentamento de uma realidade
que, pela primeira vez, era denominada.
Se a ciência é o esforço de reunir, pelo pensa-
mento sistemático, os fenômenos perceptíveis,
e é a reconstrução posterior da existência pelo
processo da conceituação, a religião é o esforço
da humanidade para atingir uma clara e com-
pleta consciência dos valores e das metas por
aspirações suprapessoais. Einstein nos brinda
com essa reflexão, no texto “Ciência e Religião”.
A ciência lida com o real, não emite juízos de va-
lor; no entanto, é da esfera da religião que brota
a fé na possibilidade de regulações válidas para
que a existência do homem seja compreensível
à razão. No trabalho de Márcia, encontramos
essa postura científica e humana pela abertura
e exposição de suas próprias aprendizagens e
crescimento como pessoa e terapeuta e por sua
coragem de abrir-se às experiências e sofrimen-
to do Outro.
Resenha realizada no Centro Universitário FIEO –
UNIFIEO, Osasco, SP, Brasil.
Artigo recebido: 19/12/2010
Aprovado: 21/12/2010

ASSOCIADOS TITULARES PARA REVISTA Nº 84 – 2010
ALAGOAS
Maceió
ELIANE CALHEIROS CANSANÇÃO
[email protected]
(82) 3223-4258 – Farol
BAHIA
Feira de Santana
LOURDES MARIA DA SILVA TEIXEIRA
[email protected]
(75) 3221-3456 – Mangabeira
Itabuna
GENIGLEIDE SANTOS DA HORA
[email protected]
(73) 3617-0372 – São Caetano
Salvador
ARLENE NASCIMENTO PESSOA
[email protected]
(71) 9983-0470 – Caminho das Árvores
DEBORA SILVA DE CASTRO PEREIRA
[email protected]
(71) 3341-2708 – Candeal
JACY CÉLIA DA FRANCA SOARES
[email protected]
(71) 3347-8777 – Pituba
JOZELIA DE ABREU TESTAGROSSA
[email protected]
(71) 3341-2708 – Caminho das Árvores
KARENINA AZEVEDO
[email protected]
(71) 3345-3535 – Pituba
LEILA DA FRANCA SOARES
[email protected]
(71) 3347-8777 – Pituba
MÁRCIA GONÇALVES NUNES
[email protected]
(71) 3374-4505 – Federação
MARIA ANGELICA MOREIRA RO-
CHA
[email protected]
(71) 3345-1111 – Pituba
SANDRA MARIA FURTADO ANDRA-
DE
[email protected]
(71) 3351-9973 – Itaigara
CEARÁ
Fortaleza
ANDRÉA AYRES COSTA DE OLI-
VEIRA
[email protected]
(85) 3261-0064 – Aldeota
ELIANE CÁSSIA ROCHA BLANES
[email protected]
(85) 3244-2820 – Dionísio Torres
FRANCISCA FRANCINEIDE CÂN-
DIDO
[email protected]
(85) 3272-3966 – Fátima
GALEÁRA MATOS DE FRANÇA
SILVA
[email protected]
(85) 3264-0322 – Aldeota
MARIA JOSÉ WEYNE MELO DE
CASTRO
[email protected]
(85) 3261-0064 – Parque
MARISA PASCARELLI AGRELLO
[email protected]
(85) 3267-5714 – Varjota
OTILIA DAMARIS QUEIROZ
[email protected]
(85) 3246-7000 – Dionísio Torres
Tianguá
GRAÇA MARIA DE MORAIS
AGUIAR E SILVA
[email protected]
(88) 9963-5854 – Centro
DISTRITO FEDERAL
Brasília
MARINA LIMA BEUST
[email protected]
(61) 3326-9314 – Asa Norte
MARLI LOURDES DA SILVA CAMPOS
[email protected]
(61) 3321-3666
Guará
ELINE LIMA M. DE AZEVEDO
[email protected]
(61) 3901-7583 – Vila Tecnológica
ESPÍRITO SANTO
Vitória
HIRAN PINEL
[email protected]
(27) 3325-6765 – Jardim da Penha
IARA FELDMAN
[email protected]
(27) 3225-9101 – Jardim da Penha
MARIA DA GRAÇA VON KRUGER
PIMENTEL
[email protected]
(27) 3225-9978 – Praia do Canto
MARISTELA DO VALLE
[email protected]
(27) 3215-5039 – Jardim da Penha
GOIÁS
Goiânia
CARLA BARBOSA DE ANDRADE
JAYME
[email protected]
(62) 3225-9805 – Setor Oeste
JANAÍNA CARLA R. DOS SANTOS
[email protected]
(62) 3241-7837 – Setor Sul
LUCIANA BARROS DE ALMEIDA
SILVA
[email protected]
(62) 3293-3067 – Setor Marista
MARISTELA NUNES PINHEIRO
[email protected]
(62) 3259-0247 – Nova Suíça
MATO GROSSO
Cuiabá
ÂNGELA CRISTINA MUNHOZ
MALUF
[email protected]
(65) 9214-4484 – Jardim Cuiabá
MARIA MASARELA MARQUES DOS
PASSOS
[email protected]
(65) 3028-1372 – Campo Velho
MINAS GERAIS
Campanha
RAMONA CARVALHO FERNANDEZ
NOGUEIRA
[email protected]
(35) 3261-2119 – Centro
Pouso Alegre
SÔNIA REGINA BELLARDI TAVARES
[email protected]
(35) 3425-3456 – Santa Filomena
Uberlândia
SANDRA MEIRE DE OLIVEIRA R.
ARANTES
[email protected]
(34) 3224-3687 – Lidice
Varginha
HELENA SCHERER GIORDANO
[email protected]
(35) 3212-7296 – Novo Horizonte
JÚLIA EUGÊNIA GONÇALVES
[email protected]
(35) 3222-1214 – Centro

MARIA CLARA R. R. FORESTI
[email protected]
(35) 3212-3496 – Centro
MARIA ISABEL SILVA PINTO RE-
ZENDE
[email protected]
(35) 3212-9120 – Jardim Andere
REGINA CLÁUDIA A. S. FERRAZ
[email protected]
(35) 3214-5660 – Jardim Andere
PARÁ
Belém
CARMEM CYLBELLE PEREIRA AL-
VES VIÉGAS
[email protected]
(91) 3259-3531 – São Braz
ELIANE SOUZA DE DEUS NETO
ALMEIDA
[email protected]
(91) 3259-3531 – Cidade Velha
MARIA DE NAZARÉ DO VALE
SOARES
[email protected]
(91) 9981-2076 – São Braz
PARANÁ
Curitiba
ADRIANE CREDIDIO R.C.DYMINSKI
ARRUDA
[email protected]
(41) 3672-3454 – Jardim Menino Deus
ARLETE ZAGONEL SERAFINI
[email protected]
(41) 3363-1500 – Santa Cândida
CINTIA BENTO M. VEIGA
[email protected]
(41) 3332-2156 – Rebouças
EVELISE M. LABATUT PORTILHO
[email protected]
(41) 3271-1655 – Prado Velho
FABIANE CASAGRANDE C. O.
MELLO
[email protected]
(41) 3022-4041 – Batel
ISABEL CRISTINA HIERRO PAROLIN
[email protected]
(41) 3264-8061 – Alto da XV
LAURA MONTE SERRAT BARBOSA
[email protected]
(41) 3363-1500 – Alto da Glória
REGINA BONAT PIANOVSKI
[email protected]
(41) 3345-8798 – Portão
ROSE MARY DA FONSECA SANTOS
[email protected]
(41) 3026-2865 – Centro Cívico
SONIA MARIA GOMES DE SÁ
KUSTER
[email protected]
(41) 3264-8061 – Centro
Foz do Iguaçu
ANA ZANIN ROVANI
[email protected]
(45) 3025-6103 – Centro
Guarapuava
ADRIANA CRISTINE LUCCHIN
[email protected]
(42) 3622-4022 – Trianon
Londrina
ROSA MARIA JUNQUEIRA SCIC-
CHITANO
[email protected]
(43) 3342-7308 – Jardim Caiçaras
Maringá
GEIVA CAROLINA CALSA
[email protected]
(44) 3261-4127 – Vila Morangueira
NERLI NONATO RIBEIRO MORI
[email protected]
(44) 3261-4887 – Campus Universitário
São José dos Pinhais
LORIANE DE FÁTIMA FERREIRA
[email protected]
(41) 3282-9357 – Centro
PERNAMBUCO
Recife
DAISY FLORIZA C. AMARAL
[email protected]
(81) 3326-1927 – Boa Viagem
PIAUÍ
Teresina
AMÉLIA CUNHA RIO LIMA COSTA
amé[email protected]
(86) 3233-2878 – Fátima
JOYCE MARIA BARBOSA DE PADUA
[email protected]
(86) 3221-1013 – Centro/Sul
RIO DE JANEIRO
Ilha do Governador
DULCE CONSUELO RIBEIRO
SOARES
[email protected]
(21) 3366-2468 – Freguesia
Niterói
FÁTIMA GALVÃO PALMA
[email protected]
(21) 2710-5577 – Icaraí
Rio de Janeiro
AGLAEL LUZ BORGES
[email protected]
(21) 2493-8481 – Flamengo
ANA MARIA ZENÍCOLA
[email protected]
(21) 2556-3767 – Flamengo
ANA PAULA LOUREIRO E COSTA
[email protected]
(21) 2436-1803 – Jacarepaguá
CLYTIA SIANO FREIRE DE CASTRO
[email protected]
(21) 2247-3185 – Ipanema
DIRCE MARIA MORRISSY MACHA-
DO
[email protected]
(21) 2236-2012 – Copacabana
HELOISA BEATRIZ ALICE RUBMAN
[email protected]
(21) 2259-9959 – Jardim Botânico
JANE BRAVO GORNE
[email protected]
(21) 2541-4623 – Botafogo
LUCIA HELENA MACHADO SAA-
VEDRA
[email protected]
(21) 2239-5878 – Gávea
MARIA HELENA C. LISBOA BAR-
THOLO
[email protected]
(21) 2266-0818 – Humaitá
MARIA KATIANA VELUK GUTIER-
REZ
[email protected]
(21)2527-1933 – São Conrado
MARIA LÚCIA DE OLIVEIRA FI-
GUEIREDO
[email protected]
(21) 9345-4020 – Botafogo
MARLENE DIAS PEREIRA PINTO
[email protected]
(21) 9739-5332 – Leblon
MARTHA IZAURA DO NASCIMEN-
TO TABOADA
[email protected]
(21) 2570-0065 – Barra da Tijuca

VERA BEATRIZ DA COSTA NUNES
MENDONÇA
[email protected]
(21) 2295-4838 – Botafogo
RIO GRANDE DO NORTE
Natal
ADRIANNA FLÁVIA DE FIGUEIRE-
DO MELO
[email protected]
(84) 3031-0193 - Tirol
EDNALVA DE AZEVEDO SILVA
[email protected]
(84) 3221-6573 – Lagoa Seca
CHRISTINA SALES NOVO
[email protected]
(84) 3206-4449 – Dix Sept Rosado
ELOISA ELENA PRATES BOEIRA
[email protected]
(84) 3642-1004 – Alecrim
SONIA APARECIDA MONÇÃO
GONÇALVES
[email protected]
(84) 3211-4220 – Ribeira
Parnamirim
FRANCY IZANNYDE BRITO BARBO-
SA MARTINS
[email protected]
(84) 4006-9509 – Parque das Nações
RIO GRANDE DO SUL
Passo Fundo
IARA SALETE CAIERÃO
[email protected]
(54) 3311-5230 – Centro
Porto Alegre
CLARA GENI BERLIM
[email protected]
(51) 3221-1740 – Santana
FABIANI ORTIZ PORTELLA
[email protected]
(51) 3209-5722 – Cidade Baixa
MARILENE DA SILVA CARDOSO
[email protected]
(51) 8182-0721 – Higienópolis
NEUSA KERN HICKEL
[email protected]
(51) 3333-5478 – Centro
SANDRA MARIA CORDEIRO
SCHRÖEDER
[email protected]
(51) 3328-3872 – Chácara das Pedras
SONIA MARIA PALLAORO MOOJEN
[email protected]
(51) 3333-8300 – Petrópolis
VERÔNICA ABELLA MARQUES
[email protected]
(51) 3374-6938 – Higienópolis
Santa Maria
FABIANI ROMANO DE SOUZA
BRIDI
[email protected]
(55) 3225-1577 – N. Sra. de Lourdes
SANTA CATARINA
Florianópolis
ALBERTINA C. MATTOS CHRAIM
[email protected]
(48) 3244-5984 – Estreito
JANICE MARIA BETAVE
[email protected]
(48) 8453-7791 – Ingleses
LILIANA STADNIK
[email protected]
(48) 3248-0401 – Balneário
MÁRCIA FIATES
[email protected]
(48)3224-0441 – Centro
MARIA GUILHERMINA COSTA
ACIOLI
[email protected]
(48) 3223-6402 – Centro
MARIA LÚCIA ALMADA FERNANDES
[email protected]
(48) 3331-1952 – Trindade
SÃO PAULO
Araraquara
ALINE RECK PADILHA ABRANTES
[email protected]
(11) 3335-7440 – Centro
Campinas
MARIA LAURA CASSOLI MACEDO
[email protected]
(19) 3254-2714 – Jardim N. Sra Auxi-
liadora
Cotia
MARIA CECILIA CASTRO GASPA-
RIAN
[email protected]
(11) 4702-2192- Granja Viana
Jacareí
ANA MARIA LUKASCHEK BRISOLA
[email protected]
(12) 3951-7929
Ribeirão Preto
ANA LUCIA DE ABREU BRAGA
[email protected]
(16) 3021-5490 – Jardim Sumaré
Santos
ANGELA COTROFE RODRIGUES
[email protected]
(13) 3232-5020 – Boqueirão
São Bernardo do Campo
BEATRIZ PICCOLO GIMENES
[email protected]
(11) 4368-0013 – Rudge Ramos
São Paulo
ADA MARIA GOMES HAZARABE-
DIAN
[email protected]
(11) 2261-2377 – Jardim França
ANA LISETE P. RODRIGUES
[email protected]
(11) 3885-7200 – Jardim Paulista
ANDREA DE CASTRO J. RACY
andré[email protected]
(11) 5572-1331 – Vila Nova Conceição
BEATRIZ JUDITH LIMA SCOZ
[email protected]
(11) 3651-9914 – Alto de Pinheiros
CARLA LABAKI
[email protected]
(11) 3815-5774 – Vila Madalena
CLEOMAR LANDIM DE OLIVEIRA
[email protected]
(11) 9302-5501 – Moema
ELISA MARIA DIAS DE TOLEDO
PITOMBO
[email protected]
(11) 5184-1340 – Granja Julieta
ELOISA QUADROS FAGALI
[email protected]
(11) 3864-2869 - Perdizes
HERVAL G. FLORES
[email protected]
(11) 3257-5106 – Higienópolis
LEDA MARIA CODEÇO BARONE
[email protected]
(11) 3082-4986 – Vila Olímpia
LUCIA BERNSTEIN
[email protected]
(11) 3209-8071- Aclimação

CADASTRE-SE NO SITE DA ABPp
e receba em seu e-mail as newsletters com notícias,
programação de eventos da ABPp e de seus parceiros
www.abpp.com.br
MÁRCIA ALVES SIMÕES
[email protected]
(11) 8192-0921 – Tatuapé
MARGARIDA AZEVEDO DUPAS
[email protected]
(11) 3021-8707- Alto de Pinheiros
MARIA BERNADETE GIOMETTI
PORTÁSIO
[email protected]
(11) 2950-6072 – Santana
MARIA CÉLIA R. MALTA CAMPOS
[email protected]
(11) 3819-9097 – Alto de Pinheiros
MARIA CRISTINA NATEL
[email protected]
(11) 5081-2057 – Vila Mariana
MARIA DE FATIMA MARQUES
GOLA
[email protected]
(11) 3052-2381 – Jardim Paulista
MARIA IRENE DE MATOS MALUF
[email protected]
(11) 3258-5715 – Higienópolis
MARIA TERESA MESSEDER
ANDION
[email protected]
(11) 3023-5834 – Alto de Pinheiros
MARISA IRENE S. CASTANHO
[email protected]
(11) 3491-0522 – Ipiranga
MÔNICA HOEHNE MENDES
[email protected]
(11) 5041-1988 – Alto de Pinheiros
NÁDIA APARECIDA BOSSA
[email protected]
(11) 2268-4545 – Mooca
NEIDE DE AQUINO NOFFS
[email protected]
(11) 3670-8162 – Perdizes
NIVEA MARIA DE CARVALHO
FABRICIO
[email protected]
(11) 3868-3850 – Perdizes
QUÉZIA BOMBONATTO SILVA
[email protected]
(11) 3815-8710 – Vila Madalena
REGINA A. S. I. FEDERICO
[email protected]
(11) 5041-1988 – Brooklin
REGINA ZAIDAN PEREIRA MENDES
[email protected]
(11) 3872-2434 – Pacaembú
SANDRA G. DE SÁ KRAFT MOREIRA
DO NASCIMENTO
[email protected]
(11) 3805-9799 – Morumbi
SANDRA LIA NISTERHOFEN SAN-
TILLI
[email protected]
(11) 3259-0837 - Higienópolis
SILVIA AMARAL DE MELLO PINTO
[email protected]
(11) 3097-8328 - Pinheiros
SONIA MARIA COLLI DE SOUZA
[email protected]
(11) 3287-8406 - Bela Vista
TELMA PANTANO
[email protected]
(11) 3062-6580 – Jardins
VALÉRIA RIVELLINO LOURENZO
[email protected]
(11) 5041-7896- Brooklin
VÂNIA CARVALHO BUENO DE
SOUZA
[email protected]
(11) 5041-7896 - Brooklin
VERA MEIDE MIGUEL RODRIGUES
[email protected]
(11) 3511-3888 - Pacaembú
WYLMA FERRAZ LIMA
[email protected]
(11) 3721-6421 – Morumbi
YARA PRATES
[email protected]
(11) 2976-8937 – Vila Ester
Valinhos
SILVANA BRESSAN
[email protected]
(19) 3829-1704 - Recanto
Vinhedo
CRISTINA VANDOROS QUILICI
[email protected]
(19) 9259-6652 – Portal Itália
SERGIPE
Aracaju
AUREDITE CARDOSO COSTA
[email protected]
(79) 3211-8668 – São José
Tags