Comunicação, Educação e Tecnologia 15
guarda / Ele acerta sua carne / Você
é nocauteado / Boca tão cheia de
mentiras / Tende a enegrecer seus
olhos / Apenas os mantenha fechados /
Continue rezando / Apenas continue es-
perando / Esperando por ele / O dia que
nunca vem”.
Quando assisti o clipe, fiquei surpresa
com a história que o diretor Thomas Vin-
terberg criou: “The day that never
comes” mostra um dia difícil na vida de
um soldado americano no Iraque ou no
Afeganistão, e cria uma típica história
com começo, meio e fim, intercalada por
cenas da banda tocando no meio do de-
serto. E aqui começa um problema
rock’n’roll.
Na perspectiva dos estudos de mídia,
narrativas são cadeias de fatos que geram
um sentido final.Assim, representação e
valores emergem do texto, e não de uma
suposta interpretação livre do observa-
dor. Se quisermos ter consciência dos
ESTUDANDO ESTRUTURAS NARRATIVAS Leia este texto sobre estruturas narrativas e re-
presentação a partir do videoclipe “The Day
that never comes”, do Metallica, gravado no
disco Death Magnetic, de 2008. Preste atenção
no modo como o texto desmonta o clipe em
termos de começo, meio e fim e, ao fazer isso,
identifica as representações e valores subja-
centes ao modo como a história foi organizada.
Na tentativa de aproximar conceitos
da área de estudos de mídia à realidade
cotidiana dos alunos de licenciaturas da
Universidade Federal do Triângulo Mi-
neiro, resolvi encarar um videoclipe da
banda de heavy metal Metallica. Se a
cultura midiática é o palco das disputas
simbólicas, então uma das mais impor-
tantes bandas de rock da atualidade tam-
bém deve ter lá as suas controvérsias de
representação.
O clipe escolhido foi o da música
“The day that never comes”, do álbum
“Death Magnetic”, lançado em 2008.
Quando comprei o disco e ouvi a canção
pela primeira vez, a imagem que me veio
à consciência foi a de um detento, vi-
vendo sua última noite na prisão e aguar-
dando ansiosamente o dia da liberdade –
que parece nunca chegar. Vários ele-
mentos da letra permitem essa interpre-
tação: “Nascido para te maltratar/
Melhor só aceitar isso / Você se res-
Nem Metallica escapa*
Alexandra Bujokas
processos subjetivos através dos quais
lemos , introjetamos idéias e damos sen-
tido ao mundo, o primeiro passo é tentar
se afastar emocionalmente das narrati-
vas que nos chegam pela cultura midiá-
tica, e olhar o que há ali. Façamos isso.
O clipe de “The Day that never
comes” pode ser organizado em termos
de começo, meio e fim. A história co-
meça com um grupo de quatro soldados
fazendo patrulha em uma região desér-
tica, quando são atingidos por uma ex-
plosão. Rapidamente eles se posicionam
para contra-atacar, mas um soldado fica
ferido. O líder do grupo fornece os pri-
meiros socorros, pede ajuda e tenta man-
ter seu companheiro consciente. A partir
daí se desenrolam as complicações da
história: o soldado ferido está à beira da
morte e é levado de helicóptero, o líder
do grupo volta para a base e, enquanto
recarrega suas armas, adquire uma ex-
pressão sombria, típica de quem pensa
em revanche. Ele reúne sua tropa e volta
para o deserto. No meio do caminho, os
soldados encontram um carro parado,
um homem com trajes típicos da cultura
muçulmana mexendo no motor, uma
mulher de burca dentro do veículo. Os
soldados se posicionam estrategicamente
ao redor do carro, o comandante manda
o homem se ajoelhar e aponta sua arma,
e este é o momento de maior tensão na
história. Mas a mulher decide sair do
carro e caminha com as mãos levantadas
em direção ao comandante. Olhos nos
olhos e o líder deduz que eles não são ter-
roristas. A arma é abaixada. No final, os
soldados ajudam o muçulmano a conser-
tar o carro, deixam-no seguir seu cami-
nho e o comandante olha para o sol,
numa atitude reflexiva.
Ao explicitar a evolução do clipe,
temos evidências que nos ajudam a re-
fletir sobre o processo narrativo que foi
criado ali: como as informações foram
fornecidas, atrasadas ou sonegadas, quais
pistas foram dadas para guiar nossa in-
terpretação, como a história joga com