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canalizando-os de forma mais adequada e coerente. Esses dois impulsos
fundamentais, o prazer e a raiva, nesses mesmos indivíduos foram depurados
em seus estados primitivos - atividades eróticas e violentas - e transformados
nas atividades das áreas afetiva e de iniciativa com determinação.
Essencialmente, porém, é preciso dizer que o ato de transformação do
impulso de destruição não requer a “anulação” ou “extinção” dele em nossa
intimidade , e sim o aprendizado de transmutá-lo, observando o que diz
literalmente a palavra “transformação”, oriunda do latim: “trans” quer dizer
“através de”; “forma”, o modo pelo qual uma coisa existe ou se manifesta; e
“actio”, “ação”. Entendemos por fim que, “através de novas ações, mudaremos
as formas pelas quais a raiva se manifesta”, sem, todavia, aniquilá-las ou
exterminá-las.
Com essa visão, a proposta salutar de canalizar e sublima r a
agressividade é promover-nos profissionalmente, criando at ividades
educativas, usando práticas do esporte e outras tantas realizações. Todos
aqueles que se dedicam às atividades nas áreas da criatividade, como poetas,
pintores, oradores, escultores, artesãos, escritores, compositores e outros,
fazem parte das criaturas que direcionam seus impulsos de agressividade para
as artes em geral, sublimando-os.
Por sua vez, os que se exercitam fisicamente constituem exemplos
clássicos daqueles que escoam naturalmente para o esporte sua energia de
raiva. Outros tantos a transformam, redirecionando-a para as atividades junto
aos carentes, nas obras e instituições de promoção e assistência social.
Quando as crianças insistirem em cortar, destruir, quebrar, arrancar,
esmagar, torcer, bater ou amassar, estão apenas manuseando suas emoções
emergentes de raiva ou seus impulsos agressivos, para que saibam usá-los no
futuro com controle e conveniência. Em vez de censurá-los e criticá-los,
devemos oferecer-lhes um “material adequado”, para que essas manifestações
possam ocorrer plenamente, sem dissabores ou demais prejuízos.
Desse modo, “amar os inimigos não é, pois, ter para com eles uma
afeição que não está na Natureza”. (2) Nossas emoções são energias que
obedecem às leis naturais da vida, são previstas nos estatutos da “Lei de
destruição” e da “Lei de conservação”, e agem mecanicamente, pois são
disparadas ao detectarmos nossos adversários.
Não obstante, “o contato de um inimigo faz bater o coração de maneira
bem diferente do de um amigo”, (3) quer dizer, a emoção energética da raiva
ativa a glândula supra-renal, que libera a adrenalina no sangue. O coração
acelera, a pressão arterial sobe, a respiração se intensifica, os músculos se
contraem; daí sentirmos essa sensação estranha e incômoda.
Em síntese, “amar” os inimigos ou adversários, na interpretação do
ensino de Jesus Cristo, não é nutrir por eles ódio ou qualquer propósito de
vingança, nem mesmo desejar-lhes mal algum.
Acima de tudo, o Mestre queria dizer que nossas emoções inatas de
raiva, em nosso atual contexto evolutivo, não querem, em verdade, destruir
nada do que está “fora de nós”, como se fazia nos primórdios da evolução. Ao
contrário, elas querem nos defender, destruindo conceitos, atitudes e
pensamentos “dentro de nós”, os quais nos tornam suscetíveis e vulneráveis ao
mundo e, conseqüentemente, nos fazem ser atacados, machuca dos e
ofendidos.